Segunda evocação da Crise Académica de 1962 na sua dimensão coimbrã
I.. Na sequência da evocação, que aqui fiz ontem, da dimensão coimbrã da crise académica de 1962, vou hoje transcrever um novo Anexo que também incluí no meu livro, publicado em 2016, sobre a crise de Coimbra de 1969 , “Abril antes de Abril”.
II. Anexo nº 4 - Estudantes presos em Coimbra pela PIDE na crise académica de 1962.
1.
A divulgação da lista dos estudantes presos pela PIDE em Coimbra no decorrer da
crise académica de 1962 justifica a transcrição como enquadramento de um
pequeno comentário que fiz no meu blog,
o qual como podem constatar se relaciona diretamente com a sua génese.
De
facto, em Janeiro de 2012, soube da morte do Xico
Delgado, tendo-lhe prestado homenagem no meu blog, evocando especialmente a nossa participação na aventura
poética e cívica dos “Poemas Livres”. Depois acrescentei-lhe uma pequena
narrativa que mostra a verdadeira razão pela qual, fora da Direção- Geral da
AAC, ele foi o estudante de Coimbra mais duramente sancionado (dois anos de
expulsão de todas as escolas nacionais). Eis o texto que então escrevi:
“Nesta evocação quero recordar um episódio ocorrido, em Coimbra,
durante os dias escaldantes da crise de 1962. Os estudantes tinham aceitado
sair da sede da AAC, cercada pela polícia de choque, para corresponderem a um
esforço de mediação de um grupo de professores da UC, que se dispuseram a
promover uma saída negociada para o conflito que opunha os estudantes e as
autoridades universitárias. Todavia, o máximo que esse grupo conseguiu obter
destas últimas não foi considerado satisfatório pela Assembleia Magna, reunida
no Campo de Santa Cruz , uma vez que estava encerrada a sede da AAC no Palácio
dos Grilos. Por isso, a proposta veiculada pelos professores foi rejeitada.
O corolário natural dessa rejeição era
o regresso à sede da AAC, donde só tínhamos saído para permitir essa
negociação. Falhada a negociação, haveria que voltar ao Palácio dos Grilos. Mas
se tal fosse votado expressamente no Campo de Santa Cruz, quando chegássemos ao
Palácio dos Grilos já lá estaria a polícia e não conseguiríamos entrar. Por
isso, a decisão não foi formalmente tomada na AM, tendo apenas sido passada a
palavra de que iríamos até ao Pátio da Universidade.
Apenas alguns foram informados da razão dessa
ida. Umas centenas de estudantes deslocaram-se assim até lá. Haviam sido
distribuídas tarefas pela Direcção-Geral. A mim , aos irmãos Luís e Pedro Lemos
e a mais alguns, cabia-nos promover o arrombamento da Torre da Universidade
para fazer tocar a "cabra".[
Prometo que, além dos três textos prometidos, escreverei depois um quarto em que contarei em detalhe o que
aconteceu então no Pátio da Universidade. Algo, que ao que julgo saber, nunca
foi divulgado.] Ao Xico Delgado coube um papel crucial. Chegados
ao Pátio da Universidade era preciso dar o passo seguinte: ir para a sede da
AAC, entrar arrombando a porta e reocupá-la. Mas alguém tinha que o propor. Foi
essa a missão do Xico Delgado. Subindo alguns degraus da escada que
desce da Via Latina para a Porta Férrea, perante algumas centenas de
estudantes, em breves palavras, incisivas e cortantes, como a ocasião exigia,
apelou a que regressássemos à sede da AAC. Assim aconteceu. Era perto. A
polícia não podia chegar antes de nós. Não chegou. Entrou-se pela Filantrópica.
Menos de uma hora depois o Palácio dos Grilos estava completamente cercado pela
polícia de choque.
À noite, os estudantes manifestaram-se
na rua em solidariedade com os colegas cercados. Foram dispersos brutalmente,
pela polícia. Às quatro da manhã o Palácio dos Grilos foi assaltado pela PSP e
pela PIDE. Todos os que estávamos lá dentro fomos transportados em carrinhas
para o quartel da GNR na Av. Dias da Silva. Aí a PIDE identificou-nos um por
um. Selecionou trinta e nove homens e quatro mulheres. As quatro mulheres
ficaram em Coimbra, presas na sede da PIDE. Os trinta e nove homens foram de
imediato enviados para o Forte de Caxias. Viagem de chumbo, imensa e fria;
madrugada que ia abrindo dentro de si uma noite de incerteza. O que nos ia
acontecer? Por quanto tempo iríamos estar presos? O Xico Delgado fez
essa viagem; e eu também. Foram apenas alguns dias no reduto norte do Forte de Caxias, uma das
prisões políticas existentes, mas
naquela soturna manhã de maio, nós ainda não sabíamos se iriam ser dias, meses
ou anos.”
