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domingo, 18 de janeiro de 2015

Duarte não é Charlie.


O Sr.  Duarte Pio, alegadamente de Bragança, afirmou hoje em Braga que o semanário ‘Charlie Hebdo’ é “um pasquim nojento” .
O Sr. Duarte não é, portanto, Charlie, como aliás já suspeitávamos. E está no seu  pleno direito, limitando-se  assim modestamente a ser pio.
 Mas convenhamos que esta  é uma ocasião um pouca esdrúxula para o estardaçalhar  em público. Assim pode arriscar-se a que o passem até a considera-lo como  Charliefóbico conquanto de Bragança.
O que fará com que  o semanário francês possa vir a  gritar,  a plenos pulmões:
 “Aos infiéis, senhor, aos infiéis, que não a mim…”.

domingo, 18 de abril de 2010

Negócios são negócios - por uma monarquia lucrativa.


1. O pretendente ao inexistente trono de Portugal, aliás, oriundo do que houve de mais retrógrado na monarquia portuguesa, o miguelismo, dispõe de uma imagem simpática, quando se apresenta como pessoa comum nas revistas que povoam as salas de espera dos cabeleireiros.

Se o homem se limitasse a ficar aconchegado dentro daquele seu esgar habitual que ele julga ser sorriso, talvez até viesse a conseguir um lugar na galeria dos reis simpáticos, ao lado do rei dos frangos e do príncipe da chanfana, num clima de bonomia em que o nosso povo é perito e que lhe facultaria, certamente, uma confortável simpatia entre as leitoras das revistas cor de rosa e entre os coleccionadores de selos com efígies régias. Mas o homem fala. Estimulado pela rede endinheirada dos alegados condes, duques e marqueses, o homem chega, de quando em vez, a cometer uma entrevista sem rede. Daquelas em que se mostra despido perante os seus espectadores, sem a caridade de uma correcção, sem a diligência amiga de um retoque.

Se o mencionado cidadão possuísse umas pálidas luzes, vindas dos mais elementares guias da política, talvez pudesse ter um pouco de cautela. Cautela, de modo a não desmentir, com a ostensibilidade da profunda reaccionarice do que afirma, a ficção, que cansativamente repete. A ficção de que, alegando-se subido a alteza real, paira apoliticamente sobre todos os portugueses, como impossível e generosa ave, sejam eles de direita, esquerda, centro, ou apenas distraídos. Mas nenhuma dessas luzes ameaça sequer a sua mente.

Por isso, Duarte Pio, quando fala sobre algo de mais complexo do que a chuva e o bom tempo, raramente deixa de mostrar, com indesmentível claridade, o seu profundo conservadorismo ideológico, bem como um reaccionarismo político dinossáurico, que decerto lhe dita, em noites de insónia, o espectro esbatido do seu antepassado Dom Miguel.

Mas desta vez, talvez estimulado pela forte dose de maresia da praia da claridade, sob o olhar, creio eu, de algum espanto da própria Fátima Campos Ferreira, Duarte Pio levou até ao máximo, na escala dos dislates, o que nos disse sob a nossa actual democracia e sobre a nossa Constituição. O seu tom, pela força das coisas, não deixou de ser real, mas o seu nível roçou tangencialmente o puro analfabetismo político.


2. Mas numa coisa, tenho que reconhecer, se revelou um arguto tradutor do ar dos tempos: foi quando, num argumento supremo, ofereceu aos portugueses, em preço de saldo, um reinado seu em vez da Presidência da República.

Aceito como boas as suas contas, pensando até, que, se for caso disso, o pretendente miguelista talvez faça um desconto. Estou mesmo a imaginar um debate interessante entre os portugueses duros que exigem um desconto de 50% e os mais moderados que aceitam o preço oferecido.

