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segunda-feira, 1 de maio de 2023

DEMOCRACIA. E da boa!!!

 

DEMOCRACIA. E da boa!!!

 

O Sr. jornalista Magalhães, um sujeito calvo de meia idade, percuciente crítico de tudo o que, ainda que ligeiramente, lhe cheire a PS, cometeu hoje na sua CNN uma alusão comparativa com a qual pretendeu mostrar bem a esse Partido as suas limitações como protagonista de Estado. Pretendia ele contar a recente história do computador à procura de um dono, dada a sua alergia a pertencer ao Estado.

Ilustrando bem para que horizontes olham alguns dos vigilantes críticos do actual Governo, recordou um episódio do tempo da “outra senhora” que apresentou como exemplo. Nele se envolveu uma intemerata enfermeira desconhecida que, plantada no seu hospital de trabalho , sofreu a transcendente visita do então Ministro da Saúde do Doutor Salazar, o popular Catedrático de Finanças da FDUL, o suave Soares Martinez. A audaz enfermeira e o feroz catedrático envolveram-se numa rixa de salão, correndo o risco de produzir forte  susto nos inocentes doentes.

O épico de Santa Comba, possuído pela sua consabida verticalidade democrática, apressou-se a despedir velozmente a azougada enfermeira; e, após algumas horas de serena reflexão,  correu também, num gesto  nobre e decidido. com o insalubre Ministro da Saúde.

Para o Senhor Jornalista,  estava assim bem destacado esse transcendente exemplo de Estado, em que participaram alguns destacados vultos da sua confessada democracia: os híper democráticos Salazar e Martinez, bem como a malfadada enfermeira.

Acachapado pela força moral do expoente comparativo deveria o PS curvar-se arrependidamente?  Ou  deveria apenas o povo socialista exclamar: Vai-te encher de moscas aos quadrados !!!

quarta-feira, 13 de outubro de 2021

 PASTÉIS DE BELÉM?

Perpassou levemente pelo espaço mediático a sombra de uma notícia incómoda. Um ou outro raro jornalista, honesto ou distraído, deu-lhe breve e discreta existência.
Afinal o tonitruante caso da possível substituição do Chefe do Estado- Maior da Marinha não foi uma desastrosa secreção ministerial, com o perverso dedinho do Primeiro-Ministro. Não foi uma tenebrosa conspiração oculta, apontada à autonomia das forças armadas, fruto distante mas efetivo da lendária sofreguidão controladora do PS. Terá sido afinal , muito subtil e prosaicamente, um malabarismo radicado numa das casas que atuam no Palácio de Belém. Possivelmente forçando ligeiramente a mão do Presidente, mas seguramente entrando no jogo de sombras de humanas ambições almiranteares, que ousaram corroer o trajeto do grande chefe das vacinações nacionais.
A contenção discreta da nossa comunicação social e mesmo da feroz orquestra dos grandes comentadores não me deixaram afinal saber mais, ter uma certeza. É certo que achei algo estranho que quem foi tão intensivo na demolição de um ministro e na corrosão de um Governo tenha agora deslizado para um discreto silêncio que, parecendo distraído, não deixa de ser muito generoso para Belém e para as suas azougadas casas.
Por mim, caí num espanto ligeira por esta diferença de intensidade e de atitude, embora reconheça que a imparcialidade da nossa comunicação social e dos oráculos políticos mais evidenciados não é a sua qualidade mais evidente ( se é que ela realmente existe).
Mesmo assim não perdi a esperança de ouvir alguma trovoada , pelo menos por parte dos irrequietos porta-vozes que se julgam à esquerda do PS. E, mínimo dos mínimos, da nossa intemerata comentadora dos domingos.
É bem certo : a esperança é a última a morrer !

domingo, 7 de março de 2021

Fantasma de um pesadelo passado

 


Fantasma de um pesadelo passado

 

Cavaco Silva explodiu numa suave reunião de senhoras do PSD. A comunicação social dominante fez respeitosamente ecoar a voz tonitruante do seu antigo senhor.

Como se de um ousado pirilampo se tratasse, a sua rápida e modesta luz prometeu salvar-nos não se sabe bem de quê. Qual arcanjo providencial, veio ostentar uma  determinação firme: a de nos salvar, salvando a nossa democracia da terrível mordaça que a malévola geringonça (que assim ressuscitou) tem vindo a perpetrar contra todos nós.

Com argúcia pôs a nu os sinais mais fortes e mais preocupantes da opressiva mordaça que cerceia a nossa democracia: o ex-Presidente do Tribunal de Contas não foi reconduzido quando terminou o mandato para que havia sido nomeado, o mesmo tendo acontecido com a anterior Procuradora Geral da República. Neste caso o implacável fantasma de si próprio não hesitou em causar um dano colateral no seu sucessor na Presidência já que foi em última instância ele quem a nomeou. Terá o seu olhar de lince da Serra da Malcata descoberto nas brumas do mistério uma secreta implicação do Presidente Marcelo nas perversas maquinações de uma geringonça que afinal existe? O oráculo de Boliqueime deixa crer que talvez.

O ponto fraco desta paixão pela democracia que quer desamordaçar é ter uma intensidade demasiado forte. Tão forte que é dificilmente  harmonizável com a mansidão com que ele suportou  essa coisa que existiu em Portugal antes do 25 de abril e que certamente nem a sua percuciência consegue considerar como algo menos amordaçado do que o agora o atormenta. Pode ser que andasse então apenas distraído e que com o nobre peso dessa distração no seu inconsciente freudiano se exceda agora num paroxismo compensatório de vigilância democrática. Pode também ser um prosaico problema de maus fígados associado a uma possível falta de tempo para encontrar algo de aparentemente consistente que legitimasse algumas farpas mais agressivas no PS, no Governo e na alegada geringonça.

