segunda-feira, 15 de agosto de 2011

POR UMA OUTRA EUROPA

Vou dar mais um passo na divulgação, ontem prosseguida, do Manifesto para uma Renovação Socialista . Hoje, vou transcrever a parte do Manifesto que se ocupa da Europa. De facto, cada dia que passa sublinha a profundidade da crise que a União Europeia atravessa, tornando ainda mais claro que nem os habituais discursos redondamente apologéticos, embrulhados cada vez mais ridiculamente num vulgata neoliberal, ostensivamente tonta, nem as declarações tremendistas e apocalipticamente anti-europeias, têm grande utilidade. Quem tiver a ilusão de que bastam ligeiros ajustamentos e uma sangria um pouco mais funda do mundo do trabalho, para se trazer à Europa um futuro, está possuído por uma ilusão nefasta. Quem se reconhecer como o luminoso e providencial salvador que nos mostrará num relãmpago de génio o caminho a seguir, apenas se estará a imaginar como excesso de oráculo. Precisamos de ideias: ousadas certamente, realistas sob pena de infecundidade, cientes de que são talvez imperfeitas para comportarem diálogo. As organizações que integram o PSE, não carregando sozinhas este fardo, estão no centro da tempestade, quer queiram quer não.


Tal como ficou dito nos comentários anteriores:"Quem desejar conhecer o texto integral do documento e a lista dos seus subscritores iniciais, pode clicar sobre a imagem que se situa na coluna lateral deste mesmo blog, já que desse modo poderá aceder ao blog do próprio Manifesto. Quem, sendo militante do PS, quiser subscrever o Manifesto, basta deixar nesse outro blog um comentário em que afirme a vontade de ser um dos subscritores, o nº de militante e o concelho a que pertence". Eis o excerto hoje transcrito:

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3. Um novo fôlego para a União Europeia


