terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Pensar politicamente os resultados de algumas sondagens


 Pensar politicamente os resultados de algumas sondagens 


1. Esbatido o ruído mediático que acompanhou a sua divulgação e os esforços dos atingidos que procuram sempre afeiçoar os seus resultados ao sabor dos seus interesses, vale a pena olharmos com alguma atenção para os resultados de cinco sondagens difundidas entre 16 de janeiro e 13 de fevereiro. Duas da Universidade Católica, duas da Eurosondagem e uma da Aximage . Quatro foram sondagens que seguiram o modelo habitual, uma foi feita à boca das urnas nas eleições presidenciais. Os resultados desta última mostram uma diferença ligeira relativamente ao conjunto dos outros que refletem pesquisas realizadas antes e depois das eleições presidenciais.

2. Os resultados do PS oscilam entre 39 e 39,9%, no âmbito do grupo das quatro sondagens, descendo para 35%, na sondagem feita à boca das urnas no dia das eleições presidenciais.

Os do PSD, entre 26,2 e 28% no grupo das quatro sondagens , atingindo 28% no dia das presidenciais.

Os do BE, entre 6,5 e 7,2 % nas quatro, chegando a 8% na outra.

O Chega, entre 5,5 e 8% nas quatro, chegando a 9% na outra.

A CDU, entre 4,8 e 5,3% nas quatro, atingindo 6% na outra.

O PAN, entre 2 e 3,5% nas quatro, tendo 2% na outra.

O CDS, entre 0,8 e 2,5% nas quatro, tendo 2% na outra.

A IL, entre 1,3 e 5% nas quatro, tendo chegado aos 7% no dia das presidenciais.

O conjunto das esquerdas oscilou entre 50,8 e 52,1 % nas quatro, tendo tido 50% na outra. As esquerdas não PS oscilaram entre 11,7 e 13%, tendo tido 14% no dia das presidenciais.

O conjunto das direitas oscilou entre 36 e 43% nas quatro, tendo tido 41% na outra. A direita sem o Chega oscilou entre 31,4 e 35%, tendo tido 32% na outra.

Se considerarmos o PAN como sendo o centro, os seus resultados estão acima indicados.

3. Estes números não representam uma antecipação dos resultados das próximas eleições, mas retiram verosimilhança a premonições  e cenários que pressuponham o seu contrário.  Larachas sobre mudanças de ciclo político, alegações de que o governo está destroçado podem exprimir desejos de quem os formula, mas não há verificação objetiva de que sejam uma realidade.

Os portugueses não transformaram a angústia e o sofrimento suscitados pela pandemia numa rejeição do governo. Certamente, não porque entendam que a sua ação não refletiu nunca qualquer erro, mas por verem que procurou sempre fazer o melhor, tendo-o conseguido muitas vezes. Certamente, por perceberem que muito do sofrimento e muitas das dificuldades resultam de ressonâncias  estruturais do atual tipo de sociedade e não de decisões conjunturais deste governo. Elas são seguramente um desafio,  para este e para os próximos governos , mas não são culpa sua.

E não ressalta deste conjunto de sondagens que as oposições tenham visto a sua popularidade explodir, como reflexo de uma apreciação entusiástica do seu hipercriticismo antigovernamental.

 

4. Dos resultados comentados podem extrair-se algumas conclusões.

O PS mostra estabilidade na preferência relativa dos portugueses, mas com reforço da posição alcançada nas últimas eleições legislativas (36,34%).

 O PSD revela estagnação, já que nas eleições de 2019 teve 27,76 %.

O BE mostra alguma retração em face dos resultados de 2019: 9,52%. A CDU mostra uma ligeira flexão, perante os 6,33 %, atingidos em 2019.Em  conjunto ficam abaixo dos 15,85 % que  somaram em 2019.

O CDS perdeu mais de metade dos escassos 4,22 % em que ficou em 2019, colocando-se em risco de sobrevivência.

A IL fica claramente acima dos 1,29% de 2019 e o Chega rondando os 9% distancia-se muito dos 1,29 de 2019, parecendo consolidar os resultados que o seu candidato atingiu nas presidenciais. Desse modo, introduz instabilidade e incerteza na direita portuguesa.

Portanto, se a direita democrática resistir ao oportunismo de uma aliança com o Chega fica confinada a uma oscilação entre 31,3 e 32,7% nas quatro primeiras sondagens, chegando aos 35% na sondagem feita no dia das eleições presidenciais. Se renunciar à sua natureza democrática acolhendo o Chega, oscilará entre os 36,9% e os 43 % nas quatro sondagens, tendo tido 41% no dia das presidenciais.

Parece poder concluir-se que a ultrapassagem do conjunto das esquerdas pela direita não parece provável, mas a ultrapassagem das esquerdas pela direita democrática mostra-se uma hipótese muito remota. Não só à luz das sondagens de 2021, mas também em função da trajetória inerente à sua comparação com os resultados das eleições de 2019. Tanto mais que o período desde então decorrido já foi em grande parte sob a pandemia.

5. A intensa campanha política e mediática contra o governo e o PS não parece ter tido o efeito pretendido pelos seus promotores. A tentativa de transformar o mais pequeno erro do governo numa catástrofe de grandes proporções e de lhe imputar as culpas por todas as dificuldades surgidas no país parece não estar a convencer o povo.

Do mesmo modo, acumulam-se sinais de que assusta menos a continuidade deste governo do que a hipótese de cair sobre nós um governo de direita. Em especial porque começa a enegrecer essa ameaça o risco de um governo de direita não poder deixar de incluir o Chega. É como se o fantasma do 24 de abril nos viesse assombrar meio século depois de nos deixar.

Também parece claro que a crispação antigovernamental dos partidos de esquerda que não estão no governo não se revela um caminho promissor para o seu reforço eleitoral. E embora com menos nitidez parece merecer mais reservas aos seus próprios eleitorados a crispação agressiva  do BE do que a demarcação tribunícia do PCP. No horizonte a ambos assombra  a dificuldade em calibrarem bem a atitude de oposição ao governo. Ou são tão eficazes na crítica ao PS  que colocam a direita no poder, ou são tão inábeis nessa crítica que apenas alteram ligeiramente a relação de forças. Dificuldade acrescida por haver o risco de  a crítica ao ser excessivamente agressiva , em vez de desgastar o destinatário da crítica,  desgastar os seus autores.

Mesmo a direita não está livre de que isso também  lhe aconteça. Na conjuntura atual o trauliteirismo demagógico antigovernamental se passar certos limites pode virar-se contra os seus promotores.


 

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