Será talvez a mesma falta de tempo para dar mais consistência ás suas pirilampices que o fez sugerir sem subtileza que os mortos da covid 19 são fundamentalmente culpa do atual governo. Só não se percebeu se o oráculo de Boliqueime imputava ao governo português a culpa apenas pelas consequências nacionais do vírus ou se a estendia à Europa e ao mundo. Não se sabe. De certeza certa, apenas se sabe que sentiu vergonha.

 Anda a OMS na China à procura da raiz da pandemia, quando facilmente evitaria perdas de tempo e dinheiro se perguntasse a Cavaco. Se estiver atenta é o que fará. Terá talvez apenas de inquirir se a culpa foi principalmente do Primeiro-Ministro, da Ministra da Saúde ou de todo o Governo. Aguardemos.

Também foram comoventes as melífluas alfinetadas que espetou em Rui Rio. Não se sabe se para o estimular se para o enfraquecer. Mas foi particularmente brilhante a lógica que uniu a sua enérgica diatribe desqualificativa do PS e a recomendação dirigida ao PSD para atrair os eleitores que têm preferido o PS. Rui Rio ficou tonto:" Então para conquistar os eleitores do PS insulto a escolha que eles fizeram?" Isso o oráculo de Boliqueime não explicou.

Mas onde ele mais se excedeu em rasgo, foi no críptico conselho dado a Rui Rio para lidar com o Chega. Não fale nele. Nunca responda a qualquer pergunta sobre ele. Seja inerte perante qualquer enormidade que venha dele. Notável como Cavaco, que foi tão eloquente em imaginar mordaças para as imputar ao atual  governo, numa pose de intransigente excelência democrática, tenha ficado preso numa bonomia inerte perante as piruetas neofascistas do Chega. Estranho! Tão estranho que é legítimo suspeitar-se que o aferidor de democracia que ele usa está notoriamente avariado. Ou então é o próprio oráculo de Boliqueime que está desbussolado, tendo-se perdido do norte e do simples bom senso.

Cavaco voltou, a direita mais linha do Estoril adorou, o jornalismo mole da matilha dominante mastigou penosamente as banalidades básicas. Mas se me perguntassem em que tipo de programa o colocaram não saberei dizer se foi um programa cómico ou trágico.

domingo, 13 de setembro de 2020

A matilha mediática e os seus senhores

 


A matilha mediática, megafone insalubre da direita, uiva raivosa contra António Costa, contra o Governo, contra o PS. Hoje o pretexto é A, ontem foi X, amanhã será Z. Ora trovejante, ora melíflua. Ora brutal, ora florentina. Incansável, hipócrita, rasteira. Usando o estipêndio dos poderes fácticos, por vezes abusando sem pudor de recursos públicos.

Ocorre-me irresistivelmente, um velho provérbio: “ Se atirares pedras aos cães que te ladram, nunca chegarás ao fim do teu caminho”.

Espreguiço-me com tédio pelo viscoso alarido e cometo  uma pergunta simples: “Se a matilha mediática e os seus senhores, por insidiosa obra do mafarrico, assumissem sem peias o poder político, de quantas semanas precisariam para destruir Portugal?” Não sou capaz de responder com segurança, mas receio que não fossem muitas.

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

A economia social no programa do Governo



No passado dia 7 de novembro, foi publicado no jornal Negócios um artigo da minha autoria, cujo tema era “A economia social no programa do Governo”.  Vou transcrevê-lo.


1. A economia social tem um lugar modesto, mas visível no programado atual Governo. Às entidades que a integram é reconhecida vocação para serem “parceiras fundamentais do Estado na prestação de serviços de interesse geral às populações em termos não mercantis”, com salvaguarda expressa da sua autonomia, radicada em “valores solidários” indutores da sua contribuição “para a satisfação das necessidades coletivas”. Sublinha-se o seu “papel decisivo junto dos segmentos sociais mais fragilizados”. Reconhece-se-lhe o contributo para a “dinamização da própria atividade económica e social”, geradora de emprego.
No programa dá-se ainda relevo à necessidade de estimular o desenvolvimento das entidades da economia social, apostando-se em aumentar “a eficácia e a eficiência da sua atuação” e garantindo-se também “a sua sustentabilidade económica e financeira”. Por isso, o Governo, reconhecendo expressamente “o papel determinante que a economia social desempenha”, manifesta a sua vontade de trabalhar em conjunto com as organizações que a integram, “dando passos no sentido de consolidar uma trajetória de parceria”.
Nesse quadro, propõe-se: 1) melhorar “os instrumentos de regulação da economia social”; 2) promover a modernização dos vários ramos cooperativos e estimular o seu rejuvenescimento, com destaque para o reforço e a agilização das cooperativas de interesse público [neste caso, explicita-se a vontade de as tornar “mais atrativas para o envolvimento de diferentes entidades públicas e privadas na construção de parcerias duradouras na resposta a necessidades sociais, culturais e outras”]; 3) “desenvolver um programa de formação e capacitação para dirigentes de entidades da economia social”; 4) “criar uma rede de incubadoras sociais”; 5)” criar incentivos à inovação social e à exploração de tecnologias que coloquem o cidadão no centro da decisão”; 6) “estimular dinâmicas de medição dos impactos sociais das iniciativas”; 7) “proceder a uma revisão global e integrada da legislação aplicável às fundações”.