Mas a crise que atravessamos e a vertigem modernizadora, que assola tantos espíritos luminosos, levam-me a não excluir a hipótese de que, entre os portugueses mais somíticos, alguns se lembrem de propor: "Já que a monarquia vale sobretudo pelo seu baixo preço, por que não transformá-la num negócio, passando-se a levar a leilão o lugar de rei. Em vez de despesa, a chefia do estado passaria a dar lucro".


E, já que estamos em maré de propostas, atrevo-me eu nessa lógica a ir um pouco mais longe. Assim, eu proporia que se leiloasse, não um lugar vitalício de rei, mas, melhor do que isso, por fatias temporárias : uma ano, quatro meses, quize dias, uma semana.

Poder-se-ia então ouvir a Dª Miquelina dizer afogueada de emoção para a vizinha do lado. “ Estou muito emocionada. Juntei dinheiro vinte anos , mas consegui comprar um lugar de rainha para o próximo fim de semana”. E às crianças, ouviríamos dizer, com impaciência: “Papá, quando for grande também quero ser rei”. E aos paizinhos, decerto: “Se te portares bem, prometo-te uma semana de rei, quando fizeres dezoito anos”.

Se os nossos circunspectos pastores de ideias admitissem esse caminho, tudo se poderia reconciliar. A monarquia talvez ficasse mais popular do que a república, mas, mais do que isso, seria seguramente mais barata; ou até mais rentável. O Banco Central Europeu babar-se-ia de gozo.

Aliás, indo ainda mais longe, com uma verdadeira modernização da nossa Constituição, poder-se-ia mesmo retomar a outorga pelo Estado dos títulos nobiliárquicos. E assim talvez, sob a égide de uma empresa concessionada, a qual ficaria autorizada a alugar títulos, podia conceder-se um título de duque durante um fim de semana, ou durante a uma viagem ao Brasil; ou ser-se marquês durante uma peregrinação a Roma; ou conde, enquanto durasse o Mundial de futebol; ou ser-se baronesa, durante um desfile de moda em Sintra. Tudo isso seriam alegrias, necessariamente bem pagas, é certo, mas alegrias. Alegrias que, além do mais, dariam um forte impulso à saída da crise.

Não me admiraria, aliás, que o Sr. Duarte Pio viesse a soprar àquele seu escudeiro e partidário, que diz querer ser Presidente da República, o Dr. Nobre, para ele enriquecer o seu programa presidencial com essa proposta revolucionária: substituir a nossa dispendiosa república democrática por um monarquia lucrativa, na qual quem quisesse ser rei pagaria bem caro o sonho, embora num esforço democratizador e com um preço mais modesto se admitisse também a monarquia precária. Rei por um mês, uma semana, um dia, a preços convidativos, já se vê.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

As palavras e os campos


Um descendente do Sr. D. Miguel, fautor da mais prolongada e sangrenta guerra civil por que Portugal já passou, na qual foi derrotado e na sequência da qual lhe foram formalmente retirados todos os direitos de suceder na coroa portuguesa, veio à superfície, na alegada qualidade de sucessor de tão sombria personagem.

Fruindo as liberdades públicas que, e muito bem, a República lhe concede, esse descendente, o Sr. Duarte Pio, arrasou a conjuntura republicana e ergueu com o seu fraco verbo uma estátua imaginária a uma monarquia, que como projecção da alegada aura, nunca existiu.

Teria preferido ter tido notícia de que esse Senhor erguera, alguma vez, a sua voz, quando foi preciso sob o consulado do ”monárquico “ Salazar, antes de 1974, resistir a um poder ditatorial e obscurantista. Não foi isso que aconteceu. Durante todo esse tempo, ele e o seu progenitor, ronronaram mansamente no aconchego da complacência salazarenta.

