O transcendente Rangel e a luz.
O transcendente Rangel acendeu-se como um pirilampo mágico
na alegada escuridão lusitana, tendo começado por transformar num discreto
ribeiro o frondoso rio que afirmava sonhar que ganhou politicamente as eleições
que perdeu.
Antes de se ocupar generosamente de nos salvar a todos, não
sabemos bem de que desgraças, propôs-se estancar sem piedade um espantado
ribeiro. Não o deixando trovejar a sua imaginária vitória autárquica,
confronto-o com uma refrega dramática que teve o país suspenso: as primárias do PSD eram ou não eram
adiadas?
Os conselheiros espremeram rudemente as suas agitadas mentes e deram ao transcendente Rangel um
inesperado presente : não eram! O transcendente transcendeu-se ainda mais e
ganhou um novo suplemento de alma, quando num esforço arqueológico reuniu apoios de velhas glórias de pretéritos desastres governamentais do PSD.
Concedendo subir à varanda da História, deu–nos a chave mágica das glórias futuras que nos oferecia e da fácil planície que nos levaria a percorrer. Desde logo ele prometeu oferecer-nos um elevador social que permitiria aos portugueses submetidos a um excesso de agruras, por uma sociedade desigual e injusta, que subissem na vida rumo à felicidade e ao sucesso.
Os oráculos gregos esfregaram os olhos estremunhados perante a chegada abrupta de um novo colega capaz de inventar tão luminoso futuro. É certo que alguns deles se atreveram a estranhar que um tão forte defensor de um Estado fraco pedisse as rédeas do poder para dar corpo a um desígnio político tão intenso. Rangel acenava glorioso com a promessa de tornar o Estado paralítico para depois correr com ele os cento e dez metros obstáculos ─ um espanto.
Alguns entre os
mais céticos ainda perguntaram: “ Mas não seria melhor pensar um futuro em que
não fosse necessário um elevador social por ninguém precisar de o subir?”
Outros, mais presos a um presente que justamente não suportam, acumulando-se desde já à porta
do prenunciado elevador perguntam em uníssono : “Subimos todos?”
Embalado na ascensão irresistível, o transcendente deu mais um
passo decisivo. Como sinal de robustez
do seu desígnio de subida, anunciou a sua ideia salvífica e decisiva de
oxigenação da esfera pública: logo que lhe fossem dadas as rédeas internas do
poder no PSD, sem mais delongas ele arrastaria os outros partidos na Assembleia
da República para alimentarem atordoadamente o seu desígnio naturalmente
transcendente. Os debates com o Governo deixariam de ser mensais e voltariam
a ser quinzenais. Os politólogos mais
exigentes estremeceram de espanto, perante tão luminosa inovação
político-institucional. A ciência política abriu a sua exigente porta e acolheu
desvanecida este assomo de criatividade: Debates quinzenais!
Esta é a história que conta como o transcendente Rangel se
acendeu como um pirilampo mágico na alegada escuridão lusitana.
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