sexta-feira, 17 de maio de 2013

CAPITALISMO. SELVAGEM ?


1. Alguns dos que estendiam as suas ideias como um dócil tapete sobre o qual desfilava impante de soberba o capitalismo, assustados pelas malfeitorias, dia a dia mais insuportáveis, perpetradas por esse sistema, titubeiam agora umas vagas diatribes contra o capitalismo selvagem. Na junção suave deste adjectivo, inscreve-se todo um programa de rendição ideológica. Há nesta palavra  tão simples o eco implacável de toda uma paspalhice intelectual. É como se dissessem: detesto os lobos selvagens. Ou dito de outra maneira: amo os lobos que não são selvagens.Ora, de facto, os lobos só são lobos porque são selvagens. Se o não fossem, não eram lobos. 

Paralelamente,o capitalismo, pelo facto de o ser, é necessariamente selvagem. É a sua impessoalidade essencial que o torna um predador de pessoas. A sua força implica necessariamente uma impossibilidade estrutural de ter em conta o sofrimento, a dor e a infelicidade das pessoas. A sua lógica mais funda nada tem a ver com a justiça. Ele é a fonte suprema da desigualdade social, alimenta-se dela, vive da sua perpetuação. É uma coisificação (ou uma abstracção ) do trabalho morto, apostada em escravizar o trabalho (dos) vivo(s).

Por isso, não faz sentido empreender-se uma saída do capitalismo selvagem, se esse caminho não nos levar também para fora do próprio capitalismo. Pode sair-se do capitalismo no seu todo, mas não se pode esconjurar apenas a sua alegada selvajaria, sem o pôr em causa na sua totalidade.

2. O capital ao serviço das pessoas, nunca mais as pessoas ao serviço do capital. É um objectivo simples, compreensível, eticamente legítimo, amigo da liberdade e gerador de igualdade. É um objectivo justo, o único objectivo verdadeiramente justo.Muitas práticas e organizações são, já hoje, um pouco por todo o mundo, guiadas por essa lógica de emancipação e de esperança. É ainda preciso imaginar muito, mas já não é preciso inventar tudo. Sair equilibrada e gradualmente do capitalismo é possível e necessário. Urgente. Procurar escapar apenas a uma hipotética vertente selvagem do capitalismo é correr sem sair do mesmo sítio.

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