sábado, 31 de janeiro de 2009

Justiça mediática




Corajosa verdade: qualquer alegação que enxovalhe Sócrates.

Mentira cobarde: qualquer alegação que favoreça Sócrates.

Viva o 31 de Janeiro!



Ergueram-se e tudo foi possível.

Venceu-os a ilusão de uma derrota.

E afinal estão entre nós:
como irmãos.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Mudar para mudar - em Coimbra


1. Neste dia 30 de Janeiro, sexta-feira, às 21 horas e 30 minutos, na sede do PS, na Rua Oliveira Matos, em Coimbra, vai realizar-se uma reunião dos subscritores e apoiantes da moção de Orientação Política, a debater no próximo Congresso do PS, Mudar para Mudar – mudar o PS, para mudar Portugal.

Os militantes socialistas que se sintam identificados com a moção e disponíveis para a apoiar podem e devem participar nessa reunião, para a qual se podem considerar convidados.

2. Até este momento [31de janeiro de 2009], que eu saiba, subscreveram já a referida moção os seguintes militantes socialistas inscritos na Federação de Coimbra do Partido Socialista:

Adriano Barbosa de Sousa
Álvaro Aroso
António Arnaut
António Cândido Alves
António Casimiro Ferreira
Armando Gonsalves
César Ribeiro
Décio Sousa
Eliana Pinto
Emília Dias Gil
Estela Castilho
Fernanda Campos
Graça da Cruz Lapa
J.L. Pio Abreu
João de Carvalho Ferreira
João Rosendo
João Rui de Almeida
José Gama
Júlio Mota
Luìs Duarte Coelho
Manuel Claro
Manuel Milagre
Manuela Lacerda
Margarida Antunes
Maria Adelaide Claro
Maria Gabriela Carvalho
Maria Teresa Coimbra
Nuno Filipe
Pedro Bingre
Rui Namorado
Sérgio Namorado



3. Como podem verificar pela sua leitura, esta moção leva a sério o facto de estarmos perante um congresso do PS e não perante uma convenção destinada principalmente a debater a política de um governo. Dá por isso um apreciável relevo à necessidade de se romper com a progressiva perde de energia política do PS, a qual o tem vindo a fazer cair num verdadeiro marasmo político. Afirma uma forte determinação em contribuir para a inversão dessa tendência. Contribuição essa que envolve propostas concretas, algumas das quais têm vindo a merecer um apoio crescente dos militantes socialistas.

Não pretende ser um rol de elogios ao governo, encarando-o como uma entidade infalível que só tivesse conhecido êxitos, mas também não confunde independência crítica em face do governo, com uma atitude sectária que lhe menosprezasse os méritos.

Principalmente, procura equacionar as grandes questões do mundo em que vivemos e propor linhas de orientação que abram um caminho de esperança para o nosso país.

Valoriza o papel do cooperativismo e da economia social como elementos insubstituíveis de um desenvolvimento sustentável. Considera imperativa a regionalização, como dinâmica descentralizadora e aspecto integrante de uma reforma do sistema político que fica longe de qualquer tentativa de uma simples engenharia isntiuccional, salientando a necessidade de se seguir um processo amplamente participado e claramente fiel aos ditames de uma democracia sem mácula. Sublinha a importância de uma política energética inovadora e corajosa tributária do essencial das opções que t~em vindo a ser tomadas pelo governo.

Inscreve as suas ideias na problemática vivida pelo movimento socialista mundial, sem menosprezar a análise do papel de Portugal na Europa; e num mundo que se quer justo, livre e democrático. Por isso, valoriza muito os mecanismos de regulação económica e política, cujas deficiências exprimiram e aceleraram a crise que se atravessa.

A moção analisa com serenidade e sem ficar presa ao ruído conjuntural o que se passa no campo da educação. Sublinhando a centralidade do envolvimento dos professores na aplicação de qualquer polítca educativa e o consequente imperativo de dignificação da profissão docente, salienta a necessidade urgente de uma profunda reforma da educação que responda realmente à conjugação de desafios que se acumulam neste mundo e neste tempo do país em que vivemos.

Materializa, em si própria, a convicção de que há lugar para a pluralidade de ideias e de posições dentro do PS e que só empobrece a vida partidária a atitude dos que que se mobilizam sectariamente contra o que contrarie a linha dominante , bem como a pusilaminidade dos que, pensando diferentemente da direcção do partido, escondem o que pensam numa silenciosa comodidade de águas mansas.

Democracia e poder judicial


Quem aposta na judicialização da política, acabará por conseguir a politização da justiça.

