quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O AVESSO DAS ESQUERDAS


As direitas, às vezes quando lhes é útil e sempre quando lhes é indispensável, lá se vão entendendo.


As esquerdas, sempre de olho vivo, vigiando-se umas às outras com extrema eficácia, raramente se entendem, a não ser sobre bagatelas. Por uma lado, a que se reconhece na Internacional Socialista, pelo outro, as que se reconhecem nas sombras do sovietismo desaparecido e no pós-esquerdismo, vão-se combatendo animadas por excelentes razões e por motivos que todos compreendem. Se forem perguntadas não se confessam inimigas, mas não resistem a apontar as enormes mazelas da outra parte.


Pode não parecer, mas se olharmos com atenção, todas elas ainda estão afinal possuídas pelo espírito da velha máxima estalinista, nos primórdios da ascensão de Hitler: " Enterrar o nazismo sobre o cadáver da social-democracia". Como sabemos, a história não foi meiga: enterrou socialistas e comunistas no mesmo buraco, e foram precisos milhões de mortos para a Europa voltar a ser normal.


Hoje, parece que as várias esquerdas estão ainda hipnotizadas pela velha máxima estalinista . Cada uma quer vencer a outra, ao mesmo tempo que derrota a direita. Mas a realidade é teimosa, a relação de forças não se altera por magia de um dia para o outro.


Enquanto as coisas continuarem assim, as direitas podem dormir tranquilas no governo ou na oposição. As esquerdas velarão ciosamente as suas verdades parcelares, evitando metodicamente ganharem a força que naturalmente teriam, se não estivessem ocupadas em continuar a guerra civil histórica de que não conseguem fugir.


E infelizmente, falando de Portugal, não estou só a falar de Portugal.

12 comentários:

Anónimo disse...

concordo, sem qualquer ironia.
o PS que volte a ser de esquerda e depois sim, poderá (deverá) cobrar aos dogmáticos inflexíveis os serviços mínimos unitários. até lá, nem pensar... rectaguarda por rectaguarda, mais vale a antiga vanguarda ( algo que o PS nunca foi). é igualmente inútil, claro, mas tem muito mais piada e, em tempos de traição ideológica e crise consentida, resta-nos talvez a ousadia de um sorriso selvagem ( pequena revolta, indignação, recusa, etc... )

cumprimentos,

rui ribeiro

b m disse...

No essencial, não posso estar mais de acordo contigo e também com o comentário de Rui Ribeiro.
Mas já agora,com ironia..., uma pequena interpelação :
Rui, onde se situa a tua corrente de opinião,"Esquerda socialista" ?
Na Internacional Socialista ou no Pós Esquerdismo !?...
Eu próprio, aliás, venho por forma reiterada equacionando no m/ blog e no facebook esta questão.
Ainda aqui há tempos dizia, o que ora renovo: " APRENDAM COM A DIREITA !". E não me referia a bagatelas.

Um forte e saudoso abraço.
( bento )

luismarinho disse...

Traiçaõ, vanguarda e outras palavras do género são léxico revivalista de uma "esquerda"cadavérica que continua a poluir a política, servindo todas as direitas no combate histórico contra a esquerda democrática.Estes senhores não aprendem nem esqueçem nada...

horta pinto disse...

Como podem as esquerdas entender-se se as esquerdas dos "dogmáticos inflexíveis" começam logo à partida por considerar que o PS não é de esquerda,como se vê pelo comentário de Rui Ribeiro?
Assim não há sequer margem para começo de conversa, quanto mais para entendimento.

JGama disse...

Nos momentos da vida política portuguesa em que que se esperaria alguma atitude relacional e negocial entre os partidos de esquerda verificamos sempre um comportamento muito peculiar dos sacerdotes dos blocos PC e BE: abrem o catecismo, purificam-se com as palavras santas e apresentam-se perante Deus como os mais puros, renovando todos os propósitos de afastamento porque o demónio está com os outros.