Diz o referido senhor que o rei, que ele imagina poder ser, estaria, por natureza, acima de todas as tendências políticas. Não sei se é ingenuidade se desfaçatez que, quem ostenta publica e repetidamente uma posição ideológica que o situa dentro da direita mais reaccionária, pretenda exprimir desse modo a sua “pairância” por sobre as ideologias políticas de todos os portugueses. Sei que objectivamente estamos perante uma grosseira mistificação. Seria como se a uma tendência política, fracamente presente nas preferencias dos portugueses, fosse dado o prémio anti-democrático de lhe ser concedida uma vitória repetida, num rosário de eleições que a dispensariam de enfrentar.

Mas, na página de internet do periódico que o acolheu, há pelo menos uma boa notícia a seu respeito: ele é engenheiro agrónomo. Talvez, por erro meu, isto não seja uma notícia a não ser para mim próprio. Mas a verdade é que eu fazia fé num amigo meu que foi colega do Sr. Duarte Pio na Faculdade e que sempre me garantiu que o referido senhor apenas conseguira fazer a custo uma cadeira, concedida aliás por um professor que era monárquico dos quatro costados.

Vejo agora que apenas o equívoco desse meu amigo, ou o seu hipotético sectarismo republicano, conduziram a essa minha desinformação. A não ser que esse meu amigo estivesse certo, tendo afinal nós pela a frente, um exemplo feliz do programa das novas oportunidades, à sombra do qual o descendente do Sr. D. Miguel realizou o sonho da sua vida, ser um verdadeiro engenheiro agrónomo. Ou ainda, hipótese improvável, termos pela frente uma manifestação ilustrativa da grande aceleração e simplificação dos percursos universitários tão brilhantemente conseguida pelo manhoso Processo de Bolonha.

Seja como for, ou apenas subjectivamente ou mesmo objectivamente, eis uma boa notícia. É que , seguramente, o Sr. Duarte Pio poderá ser muito mais útil ao nosso país como engenheiro agrónomo do que como ocioso pretendente a um trono que deixou de existir, quando o seu antepassado D. Miguel perdeu a guerra civil contra os liberais.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

A República como superação da Monarquia


1.No caso português, entre os limites materiais das revisões constitucionais, encontra-se “a forma republicana de Governo”. Consta que alguns monárquicos sustentam a necessidade de remover esse limite, para depois se poder organizar um referendo que decida se os portugueses pretendem viver sob a égide de uma monarquia ou continuar sob uma república.

Se dissermos isto de uma outra maneira, fica claro que, no plano dos valores democráticos, a monarquia e a república não se equivalem. De facto, numa república nós escolhemos o Chefe de Estado periodicamente, o que significa que não só podemos mudá-lo de tantos em tantos anos, como asseguramos que os vindouros o possam continuar a fazer. Numa Monarquia somos condenados a ter como Chefe de Estado uma determinada pessoa, por mero facto de nascimento no seio de uma determinada família, sem possibilidade de a remover numa consulta popular livre. Pode-nos sair na rifa um génio ou um idiota, um autoritário ou um livre pensador. Pode-nos sair na rifa alguém que esteja em consonância com as opções maioritárias do povo ou que esteja contra elas.

Quando um dos valores básicos de um Estado de Direito é a igualdade dos cidadãos perante a lei, quando uma das áreas onde se têm gerado consensos interpartidários mais vastos é a que implica a valorização desse princípio, quando entre as traves mestras da nossa Constituição se encontram as várias repercussões desse princípio, se abríssemos na Constituição uma pequena porta que fosse à Monarquia estaríamos a instituir o risco da instituição de um privilégio de nascimento, para determinar quem ocuparia a cúpula do Estado. O maior privilégio que podia ser outorgado a alguém seria incrustado como um aleijão na nossa lei fundamental.

Mas não nos estaríamos apenas a condenar a um suicídio democrático no presente, estaríamos a expropriar as gerações futuras do direito de escolherem democraticamente quem vão querer como Chefe de Estado ao longo das suas vidas.