E quando esta for evidente, pressupondo-se a continuidade da democracia, os cidadãos hão-de perguntar-se a que título alguém aplica a justiça em nome do povo , sem ter passado pela sua escolha.

É que, como diz a Constituição, e é ela o único título de legitimidade jurídica de todos eles:"Os tribunais são órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo". E a Constituição diz também que: "Os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei".
Reparem: a independência dos tribunais, está limitada pela sua expressa sujeição à lei. E a lei é feita pelo legislador. O legislador dominante é a Assembleia da República, estando os seus membros obrigados a cumprir as leis que eles próprios fizeram e submetendo-se os seus membros periodicamente ao juízo de mérito dos eleitores. A competência legislativa do Governo resulta do mandato revogável a todo o tempo que para isso recebeu da Assembleia da República.

O Presidente da República, ele próprio também eleito pelo povo, pode suscitar a renovação do Governo pela Assembleia da República , mas não pode invadir as suas competências, nomeadamente, não pode fazer qualquer lei. Pode , em casos muito limitados, dissolver a Assembleia para dar ao povo a possibilidade de a renovar, mas não pode exercer, por si próprio, as competências da Assembleia.

E os tribunais podem escrutinar e avaliar o mérito das leis ? Em geral, não podem. Pode um deles, o Tribunal Constitucional, pronunciar-se sobre o respeito da Constituição pelas outras leis, mas não lhe cabe avaliar o mérito dessas leis ou da Constituição. E aos outros tribunais nem essa pequena fatia de avaliação das leis , em última instância, lhes compete.

E podem os ocupantes circunstanciais dos tribunais, os juízes, assumindo essa qualidade e com base nela, pronunciarem-se publicamente sobre o mérito das leis ? Não podem, sob pena de estarem a subverter, como se pode ver pela citação que fiz, a própria CRP. De facto, não podem escolher na Constituição a parte que os institui como órgão de soberania e esquecer as autolimitações constitucionais que a isso correspondem.

Por isso, os juízes devem compreender que se deixam resvalar o seu protagonismo para esfera pública, envolvendo-se no debate político, serão mais cedo ou mais tarde confrontados, com a incomodidade crescente dos cidadãos, cada vez menos dispostos a aceitar que administre justiça em seu nome quem não tenha sido democraticamente escolhido por eles para isso. O canudo obtido numa Faculdade de Direito e a passagem por um centro especializado de formação profissional, não são suficientes para dispensarem o voto popular.

É por isso que, quanto mais os juízes se intrometem no espaço mediático numa ostentação de protagonismo, mais minam os alicerces da sua credibilidade estrutural, mais abrem a porta ao questionamento da legitimidade democrática dos poderes que exercem.

Quanto aos magistrados do Ministério Público, o caso é ainda mais nítido. Cabe-lhes, no essencial,nos termos da Constituição, "participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania". Carecem por isso, enquanto magistrados do MP, de qualquer legitimidade para escrutinarem o mérito dessa política criminal. Participam na sua execução, mas não partilham a responsabilidade pela sua definição.

Por isso, aqueles que do interior do MP encaram a sua autonomia em termos absolutos, devem dizer-nos a que tipo de escolha popular pretendem ser submetidos. Ou acharão que devem ser por completo independentes do poder político, dispensando também qualquer legitimação eleitoral que torne democraticamente aceitável essa pretendida independência?
Que fique claro, uma vez mais : um canudo dado por uma Faculdade de Direito e um curso especializado de formação profissional, por si sós, não são bases legítimas suficientes para o exercício de poderes de Estado autónomos, se de facto vivermos numa democracia.

sábado, 24 de janeiro de 2009

A coligação canguru



Um observador que pudesse desembaraçar-se da poeira quotidiana e conseguisse olhar para a realidade com uma pureza quase ingénua, encontraria, na cena política do nosso país, nos tempos mais recentes, motivos para ficar perplexo.

De facto, o acirramento antigovernamental tem construído uma improvável irmandade, dentro da qual convivem com ardor de combatentes, o CDS e PSD, com o BE e o PCP. Vituperam num tom idêntico, a propósito da mais ligeira oportunidade de eco mediático, unem-se como gladiadores implacáveis em votações parlamentares. Sindicalistas de referência da CGTP dão a cara a favor do CDS, partilhando as suas derrotas parlamentares como se também as tivessem sofrido. Todos aproveitam todas as crispações sociais, não com a habitual subtileza discreta, a que aconselha a prudência da distinção entre o que é sindical e político, mas com a ostensiva ostentação de quem já se fundiu num objectivo comum.