2. Neste programa, têm uma ressonância limitada as moções aprovadas nos últimos congressos nacionais do PS, quanto à economia social e não se valoriza com clareza o caminho percorrido na legislatura anterior. Isto não legitima que se menospreze o valor objetivo das opções apresentadas, bem como o acerto estrutural da inclusão da economia social nas respostas ao desafio estratégico do combate às desigualdades. Simetricamente, não se deve apagar a necessidade de se inverter a deriva desvalorizadora do protagonismo do CNES no período final do Governo anterior. Mas para além de uma amplitude mais ambiciosa das medidas propostas e das linhas de orientação reveladas, teria constituído um importante salto qualitativo ter-se dado à economia social uma maior transversalidade, fazendo-a impregnar estruturalmente o programa do Governo. Bastaria, por exemplo, que se assumisse a ressonância plena do mais recente Congresso do PS: “Para o PS é importante a imbricação da economia social na reforma do Estado, como reforço do seu caráter democrático e como elemento de contenção e reversão dos atuais desequilíbrios demográficos, ecológicos e económicos do país”. Em sinergia com isto, teria sido bom ter-se dado uma expressão mais consistente ao que na mesma circunstância se defendeu: a especial valorização da simbiose entre a economia social e o desenvolvimento local.
Na verdade, um olhar sobre o programa do Governo mostra uma abordagem bem mais pobre da economia social do que a induzida pelo decidido no 22º Congresso do PS: “A economia social é um movimento relevante do horizonte socialista. Inscreve-se na história como memória marcante, no presente como virtude prática e no futuro como esperança emancipatória”.
                                                           RUI NAMORADO

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

O sofrimento da verdade no caso de Tancos




O sofrimento da verdade no caso de Tancos

1. O caso de Tancos foi implantado na campanha eleitoral na tentativa de prejudicar tão gravemente quanto possível o Partido Socialista, enquanto partido estruturante do atual governo. Não foi o primeiro, mas foi desenhado para se revestir de uma especial dramaticidade.

Só na noite das eleições ficaremos a saber se a manobra teve êxito, se foi eleitoralmente inócua ou se acabou por prejudicar alguns dos seus potenciais beneficiários. A sofreguidão com que os partidos de direita se agarraram ao evento, como náufragos a uma bóia de salvação, trouxe um claro acréscimo de insalubridade política à campanha em curso. Os partidos de esquerda que apoiam parlamentarmente o governo tiveram reações equilibradas, embora o BE resvalasse por vezes para uma confusão excessiva entre o conteúdo da acusação do MP e a verdade.

 Ora, é bom não esquecer que o visado (o ex-Ministro da Defesa do governo do PS) negou publicamente a veracidade das imputações que lhe foram feitas; e que só é legítimo tirarem-se consequências políticas definitivas de alegações inseridas num processo judicial, quando a sua veracidade estiver definitiva e irrecorrivelmente estabelecida na instância jurídica numa sentença final.

O PS, pela voz do seu SG, reiterou a sua fidelidade a uma separação clara entre a dimensão judicial do caso e a sua dimensão política, movendo-se com a prudência de quem tem responsabilidades institucionais, mesmo sabendo-se o principal  alvo de todos os tiros.

Compreendo este cuidado de quem não quer agravar o risco de descrédito das instituições, pela veemência de uma defesa ou de um contra-ataque, que, mesmo justos e justificados,  poderiam agravar as sequelas institucionais e sistémicas da situação criada. Mas, a título estritamente pessoal, não quero deixar de partilhar algumas interrogações que me têm assolado e que não tenho encontrado na comunicação social. 

Mesmo sem o motor de tentar ter influência nas eleições, o processo, cuja acusação foi agora conhecida, seguirá certamente o seu caminho. Cá estaremos para ver o resultado. Mas é bom que se garanta que todas as circunstâncias que o têm rodeado serão também devidamente escalpelizadas e esclarecidas. É nesse registo que inscrevo as considerações que se seguem.


2. Quanto ao caso de Tancos, a matilha mediática, os partidos políticos da direita, os agentes dos poderes fácticos mais sombrios e uma parte insalubre da máquina judicial elegeram como verdade única uma nebulosa jurídico-política  onde caiba tudo aquilo que, de perto ou de longe, possa atingir e prejudicar o atual governo e o PS.

Meteram assim num mesmo saco alguns factos judicialmente provisórios que tratam desde já como definitivos, juntando-lhe as suas impressões, os seus preconceitos ideológicos e a sua visão unilateral dos acontecimentos. Projetaram sobre tudo isso a sombra das suas conveniências políticas mais imediatas, para apontarem o dedo acusatório ao governo do PS, comportando-se como se todos eles estivessem ungidos pela graça de uma virtude impoluta.

A origem de tudo, ou seja, o furto das armas, vai deslizando para uma estranha penumbra. O “gravíssimo” que vai envolvendo o episódio no seu todo tende a concentrar-se nas imprevistas sequelas de uma rivalidade entre polícias, apimentada pelo alegado envolvimento de um Ministro que entretanto deixou de o ser e que nega esse envolvimento. Por essa ponta se quer chegar ao Governo.

Este é o cerne dissimulado da dramatização em curso, assentando principalmente  na consideração, como definitivamente provados, de  factos até agora apenas  alegados numa acusação e que portanto são provisórios, até serem definitivamente estabelecidos, no quadro de uma sentença judicial transitada em julgado.


3. Para dar conta da minha primeira perplexidade, a mais importante, acho pelo menos estranho que, no quadro do alarido mediático reinante, não se tenha mencionado algo de verdadeiramente insólito e intrigante. Na verdade, nos termos da mesma peça processual que tem suportado o recrudescer do ruído, sabe-se que vários meses antes do assalto ter tido lugar, foi levado ao conhecimento do Ministério Público e da Polícia Judiciária, que o paiol de Tancos ia ser assaltado, bem como a identidade do possível assaltante. Estranhamente, as autoridades militares não foram informadas  de modo a poderem tomar providencies preventivas, de modo a prevenirem e certamente de evitarem o assalto.

Como se sabe, as diligências internas que terão sido feitas pelas autoridades informadas não impediram que o assalto se realizasse. O suspeito só viria a ser detido meses depois do assalto. Detido em setembro de 2018, ou seja, um ano antes da parte final da campanha eleitoral agora em curso, uma campanha cujas datas eram conhecidas de antemão por corresponderem a um calendário institucional. Isto é, quem quisesse fazer cair a acusação em plena campanha eleitoral, invocando a imperatividade de não exceder o prazo da prisão preventiva, tinha apenas que escolher a data de início da prisão preventiva, que neste caso foi, como vimos, estranhamente protelada.