Ora, se é legítimo que se escolha quem deve ocupar este ou aquele cargo durante um certo período de tempo, não é legítimo que alguém decida hoje que os vindouros perdem o direito de decidir. E se já me parece difícil de sustentar que se use uma consulta democrática para legitimar uma possível perda do direito de ser consultado, mesmo que o eleitorado estivesse cem por cento de acordo, não me parece que pudesse confiscar aos vindouros o direito de decidirem quem deve ser o seu Chefe de Estado. Por tudo isso, me parece que, sem necessitar de outras considerações, o facto de a Constituição portuguesa não admitir a forma monárquica de regime, sendo essa inadmissibilidade um dos aspectos irremovíveis da sua lógica é coerente com o princípio democrático e com o valor da igualdade, da ilegitimidade geral de privilégios por nascimento. Não a admite, não por uma opção circunstancial e secundária que pode ser removida sem pôr em causa a sua estrutura e o seu sentido geral, mas sim pelo facto de essa mensagem normativa ser um elemento básico da sua identidade como um todo.
Por isso, verdadeiramente, aceitar na Constitução a possibilidade de uma monarquia não implicaria apenas retirar uma alínea dos limtes materiais da revisão constitcional, obrigaria também , pelo menos, a retirar dela o princípio da igualdade.

2. Isto é o principal, mas no caso português, podem juntar-se mais algumas considerações.

Desde logo, não podemos esquecer que o salazarismo em Portugal foi uma "república" apoiada pelos monárquicos ( salvas honrosas excepções que se não esquecem, mas que não podem servir para branquear a regra). E de tal o modo o foi, que com base nas alegadas preferências de Salazar, por mais do que uma vez pairou a hipótese de uma passagem suave da “república” salazarista para uma monarquia. Basta, por exemplo, consultar o jornal da “Causa Monárquica”publicado em plena ditadura, para se ver como estava identificado com o essencial da política do salazarismo.

E ,na actualidade, além de o PPM ser um pequeno partido de direita, entre os poucos cidadãos cuja opção monárquica é conhecida, a larga maioria é de gente claramente situada na direita política e ideológica. Também aqui, as honrosas excepções não podem servir para obnubilar a tendência largamente dominante. Aliás, bem sublinhada pelo Sr. Duarte Nuno, alegado pretendente ao trono português, um sujeito ideologicamente conservador e politicamente identificado com a direita portuguesa.

Ou seja, hoje, pode haver um Presidente ideologicamente de direita, como actualmente acontece, mas já houve os dois anteriores que eram de esquerda, todos eles escolhidos por voto popular. Se o Sr. Duarte Nuno fosse o Chefe de Estado vitalício, a direita teria instalado no topo do Estado um dos seus para sempre, seguindo-se-lhe os filhos e netos; e a esquerda, que representa mais de metade do eleitorado, ficaria reduzida a fazer vénias aos ungidos. Isto, desconsiderando provisoriamente o facto de, em circunstâncias normais, uma grande parte da direita preferir a República à Monarquia.

Com a agravante de, no caso concreto, o Sr. Duarte Nuno não estar sequer próximo de ter as capacidades e competências mínimas exigíveis a quem pretenda desempenhar a função de Chefe de Estado. Se o compararmos com qualquer dos Presidentes da República eleitos depois do 25 de Abril ou durante a 1ª República, percebemos a diferença e avaliamos melhor o risco da Monarquia.

Mas, mesmo que desembocássemos nesse absurdo histórico, por uma conjunção improvável de dislates, o Sr. Duarte Nuno não seria reconhecido como pretendente legítimo ao trono português, por uma boa parte dos monárquicos portugueses e desde logo pelo único partido monárquico existente, o PPM. De facto, o alegado pretendente descende do Infante D. Miguel que liderou os absolutistas na guerra civil que desencadeou contra os monárquicos liberais e que devastou Portugal no início do século XIX. Não descende dos reis liberais, mas sim do usurpador absolutista. Com ele não se chegaria a qualquer imaginário oásis de uma qualquer concórdia, mas a um provável acréscimo de confusão. Mesmo que se chegasse ao termo dos vários processos que conduzissem à Monarquia continuaria a não ser claro e pacífico quem podia ser rei.