É certo que em anos pretéritos na longínqua Grécia, por uma vez sem exemplo, já os comunistas gregos se aliaram formalmente é direita numa coligação contra os socialistas do PASOK. Foi efémera? Foi. Mas existiu. Resultados? Pouco brilhantes.

É certo que, cumprindo uma dissimulação felina, em vários dos nossos municípios, em diversas circunstâncias, autarcas do PCP têm dado uma mãozinha a maiorias relativas do PSD.

Mas a improvável orquestra política que acima referi, promete mais solidez e não tem procurado esconder-se. Estamos, portanto, perante uma novidade.

O coração combatente dos socialistas sofrerá talvez um calafrio, perante o espectro dessa nova maioria que se desenha contra eles. Mas a sua razão há-de serená-los. De facto, se essa coligação (verdadeiramente canguru, por implicar um salto por cima do PS) amadurecer e despontar, ficará o PS com o peso da concorrência de uma maioria alternativa, mas ganharão os eleitores a clareza transparente de uma alternativa. E com isso, dizem os politólogos encartados da escola da governabilidade, ganhará o país.
Ou teremos um governo PS, ou teremos um governo dirigido por Manuela Ferreira Leite, acolitada por Jerónimo de Sousa e talvez pelos dois irmãos Portas. A sombra da ingovernabilidade ter-se-á assim esvaído e os portugueses passarão a saber de ciência certa que, votem como votarem, terão sempre um duradouro governo de maioria absoluta.

Admito que, mesmo os tenores mais visíveis desse orfeão afinado que tem arrasado o Governo, não estejam ainda psicologicamente preparados para assumirem, por completo, tão ousada coligação. Compreendo o incómodo da parte do povo de esquerda que se reconhece no PCP e no BE, quando pretenderem alinhá-lo na mesma procissão, onde sigam o CDS e o PSD. Mas não excluo que a voragem dos factos políticos, em que os quatro partidos têm emparceirado, tenha força suficiente para fazer com que os estados-maiores dessas quatro forças, com a bênção de algumas das mais mediáticas lideranças sindicais, passem das palavras aos actos.

E excluo tanto menos a coligação canguru, quanto, a fazer fé na esmagadora maioria das sondagens dos últimos seis meses, ela teria todas as hipóteses de constituir um governo maioritário. É certo que pode parecer estranho imaginar-se a Dama de Cinza marchando no Primeiro de Maio ao lado de remoçadas lideranças da CGTP, nesse caso, decerto convertidas ao entusiasmo por esse novo governo, em que Jerónimo de Sousa teria talvez a pasta da defesa , para se poder sentar nas reuniões da Nato, ao lado do amigo americano. Alguns se poderiam admirar por ver Paulo Portas. sorridente nas ruas de Pequim, confraternizando com os camaradas capitalistas chineses, e outros se poderiam espantar de deparar com Francisco Louçã confraternizando malandramente com a Srª Merkl. Mas, convenhamos que tudo isso não seriam mais do que detalhes, sempre se podendo aliar, então, qualquer voz pública menos favorável à má fé dos sicários do PS, nessa hipótese a única oposição.

Seria aliás um governo com favor mediático. Pois quando um ministro anunciasse a inauguração de um chafariz, havendo embora o risco de algum socialista surgir torcendo discretamente o nariz, sempre haveria dois esforçados cidadãos da esquerda e dois circunspectos senhores da direita que bebessem deliciados a água do chafariz , aplaudindo calorosamente o Governo.

As relações dos Sindicatos dos Professores com o Ministério da Educação ficariam salomonicamente estabilizadas. No Sul do país, seria Ministra a actual deputada Varela do BE e cada professor se avaliaria a si próprio; no Norte, seria Ministro o jovem dr. Coelho do PSD que privatizaria as escolas, deixando as tarefas de avaliação ao cuidado dos novos proprietários. Uma parte dos professores independentes manifestar-se ia em Belém, contra a ministra Varela, a outra manifestar-se-ia em Belém contra o Ministro Coelho.

Para combater a crise o novo Governo revelaria igual flexibilidade: às segundas , quartas e sextas, funcionaria como Ministro das Finanças o regressado Félix e ás terças, quintas e sábados, seria a vez do deputado Novo. Se algo de mal acontecesse ao domingo, as culpas seriam atribuídas à oposição, ou seja, ao PS.

Alguns inimaginosos comentadores políticos acolhem-se, por vezes, à básica banalidade, atribuída a um político de botas do século passado, que se traduz na ideia de que em política o que parece é. Sem me pretender melhor do que eles, não partilho essa ideia, mas se a partilhasse seria tentado a dizer que se nos últimos tempos parece estar na forja uma coligação canguru, então politicamente há que reconhecer que está na forja uma coligação canguru.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

O Chafariz


Eis mais um texto do J.L. Pio Abreu, hoje publicado no Destak, que com a sua autorização aqui transcrevo. Leiam-no: humor certeiro.


