quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

A incómoda mensagem de uma recente sondagem


Sob o manto diáfano da fantasia
a nudez forte da verdade.

A incómoda mensagem de uma recente sondagem

1. Sem ser uma novidade, o modo como tem sido noticiada a partir da sua fonte (O Observador) a mais recente sondagem por ele divulgada reflecte com clareza todo um programa político, ainda que de certo modo dissimulado.

De facto, noticia como se fosse o espelho fiel da realidade política o contraponto entre o PS , por um lado e  uma alegada “direita junta”, por outro. O PS teria 40,3% e essa alegada “direita junta” teria 41,1 % . A mensagem subliminar é simples: a competição que conta é entre esses dois pólos.

De uma penada, faz-se desaparecer a extrema-direita (neofascista), que assim se branqueia implicitamente; esquece-se a autonomia da direita democrática, evitando-se  que  se mostre reduzida a uns escassos 32,7 % , nos quais o PSD fica  encurralado com os seus 28,5%. Aliás, muito longe do PS; o que também se esquece.

Ao mesmo tempo,  apaga-se da relevância  o centro político (PAN- 2,2%) e as outras esquerdas( 10,8 % [BE 5,5% + CDU 5,3 %]) . Ou seja, os 8,4% do Chega e os 4,2 da direita democrática não-PSD contam, mas os 13% do centro e dessas esquerdas não existem.

2.Uma sondagem não é uma antecipação segura de um futuro resultado, mas a proximidade relativa dos panoramas projectados por cada uma delas reforça a probabilidade de conterem previsões criveis. Destes resultados, se os compararmos com os resultados das eleições legislativas de 2019, ressaltam algumas constatações:

1º A campanha da direita e da extrema-direita, acolitadas por uma boa parte da comunicação social, apesar de uma intensa barragem de propaganda nesse sentido, não têm conseguido transformar o mérito deste governo num fracasso;

2º A direita democrática atinge nesta sondagem uns modestos 32,7%, abaixo dos 33,27 % que conseguiu em 2019.

3º A extrema-direita (neofascistas) subiu de 1,29% para 8,4%.

4º O PS subiu de 36,34 para 40,3%, isto é, cerca de 4%.

5º As esquerdas exteriores ao Governo do PS passaram de 15,88 % em 2019, para 10,8% nesta sondagem. Mas esta descida depende de duas parcelas desiguais: o BE desce 4% e a CDU cai 1%.

5º Se considerarmos o PAN como sendo o centro político, constatamos que perdeu cerca de 1 % (3,32/2,2 %).

Daqui podem tirara-se algumas conclusões.

1ª O tipo de campanha política contra o actual Governo, feita pelos partidos de direita e de extrema-direita, bem como pela matilha mediática que os acompanha, beneficiou principalmente o Chega (+ 7,2%) e apenas ligeiramente a IL (+1,2%) e o PSD ( +0,8%). Nada aproveitou ao CDS (- 2,4%). Globalmente, a soma da direita e da extrema-direita aumentou 6,6 % (de 34,56% para 41,1). Ou seja, só beneficiou significativamente  o Chega.

2ª Não o fez, no entanto, à custa da esquerda no seu todo, a qual desceu apenas  de 52,19% para 51,4 % e continua com uma vantagem superior a 10% em face do outro conjunto antes referido. Mas esta relativa estabilidade não é interiormente homogénea: o PS sobe 4%, o BE desce 4% e a CDU perde 1%. Parece que ser o partido do governo não foi penalizador, mas a demarcação em face do governo dentro da esquerda não entusiasmou os respectivos eleitores. Pode mesmo dizer-se que o modo de distanciamento/oposição, nestes casos, foi quatro vezes mais penalizador para o BE do que para a CDU.

3º Sem os neofascistas do Chega a direita democrática não tem como expectativa realista chegar ao governo proximamente, mas mesmo com o seu concurso está muito longe de poder considerar essa hipótese como provável.

4º Uma colocação em minoria do conjunto das esquerdas em próximas eleições parece improvável, como  também o parece a conquista de uma maioria absoluta pelo PS. Mas o exacerbar do urgentismo antigovernamental e duma hostilidade ao actual governo que possa favorecer a direita podem suscitar uma deslocação de voto favorável ao PS no seio do conjunto das esquerdas. E com base nos resultados desta sondagem parece que este exacerbar da hostilidade ao governo é o único caminho que pode tornar provável uma maioria absoluta do PS.

Principais conclusões finais a retirar :

I-                 As campanhas feitas a partir das várias direitas e da extrema-direita têm beneficiado o Chega, de pouco tendo aproveitado aos partidos da direita democrática  e não tendo afectado negativamente  o PS.

II-              A via seguida pelo BE a partir da votação do orçamento, parecendo levá-lo a combater o governo, tem-se virado afinal contra ele próprio.

 


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