domingo, 21 de outubro de 2007

A UE, a Turquia e a Sérvia : ora gato, ora tigre.





Se a chamada "comunidade internacional" tratasse a Turquia como tem tratado a Sérvia no Kosovo, as suas tropas estariam a ocupar o Curdistão turco, e uma "comissão de não se sabe bem o quê" estaria a estudar a maneira de fazer engolir à Turquia a independência do Curdistão.

Mas a Sérvia é fraca e a Turquia é forte. Por isso, a " comunidade internacional" (e com uma voz muito especial dentro dela a União Europeia) ruge como um corajoso tigre frente à Sérvia e ronrona como um pobre gatinho perante a Turquia.

Se a União Europeia quer realmente ter um peso maior na arena política internacional, antes de inventar um Ministro dos Estrangeiros de âmbito europeu, que se passeia a sorrir por metade do mundo, ou de brincar às guerras contra inimigos imaginados, tem de começar por se impor como uma potencia moral que actua com justiça, em face do que lhe é exterior, usando contra os fracos, apenas a força que saiba ter, para agir contra os fortes.

Assim, se contra a Turquia só tiver possibilidades de usar sanções simbólicas, políticas ou económicas, não poderá ir mais longe do que isso contra a Sérvia. Se contra a Sérvia usar a força militar, usa-a também conta a Turquia. O problema está no facto de já a ter usado contra a Sérvia, sendo incapaz de a usar conta a Turquia...

Uma coisa é certa, no entanto, será um escândalo político imenso, uma vergonha sem tamanho no plano ético, se impuser à Sérvia a independência do Kosovo e não impuser à Turquia a independência do Curdistão.

Se assim não for, fica claro que todas as encenações internacionais em torno da igualdade entre os povos, dos direitos humanos, da democracia e da justiça nas relações internacionais, são afinal um retórica hipócrita que apenas oculta o jogo da pura relação de forças. E para esconder esta ocultação , nada melhor do que obrigar os fracos aos rituais das virtudes, que a coligação dos fortes decida que são conjunturalmente adequadas.

Mas se isto já é, em si, degradante, dado o destaque que UE ocupa nesse eufemismo pairante que é a "comunidade internacional", pior o será quando a UE se perfila como espaço político onde pode vir a ser acolhida esta Turquia.

Ora, se a UE quer na verdade ser olhada com respeito pelos povos do mundo e ter a reputação de uma comunidade de pessoas de bem, tem de praticar realmente o que declara ser a sua matriz identificadora. E, por isso, no mínimo, deve desde já tornar claro que com um Estado que se comporta como a Turquia em face dos curdos não há negociações de adesão.

E é bom não esquecer que a "comunidade internacional" tem uma dívida de quase cem anos para com os curdos : o compromisso não cumprido da sua independência. Há vários países que poderiam não gostar ? Certamente, mas o povo curdo gostaria de certeza.

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