"A política portuguesa está a ser hilariante. Qualquer notícia sobre uma iniciativa ou declaração governamental é seguida de quatro contestações dos partidos da oposição e de mais uma ou duas dos sindicatos ou dos movimentos cívicos.

Suponhamos que o Governo anuncia a construção de um chafariz para abastecer de água uma população sequiosa, promover o turismo e aumentar o emprego. Vem o CDS e diz que os velhinhos não podem deslocar-se ao chafariz. Vem o PSD indignar-se pelo prejuízo da iniciativa privada. Vem o PC organizar uma manifestação e reclamar um chafariz em cada bairro. Vem o BE demonstrar que as construtoras pressionaram o Governo. Há-de haver também um sindicato a denunciar a precaridade do trabalho e uma ONG a condenar o desvio da água.

Como chegámos a isto? O CDS diz-se do centro, tem um eleitorado de direita mas é um projecto pessoal de sobrevivência política. O PSD afirma-se social-democrata mas é, na verdade, liberal, quando o liberalismo está em queda, depois de ter reunido os disfarçados apoiantes do regime que desaparecera. O PC é uma cassete gasta que vive dos herdeiros e deserdados do orçamento de Estado. O BE reúne os sonhadores utópicos com vocação adolescente.

Em Portugal, os partidos de oposição são um engano. Têm apenas a virtude de evitar fenómenos do tipo Le Pen. Mas a única oposição responsável ainda é a que está no interior do PS. Infelizmente para a alternância do poder e para as dinâmicas sociais que enformam a democracia, mas felizmente para enfrentar a crise que temos aí."

[J. L. Pio Abreu]

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Uma lição alemã ?



O resultado das eleições que recentemente tiveram lugar no Estado Alemão do Hesse, deve ser objecto de reflexão para os partidos que representam as várias áreas da esquerda em Portugal.

Note-se que o Hesse é um Estado importante, com mais de seis milhões de habitantes e cerca de 21000 quilómetros quadrados.

Estas eleições foram neste mês de Janeiro, uma vez que das anteriores eleições, ocorridas no ano passado, resultou uma relação de forças no parlamento estadual que, conjugada com as posições assumidas pelo SPD (socialismo democrático) e pela Esquerda (Die Linke), não permitiu que se constituisse uma maioria de governo.
De facto, no ano passado, o SPD, reflectindo um grande reforço eleitoral ( 7,6%), ficou então apenas a uma décima da CDU, que nessa eleição sofreu um apreciável recúo (12, 1%), ficando ambos os partidos, no entanto, com o mesmo número de deputados. Assim, a CDU não conseguiu apoio para formar governo, dado que a soma dos seus votos com os liberais (FPD), seus aliados tradicionais, não era suficiente. Já o SPD poderia ter liderado um governo com apoio maioritário, se tivesse tido o apoio dos Verdes(Die Grünen) e da Esquerda ( Die Linke). Mas as divergências dentro do SPD, quanto à aceitação do apoio da Esquerda ( Die Linke), impediram que se tivesse conseguido instituir um governo estável, obrigando a novas eleições. Se o SPD tivesse feito uma aliança com a Esquerda (Die Linke) ( ou se tivesse, pelo menos, aceitado o seu apoio parlamentar) isso não teria acontecido. Dividido internamente, quanto a essa hipótese, acabou por não a poder pôr em prática. Em virtude disso, as eleições tiveram que ser repetidas agora, em Janeiro de 2009.


O pouco tempo decorrido entre as duas eleições não impediu uma enorme diferença nos resultados eleitorais. Resultados esses que reflectiram uma pesada derrota do SPD. De facto, agora o partido mais votado passou a ser o da actual chanceler federal, a SrªMerkel, a CDU(democracia-cristã), com 37,2 % dos votos. Progrediu apenas 0,4 %, mas isso foi suficiente para poder formar governo, coligando-se com um aliado tradicional, o FDP (liberal), que subiu mais de 6,8 %, atingindo os 15,9% dos votos. Subida idêntica,(6,2) tiveram-na os Verdes (Die Grünen), que atingiram os 14%.

Por seu lado, o SPD, grande derrotado, ficou-se pelos 23,7%, tendo perdido 13% dos votos, de um ano para o outro. Mas deste desmoronamento eleitoral não tirou qualquer proveito A Esquerda (Die Linke) que pouco subiu (0,3), ficando com 5,4%. E, assim, o não entendimento entre estes dois partidos, que, neste caso, resultou mais directamente do facto de o SPD recusar alianças com A Esquerda (Die Linke), tendo punido o primeiro, em nada beneficiou o segundo.