Parece clara a legitimidade para se exigir que se apure a razão de ser desta inércia objetiva perante um aviso de roubo de armas, de que se teve conhecimento antecipado, mas que não foi impedido. É imperativo saber-se, sem margem para dúvidas, se isso foi o resultado de uma incompetência funcional ou institucional, de uma falha estrutural objetiva ou se foi uma omissão calculada. Uma omissão calculada para fazer com que se consumasse um facto politicamente prejudicial ao Governo, através do qual ele poderia ser flagelado como o foi e está a ser.

 Parece-me, aliás, fruto de uma estranha hipocrisia  que expludam  os gestos de preocupação em torno de outros aspetos do caso de Tancos e se passe uma esponja sobre esta questão que é afinal a raiz de tudo. Onde estão os fogosos jornalistas de investigação, onde estão os virtuosos partidos da nossa impoluta direita, onde estão os nossos imparciais comentadores televisivos?

Na falta de um esclarecimento cabal quanto à omissão em causa, podem até surgir dúvidas quanto às reais motivações da acrimónia e da competição entre a Polícia Judicial Militar  por um lado e a Polícia Judiciária  e o Ministério Público  por outro; uma competição que aquela parece ter perdido. 

Será apenas uma rivalidade funcional ou um cálculo estrutural quanto ao futuro numa disputa de prestígios? Ou teria pesado, na intensidade da refrega, pelo lado da PJ e do MP, a preocupação pelas consequências de um aprofundamento da investigação das razões que levaram a que o assalto não fosse evitado? Um aprofundamento que seria mais provável se fosse a PJM  a responsabilizar-se pela investigação do caso.


4. Um outro ponto, ainda que menos relevante, é o que diz respeito à tonalidade política da acusação. Uma vez mais, aquilo que a comunicação social já revelou dessa acusação é suficiente para se poder verificar que realmente quem a formulou partilha com a direita uma visão comum quanto ao Governo e quanto ao significado político dos acontecimentos ocorridos em 2017. Nesse registo projeta uma visão negativa quanto á ética do Governo, reproduzindo por completo  a narrativa politica da direita. Uma visão que, diga-se em abono da verdade , não a salvou de uma severa derrota nas eleições de autárquicas de 2017, por não ter então convencido a maioria dos portugueses.

Portanto, o acusador do MP justificou as suas decisões indiciárias com considerações que reproduzem o discurso político da direita quanto ao Governo e quanto a alguns factos e episódios políticos mais marcantes.

A escolha do período eleitoral, em que as acusações só podem ser contrariadas depois das eleições, alguns outros episódios recentes e a continuação de uma concertação insalubre com alguma comunicação social dirigida às clássicas fugas cirúrgicas de informação  que convêm à acusação, são circunstâncias  que devem fazer-nos pensar e agravam a nossa desconfiança. Ora, numa democracia digna desse nome ( e no quadro da nossa ordem jurídico-constitucional) não cabem jogadas de instrumentalização do aparelho judicial contra ou a favor de quem quer que seja. Por isso, neste plano não pode haver dúvidas, já que ele importa muito mais do que os resultados de uma eleição.


5. Num registo ainda menos relevante, vale a pena invocar um pequeno detalhe, evidenciado nas discussões públicas subsequentes á difusão da acusação do MP. O réu acusado de liderar o assalto alega que lhe foi garantida imunidade, se entregasse as armas roubadas.

Tal como é apresentada, essa promessa de imunidade é um elemento decisivo da manobra da PJM em que se radica a segunda vertente do processo. A única, aliás, que envolve o ex-ministro da Defesa. Sendo assim, se esse envolvimento fosse real, nos termos alegados pela acusação, a parte mais importante da sua intervenção não podia deixar de ser a de garantir  essa imunidade. E se o tivesse feito o seu envolvimento seria formal e inequívoco. Não haveria lugar para quaisquer dúvidas. 

Acontece que ninguém o acusou disso, nem houve ninguém que sequer alegasse ter-lhe feito esse pedido. Ninguém sequer falou nisso  publicamente . Nesta medida,, não parece ter muita lógica a versão da acusação, quando alega que o ex-ministro conhecia a manobra de entrega e encobrimento, mas não menciona o seu conhecimento quanto àquilo em que o seu envolvimento seria mais relevante e decisivo, implicando necessariamente uma decisão sua.


6. Em conclusão, merece desconfiança a intensidade do alarido politico-mediático a propósito de Tancos, nos termos em que tem ocorrido.

 Será apenas uma tentativa de prejudicar eleitoralmente o Partido do Governo? O que já seria um grave inquinamento da decência democrática e uma forte distorção institucional. 

Ou será também uma tentativa de esconder uma manobra ainda mais grave, traduzida na omissão propositada das diligências que evitariam o roubo das armas, de modo a agravar-se o clima político, para no limite se provocar a queda do governo?

Não rejubilaria se ficasse demonstrado que esta hipótese é verdadeira, mas acho indispensável, para a salubridade da nossa democracia, que seja investigada com rigor. Se verificarmos que é uma hipótese infundada respiraremos melhor e estaremos mais perto de evitar que alguma vez aconteça algo de semelhante. Se verificarmos que +e uma hipótese verdadeira, muita coisa vai ter que ser mudada se quisermos evitar a degradação institucional da nossa democracia.

Não esqueçamos: enquanto não for procurada por completo, a verdade sofre.

terça-feira, 17 de setembro de 2019

Medicamentos - o nó do problema.


