domingo, 19 de agosto de 2018

Libertar os professores socialistas?





Libertar os professores socialistas?

Há um velho dilema objetivo que se coloca aos professores socialistas. Especialmente aos militantes e aos simpatizantes do PS, mas que envolve também os seus eleitores habituais. Devem os professores socialistas esquecer o seu vínculo partidário, quando se trata da atividade sindical, enquanto  os militantes e simpatizantes de outros partidos o não fazem?  Deve, nestas circunstâncias, o Partido continuar totalmente alheio a esse dilema, não dando aos socialistas qualquer orientação explícita e taxativa ,  nem sequer dando também  qualquer indicação preferencial com o simples carácter de sugestão?

O que foi noticiado este fim de semana quanto às posições dos sindicatos dos professores no que concerne à aprovação do próximo orçamento de Estado  reacende a questão. De facto, os sindicatos em causa, e em especial os três com maior visibilidade, declararam ir pressionar o PCP e o BE para chumbarem o orçamento, se dele não resultar a satisfação completa das reivindicações que os opõem ao Governo. Ou seja, pedem a esses partidos para derrubarem o atual Governo do PS, dando assim à direita uma oportunidade para o substituir na sequência das novas eleições que daí adviriam.

Julgam que um Governo de direita trataria melhor os professores do que o atual ? Foi isso que fez o Governo anterior? E acham os professores simpatizantes das diversas áreas políticas da esquerda que um governo de direita seria melhor para o país do que o atual governo? Se o pensam por que continuam a ser de esquerda? Se o não pensam, porque deixam que as lideranças sindicais atuem em sua representação contra aquilo que pensam?

Os três sindicatos mais visíveis têm como líderes mais ostensivos dirigentes cuja identidade política é pública: um é militante do PCP, outro é militante do PSD e outro (mais recente, mais fogoso e com menos apoios) é de um antigo candidato do MAS. Todos convergiram na iniciativa política acima referida, dirigida ao chumbo do próximo orçamento. É aliás comovente apreciar o entusiasmo  com que um destacado militante do PSD se associa angelicamente à exigência feita ao PCP e ao BE, para chumbarem o próximo orçamento, se ele não for tão longe como acham  que deverá na reversão das malfeitorias feitas pelo seu próprio partido quando foi governo. A pergunta regressa: o que pensam os professores socialistas de tudo isto? O que contam os professores socialistas em tudo isso?

E aqui eu não discuto o fundo da questão, mas apenas se a constância do desacordo entre o Governo e os sindicatos, é uma razão suficiente para derrubar este governo, abrindo de novo as portas à direita? Que os professores de direita possam pensar isso acho compreensível. Que os professores de qualquer das áreas da esquerda o pensem acho estranho, a não ser que discordem da atual solução e preferissem que tivesse continuado a governar  Passos Coelho. Mas que os militantes, os simpatizantes e os eleitores do PS pensem dessa maneira acho muito improvável. E, no entanto, esta área política envolve, previsivelmente, entre 35 a 40 % do eleitorado. Quem os ouve? Quem os pode representar?

Em função, de tudo isto dou comigo a regressar há umas  décadas atrás, quando os professores do PCP quebraram a unidade sindical dos professores e criaram os seus próprios sindicatos. Eu não era então militante do PS, mas da UEDS, tendo havido reuniões com militantes do PS para se equacionar a possibilidade de fazermos algo de paralelo nos professores ao que havia feito  o PCP. A iniciativa morreu. Passaram décadas; mas  o problema mantém-se: os socialistas estão dispersos pelos vários sindicatos e em todos subalternos. É uma opção possível deixar tudo como está. Mas não acho que seja uma boa opção.

Por outro lado, a expressão organizada dos professores dentro do PS é fraca, embora já o tenho sido mais. Durante mais de uma década, a partir de 1989, participei na Federação a que pertenço numa seção sectorial de Educação. Mais algumas idênticas existiam então noutras federações. Poucas , mas com alguma audibilidade. Tudo entretanto foi esmorecendo, perdendo visibilidade e relevância política autónoma. 

Algum tempo depois, na minha Federação foi desencadeado um subtil processo de confinamento e neutralização da seção de educação de que era membro . No termo de um sub-reptício  processo  a seção foi extinta, aparentemente por força do jogo de pequenas lógicas de pequenos poderes.  Olhando hoje para o rosário dos protagonistas e animadores principais de tão discretas manobras, surpreendo-me a desconfiar do lóbi dos negociantes de colégios.

Seja como for, com o desprendimento e o distanciamento  que a senectude traz, parece-me tempo de os professores socialistas forjarem uma dinâmica própria que os habilite a ter um papel de interlocução no seio do Partido e no seio dos Sindicatos. Não se trata de preconizar a criação de um bloco de guerreiros que se ponha ao serviço de poderes ou da sua contestação. Trata-se de criar um lugar organizado de troca de ideias, útil ao país, à educação, aos sindicatos e ao partido. Para começar, juntamo-nos organizadamente. Depois decidimos o que fazer. E se a direção do PS tomar este processo em mãos, isso então será excelente.

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