3.1. O futuro de Portugal depende muito do destino da União Europeia. Ora, a Europa atravessa hoje uma grave crise, sem cuja superação se arrisca a condenar-se a si própria a uma longa estagnação ou a um possível colapso.
De facto, os europeus podem ver declinar a sua relevância no mundo, se não reverterem a deriva para onde se deixaram arrastar. Especialmente grave como factor dessa crise é o esquecimento de si próprios de que parecem padecer os socialistas europeus.
Paralelamente, o paradigma capitalista dominante, na sua versão neoliberal, atravessa uma lenta agonia, que tem que ser pilotada e apressada, para que não arraste consigo toda a sociedade.
Mas a História não nos vai oferecer um futuro melhor, dispensando-nos das lutas e do risco. E não está escrito que a Europa se vai forçosamente integrar no futuro da humanidade como esperança em movimento e não como museu de um tempo perdido.
3.2. Para compreendermos a época que atravessamos temos que ter bem presente que o pós-capitalismo é uma inevitabilidade objectiva, que pode desembocar nos dramáticos escombros de uma regressão civilizacional, mas que também podemos conseguir que reflicta a sinergia virtuosa de todos os ideais emancipatórios e solidários até hoje existentes.
Cabe aos socialistas não desistirem de um pós-capitalismo que reflicta os sonhos milenares de emancipação e liberdade de que o socialismo aspira ser a realização e o episódio supremo. Mas se os partidos da Internacional Socialista na Europa não forem capazes de assumir o protagonismo hegemónico desse processo, podem torná-lo irrealizável.
3.3. De facto, a União Europeia, no essencial, tem vindo a ser construída através de um compromisso entre Estados, sendo agora necessário valorizar a participação dos cidadãos. E é aí que se enquadra um envolvimento dos partidos políticos que implique, pelo menos, um compromisso entre o Partido Socialista Europeu, por um lado, e o Partido Popular Europeu, por outro. Um compromisso que deverá no futuro estender-se a outras famílias políticas europeia. É neste sentido, que se deve falar num novo compromisso histórico para a Europa.
3.4. Para isso, é preciso reconhecer que até agora, no essencial, a União Europeia tem sido fiel ao paradigma neoliberal. E assim o Partido Popular Europeu tem jogado em casa, enquanto o Partido Socialista Europeu se tem deixado condicionar, por uma ideologia alheia.
A Europa não tem sido realmente fruto de uma convergência, entre essas duas grandes áreas políticas, já que apenas uma delas tem conseguido reflectir a sua identidade no rumo europeu. A área socialista, quando muito, apenas tem travado o fundamentalismo da lógica dominante, mas sem a influência suficiente para evitar a deriva suicidária em curso.
3.5. Este é o equívoco político que inquina a actual fase da vida da União Europeia e uma das causas do enfraquecimento eleitoral e político dos partidos que integram o Partido Socialista Europeu (PSE).
De facto, a deriva neoliberal tem vindo a gerar uma insatisfação crescente nos cidadãos europeus mais penalizados pelo agravamento das desigualdades sociais, rumo a uma dramatização da crise da União Europeia. Mas é ilusório pensar-se que os cidadãos europeus estarão, indefinidamente, dispostos a abdicar dos seus direitos, para salvaguarda dos privilégios de grupos sociais minoritários, que são movidos por uma sofreguidão de lucro socialmente suicida. Cada vez é menos convincente a ideia de que é de interesse público o enriquecimento ilimitado dos detentores do capital. Enriquecimento esse que a redução da economia a uma ideologia paroxística do lucro, sob a égide, mais ou menos desregulada, da especulação financeira, tem feito tudo para incentivar.
3.6. Ora, as principais vítimas do predomínio neoliberal na construção europeia integram a base social e o eleitorado dos partidos socialistas europeus, que não têm sido capazes de escapar a esse paradigma, potenciando assim o risco de uma ruptura com essa sua base. Por isso, estando embora a União Europeia hegemonizada pelo Partido Popular Europeu, o epicentro da sua crise actual está no Partido Socialista Europeu, cujos ramos nacionais correm um risco crescente de dramático definhamento. Ora, se isso acontecer, fica sem expressão institucional o descontentamento dos grupos sociais estruturalmente excluídos, abrindo-se a porta ao caos das pulsões dissipativas de desespero e revolta.
O Partido Popular Europeu passaria a ser o único responsável pela vertente institucional da instância política, no seio da União Europeia. Os conflitos sociais, provavelmente, sairiam ainda mais do terreno democrático institucional, transferindo-se por completo para as ruas. Seria o bloqueamento duradouro do processo europeu, com risco de implosão.
3.7. A União Europeia tem pela frente problemas difíceis. A sua actual estagnação e a crise que atravessa são sinais de um impasse estrutural que só pode ser enfrentado com êxito através de medidas com densidade política e relevância estruturante como é o caso do novo compromisso histórico proposto.
Nessa medida, é imprescindível que a posição dos socialistas incorpore, pelo menos:
3.7.1. Uma visão pós-capitalista do futuro que não encare o capitalismo como o fim da história, nem como uma segunda natureza das sociedades modernas.
3.7.2. Uma ambição de hegemonia no pós-capitalismo, com base num horizonte socialista, encarado como um projecto aberto, democrático e plural.
3.7.3. Uma atitude reformista dinâmica, traduzida em reformas parcelares dirigidas a uma subsequente transformação completa da sociedade.
3.7.4. A valorização das instituições democráticas representativas, perante as quais todos os outros poderes se têm que subalternizar.
3.7.5. A promoção da qualidade democrática de todas as instituições, colocando no centro dela o aprofundamento democrático do processo europeu.
3.7.6. Uma nova centralidade das dinâmicas endógenas do tecido social, nomeadamente, da economia social e solidária.
3.7.7.Uma perspectiva racionalista que tudo submeta a uma permanente crítica.

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