Por último, quando se caminha para um mundo com instituições políticas globais, necessariamente democráticas e republicanas, que tornem mais provável a sobrevivência da espécie humana (no caso português, através de um projecto europeu que una os seus povos numa entidade que a todos represente e respeite), seria anacrónico devolver-nos ao pesadelo vivido um século atrás.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Ideias


O pensamento da semana, atribuído a Pilica de Azevedo, futura Marquesa da Maresia:


" A monarquia é gira. Pecebe?"

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Os monárquicos subreptícios



Num dos jornais de hoje, noticia-se um poderoso evento: o herdeiro do trono português está irremediavelmente de candeias às avessas com o PPM, o único partido português que ostenta garbosamente a opção monárquica.
Para o sucessor do Sr. D. Miguel, tudo se resume ao azedume do Sr. Presidente do PPM, pelo facto de o nosso pré-monarca não ter dado prontamente ao referido dirigente o direito de usar o título de Dom. Para este dirigente político, reconhecendo, é certo, a realidade dessa desfeita, as coisas têm raízes mais fundas. E a principal está no facto de não ser reconhecível como pré-rei alguém que tem como título único de legitimidade monárquica o sangue do Sr. D. Miguel. Sangue esse que é muito justamente apodado como sangue de usurpador. Direi eu , à laia de suplemento, que é também sangue de alguém que, em nome da recusa da introdução do liberalimo na instituição monárquica, se permitiu desencadear e liderar uma mortífera guerra civil entre os portugueses.
Que uma tão baça linhagem tenha tido os favores do Dr. Salazar, nós compreendemos. O Sr. D. Miguel e o Dr. Salazar comungavam na mesma desconfiança inabalável, em face de tudo que tivesse qualquer leve perfume democrático. Que a República de Abril tenha deixado continuar o descendente miguelista ostentar a sua qualidade de pretendente a algo que não existe, nós compreendemos. De facto, se há pelo menos um personagem que ostenta o garboso título de Rei dos Frangos, sem ser conhecida qualquer consulta democrática aos ditos, por que se havia de embirrar com alguém que, embora sem nos consultar, tem a prudência de se considerar apenas um mero pretendente.
Já é um pouco mais estranho, terem-no deixado misturar-se com a actual nomenclatura republican em cerimónias oficiais, bem como ter havido Presidentes da República que passearam com sua Pretedência nos Jardins de Belém. Mas não nos vamos zangar com tais deferências. O nosso bom povo aceita tudo isso com bonomia. É até capaz de uma festinha na bochecha da infanta, de se deliciar com as travessuras do príncipe e de colocar Sua Pretendência, ao lado do Rei dos Frangos na sua saudável tolerância, perante qualquer cidadão que se lembre de ostentar ( ou sugerir que pretende ostentar) o título de Rei, seja lá do que for. Aliás, num brasileirismo fraterno, copiando hábitos dos nossos irmãos, afloram já aqui e ali glorificados Reis do Carnaval magestosamente acompanhados por exuberantes Rainhas.
Por isso, certamente, o povo aceitará também que o Sr. Presidente do PPM, tenha descoberto que inquinada Sua Pretendência, D. Duarte Pio, pela mácula sem perdão do usurpador miguelista, quem verdadeiramente pode ser Pretendente é um pacato cidadão que vive anónima e tranquilamente algures, dado ser um legítimo sucessor dos monarcas liberais que aceitaram ser limitados pelas celebradas Constuituições. De facto, consta que nas profundezas do Portugal eterno dorme a sesta da vida um quinto bisneto de uma sétima prima da segunda tia de uma quinta filha do Sr D. João VI, que sempre esteve ao lado do irmão Pedro contra o renegado irmão Miguel.
Se eu fosse juiz de pretendências, não hesitava, dava já razão ao ramo liberal, pela razão simples de que prefiro sempre os que deixam votar.
Aliás, ao que parece, o herdeiro do Sr. D. Miguel ficou tão furioso com o PPM que se pôs descobrir monárquicos no PSD, no CDS, garantindo que os havia entre os deputados do PS e que até nas inóspitas paragens do PCP se encontravam alguns entre as respectivas franjas autárquicas. Não se sabe se por esquecimento o BE escapou, bem como todos os pequenos partidos, incluindo o próprio PPM.
Ficámos pois a saber que não há afinal monárquicos no PPM, para sua Pretendência Real D. Duarte Pio, abundando os monáquicos subreptícios nos grandes e médios partidos nacionais, embora se mantenham higienicamente longe dos pequenos.
Por mim, registo este drama histórico entre o partido monárquico acusado de não ter nenhum e o Pretendente ao trono acusado de ter sangue de usurpador. Mas como socialista, curioso de conhecer todos os meandros do meu partido, espero que em tempo de eclosão de correntes internas, a par das várias de esquerda que certamente vão aparecer , da corrente realista que certamente continuará maioritária, se mostre a vigosorosa corrente dos monárquicos, que, sem com isto me querer intrometer, podia ostentar o vistoso nome de "socialistas esotéricos".

