segunda-feira, 14 de março de 2011

GREVES, EMPRESÀRIOS E OUTRAS COISAS


Dizem que é uma espécie de greve. Estranha. Uma das três reivindicações dos alegados grevistas é a reforma da legislação laboral num sentido desfavorável aos trabalhadores, segundo afirma um dos sindicatos dos trabalhadores de transportes.

Sindicato esse que sublinha o facto de se não estar perante uma greve dos camionistas - trabalhadores, mas dos empresários de camionagem-patrões. Entre os manifestantes vários são identificados como empresários, confirmando esse sublinhado. As negociações falhadas foram entre associações empresariais e governo.

Não estamos, portanto, perante greve nenhuma , mas perante um "lock-out", que em Portugal é expressamente proibido pela Constituição. Não há pois quaisquer piquetes de greve, legalmente protegidos e regulados. Há apenas grupos de pressão organizados, actuando á margem da legalidade democrática. Não acho mal que, mesmo não se estando perante o exercício de um direito de greve, se tratem os protestos sem violência. Mas não acho que se possam deixar desprotegidos todos os que não se submetam ao "lock-out", nem que se leve a transigência tão longe que possa ser posto em causa o interesse público.

E, principalmente, não esqueçamos protestos de camionistas noutros tempos, noutros países. por exemplo, no Chile de Allende, quando ajudaram a abrir caminho a Pinochet. Admito até que muitos não o tivessem feito desejando o resultado, mas a verdade é que o resultado ocorreu e durante toda o tempo da ditadura de Pinochet nunca mais houve protestos de camionistas. Nem de camionistas nem de ninguém. Pelo menos, protestos que não fossem brutalmente reprimidos.

Devo, no entanto, dizer que acho mais compreensível que quem protesta se revista da qualidade imaginária de grevista, do que a tacanhez dos jornalistas que papagueiam um palavreado estereotipado dos acontecimentos como se estivessemos perante uma autêntica greve.

Aliás, um tanto à margem destes acontecimentos, mas a partir deles, há algum tempo que me parece que tem que haver uma mudança de fundo, no modo como são encarados pela ordem jurídica os pequenos empresários, que muitas vezes são realmente trabalhadores ao serviço de grandes patrões. Simplesmente, em vez de serem encarados e protegidos como tais, são erguidos à digníssima qualidade de empresários para poderem ser desprotegidamente explorados pelos empresários graúdos. Neste, como em muitos outros casos, no campo da luta politico-ideológica quem se engana de adversário é muitas vezes levado a combater-se a si próprio.

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