terça-feira, 7 de setembro de 2010

Calinadas 5 - Terras do Demo



Foi ontem, cerca das 13 horas, que os meus ouvidos se arrepiaram. Na Antena 1, uma eloquente jornalista narrava as transcendentes novidades que o nosso previsível Presidente da República espalhava oficialmente por terras de Sernancelhe. O eminente político falava de castanhas. Exaltava-lhes o sabor, ousando mesmo considerá-las, num assomo de objectividade verificada, como as melhores do mundo. Tão rasgado discurso teria sido suficiente, para uma jornalista comum. Mas perante nós estava uma daquelas vocações pedagógicas que nunca deixa de aproveitar cada oportunidade para nos oferecer generosamente, quais raras iguarias, os artefactos demonstrativos da sua vasta erudição.


E para ela, terras de Sernancelhe estava longe de ser suficiente. Numa compulsão erudita ela tinha que dizer algo de mais profundo. E disse: "terras do demo". O Sr. Presidente estava na região a que Aquilino Ribeiro chamara simbolicamente "terras do demo". Estou certo que Aquilino não se terá incomodado com a mistura: estávamos, apesar de tudo, perante um Presidente da República.


Mas a sábia jornalista não conseguiu ficar-se por aí. Ela tinha que ir ainda mais longe, revelando-nos a obra onde mestre Aquilino usara a preciosa expressão. E foi o que aconteceu: a senhora jornalista informou-nos então, solenemente, que Aquilino Ribeiro usou a expressão "terras do demo" na sua conhecida obra, "Viagens na Minha Terra". Isso mesmo. E, nesse momento, a jornalista foi enorme...


Foi por isso que, no recatado Olimpo dos escritores, onde os nossos mestres falam, despreocupadamente, entre si e com a eternidade, Almeida Garrett e Aquilino Ribeiro, riram. Mas riram, desbragadamente.

2 comentários:

aminhapele disse...

Numa coisa o homem é capaz de ter razão:na qualidade das castanhas de Sernancelhe.

andrepereira disse...

A jornalista lá vai em viagens pela nossa terra revelando a sua lastimável ignorância. Com comunicação social assim, até a primeira dama parece uma intelectual de primeira água. Ui... que usei a palavra tabu... a palavra malvada... a maior crítica que se pode fazer a um português: intelectual...