A sofreguidão antigovernamental da direta, a superficialidade desinformada da grande comunicação social, o facciosismo de uma parte dos comentadores políticos têm inquinado o debate político e apoucado a qualidade da vivência democrática. Um dos tenores da direita, que aliás a renega, disse ontem trovejando contra o Governo no campo da saúde que até faltam medicamentos no SNS.
 Este texto, que transcrevo na língua em que foi publicado, na página da revista francesa  “Alternatives Économiques”,  mostra como não estamos perante um problema apenas português e como é profunda a desinformação de uma parte significativa dos mais fanáticos inimigos de atual governo, nomeadamente, neste caso, do cabeça de cartaz do PSD.
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Pénurie de médicaments : la faute à la mondialisation

Justin Delépine [16/09/2019]

La liste des médicaments en rupture de stock s’allonge en France. L’organisation de la production éclatée aux quatre coins du monde et les acteurs qui pensent plus à leur profitabilité qu’au service public en sont les principaux responsables. 
Vaccin contre l’hépatite B en rupture d’approvisionnement, l’anticancéreux Hexastat en rupture de stock, tout comme le Proleukin, les pénuries de médicaments ne cessent de progresser en France. « En septembre, cette année j’en suis déjà à plus de 70 médicaments pour lesquels j’ai signalé une rupture, indique Ahmet Ercelik, pharmacien parisien, il y a quelques années, c’était uniquement 10 à 20 produits par an. » Les chiffres de l’Agence nationale de sécurité du médicament (ANSM) témoignent de cette envolée du nombre de pénuries ; alors qu’en 2008, on comptabilisait seulement 44 signalements de rupture de stock ou d’approvisionnement, ce chiffre est monté à 871 en 2018, et pourrait bien encore augmenter cette année.
Si les causes de ces pénuries sont multiples, elles sont surtout d’ordre industriel et économique. La mondialisation de la production du médicament et sa concentration tendent à vider certains tiroirs de pharmacies. « Dans de nombreux cas de figure, les phénomènes de pénuries résultent d’une priorisation des objectifs économiques face aux enjeux de santé publique », résument deux parlementaires dans un rapport sénatorial sur le sujet. Cette évolution du marché n’est évidemment pas sans conséquences sur les patients.
En effet, les répercussions de ces pénuries peuvent rapidement être graves. Si on parle de rupture dès qu’un médicament n’est pas disponible dans un délai de 72 heures, la durée médiane de rupture est, elle, de 7,5 semaines. Surtout, ces chiffres ne concernent que les médicaments d’intérêt thérapeutique majeur (MITM), c’est-à-dire pour lesquels un arrêt de traitement peut entraîner une « perte de chance pour le patient » de guérir, voire mettre en jeu son pronostic vital. Des médicaments qui n’ont pas d’alternatives.
Concrètement quand ces cas se présentent, le patient rappelle son médecin pour tenter de trouver un substitut, « mais parfois la solution n’est pas très adéquate et pour certains patients le changement de traitement ne convainc pas », indique un pharmacien parisien voulant garder l’anonymat. Le substitut peut présenter un rapport bénéfices/risques moins avantageux que le médicament initialement recommandé. « De plus, le substitut devient davantage demandé et se retrouve parfois également en rupture. La pénurie entraîne la pénurie », résume le pharmacien.


Nombre de signalements de ruptures de stocks et d'approvisionnements en France
Note : Il s’agit du nombre de signalements de ruptures de stocks ou d’approvisionnement, qui ne débouche pas systématiquement sur une rupture.
« Il est possible que des pertes de chances, des progressions, des effets indésirables, voire des décès soient aujourd’hui liés directement ou indirectement à ces tensions [d’approvisionnement] ou ruptures », note par ailleurs l’Institut national du cancer (IncA). Ces conséquences individuelles peuvent déboucher en outre sur des risques collectifs en mettant en jeu la santé publique avec notamment des craintes de résurgence de certaines maladies.
Des pénuries qui coûtent à la Sécu

Les conséquences sont aussi financières, puisque les substituts peuvent être plus onéreux pour la Sécurité sociale. En outre, pour faire face aux pénuries, la France importe des médicaments de l’étranger mais à des conditions tarifaires moins avantageuses. La gestion des pénuries est également chronophage pour les pharmacies mais aussi pour les hôpitaux qui sont tout aussi touchés par les ruptures. Pour les établissements parisiens de l’AP-HP (Assistance publique – Hôpitaux de Paris), la seule gestion des pénuries occupe 16 équivalents temps plein.
Face à ce qui représente donc un enjeu de santé publique et d’accès à la santé, la ministre concernée, Agnès Buzyn, s’est saisie du problème. Elle a déroulé au début de l’été une feuille de route pour « lutter contre les pénuries et améliorer la disponibilité des médicaments ». Au programme : transparence et partage de l’information entre les différents acteurs, renforcement de la coordination nationale et européenne, mise en place d’un comité de pilotage associant tous les acteurs.
Des causes à chercher du côté de la production

S’attaquer au problème des pénuries nécessite de comprendre quelles en sont les causes. Si ces dernières sont d’évidence multifactorielles, elles proviennent principalement du côté de la production du médicament. Que ce soit un défaut de production, un manque de matière première ou une capacité de production insuffisante, cette partie est responsable de 65 % des cas de rupture de stock.
Globalement, la demande de médicaments connaît une augmentation mondiale, tirée par les pays émergents comme la Chine. « L’augmentation de la demande, doublée d’une imprévisibilité du marché, participe à créer des tensions sur la chaîne de production», confirme Thomas Borel, directeur des affaires scientifiques du Leem (Les entreprises du médicament), syndicat professionnel regroupant les principaux industriels. Autrement dit, les capacités de production peinent à suivre l’évolution de la demande, de telle manière qu’il y a par moments une inadéquation entre l’offre et la demande.
Cette dernière est cependant aussi le résultat d’un secteur qui s’est largement mondialisé au cours de la dernière décennie. La France est ainsi loin d’être le seul pays touché par les pénuries, les Etats-Unis ou la plupart des pays européens le sont également.
De plus, la production d’un médicament est d’un niveau de technicité très élevé et demande beaucoup de temps, de six mois pour un produit classique à trois ans pour certains vaccins. « Un simple problème électrique sur un site de production ou la détection d’une substance non prévue dans le processus peut entraîner un arrêt de la production pour un moment », résume Thomas Borel du Leem. Ainsi un grain de sable dans la chaîne de production, au sens propre comme figuré, peut provoquer un arrêt.
« Une perte progressive d’indépendance sanitaire »

