quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Belém e o Rato- dois locais, dois destinos.


Dizem que no PS há divisões quanto ao grau de hostilidade que se deve pôr nas relações políticas com Cavaco Silva. Mas é legítimo que nos interroguemos sobre se uma tal questão tem a densidade política suficiente para ser suporte de uma diferenciação táctica.

O que me parece é que, quem dentro do PS a tomar como tal, apenas estará a revelar uma preocupante pobreza das suas opções políticas de natureza táctica. Mas quem dentro do PS , para além de valorizar esta questão, insistir em apelos à intervenção presidencial, estará ainda a cometer um significativo erro estratégico.

De facto, sendo o actual Presidente da República o ex-candidato triunfante da direita, será estulto imaginar que, em última instância e no essencial, ele fugirá do sector largamente dominante do seu eleitorado. Aliás, tem repetidamente dado sinais públicos de que ainda hoje se identifica como o continuador do primeiro-ministro do PSD que ele foi durante cerca de uma década.

Sendo assim, se o PS lhe atribuir um estatuto de alto relevo político, quando julga precisar dele para o ajudar a ultrapassar uma qualquer dificuldade conjuntural, está a credenciá-lo, a reconhecer-lhe um estatuto de imparcialidade e de legitimidade política substancial, que o PR poderá usar contra o PS, quando chegar uma qualquer hora da verdade, em termos do combate político.

Por isso, o PS deve encarar sempre o PR como o ex-candidato da direita que está sentado em Belém. É claro, que deve respeitá-lo institucionalmente, deve ter abertas para com ele as vias de diálogo que forem constitucionalmente adequadas, sempre leais e descomplexadas. Mas não deve nunca, mesmo que seja através de uma aparente acrimónia, deixar transparecer a ideia de que temos ali alguém de que podemos esperar qualquer verdadeira ajuda estratégica, alguém em quem possamos confiar politicamente. Deste modo, pedir-lhe para nos ajudar contra os nossos opositores, além de não ter qualquer efeito prático, é reconhecer-lhe uma credibilidade que um dia será usada contra nós, se for caso disso.
Neste contexto, o PS não pode permitir que um qualquer garnisé político, ainda que de porte pomposo e voz grossa, cacareje publicamente contra o PR, um qualquer rosário de frases inconsequentes, que só podem virar-se contra nós. Relativamente ao PR: inteligência e contenção. Nunca bicadas gratuitas ou irrelevantes: responder em legítima defesa , com serenidade mas sem ambiguidade.

De facto, nós não temos que estar a justificar a nossa saída da maioria presidencial, pois não fazemos nem podemos objectivamente fazer parte dela. E não devemos cair na esparrela de ver numa imaginária boa vontade presidencial um suplemento de força para nós. A força do PS está nos seus militantes, nos seus apoiantes, nos seus eleitores. O actual PR, quando puder (se alguma vez puder), será o primeiro a derrubar-nos. Enquanto isso não estiver ao seu alcance, coexistirá pacificamente connosco. Façamos o mesmo. Preparemo-nos para o substituir no momento próprio ( as próximas eleições presidenciais); e até lá coexistamos com ele, com sangue frio. Sem ilusões, mas também sem precipitações.

Mas, por favor, quanto ao PR, quando alguém falar publicamente em representação do PS, que seja um peso pesado, se possível da direcção do partido, necessariamente, repito, falando com serenidade e inteligência.

Sem comentários: