sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Educação, sindicatos e manifestação



                                 [Um militante do PSD e um militante do PCP lideram uma manifestação]

Educação, sindicatos e manifestação

1. Os  protagonistas principais  da educação no nosso país têm deixado, ao longo deste novo século, confinar esta problemática, em larga medida, às questões sindicais que envolvem a profissão docente. Este caminho está longe de conduzir a um pleno florescimento do processo educativo e de suscitar uma verdadeira dignificação da profissão docente e a realização profissional e humana dos professores.

 A sociedade tem vindo a tornar-se cada vez mais complexa, na esteira de uma vertiginosa evolução tecnológica, de uma crescente diversificação cultural, de uma desordenada aceleração da velocidade de circulação da informação e de uma imensa facilidade comunicacional. A multiplicidade de veículos de difusão do conhecimento e da informação convive com uma enorme escassez de instrumentos críticos que permitam o seu pleno e real aproveitamento em benefício de todos. 

Pior, a democracia continua tolhida e a sociedade injusta. A resposta dada pelas políticas educativas a esta complexidade tem sido insuficiente. Talvez demasiado presa a um conservadorismo estrutural que ficciona movimento em detalhes e em aspetos secundários, mas que não consegue quebrar as amarras estruturais que o tolhem. Os oásis de criatividade que felizmente enriquecem o panorama educativo português não são suficientes para apagarem a sensação de secura que predomina no plano da inovação educativa.

2. Se olharmos, à  luz destas dificuldades, para a agenda que tem dominado os debates em torno da problemática educativa no nosso país, veremos como temos ficado longe do desejável. Não significa isso que se deva menosprezar o tipo de questões que têm ocupado a ribalta pela mão dos sindicatos dos professores. Significa que quanto mais tudo se conserve fechado dentro delas, mais difícil será  chegar-se a uma verdadeira solução que, caminhando para uma maior justiça, rasgue em simultâneo novos horizontes.

3. A esta luz, não pode deixar de se pôr em dúvida o acerto da marcação da anunciada manifestação  para  o próximo dia 5 de outubro, dia de reflexão por ser  véspera das eleições legislativas.

Há meses atrás, no auge do seu confronto com o governo, os sindicatos dos professores anunciaram um vasto programa de lutas que incluía a referida manifestação. Ficou por isso bem sublinhado o carácter antigovernamental da manifestação.

Ora, se no dia de reflexão é proibida a propaganda a favor de qualquer partido, não deixa também de o ser, a propaganda contra. E essa proibição tem um sentido substancial e não formal; não está apenas em causa a explícita crítica ou o explícito apoio, está em causa o sentido das ações, dos cartazes e das palavras de ordem e não apenas a sua letra. Se esta manifestação, como já foi assumido pelos promotores, contende diretamente com decisões políticas do governo, não deixará de se traduzir em apoiá-lo ou criticá-lo, ainda que implicitamente. E se assim é, nesse dia é ilegal. Haver uma razão verosímil para que ela seja feita nesse dia, não parece suficiente para tornar lícito o que a lei por razões de transparência eleitoral, proíbe.

4. Sendo por isso pelo menos discutível a legalidade da manifestação em causa, não se compreende a razão por que se insiste nela. Sendo antes de umas eleições após as quais haverá um novo governo, não parece haver outra razão para a fazer nesse dia do que a   tentativa de prejudicar o PS, partido que suporta o atual governo. E isso é precisamente o que a lei eleitoral proíbe.

Para além disso, se olharmos com atenção para o que ocorreu nos últimos meses, em torno do conflito entre o governo e os sindicatos dos professores, podemos ver que está longe de poder ser dado como certo que uma manifestação contra o PS promovida pelos sindicatos dos professores prejudique realmente o PS. A fazer fé no que tem sido dito por partidos, jornalistas e opinadores de referência, essa sofreguidão anti-PS pode acabar por beneficiá-lo. E isso seria uma saborosa ironia objetiva que deixaria a nu a tacanhez tática e estratégica das figuras liderantes dos sindicatos dos professores.


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