Comme dans d’autres secteurs, cette mondialisation s’est accompagnée d’une délocalisation de la production, qui a quitté les pays industriels, principaux consommateurs de médicaments, vers des pays à plus bas coûts et aux normes plus souples. C’est particulièrement vrai pour la fabrication du principe actif, la molécule, qui constitue la matière première. Alors que dans les années 1990, la molécule des médicaments vendus sur le marché européen était presque uniquement produite sur le Vieux Continent, aujourd’hui 80 % proviennent de pays tiers, principalement la Chine et l’Inde. « L’industrie chimique, qui produit ces principes actifs, a eu des politiques de délocalisation vers des zones à moindres normes environnementales », confirme Thomas Borel. La Chine et l’Inde concentrent à eux seuls 61 % des sites de production de molécules inscrits auprès des agences européennes. 
Répartition par pays des sites de production de substances pharmaceutiques actives pour des médicaments commercialisés en Europe et enregistrés auprès des agences européennes

Pour la production du médicament, la proportion est moindre mais tout de même importante, puisque 40 % des médicaments finis commercialisés en Europe proviennent de pays tiers, indique l’Agence européenne du médicament. Les sénateurs parlent ainsi d’une « perte progressive d’indépendance sanitaire » pour notre pays.
Le marché mondial dépend d’une poignée d’usines
En parallèle des délocalisations, le secteur s’est fortement concentré. « Pour doper leur rentabilité, les firmes ont concentré leur production sur un même site pour augmenter le volume et ainsi réaliser des économies d’échelle », explique Nathalie Coutinet, économiste à l’université Paris 13. Si bien que pour certains principes actifs et médicaments, le marché mondial dépend de quelques sites de fabrication, voire d’un seul. « Pour certains vaccins, le marché européen est ainsi approvisionné à partir d’un seul site de production », regrette Yann Mazens, chargé de mission à France Assos Santé.
Cette concentration se retrouve également auprès des entreprises qui ont multiplié les fusions et rachats ces dernières années, à l’image de la fusion cet été entre les américains Pfizer et Mylan. Le français Sanofi n’est pas en reste, en 2018, il a acquis pour plus de 10 milliards de dollars l’américain Bioverativ et le belge Ablynx pour près de 4 milliards d’euros.

Evolution du nombre d'entreprises de l'industrie du médicament en France
Sont comptabilisées les entreprises proposant au moins une substance pharmaceutique à usage humain.
La chaîne de production se retrouve très éclatée entre la fabrication de la matière première, celle du médicament, son conditionnement et sa distribution, qui peuvent se faire dans des pays et continents différents. « Or comme tout fonctionne à flux tendu, cela renforce les risques sur la chaîne d’approvisionnement », ajoute Nathalie Coutinet, également auteure de l’ouvrage Economie du médicament1. Fragmentation, éloignement, concentration, l’organisation de la production de médicaments conduit en réalité à maximiser les risques d’approvisionnement. Or quand un site alimentant une grande partie du marché mondial connaît un arrêt de production, la concurrence est vive pour la gestion de stocks restants.
Les grossistes jouent des différences de prix

Autre conséquence de la mondialisation du marché : « En cas de rupture d’approvisionnement, au moment de réassortir, les différents pays les acteurs ont tendance à privilégier les marchés les plus rémunérateurs », explique Marie-Christine Belleville, auteure d’un rapport sur le sujet pour l’Académie nationale de Pharmacie. Les grossistes jouent aussi des différences de prix d’achat des médicaments entre les pays européens, en revendant dans un Etat, proposant un prix élevé, un produit obtenu dans un autre à bas prix. A ce sujet, le gendarme du secteur, l’ANSM (l’Agence nationale de sécurité du médicament), a présenté en mai cinq injonctions contre des grossistes pour défaut de service public.
Au-delà des problèmes sur la chaîne de production, les pénuries s’expliquent parfois simplement par la décision des industriels d’arrêter la production. Ces derniers mettent notamment en avant la non-rentabilité de certains médicaments et évoquent un effet ciseaux entre des coûts de production qui augmentent avec des normes de sécurité et de qualité croissante, et un prix qui tend à baisser pour certains produits. 
Bonne santé financière du secteur

« La non-rentabilité pour la production d’un produit est peut-être réelle à un instant T, mais pour juger de la rentabilité d’un médicament il faut prendre en compte tout son cycle de vie, c’est-à-dire également le moment où il n’était pas encore dans le domaine public et protégé par un brevet et donc vendu à un prix supérieur », estime l’économiste Nathalie Coutinet. Toutes ces informations ne sont pourtant ni connues, ni publiques, tant l’industrie pharmaceutique est caractérisée par une opacité. Impossible par exemple de connaître le coût de production d’un médicament.
Le secteur témoigne cependant d’une très bonne santé financière : son taux de profitabilité en France est de 8,5 %. Sanofi a par exemple été en 2018 la seconde entreprise du CAC 40 la plus généreuse en versant près de 5 milliards d’euros de dividendes.
Introduire un minimum de transparence dans tout le circuit du médicament serait un premier pas pour s’attaquer aux pénuries. Mais il s’agit surtout de s’atteler aux problématiques industrielles. Une relocalisation de la production en Europe, en multipliant le nombre de sites pour diminuer les risques, apparaît à ce titre comme une partie de la réponse. Pour ce faire, les industriels du médicament demandent des exonérations fiscales ciblées pour permettre les relocalisations. «Un peu facile, personne ne les a forcés à délocaliser », ironise Nathalie Coutinet, également membre des Economistes atterrés.
Quelques pistes de solutions pour faire face aux pénuries sont aujourd’hui sur la table comme attribuer une partie de la production à des acteurs publics (à l’image de la pharmacie centrale des armées) sur certains médicaments jugés essentiels. Donner davantage de moyens à l’ANSM. Cette dernière ne semble en effet pas suffisamment armée pour traiter le problème, que ce soit en matière de moyens humains pour traiter les pénuries, mais aussi de sanctions contre les acteurs responsables. « Il s’agit tout de même de pointer les responsabilités, rappelle Yann Mazens, de France Assos Santé, et notamment les stratégies industrielles ayant débouché sur les pénuries. »
·         1.  Economie du médicament, par Philippe Abecassis et Nathalie Coutinet, coll. Repères, La Découverte, 2018.


