domingo, 19 de abril de 2009

17 de Abril – comemoração do futuro


Na próxima edição do jornal publicado em Coimbra, " Campeão das Províncias", vai sair um pequeno texto que escrevi de comentário às comemorações do dia 17 de Abril e que de seguida transcrevo.


"No passado dia 17 de Abril, em Coimbra, bem mais de uma centena de antigos estudantes que participaram na crise universitária de 1969, corresponderam ao convite dos actuais dirigentes da AAC e acorreram a uma confraternização ocorrida no Centro Cultural D. Dinis. Actuais e antigos estudantes conviveram numa atmosfera de excelência musical diversificada, onde se entrelaçaram velhas canções de resistência e a fresca sonoridade de enérgicos metais. Por entre a floresta entusiasta de exclamações de quem não se via há dez, há vinte, há trinta e mesmo há quarenta anos, irromperam breves palavras do actual Presidente da AAC, do Presidente da AAC em 1969 e do Magnífico Reitor da Universidade de Coimbra.

Estas comemorações conjugaram-se com as do 25 de Abril de 1974 e irmanaram as duas datas, olhando para o 17 de Abril como prenúncio do que viria a acontecer cinco anos depois. Estão, por isso ainda a decorrer diversificadamente, espalhando-se pelas ruas, emergindo em iniciativas culturais e simbólicas. Mas não se deixaram deslizar para o saudosismo melancólico, para um certo memorialismo passadista em que podiam incorrer. Esta comemoração foi fortemente ancorada no presente, naquilo que o presente tem de esperança e inconformismo.

Por isso, se pode dizer que estas comemorações dos quarenta anos da crise de 1969 não foram uma inútil reverência aos protagonistas num desbotado tom sépia. Foram, sim, o assumir de um testemunho que, por isso mesmo, fez com que os antigos estudantes de 1969 que puderam acorrer à chamada se sentissem tranquilos e honrados.

A Universidade Nova que já então se queria está ainda distante, a Sociedade Nova sem a qual a novidade da Universidade não teria um sentido completo desafia-nos, longínqua, no horizonte. Por vezes, a História parece cansar-se, ameaçando parar. Em vez de caminhar, cambaleia e tergiversa. Foi o que aconteceu, à escala da Universidade portuguesa, com as recentes mutações legislativas que se apresentaram como diligente execução dos desvairados ventos bolonheses. Um dia, mais cedo do que tarde, reerguer-se-á , retomando o caminho interrompido.

Por ironia do destino essa excrescência do neoliberalismo nas Universidades dá os seus primeiros passos, quando a lógica que a guia revela o seu verdadeiro rosto no desastre para onde arrastou a economia mundial. Este governo deveria ter sido imune a essa lógica que lhe é genética e estruturalmente estranha. Não foi. Mas tudo se pode mudar, desde que a capacidade de autocrítica se reanime, desde que as instituições universitárias não se limitem a oscilar entre um cordeirismo manso e um raposismo matreiro, desde que os estudantes consigam construir uma rebeldia audível e voltem a desenhar em conjunto uma esperança partilhada com as forças sociais futurantes.

Sentiu-se nestas comemorações que os estudantes de hoje não estavam através delas a refugiar-se no passado. Estavam sim a convocar para o futuro o que no passado lhes pareceu digno de receber essa chamada. E foi isso que, verdadeiramente, nos honrou.

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