terça-feira, 9 de outubro de 2007

A flexigurança - um animal coxo ?




A flexigurança é uma estratégia destinada a difundir na Europa um tipo de acordo sócio-laboral que obteve os seus resultados mais emblemáticos na Dinamarca, procurando equilibrar negocialmente vantagens e desvantagens de trabalhadores e patrões.
Mas, mesmo aí, ela não deixou de enfrentar vozes críticas, quer pela dificuldade em abranger os trabalhadores imigrantes, quer por haver algum cepticismo quanto às suas virtualidades, no médio prazo. Deve também dar que pensar o facto de o Partido, que se tem vangloriado de ser o seu principal responsável, não ter voltado a ganhar as eleições. Para além de ser discutível se com uma outra dimensão, com uma outra localização, era possível ter êxito em tão difícil caminho.

Corre, em Portugal, uma estranha operação de propaganda a favor da flexigurança. Por isso mesmo, é importante apurar se as duas metades da flexigurança são da mesma natureza ? Ou seja, se pode ser posta a hipótese de integrarem uma mesma decisão política, um único pacote legislativo? Parece-me que não.

De facto, enquanto a precarização do vínculo laboral e a flexibilização, sempre que isso represente uma vantagem para os patrões, são facilmente implantáveis. As garantias aos trabalhadores, apresentadas como contrapartidas,radicam-se no nível cultural de patrões e trabalhadores, na qualidade do sistema educativo de cada país, na existência de uma tradição negocial sólida, num Estado cujos compromissos sejam críveis.

Ou seja, a parte da flexigurança desfavorável aos trabalhadores pode resultar de uma decisão do poder político com efeitos palpáveis que podem ser imediatos. A parte favorável aos trabalhadores implica processos sociais prolongados, dependendo muito do nível de desenvolvimento do país e da continuidade de uma vontade política por parte dos poderes públicos que aposte na flexigurança. Ou seja, implica uma conjugação de factores relativamente ampla e da sua implantação duradoura num terreno social historicamente preparado para isso.

Logo, para se poder colocar hoje com honestidade política o problema da flexisegurança em Portugal, tem que se fazer com que, primeiro, o país atinja um patamar de desenvolvimento cultural, educativo e social, onde possa radicar-se uma rede de protecção efectiva aos trabalhadores que venham a ser atingidos pelas sequelas da flexibilidade. Nestes termos, qualquer estratégia assente na ilusão de que a flexibilidade e a segurança se decretam por medidas simétricas é uma pura mistificação.
E se nem sequer houver disposição para tomar algumas medidas que realmente favoreçam os trabalhadores, como contrapartida do que a flexibilidade lhes retira, ou se a flexigurança não depender de um prévio acordo social, entra-se no terreno da pura provocação.

De facto, não pode esquecer-se, se fosse um animal, a flexigurança era um animal coxo.

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