terça-feira, 20 de agosto de 2019

DILEMA





Dilema do atual governo na ótica dos seus inimigos:

se toma medidas erradas é incompetente, se toma medidas 
certas é eleitoralista.

sábado, 10 de agosto de 2019

A notícia que se desmentiu a si própria



A notícia que se desmentiu a si própria

Ontem a SIC deu uma notícia sobre um Secretário de Estado que é um exemplo paradigmático de mau jornalismo e um índice da mediocridade informativa que corrói a nossa comunicação social, mesmo em órgãos de comunicação social prestigiados. E é paradigmático pelo facto de ser a própria notícia que se desmente a si própria.

Começa pela afirmação de que há um Secretário de Estado  que está a ser investigado num caso de possível corrupção por factos ocorridos há anos atrás quando era autarca.
O  visado responde a uma interpelação jornalística. dizendo que foi ouvido no âmbito do processo em causa como testemunha ( como testemunha, note-se ) há cerca de dois anos, não tendo recebido mais qualquer notificação do MP e não sendo  constituído arguido. O que aliás a peça jornalística corrobora dizendo que no processo de investigação em causa foi constituído um arguido que identifica e o qual não é o Secretário de Estado em causa. Somos também informados de que o MP não deu qualquer resposta a uma pergunta que lhe foi dirigida pela SIC.

Ou seja, no processo em causa o Secretário de Estado foi ouvido como testemunha , não sendo portanto  sequer arguido. Portanto, não está a ser investigado, ao contrário do que falsamente foi dito a abrir a notícia.

Em suma, uma falsa notícia atingindo um Secretário de Estado, cuja falsidade é mostrada por ela própria.Eloquente...

quinta-feira, 8 de agosto de 2019


 
Um substituto de Rui Rio ?

O ex-deputado do PSD Jorge Roque da Cunha tem usado a sua qualidade de dirigente do Sindicato Independente dos Médicos para, instrumentalizando e empolando qualquer problema que surja no funcionamento do SNS, promover uma campanha política agressiva contra o atual Governo.

Mais honesto, politicamente, seria ter-se candidatado à liderança do seu partido para fazer a partir dessa liderança os combates antigovernamentais que entendesse. Rui Rio podia assim ficar descansado e o terrível Dr. Cunha daria vazão legitimamente a toda a sua acrimónia contra o atual Governo. Mas usar um Sindicato como megafone, de modo a permitir-lhe fazer-se ouvir na comunicação social, parece-me um claro abuso de poder e uma ofensa à ética sindical a que deveria obedecer.

Será que todos os médicos inscritos no SIM fazem sua a sanha antigovernamental do Dr. Cunha? Todos eles , como o fez o Dr. Cunha, alinham na delação de colegas perante a Ordem dos Médicos, por não seguirem o que ele acha bem?

Admito que o Sindicato em questão preze muito ser Independente; mas, se assim é, não pode permitir que Roque da Cunha continue a arrastá-lo para uma dependência triste, em face da esquálida  orientação estratégica do PSD.

terça-feira, 6 de agosto de 2019

AS CINZAS DA SOFREGUIDÃO




AS CINZAS DA SOFREGUIDÃO

Há uma sofreguidão aflita na tentativa de apoucar politicamente este Governo, de modo a diminuir-se eleitoralmente o PS. Essa aflição sôfrega não é boa conselheira. Sem deixar de perturbar o PS, pode fazê-lo num grau maior ou menor, mas também pode virar-se contra os seus promotores. Desnorteada e descalibrada, radicando-se principalmente em ficções, distorções, empolamentos artificiais ou simples falsidades , essa sofreguidão corrói  a qualidade da democracia e inquina a racionalidade da ação política.

Centremo-nos no binómio ─ máscaras inflamáveis, inibição de familiares de certos titulares de cargos políticos celebrarem contratos com entidades públicas. São questões distintas, mas a segunda só foi trazida à ribalta mediática na esteira da eclosão da primeira.

Não discutindo a utilidade e o mérito da campanha dirigida à melhoria das condições de segurança em aldeias isoladas, perante o risco de incêndio, um órgão de comunicação social concentrou-se num dos seus aspetos parcelares, para denunciar perentoriamente o perigo gerado pela inflamabilidade de umas máscaras de proteção contra o fumo, fornecidas no âmbito da campanha referida. 

Foi aberto um inquérito e, na sequência disso, uma entidade técnico-científica de credibilidade inquestionável concluiu que as máscaras em causa afinal não eram inflamáveis. Concluiu também que a uma curta distância as máscaras, embora não se incendiassem, podiam ser eram perfuradas pelo fogo. No entanto, teve o cuidado de esclarecer que essa perfurabilidade era na prática irrelevante, uma vez que a essa curta distância quem estivesse atrás da máscara não resistiria ao fogo, com ou sem máscara. 

Mas essa perfurabilidade, independentemente disto, não desmentia a falsidade daquilo que o meio de comunicação social falsamente alegou, no que foi acriticamente seguido por outros agentes mediáticos e por vários protagonistas políticos hostis ao governo.

Durante o período  que antecedeu a revelação pública de que se estava perante um notícia falsa, houve reações públicas de membros do Governo, algumas das quais discutíveis, que foram aproveitadas para desencadear um grande alarido político-mediático. 

