sexta-feira, 20 de setembro de 2019

As vacas no seu labirinto





As vacas no seu labirinto

Fontes geralmente bem informadas garantiram-me que está a ser organizada uma manifestação de vacas. No entanto, não me souberam dizer se a manifestação era de protesto contra a Universidade de Coimbra, por discriminação contra a carne de vaca ou se era, pelo contrário, de regozijo por assim se estar a diminuir o risco de morte pré-alimentícia das manifestantes.

Na mesma área, por se tratar de uma notícia difusa, não me foi possível confirmar se realmente também as vitelas tencionam manifestar a sua solidariedade para com as vacas ou se, pelo contrário, querem deixar bem claro que vacas são vacas e vitelas são vitelas; não lhes dizendo por isso respeito  o banimento  decretado para as cantinas da citada Universidade.

Um conhecido e acutilante zoólogo aludiu, filosófica e discretamente, ao risco de pairar na conjuntura alguma discriminação sexista, pelo facto de ser mencionada apenas a carne de vaca, nada se dizendo quanto à de boi.

Ainda que sem confirmação, consta também  que Boris, o irrequieto súbdito de sua majestade britânica, tendo ouvido ressoar de passagem nos seus ouvidos  uma alusão ao conflito entre a UC e os “beefs” de vaca, ensaiou um protesto diplomático contra a União Europeia, por considerar que a alusão aos “beefs” não era mais do que uma ferroada disfarçada  no Reino Unido.

Vários expoentes da aristocracia proprietário-campesina, alguns camponeses mais atentos, certos  políticos de extracção rural, diversos  intelectuais carnívoros e alguns vegetarianos, esgrimiram no espaço público  doutos argumentos, conquanto passando estranhamente à margem   da opinião das vacas. 

Houve mesmo uma historiadora mediática que se ostenta  esquerdista que trouxe lucidamente à colação a luta de classes, tendo-lhe faltado tempo para esclarecer  se estava em causa a clivagem entre vacas ricas e vacas pobres; ou se o busílis estava nos possíveis comedores. 

Em contrapartida, foi emblemática a manifestação de regozijo de um estudante, fruídor das cantinas da UC, que viu na medida do magnífico reitor uma firme promessa de que a modesta carne de vaca, com que tinha que se defrontar no  dia a dia , ia  agora ser substituída por uma saborosa e ecológica vitela maronesa. Não foi possível confirmar se, neste caso, estávamos perante uma esperança fundada ou perante um simples devaneio gastronómico.

O período que atravessamos agudizou uma estranha combinação de odores no espaço público: uns sugerindo o cheiro acre da política, outros tresandando fortemente a churrasco. Receia-se o aumento da abstenção. 

A fechar, quebrando a sua olímpica neutralidade o  Presidente da República prometeu continuar a trincar com firmeza a carne de vaca. Os deuses respiraram então de alívio libertos do temor insidioso que lhes advinha do Boi Ápis.

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