Só vejo uma razão para que isto aconteça: preferem o sossego e a vantagem de manterem vivo o seu público político, mais fácil de conservar pelo simples exercício de oposição, do que a possível vantagem política para Portugal de poderem participar num caminho diferente de afirmação dos valores da esquerda e de construção de um programa consistente e duradouro que contribuisse para uma sociedade mais justa.
Se não houver bom senso corremos o risco de nos encontrar no funeral uns dos outros

aminhapele disse...

Uma tentativa de comentário que,duvido,tenha talento para expressar.
Só conheço esquerda e direita.
As esquerdas e as direitas serão "desenvolvimentos" de raciocínio para emplumar pavões.
Em tempos,para ser de esquerda tinha que se ter um papel "selado" pelo selo branco de toda a esquerda.
E acotovelavam-se,na fila,os candidatos a naturalizados de esquerda:maoistas,trotsquistas,anarquistas,do eixo de Moscovo,do eixo de Pequim,do eixinho da Albânia e,até,do eixo de Belgrado.
O selo branco,o autêntico,de Moscovo,carimbava ou não os papeis do candidato.
Assim se obtinha o "certificado" de esquerda.Um mestrado,uma licenciatura,um doutoramento que a muitos serviu.
Com o desenvolvimento da democracia e a liberdade inerente,desapareceu o selo branco e passaram a existir vários carimbos de esquerda.
Com essa "traficância" foram desaparecendo os valores.Os nomes dos partidos existentes são enganadores
Será que o PS é socialista?!
Será que o PSD é social-democrata?!
E se,como parece o caso,o chefe de cada gangue definir quem é de esquerda?ou quem é do arco do poder?ou quem é da oposição,mas de esquerda?
Parece-me uma deriva demasiado complicada para ter uma resposta.
Espero que não levem a mal um desabafo de quem não se reconhece nesta "esquerda" regulamentada pela direita.
Deixem-nos sonhar.
Deixem-nos a utopia.
Deixem-nos viver.

Anónimo disse...

se me permitem, já que fui 'interpelado':

caro b m: prefiro pensar e viver a política a partir de 'realidades' que geram discurso do que situar-me (sitiar-me) em 'correntes de opinião'. se calhar isto parece um chavão, não sei dizê-lo de outra forma.

caro luís marinho: concordo com a esquerda cadavérica. foi isso que eu disse. mas pelo menos é um 'cadavre exquis'...

caro horta pinto: claro que este PS não é de esquerda. quem sabe um dia...

cumprimentos, obrigado

rui ribeiro

Rui Namorado disse...

1. Rui Ribeiro é uma ilustração da esterilidade política: aparentemente feroz no discruso e inócuo na prática. Mais: conveniente aos protagonistas e beneficiários do que ele mais intransigentemente julga combater.

2. O Bento Machado, bem no fundo, sabe que o que eu digo é razoável,mesmo que de efectivação difícil, mas emocionalmente não se sente em condições de me poder dar razão.É mais simples imaginar-se a cortar a direito numa ficção de autenticidade do que arriscar-se nos labirintos traiçoeiros de uma realidade complexa.

3. E, para além de tudo isso, há uma grande disseminação de uma tendência um tanto ridícula [fruto provável de um largo desconhecimento da história do movimento operário e do socialismo], de distribuir certificados implícitos de autenticidade e de pureza ideológica, como se as esquerdas fossem peças de uma imaginária igreja e os "socialistómetros" os seus sacerdotes.

4. Uns e outros mostram afinal uma das razões pela qual as esquerdas não se conseguem concertar entre si: sectarismo, intransigência perante a diferença, incapacidade para compreender o outro.

5. Na verdade, se qualquer das partes imaginar que, para entrar num processo de concertação, a outra tem que passar a parecer-se com ela, é porque ao fim e ao cabo não pretende procurar um acordo, mas obter uma rendição.

E quando essa atitude é tomada por quem pertença ao lado que até concita politicamente menos apoios, já nem estamos perante uma pesporrência de quem não entende os limites da sua predominância, mas perante uma pulsão suicidária de quem não compreende o ónus da sua subalternidade.