Revelada a natureza de falsa notícia da inflamabilidade das máscaras, não me lembro de alguém vir publicamente pedir desculpa pela falsidade que publicitou ou comentou dando-a como certa. Muitos dos objetivamente falsários preferiram esquecer o seu próprio erro, para insistirem na alegação de um excesso de reação do Governo, esquecendo-se  que ela foi uma resposta  à falsidade com que eles próprios o agrediram.

Outros, na ânsia de reduzirem o eco do seu próprio erro, descobriram três contratos celebrados com entidades públicas por uma empresa de que era sócio minoritário um filho do Secretário de Estado com maior conexão com a questão das máscaras. E na esteira de uma nova  interpretação da lei aplicável , diferente da que  nos vinte e quatro anos anteriores fora dominante, alegarem a nulidade desses contratos e a imperatividade desse Secretário de Estado perder o mandato.

Esta luminosa descoberta tinha a modesta pretensão de acabar com vinte e quatro anos do que ela pressupunha ser uma generalizada cegueira das mais diversas e qualificadas instâncias. E implicava que se imputasse a todas elas um incumprimento de uma lei durante duas dúzias de anos. 

Ouvimos desde então uma enorme variedade de cacofonias jurídicas, alheias aos mais elementares ensinamentos da teoria de interpretação das leis, mas perentórias na garantia de que, perante o que eles sabiam do alto da sua infalibilidade subjetiva ser o texto da lei, do que se tratava era de um incumprimento generalizado de uma lei durante vinte e quatro anos. Não se tratava simplesmente de uma interpretação da lei dominantemente partilhada pelos atores jurídicos, políticos e administrativos mais  relevantes, contrária àquela agora invocada na esteira do caso das máscaras falsamente incendiáveis.

Aliás, uma recente alteração legislativa já consumada, mas ainda não vigente, viera clarificar o texto legal, de modo a tornar mais nítido o entendimento dominante desde 1995.

E como não há ciência jurídica que obrigue os atores jurídicos ao absurdo, como a própria teoria da interpretação das leis integra mecanismos e conceitos que previnem  esse risco, vale a pena olhar através do simples bom senso para o que está substancialmente em causa neste caso.

Se realmente a lei impusesse aquilo que os precipitados inovadores dizem que ela impõe, isso implicaria um conjunto de consequências práticas que arrepiariam o simples bom senso.

Desse modo, suponhamos que uma empresa de que fosse sócio A filho de um membro do Governo B (ou de qualquer outro dos múltiplos titulares de cargos públicos alegadamente abrangidos pela lei) resolvia no âmbito da sua esfera jurídica celebrar um contrato que essa visão da lei não admite. Sendo A minoritário na empresa, mesmo que fosse contra a celebração desse contrato, isso seria irrelevante na prática. Aliás,  mesmo uma decisão a que ele fosse contrário podia fazer com que o pai B  perdesse o mandato. No entanto, mesmo que A tivesse concordado com a celebração do tal contrato não vemos como um comportamento seu pudesse fazer repercutir na esfera jurídica de um outro sujeito jurídico (B) as consequências sancionatórias do seu ato.
Do mesmo modo, é difícil admitir que o sócio maioritário de uma empresa possa deixar de poder fazer contratos com entidades públicas só porque o pai de um dos seus sócios minoritários (mas com uma percentagem que exceda um certo limite) entra para um Governo.

Basta o que se acaba de dizer, para vermos como é absurdo pensar-se que estamos perante uma falha incompreensível no cumprimento da lei, por parte de múltiplas entidades públicas durante vinte e quatro anos e não perante o simples funcionamento normal das instituições. A simples sofreguidão para criar dificuldades ao atual Governo não me parece suficiente para tornar lógico o absurdo.

De facto, teria sido necessário que, ao longo de vinte e quatro anos, Governos de cores diferentes e as respetivas oposições deixassem passar em branco aquilo que estariam a ser sucessivas ilegalidades: uns praticando-as, outros não as denunciando. E os que as praticavam hoje eram aqueles que as não denunciavam amanhã, sendo certo que mesmo os partidos habitualmente exteriores aos centros de poder político também se teriam calado, durante quase um quarto de século.

Se a isto juntarmos o facto dessa posição implicar que se devesse achar natural que todas as empresas que poderiam beneficiar com a nulidade desses contratos tivessem renunciado a essa possível vantagem durante vinte e quatro anos, entramos ainda mais dentro do território do absurdo.

Na esteira da mesma sofreguidão mediática, três Ministros foram trazidos à colação pelo mesmo motivo. Curiosamente, o cônjuge de uma Ministra envolvida fora questionado, numa estação televisiva,  há uns meses atrás sobre a inibição que esse vínculo conjugal podia gerar no que diz respeito à sua prestação de serviços jurídicos ao Estado. O questionado, um prestigiado Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa,  excluiu  sumária e perentoriamente a existência de qualquer razão de ser da questão que lhe foi colocada. Não tive notícia de ninguém ter vindo publicamente pôr em causa essa posição.

É politicamente compreensível que o Governo tenha pedido um parecer jurídico ao Ministério Público. Os partidos de direita em registos vários foram tentando participar na festa sem se queimarem, os partidos de esquerda aliados ao PS nesta solução de governo não escaparam a uma ambiguidade discreta, o PS procurou ficar naturalmente em linha com as posições do Governo.

Um olhar rápido mostra como os partidos de direita esbracejam politicamente agarrados às saias das notícias falsas e como os poderes mediáticos dominantes, procurando levá-los ao colo, vão cavando mais fundo a crise da sua credibilidade. Não sabem como vencer este Governo. Não sabendo evidenciar  uma capacidade maior para  melhorarem a qualidade de vida do nosso povo , agarram-se  ao sonho de pelo menos  o enlamearem com as suas intrigas, no que realmente são peritos. É um caminho que não os leva longe. Mas o mais estranho é espantarem-se com o facto da sua rasteirice mesquinha  não  produzir os efeitos com que sonharam.