Uma outra leitura, radicada num olhar para o conjunto do país, acentua a ideia de qua a grande coligação CDU/SPD, que partilha o poder no conjunto da Alemanha, e que só existe em virtude da mesma recusa do SPD em envolver A Esquerda (Die Linke) numa maioria federal, pode traduzir-se numa severa punição do SPD e numa ascensão do centro político que beneficiará por tabela a CDU, dando-lhe o poder, mas que em nada aproveitará à Esquerda (Die Linke).

Este exemplo, deveria fazer com que as actuais lideranças do PS, do BE e do PCP reflectissem muito cuidadosamente sobre o modo como se relacionam. E o que parece certo é que a diabolização do outro e angelização de si próprio revelam um tipo de atitude política que muito provavelmente levará ao desastre.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

A Dama de Cinza ataca de novo



Com a liderança de MFL, o PSD corre o risco de se transformar numa laranja azeda. De facto, por entre a penumbra do seu jargão politico-económico, desponta com nitidez crescente a imagem de uma senhora que encara a política como uma querela entre donas de casa.

Na verdade, pelo menos nas suas mais recentes aparições, a Dama de Cinza reduziu o seu mais forte adversário a um mentirosos contumaz, que ocupa o seu tempo a urdir mentiras com as quais engana os portugueses, recorrendo a uma sofisticada máquina de propaganda.
Aprisionada nas posições imprudentes que começou por tomar, não conseguiu fugir ao imperativo de ilustrar a sua trovoada contra as obras públicas, pelo menos, com um exemplo. E assim agarrou no TGV e arremessou aos quatro ventos a sua suposta inutilidade. Azar! Alguns anos atrás, a mesma circunspecta senhora havia colocado essa execrada obra pública no altar dos mais rasgados horizontes estratégicos. Atropelou-se assim a si própria. E nem as piedosas ajudas do aparelho mediático-ideológico que a suporta conseguiram limitar significativamente os danos causados.

Assanhada pelas reacções naturais dos nossos interlocutores espanhóis, perante esse fantástico golpe de rins político, a Dama de Cinza atacou os socialistas espanhóis, atacou os jornalistas que tiveram a ousadia de perguntar em Madrid o que pensavam os espanhóis desta alergia inesperada ao TGV, assumindo-se como a versão pós-moderna da padeira de Aljubarrota. Detalhe embaraçoso: não havia nenhuma invasão dos malvados socialistas espanhóis, havia sim uma reacção natural, quer da esquerda, quer da direita do país vizinho. E quando a amarga senhora até havia sofrido um puxão de orelhas dos seus companheiros espanhóis do Partido Popular Europeu, reagia como se fosse caso de ter que resistir a uma verdadeira invasão dos socialistas espanhóis. E numa rabugice quase infantil acusava mesmo os socialistas portugueses de serem “queixinhas”. Com esta sólida panóplia de argumentos políticos, a furiosa senhora imagina-se digna de um arco de triunfo.

É por estas e por outras que algumas vozes fortes do seu partido tão frequentemente a bombardeiam com desautorizações e críticas. Talvez por isso, esteja cada vez mais consonante com o trovejador madeirense , sempre disposto a fustigar os abominados continentais com o seu verbo agressivo e tosco. Mais civilizada e comedida, a Dama de Cinza não tem, no entanto, resistido à tentação de confundir o combate político com um linear processo de intenções, em que os seus adversários principais não são mais do que malfeitores disfarçados, apostados em destruir o país, movidos por uma pulsão tão maléfica quanto incompreensível.

No que lhe diz respeito as sondagens continuam a reduzi-la a uma cópia cansada do Dr. Menezes, colocando-a em patamares de uma modéstia quase chocante. Acicatada, MFL
resolveu assustar os portugueses com a sua improvável vitória, como se quanto menor fosse a sua disposição de a escolherem, mais furiosa fosse a ameaça de a virem a sofrer.

Por isso, se fosse possível ver-se o sabor dos laranjais, certamente que seria já hoje evidente que a liderança de MFL transformou o PSD num melancólico laranjal, entre crispado e azedo.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Mudar para Mudar - mudar o PS para mudar Portugal


Quem tiver visitado este blog nos últimos meses poderá recordar-se, fazendo fé nalgumas notícias aqui dadas, que há muito o Clube Político Margem Esquerda, vem preparando uma moção para apresentar no próximo Congresso do PS.

Essa moção foi entregue na sede nacional do PS na passada sexta-feira, dia 16 de Janeiro, por volta do meio-dia. Foi a primeira moção a ser entregue. Na parte final da sua elaboração, recebeu contributos de muitos camaradas exteriores à Margem Esquerda, os quais vieram assim, naturalmente, a subscrevê-la. No momento da sua entrega, recebera já o apoio de mais de duzentos socialistas, sendo certo que apenas teriam sido estatutariamente necessários cem subscritores.

O seu sentido é o de superar uma rotina, de apontar para a urgência de se romper o círculo viciosos dos hábitos organizativos, das inércias paralisantes que têm vindo a atrofiar o partido, deixando que ele acompanhe a voragem de deslegitimação cívica que tem vindo a corromper os partidos políticos, em Portugal é certo, mas também noutros países europeus. Por isso, a moção se propõe essencialmente contribuir para mudar o PS. E sublinha a necessidade de uma mudança profunda no PS, por saber que, no caso português é irrealista esperar conseguir mudanças profundas no país, se um dos instrumentos centrais dessa mudança necessária – o Partido Socialista - não começar a mudar, já. Por isso, a nossa moção afirma o imperativo de se “Mudar para Mudar”, ou seja, de “mudar o PS para mudar Portugal”.

Foram dados a conhecer a muitos socialistas vários documentos preparatórios da versão final da moção. Essa versão final será divulgada abundantemente, tal como as outras moções. Qualquer interessado pode pedir desde já esse texto, dirigindo-se através da internet a
mudar.para.mudar@gmail.com (também se pode dirigir directamente a mim para rop37798@mail.telepac.pt ). A curto prazo, receberá o ficheiro com o respectivo texto.

Apesar disso, talvez valha a pena que eu vá sublinhando neste blog alguns dos aspectos mais relevantes da referida moção.

Quanto ao PS, apontamos dois tipos de medidas, como elementos do necessário processo de mudança que preconizamos, umas imediatas e outras para irem sendo implantadas num processo prolongado. Quanto às medidas imediatas, valorizamos três: 1) eleições primárias para escolher os candidatos do PS a todas as eleições em que se apresente como partido, sejam elas autárquicas (neste caso, essencialmente o candidato a Presidente da Câmara), legislativas, europeias e presidenciais, envolvendo militantes, simpatizantes e eleitores habituais declarados; 2) aperfeiçoamento da democracia interna do partido, instituindo regras que garantam a plena igualdade de todas as candidaturas, proscrevendo-se assim todas as práticas e comportamentos que inquinem as eleições internas no PS; 3) tomar as necessárias medidas preventivas para evitar o risco objectivo de que as estruturas partidárias dirigentes possam servir de plataformas de favorecimento em negócios pessoais, ou seja, tornar objectivamente impossível no plano do partido a promiscuidade entre a política e os negócios.

Quanto às medidas de médio prazo, destaco: 1) trazer a cultura para dentro do PS como prática habitual veiculadora dos pressupostos indispensáveis para a impregnação do partido, enquanto colectivo de militantes e cidadãos, pelo espírito crítico necessário para a compreensão do complexo mundo em que vivemos; 2 ) construção de uma vertente mutualista formal, ligada ao partido que una os socialistas numa solidariedade organizada que, em sinergia com elas, seja um complemento das estruturas públicas de solidariedade e segurança social; 3) substituir o distrito pela região como base da estrutura federativa do partido; 4) usar todos os recursos da internet para dotar o PS de uma rede nacional de contactos entre os seus militantes e entre eles e as suas estruturas; 5) modernizar as sedes existentes de modo a torná-las espaços acolhedores, funcionalmente adequados às tarefas implicadas por tudo o que atrás se disse.

A moção não esquece naturalmente a tradição socialista em que se incorpora, valorizando-a criticamente, e assume uma visão prospectiva do mundo que transcende a simples reprodução do presente. Propõe, por isso, uma nova ordem institucional mundial democrática e a pressupõe a caducidade histórica do capitalismo, valorizando a necessidade de um horizonte socialista.

No centro das preocupações centrais que devem estar no cerne das políticas socialistas, coloca o combate às desigualdades, geradoras da miséria e da infelicidade de uma boa parte dos portugueses, cuja centralidade não a faz , no entanto, esquecer idêntico sofrimento de uma grande parte da humanidade.