2.Viria
a juntar-se-nos já em Caxias o Presidente da Assembleia Magna da AAC, o
angolano estudante de Medicina, Mac Mahon. Foi no dia 18 de maio de 1962. Os
que estiveram menos tempo saíram oito dias depois. Tal como outros, eu saí ao
fim de onze dias. Os restantes foram saindo aos poucos. Os últimos passaram em
Caxias mais de um mês.
Um
amigo e companheiro desses velhos tempos ─ Marcelo Correia Ribeiro ─ fez-me
recentemente chegar às mãos o elenco completo dos estudantes presos nas
circunstâncias acima mencionadas. Cada nome vinha acompanhado das referências
que ele achou relevantes. A uma parte delas reproduzo-as, tendo apenas
acrescentado duas ou três alterações de pormenor.
As
quatro estudantes presas ficaram na sede da PIDE em Coimbra na Rua Antero de
Quental, Foram elas:
Isabel Duarte Reis
(médica estagiária), Irene Namorado
(Ciências), Judite Cortesão (Letras), Margarida Lucas (Direito; direção-geral da AAC).
Os
quarenta estudantes presos foram enviados em carrinhas da polícia para o reduto
norte do Forte de Caxias. Foram eles:
Abílio
Vieira (Direito; presidente da seção de futebol da AAC), Alberto Mendonça Neves [Alá]
( Medicina; Rep. do Prá-kystão), Alberto
Sousa Pinguinhas (Medicina; CITAC),Alfredo
Fernandes Martins (estudante liceal; Pró-associação), Alfredo Soveral Martins (Direito; Rep. dos Corsários, delegado de
curso),António Bernardes (Letras;
República do Rás-teparta), António
Ferreira Guedes (Direito; TEUC; “Poemas Livres”), António Jacinto Rodrigues [Yoga] (Letras- Universidade de Lisboa), António Lopes Dias (Direito; CITAC;
“Poemas Livres”), António Manuel Lecquoc ( Medicina), António Mota Prego ( Direito), António
Teles Grilo (Direito; Rep. do Bota-abaixo; Orfeon), Carlos Ferreira Bento (Ciências; Rep. do Bota-abaixo), Carlos Mac-Mahon de V. Pereira
(Medicina; Presidente da Assembleia Magna), Eduardo Casais ( Letras), Francisco
Delgado (Letras; CITAC; “Poemas Livres”), Jaime Dória Cortezão (Direito), João Gargaté (Medicina), João
Quintela (Letras; CITAC), Jorge
Manuel Bretão (Direito; Rep. dos Corsários; Orfeon), Jorge Ormonde de Aguiar (Medicina; Rep. dos Corsários; Orfeon), José Augusto Rocha (Direito;
direção-geral da AAC), José Ferraz
Alçada ( Medicina; Rep. dos Corsários; Orfeon), José Martins Baptista (Medicina; CITAC), José Monteiro (Ciências; Rep.do Prá-kystão), Luís Gonzaga Bagulho (Medicina; Cine- Clube), Luís Nogueira de Lemos (Medicina; “Via Latina”), Manuel Balonas [Manecas] (Medicina;
Rep. dos Myl-ionários; delegado de curso),
Manuel Cassiano Póvoas
(Direito; Orfeon), Manuel Lima (
médico estagiário), Marcelo Correia
Ribeiro (Direito; CITAC; secção pedagógica), Mário Silva (Ciências; Círculo de Artes Plásticas), Octávio Ribeiro da Cunha (estudante
liceal; Pró-associação), Pedro Mendes de
Abreu (estudante liceal; Pró-associação), Pedro Nogueira de Lemos (Medicina; seção de atletismo), Raul Branco (Ciências; CITAC), Raul Sobral (Ciências), Rui Fernando de Moura ( Direito), Rui Namorado (Direito; “Via Latina”;
“Poemas Livres”), Uriel de Oliveira
(Direito; secção de natação).
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