domingo, 28 de novembro de 2021

O MISTÉRIO DO LARANJAL EXTRAVIADO

 

O mistério do laranjal extraviado

Era uma vez um laranjal com um disfarçado perfume de direita. Discreto para não afastar os pacatos portugueses suaves. Suficientemente detectável para fixar a nebulosa conservadora, não desiludir o entusiasmo dos liberais, nem excluir os prisioneiros distantes da ressaca salazarista.

No passado, num tempo de pujança eleitoral, chegaram a falar em  cavaquistão. Há anos que muitos o procuram reencontrar num saudosismo infrutífero. Os museus acolhem memórias; não prenunciam regressos.

Ontem, houve dentro do laranjal uma competição feroz entre Rio e Rangel, para legitimar a entrega do leme partidário a um deles. O segundo desafiava o primeiro que, aliás, dirigia já o laranjal em questão.

Os notáveis, os notabilíssimos e os híper-notáveis, reconhecidos como frequentadores ou proprietários  do laranjal, fizeram os seus alinhamentos. Estilos diferentes: alguns deixavam deslizar um esgar aqui um sorriso ali sugerindo uma posição; outros almoçavam com, pouco inocentemente; outros recebiam indiscretamente cumprimentos. Só alguns desferiam verdadeiras cacetadas. Uns tantos frequentavam lançamentos e cerimónias sentando-se uns ao lado dos outros com um sorriso maroto. Queriam tornar bem clara a sua preferência sem que pudessem ser acusados de a ter explicitado. No meio desse  labirinto de subtilezas e de hipocrisias, pode nem sempre ter sido claro o apoio a Rangel, mas foi sempre evidente a recusa em apoiar Rio.

Marcelo, Balsemão, Cavaco, Moedas, Manuela Ferreira Leite, Passos Coelho, Poiares Maduro, Morais Sarmento, não apoiaram Rio. O chamado aparelho, ao que disseram vozes conhecedoras, também não. Apesar disso, 52,43 % dos votantes nas primárias deram a vitória a Rio.

Os derrotados, sem deixarem de o ser , deixaram contudo uma mensagem devastadoras quanto ao vencedor: Rui Rio não seria um primeiro-ministro desejável. Mas mostraram também que, todos juntos, só foram ouvidos por 47,57 % dos militantes do PSD que votaram. Para tão ilustre equipa é pouco, muito pouco, muitíssimo pouco. No entanto, Rio está desde já condenado a suportar o peso desses 47,57 % e da luzidia plêiade de notáveis que o abandonou. Incontornável!

Como podem os portugueses confiar para os governar em alguém que reúne uma tal unanimidade cética  de tão ilustres figuras tão próximas dele ?  

Por isso, se pode dizer que se há ainda um verdadeiro laranjal com o respetivo perfume ainda ativo , seguramente que se extraviou.

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