Mas isso talvez nada lhes importe , inebriados que estão pela suprema certeza de terem toda a razão,ungidos pela convicção profunda de uma posse exclusiva da verdade total.

Enfim, imaginários "papas" de uma infalibilidade que já quase só eles reconhecem, mas que a renegada História se entretem a desmentir.

Anónimo disse...

caro rui namorado,

que me considere 'feroz no discurso' é lá consigo. há sempre quem se assuste com pouco, e já se viu que hoje em dia tudo mete medo ao Partido 'Socialista'. é já a herança só-cretinista, 'avant la chute'. um mal nunca vem só, e atrás de um líder vem todo um aparelho...

agora, 'inócuo na prática' é que me deixa um pouco perplexo. você nem sequer me conhece!

eu percebo as angústias actuais de alguns socialistas do PS. não é fácil, eu sei, recalcar tanta vergonha e mal estar.

ainda assim, cumprimentos, aqui da facção estéril da política...

rui ribeiro

Rui Namorado disse...

Realmente não o conheço.Nem isso interessa num comentário ao seu discurso.É a ele que me refiro, pressupondo que o que diz reflecte o que faz.

De facto, se não é inócuo na sua prática, o seu discurso combate a sua prática.

Mas não deixa de ser sintomática a tentação de começar a resvalar para o insulto:lá vem a "herança só-cretinista"; lá vem a referência a "recalcar vergonha".

Enfim, é a clássica empáfia dos "dadores" de lições que se têm a si próprios sempre na "melhor" conta, atirando aos que não pensam como eles o fogo das suas diatribes. Mas como só precisa de insultar quem não está seguro da sua razão, tudo acaba por se ajustar.

Mas há sempre uma esperança: o diálogo, mesmo ríspido, talvez acabe por habituá-lo a ponderar as razões dos outros.

24 de Outubro de 2010 03:08

Anónimo disse...

o rui namorado aconselha diálogo, mas esquece que tudo isto começou com um comentário meu onde reconhecia a justeza dos seus argumentos. só depois, quando introduzi os meus próprios argumentos, é que começou a 'esterilidade'... quanto a 'dadores de lições' estamos conversados.
se calhar deveria mesmo reler essse meu primeiro comentário e tentar encontrar qualquer insulto a quem quer que seja. eu só disse que o PS não pode, neste momento, dar lições de moral à esquerda. o PS de sócrates, teixeira dos santos, valter lemos, pina moura (que acaba de defender a entrado do FMI...). o PS da vergonha da privatização escondida da saúde, da educação, do ataque aos mais pobres, do BPN, da Mota-Engil, da Parque Escolar, das 'engenharias', das Novas Oportunidades, do ataque social aos desempregados, do cartão de cidadão para bébés...

basta, basta.

cumprimentos,

Rui Namorado disse...

1. Basta ler este blog para se ver que não sou seguidista no que concerne às posições dominantes do PS.

2. As palavras de Rui Ribeiro estão ancoradas numa hostilidade global e irrestrita em face do PS que é o pano de fundo das posições das outras esquerdas.

3.Pôr o acento tónico no seu absoluto acerto e no absoluto erro do PS, pode ser certo ou errado,mas seguramente não terá qualquer efeito prático relevante em prol de uma necessário conjugação de esforços.

3. Como resulta do que acima disse tenho repetidas diverg~encias de opinião em face das direcções os Partidos da Internacional Socialista.

Mas essa crítica por certeira que possa ser não destrói o facto desta linha pol´tica não ter no seu passivo os equívocos históricos traduzidos nos modelos soviético ou chinês.

Se o PS não é socialista? Será os que ainda têm saudades da União Soviética o são? E os que se reconhecem no actual modelo chinês?

Desconfiemos de um rigor tão rigoroso que leve a considerar que quase ninguém é afinal socialista. De facto, podemos esperar lutar realmente pelo socialismo com base em tão raros socialistas?

No limite cada um de nós pode pensar, com sinceridade, que é o único verdadeiro socialista, o único miitantes autenticamente de esquerda. Mesmo que essa sinceridade fosse a imagem pura da verdade, seria possível algum tipo de acção a partir dela ?