UMA SONDAGEM, A POLÍTICA E O FUTURO
1.
Uma recente sondagem quanto à intenção de voto nas legislativas, promovida pela
Intercampus , foi recentemente
publicada pelo CM e pelo Negócios. Eco mediático modesto. Compreensível. Os
resultados não permitiam um alarido simplista. Traduziam modestamente o
foguetório antigovernamental e apontavam para um agravamento do pântano
político em que as direitas parecem atolar-se. Os jornais comparavam estes
resultados com os de uma sondagem feita no mês anterior já depois das eleições.
Por mim, vou compará-los com os resultados das últimas legislativas. Parece-me
mais significativo.
O
PS passa de 36,5% para 34,9 %, o que significa uma perda de 1,6%. O PSD desce
de 27,9para 24,9, o que implica uma perda de 3%.O BE passa de 9,7 para 10,8, o
que se traduz num ganho de 1,1 %. A CDU passa de 6,5 para 8,1, o que representa
um ganho de 1,6%. O CDS passa de 4,3 para 2,9, o que significa uma perda de
1,4%. O PAN sobe de 3,3 para 4,8, o que se traduz num ganho de 1,5%. O Chega
sobe de 1,30 para 4,8, o que representa uma subida de 3,5%. A IL cresce de 1,3
para 2,9 o que implica um ganho de 1,5%. O Livre passa de 1,1 para 2,7 o que
significa um aumento de 1.6 %.
Se
considerarmos o PAN como ele diz que é (“nem de direita nem de esquerda”, ou
seja de centro) esse espaço político alargou-se em 1,5%.
Se
considerarmos a direita como abrangendo o PSD, o CDS, a IL e o Chega este
conjunto passou de 34,7 para 35,5, o que significa um aumento de 0,8%. Mas se
separarmos a direita clássica da extrema-direita, a primeira terá perdido 2,7%
e a segunda terá ganho 3,5%.
Se
considerarmos a esquerda como compreendendo o PS, o BE, a CDU e o Livre,
verificamos que passou de 53,7 para 56,5, o que significa um ganho de 2,8%. Mas
como vimos o PS perdeu 1,6% e os outros três partidos partilharam entre si em
partes quase iguais um progresso de 4,4%.
2. As
variações não são grandes. O PS sofreu um desgaste modesto apesar da intensa
barragem de artilharia política que o tem assediado. As outras esquerdas
ganharam algum viço o que parece especialmente relevante para o PCP, por
parecer que desse modo reverte a tendência revelada nas legislativas; e para o
Livre pelo facto de ter duplicado a percentagem de intenções de voto.
O
PAN parece mostrar a solidificação da robustez adquirida .
Na
direita clássica tradicional o CDS parece atolar-se ainda mais dramaticamente
na sua crise. O PSD parece patinar, murchando um pouco mais, talvez em função
da disputa interna que está a atravessar. A IL tem em termos relativos um
aumento animador.
A
extrema-direita quase quadruplicando as intenções de voto em comparação com os
resultados eleitorais que obteve, ao ultrapassar claramente o CDS, acentua-lhe
a dramaticidade da crise que está a viver. Coloca-se assim no horizonte como
questão estruturante do futuro da direita clássica o modo como se vai relacionar
com a extrema-direita.
O
relacionamento entre PS e os outros partidos de esquerda tem-se revestido de
uma atmosfera de incerteza. Parece não ter sido encontrado um tipo de
conjugação entre eles que todos aceitem sem reserva mental. Se deixarem
resvalar para o antes de 2015 o modo como se relacionam estarão a abrir a única
porta através da qual a direita pode regressar ao poder. O BE, o PCP, os Verdes
e o Livre só aprovarão as medidas que tiverem o voto favorável do PS, a não ser
que se disponham a ter uma agenda política em que sejam centrais as medidas que
suscitem o acordo das direitas ainda que não o do PS. Este tem uma situação
quase simétrica ainda que lhe baste a abstenção das outras esquerdas ou de uma
parte delas para não ter que recear a reprovação pelas direitas mesmo que
concertadas. Se todos vemos isto, parece
inútil tentar esquecê-lo.
O
governo afirmou expressamente que privilegia os acordos políticos entre o PS e
os outros partidos de esquerda, mas estes parecem mais interessados num alarido
de demarcação do que numa atmosfera de concertação. Vejamos o que realmente
acontece.
No
entanto, todos estes partidos não deveriam esquecer-se que a articulação
política que construíram na legislatura anterior não foi uma invenção a frio de
estados-maiores partidários, foi um impulso do povo de esquerda, do bloco dos
seus eleitorados efetivos e potenciais a que esses estados-maiores tiveram o
mérito de dar sequência. E é bem provável que os vários tios de tergiversações
e de ambiguidades ocorridas na campanha eleitoral para as legislativas, quanto
à assunção do que tinha ocorrido entre eles e quanto á vontade de a
continuarem, tenham atirado para uma abstenção desiludida ou cética muitos e muitos
eleitores do povo de esquerda.
E
é bom que nos lembremos que nos cemitérios da memória política europeia jazem
muitos partidos de várias esquerdas que, inventando ou conservando cartilhas
obsoletas oriundas do seu passado ou do seu exterior, esqueceram a primazia da
consonância com o povo de esquerda, com a sua esperança , com a recusa da sua
humilhação. E assim foram murchando, murchando até serem nada. Se qualquer
partido de esquerda for derrotado por ter ficado realmente junto dos seus, nada o apagará, mas se for
derrotado por se ter esquecido deles acabará por se esvair.
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