quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Frutos amargos

 

Mais tarde, poderei vir a fazer um comentário político global aos resultados das recentes eleições autárquicas. Deixemos assentar a poeira. Hoje, vou-me limitar a um comentário muito circunscrito, sem pretensões que transcendam o seu conteúdo visível. Vou falar muito genericamente da campanha do BE e dos seus resultados.

Se olharmos para o seu conteúdo, podemos dizer que as suas propostas estiveram em linha com o essencial da sua linha política. Mas esse conteúdo  foi expresso no quadro de uma estratégia que visou dois objectivos principais: aumentar o número de vereadores eleitos pelo BE e impedir maiorias absolutas do PS nos casos em que esse perigo  (na perspectiva do BE) existisse.

O primeiro objectivo falhou, já que o BE perdeu mais de metade das cerca de duas dezenas de vereadores que tinha.

O segundo, como o caso de Lisboa documenta, foi mais do que atingido: o PS mais do que não ter chegado à maioria absoluta não chegou sequer a uma maioria; perdeu as eleições. Tornou-se impossível assim ao BE obrigar o PS a comportar-se de acordo com as suas virtuosas indicações. Pelo que nos podemos interrogar sobre se este resultado é o pleno cumprimento do objectivo do BE ou a sua absoluta frustração.

Podemos andar às voltas de tudo isto com a imaginação própria das preferências de cada um de nós. Mas dificilmente podemos deixar de constatar que, se é certo que se pode envolver em subtis justificações a relação entre os resultados pretendidos e os conseguidos pelo BE, parece claro que com o modo como essa estratégia se concretizou a direita lucrou fartamente.

Os entusiasmos de Catarina tiverem pois alguns frutos, mas certamente amargos. Os vereadores salvadores com que ambicionava polvilhar as governações do PS de vários municípios não vão poder agir; ou porque não chegam a existir ou porque é a direita que está no poder.

Faço a justiça ao BE ao imaginar que estes frutos lhe são amargos.

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

PEDIR POUCO

 

Enérgica e perentória, Catarina apela à eleição de mais um vereador para o BE, em Lisboa ou noutro lugar, para assim abrir as portas  às coisas boas que os aturdidos munícipes já não esperavam .Uma chama incendeia-lhe o olhar, a felicidade está ao alcance das nossas mãos. Deem mais um vereador a Catarina e tudo será diferente.

É certo que podia pedir uma maioria absoluta para o BE, que assim teria os meios para realizar as suas esperanças. Mas Catarina é modesta. Tão modesta quanto entusiasta: não quer tanto, basta-lhe mais um vereador.

E é tão modesta que se inibe de ostentar toda a extensão do que nos promete. De facto, o seu contido desejo de mais um vereador, para além de poder ser a chave de uma boa fortuna, é muito mais do que isso, o princípio de um milagre. Não tão extraordinário, é certo, como o das rosas, mas seguramente também notável.

De facto, de um PS pesadão e relapso,  alérgico à abertura das generosas portas de Catarina, rumo a um início de respiração do paraíso, ela fará uma coleção de arcanjos, vocacionados para  o cometimento de todas as propostas  almejadas pelo BE. E afinal com uma condição muito simples: mais um vereador  para Catarina.  E, já agora, se não for pedir muito, não concedam ao PS maiorias absolutas.

Um cético oráculo da Grécia antiga talvez insidioso  encolhesse os ombros e regougasse : “Delírio, puro delírio”. Mas eu que sou um otimista do século XXI , generoso para com a alma humana ,afirmo com firmeza: “ Nada disso. Entusiasmo, voluntarismo , sonho  “.

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Homenagem a um amigo

 

Jorge Sampaio sempre

 

Escreveste o teu futuro firmemente

na parede mais branca do destino

 

Colheste os labirintos do poder

sem medo sem soberba sem pudor

de mãos nuas e limpas   desarmadas

 

Os pássaros da noite não tolheram

a força tranquila dos teus gestos

o diamante intenso da revolta

 

Na inquieta bruma das palavras

disseste sempre todo o pensamento

sem que o gume do ódio te perdesse

 

Sentiste em ti o coração do mundo

batendo através de Portugal

gritando   gritando  humanidade

 

O grande rio do povo recolheu-te

e aí é que encontraste o teu lugar