sábado, 26 de janeiro de 2008

A direita na sua forma monárquica


Alguma direita tem a nostalgia da monarquia. Não há nisso uma contradição estrutural com os seus valores tradicionais, mesmo que seja verdade que a maior parte da direita é hoje republicana, ou, pelo menos, acha que seria estúpido sacrificar-se, lutando pela restauração monárquica. Se lha oferecessem talvez não se revoltasse contra ela, mas não tem nenhum interesse em correr riscos por causa dela.



Já a esquerda, que não tenha ficado mole no cerne da sua própria identidade, não pode deixar de ser republicana. Não por acreditar que a República é um antídoto infalível para qualquer mau governo, ou que o invólucro monárquico de uma democracia a arrastará necessariamente para soluções políticas piores do que as de qualquer república. Mas, principalmente, por que o princípio democrático de legitimação do poder, que se traduz, no mínimo, pela escolha democrática dos detentores de todos os lugares de chefia no seio de um Estado, é incompatível com o princípio monárquico pelo qual o rei é escolhido numa lógica hereditária, sendo estruturalmente irremovível. De facto, não se pode admitir, se quisermos respeitar realmente os valores democráticos em toda a sua amplitude, que a escolha de um Chefe de Estado não resulte directa ou indirectamente da vontade livremente expressa pelos cidadãos eleitores, válida para um mandato temporário, periodicamente posto à prova por novos processos eleitorais.


Não é esta a única razão que tem levado a uma preferência crescente da forma republicana da chefia do Estado, em detrimento da forma monárquica, mas está nela o cerne da ilegitimidade democrática intrínseca de qualquer monarquia. E é esta uma das razões pela qual seria absurdo admitir que, no quadro de uma República democrática, se admitisse sujeitar a referendo a perenidade da República, perguntando aos cidadãos eleitores se preferem submeter-se a uma Monarquia.


De facto, é absurdo pensar-se que é compatível com os princípios que regem um Estado de Direito democrático conceder-se a uma hipotética maioria de cidadãos a faculdade de apoucarem em definitivo o conjunto dos eleitores, bem como o das gerações vindouras. Na verdade, compreende-se que seja legítimo que os eleitores de uma época garantam a liberdade de escolha às gerações vindouras, quanto à escolha do Chefe de Estado, mas não é igualmente legítimo que se permitam retirá-la. É democraticamente legítimo que uma maioria garanta a liberdade de escolha mesmo a uma minoria que esteja disposta a abdicar dela, mas não é igualmente legítimo que uma maioria retire a uma minoria essa liberdade de escolha contra a sua vontade. No segundo caso, estar-se-ia a ferir uma dignidade que no primeiro caso se respeitaria, não havendo , por isso, qualquer simetria entre as duas hipóteses.