Sublinha a centralidade da educação na conquista de um futuro decente para todos os portugueses, valorizando a urgência de uma profunda reforma da educação que responda quer aos novos desafios que as próprias mutações sociais, tecnológicas e civilizacionais induzem, quer aos reflexos do progresso científico no binómio “ensinar-e-aprender”. Uma refforma que responda a esses desafios que são universais, mas que saiba também corresponder aos que sejam especificamente portugueses, entre os quais se destaca a degradação da formação de professores desencadeada pelo cavaquismo e não revertida pelos governos posteriores. Nesta medida, salienta que toda a dramaticidade de que se reveste a questão das avaliações é uma luta em torno de uma questão distante do que é, na verdade, essencial hoje no plano educativo. O essencial é recuperar um sistema de formação de professores que foi desqualificado, porque o essencial é ter bons professores e não avaliar bem professores. Nesta perspectiva, a moção sublinha que o processo de reforma que se preconiza só tem possibilidades de êxito se envolver a participação e o envolvimento dos professores, que para isso têm que ser dignificados e estimulados. É por isso que a desmotivação dos professores é, em si mesmo, um factor de degradação do sistema educativo.

Aponta também os vectores estruturantes de uma reforma do sistema político, sustentando que ela só faz sentido, se incorporar o processo de regionalização, cujos parâmetros e pressupostos a moção desenvolve com clareza.

Também é valorizado o papel do cooperativismo e da economia social, em geral, como factores estruturantes de um desenvolvimento sustentável, em sinergia com a ideia de que a transformação da sociedade não se faz apenas a partir do governo, nela desempenhando um relevante e insubstituível papel o sector cooperativo e social.

A moção ocupa-se ainda de diversas outras temáticas políticas, tais como, entre outras, a saúde, a política energética, a justiça, a segurança, a imigração, a cultura , a formação profissional.

Na minha opinião, esta moção, que não propõe um candidato próprio à liderança do partido, não é uma moção nem de aplauso nem de oposição ao actual governo. Entre os seus subscritores são diversos os graus de aplauso e de crítica ao actual governo e à direcção do partido. Esta moção, para sublinhar o óbvio, é apenas o conjunto das ideias e das propostas que contém Não tem por detrás de si nenhuma estratégia dissimulada, nem se construiu com base em cálculos. Não é um labirinto de alusões e de silêncios medidos, é um texto ostensivo. Não pede licença para criticar, mas não esconde traições programadas. Traduz apenas o compromisso entre as posições dos militantes que ajudaram a construí-la e vive do apoio de todos os que se revejam no essencial do seu conteúdo. Tudo isto significa que esta é uma moção crítica fortemente centrada numa proposta de renovação do partido, por entender que só um Partido Socialista renovado pode ser verdadeiramente eficaz, como guia do desempenho político de um governo que apoie e pelo qual se responsabilize politicamente.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Palavras de Jorge Sampaio


O ex- Presidente da República Jorge Sampaio, em consonância com o alto quadro da ONU que também é, publica hoje no DN um texto de opinião que merece uma leitura atenta.

Articula com clareza e elegância uma retrospectiva do nosso passado, uma visão do presente e um olhar prospectivo para o nosso futuro. Embora polvilhado por algumas ideias novas( o que não é pouco), o seu percurso é clássico. Podemos mesmo dizer que são mais arejadas as suas perspectivas quanto ao horizonte para onde caminhamos do que a sua análise quanto ao nosso passado recente, por vezes demasiado próxima de alguns artefactos correntes da ideologia dominante.

Pela minha parte, preferia ter tido a oportunidade de ler um artigo do socialista Jorge Sampaio. Certamente, se fosse esse o caso, não teria sido dispensada a presença do capitalismo na análise crítica do presente e não haveria lugar para se sentir incomodidade pela ausência de qualquer referência à ideia de socialismo como elemento de futuro. Em paralelo, talvez fosse possível juntar a nossa concordância quanto ao que Jorge Sampaio diz a propósito dos cidadãos, ao que ele, nessa outra qualidade, não deixaria de dizer quanto aos trabalhadores.

Num único breve reparo ao texto realmente publicado, apenas digo que, por mim, creio mais nos efeitos regeneradores da democracia, suscitados por uma sociedade globalmente justa do que em simples operações de engenharia institucional.

sábado, 3 de janeiro de 2009

Sob o manto diáfano da verdade, a nudez forte da mentira.


“Portugal gasta em cada ano muito mais do que aquilo que produz” - eis a frase, proferida no seu recente discurso de ano novo, que melhor identifica a matriz política do actual Presidente da República.

Para a vulgata ideológica dominante, estamos perante uma síntese feliz da verdade essencial do país em que vivemos. Mas vistas bem as coisas, estamos apenas perante um cínico embuste; ou, se preferimos, perante a verdade mais mentirosa da agenda mediática corrente.