Efectivamente, no segundo caso estar-se-ia a pôr em causa a estrutural igualdade dos cidadãos perante a lei e o Estado num ponto crucial: o direito a ser-se escolhido para ocupar, mediante opção livre e democrática dos cidadãos eleitores, a Chefia do Estado. A nossa Constituição exclui expressamente a possibilidade de se alterar a forma republicana do Estado, mas mesmo que não houvesse essa proibição expressa, a opção pela forma monárquica poria em causa a sua lógica democrática mais profunda, sendo só por isso incompatível com ela. Admitir o contrário seria o mesmo que admitir, por exemplo, que, no seio de um regime democrático, se optasse através de um referendo, entre continuar a viver em democracia ou aceitar viver sob um poder político ditatorial.


Aliás, no caso português, é bem claro que a opção monárquica é apenas uma das correntes de opinião dentro da direita. Não passa de artifício propagandístico mencionar, como se fosse realidade, uma preferência monárquica que, alegadamente, se espraiasse por todo o espectro político. Basta ver as opções assumidas pelo PPM ou conhecer as opiniões políticas do alegado pretendente ao hipotético trono para se verificar isso mesmo. Aliás, os portugueses foram já governados durante a República por um regime que reflectiu o poder pessoal de um monárquico confesso, Salazar. Sabem muito bem qual é a matriz política dominante entre os monárquicos portugueses .



E quando, nestes últimos dias, temos visto espalhar-se um tão grande esforço para santificar D. Carlos e demonizar os republicanos de há cem anos, aproveitando as circunstâncias violentas e dramáticas da sua morte, seria bom lembrar que o alegado pretendente ao hipotético trono português nem sequer descende dos Reis de Portugal (e, portanto, de D. Carlos). Descende sim de D. Miguel, irmão de rei e usurpador, líder da rebelião absolutista contra a monarquia liberal e grande fautor de uma longa guerra civil que ensanguentou Portugal durante vários anos. E, se atentarmos em tudo o que ao longo dos anos, antes e depois do 25 de Abril, o nosso candidato a pretendente disse publicamente, vemos que ele faz jus ao seu antepassado, sendo ostensiva a sua ligação ideológica ao que há de mais conservador e reaccionário na direita portuguesa.
É neste contexto que deve ser avaliado o modo como se tem tentado reanimar mediaticamente o regicídio, ocorrido há cem anos. Reanimá-lo, não como um facto histórico dramático que merece estudo e análise, contextualizando-o adequadamente, para nos ajudar a compreender melhor o nosso passado, mas como um acontecimento político, quanto ao qual há que tomar partido, estigmatizando postumamente os seus autores e beatificando a vítima, como se tudo tivesse acontecido ontem. E, subliminarmente, amarrar-se a República ao Pelourinho e enviar-se a Monarquia para o Olimpo. Enfim , uma operação primária e absurda. Tão absurda como o teria sido querer hoje acusar D. João I de ser um perigoso assassino, por ter apunhalado o Conde Andeiro; ou acusar D. João II de ser um bárbaro matador da família, por ter apunhalado pessoalmente um cunhado; ou debater apaixonadamente a questão de saber qual dos dois bárbaros mandantes merece a maior censura: D. Afonso IV, por encomendar o assassinato de Inês de Castro, ou D. Pedro I , por mandar arrancar o coração aos matadores da sua amada.










Enfim, tiremos da nossa História as lições que ela contém, situemos objectivamente os seus dramas, mas não embarquemos na utilização tonta de alguns dos seus acontecimentos, para os usar como elementos de propaganda política ou de proselitismo ideológico imediatista.