Numa abordagem que pode parecer ingénua, podemos começar por dizer que Portugal, em si próprio, não só não produz, como não gasta. Dir-nos-ão: é apenas uma maneira simples de traduzir globalmente as relações económicas de Portugal, como agregado de portugueses, com o seu exterior.

Pergunto: todos os portugueses gastam e produzem a mesma quantidade de bens e serviços? Se assim acontecesse, a frase de que parti seria uma forma expressiva de descrever a realidade.

Mas as desigualdades sociais em Portugal são muito acentuadas, havendo muitos portugueses que sobrevivem, gastando muito pouco, enquanto outros portugueses, em bem menor número é certo, não têm sequer tempo para esbanjar todos os bens, sobre os quais esta ordem jurídica lhes atribui um poder de disposição.

Ora, a frase acima citada reflecte a obnubilação desta diferença, fazendo pairar a sugestão de que estamos perante um excesso de gasto, cuja responsabilidade é igualmente repartida por todos os portugueses; e de que estamos perante um deficit de produção imputável também igualmente a todos os portugueses.

Mas será que é o mesmo exigir-se, a quem sobrevive no limiar da fome e da pobreza, que passe esse limiar, para mergulhar mais fundo na infelicidade; ou exigir-se aos opulentos que façam menos algumas viagens ao estrangeiro por ano, ou que comprem menos dois automóveis, ou que ofereçam às suas namoradas menos 20.000 euros de jóias por ano? Será que é o mesmo exigir a cem mil trabalhadores que se conformem mansamente com o desemprego e exigir a dez capitalistas que convertam cem milhões de euros dos seus lucros, numa mais digna remuneração dos trabalhadores que geraram esses lucros?

Esta hipocrisia é tanto mais gritante, quanto envolve, em regra, uma forte atenção a tudo o que é remuneração do trabalho e um generoso esquecimento de tudo o que é remuneração do capital. Quantas vezes não ouvimos nós ser perguntado ao autor de uma proposta política socialmente valiosa, para os trabalhadores ou para os pobres: “E aonde vai buscar o dinheiro para isso?” Mas, em contrapartida, esses mesmos seráficos perguntadores quase sempre se esquecem de colocar uma tão arguta questão, quando se trata de apoiar bancos em dificuldades ou de desencadear guerras.

São, na verdade, flores de um mesmo embuste ideológico, que procura inculcar, como verdade objectiva, a ideia de que qualquer dispêndio para pagar salários é um insuportável gasto lesivo da economia e qualquer dispêndio para pagar lucros é um sublime e virtuoso estímulo à boa saúde dessa mesma economia.

Vencidos pela evidência dos factos pelo lado dos gastos, talvez alguns procurem voltar à superfície, subindo a vertente dos bens produzidos: uns produzem mais do que outros, pelo que quem mais produz, mais pode gastar.

Estaria desde logo aí esquecida a conhecida melodia do produzir primeiro, mesmo incentivando desigualdades, para distribuir depois, corrigindo os aleijões sociais assim suscitados. Mas, como essa melodia é mais para ser ouvida, como anestesia pelos explorados, do que para ser praticada, não é por aí que chegamos ao essencial. Sigamos pois outro caminho.

Em primeiro lugar, no actual sistema económico não há apenas rendimentos de trabalho, pelo que parece aleatório justificar o que se gasta com o que antes se produziu. Dir-se-á que é legal auferir rendas, juros e lucros. Sem dúvida, mas então não é possível justificar a legitimidade do que se gaste pelo que antes se tenha individualmente produzido.

Em segundo lugar, numa sociedade que é incapaz de absorver o desemprego de milhões de trabalhadores, que querem trabalhar, seria de um cinismo insuportável imputar uma qualquer culpa por não produzirem aos próprios desempregados. Mas se assim não for, também por este lado, a frase citada não faz o menor sentido.

Já se vê por que razão me não espantei por ver a nossa direita e os seus arautos muito bem aconchegados no calor acolhedor do discurso do Presidente, mas fiquei verdadeiramente escandalizado, por ter visto os porta-vozes da esquerda parlamentar (governo e oposição) papaguearem um rol de previsíveis banalidades acerca do discurso de Sua Excelência, mas cobrirem de um inclassificável silêncio a referida frase presidencial.

E quanto ao Presidente da República, em si próprio, foi com perplexidade que integrei o grosseiro malabarismo ideológico consubstanciado na referida na frase, na sua solene proclamação pública de acrisolado apego à verdade. Admito, sem qualquer dificuldade, que cumpra as generosas intenções propaladas quanto ao que vai acontecendo no dia a dia, mas, por mais que assim seja, esse louvável esforço não será suficiente para compensar o que há de mentira na aparente e superficial verdade dessa frase.