segunda-feira, 29 de maio de 2023

“VEXATÓRIA”

 

“VEXATÓRIA”

Ontem,  [ no face book]talvez me tenha enganado, quando considerei um dislate a qualificação como “vexatória” que usou  Mariana Mortágua para se referir à actual maioria absoluta do PS. Como se ela fosse algo de pernicioso que se tinha que combater como uma quase assombração pecaminosa inventada por mentes perversas.

Talvez me tenha enganado. Se calhar a inquieta dirigente do BE estava a afinal a libertar discretamente no seu discurso uma sugestão de autocrítica. A maioria absoluta do PS é sentida como “vexatória” não por qualquer força maléfica que tragicamente a inquine, mas simplesmente por ela lembrar  ao BE o tropeção estratégica em que caiu ; o qual lhe anemiou o  grupo parlamentar, reduzindo-o em 14 deputados e tendo sobrado menos de meia d+uzia.

Foram, na verdade “vexatórias “ as consequências do tropeção táctico do BE, gerador da maioria absoluta do PS É certo que continua preso ao ritual da sua própria infalibilidade política. Mas começam já a perturbá-lo as sombras de uma autocrítica…

Terá sido afinal isso?

domingo, 21 de maio de 2023

Regresso pardo do fantasma de Boliqueime

 

Regresso pardo do fantasma de Boliqueime

O fantasma de Boliqueime voltou, espumando  uma raiva fria. O seu rosto foi assolado por um ódio pardo, quase desregrado.

Na plateia laranja e chique pairava um cheiro acre  a  cavaquistão.  Montenegro, titubeante mas deleitado, hesitava em convencer-se que estava a ser auxiliado pelo mago algarvio.

Houve então um conselho de urbanidade no debate político. Mas o conselho  sentiu-se perdido no discurso do mestre. “O que é isto?” perguntou  assarapantado. “Que moleza é esta?” quase se indignou.

No entanto, foi o  próprio mago que lhe respondeu, fazendo-o perceber que a alegada urbanidade era apenas um voto pied0so e descartável. E, para que tudo voltasse ao normal, ele próprio mostrou como realmente devia ser a cartilha do PSD: explodiu num discurso de desbragado ódio ao PS, ao seu Governo, a António Costa. Sem nuances, sem reservas, sem excepções ─ um oráculo em fúria.

Um contraponto: o PS e os seus Governos foram e são o mal absoluto; o PSD e os seus governos foram e garantem vir a ser o bem supremo. Equilíbrio, imparcialidade e tolerância; forte sentido do ridículo…

Não hesitando em proclamar-se arcanjo do seu próprio céu,  e em beatificar a memória de Durão, quebrando o seu compromisso com os Portugueses após servir umas bicas aos senhores do mundo que vieram a uma terra portuguesa fazer a  dança da guerra; Santana dissipando-se; e Passos na glória de querer ser pior que a “troika”.

Quanto ao PS, fulminou-o com um resumo das larachas rasteiras da propaganda da direita, disparando-se  num festival de diatribes, com que admoestou severamente o povo português, censurando-o indirectamente por lhe ter dado os seus votos há pouco mais de um ano. De facto, o descavacado  povo apesar de décadas de experiências  de convivência com os “diabos cor de rosa” deu a um seu Governo um suporte maioritário que o pôs a coberto de surpresas e traições parlamentares.

Na verdade, a democracia tem muito que penar até chegar aos calcanhares da filosofia política iluminada do mago algarvio. Realmente votar é um desporto ocioso; melhor seria pedir ao Senhor de Boliqueime a lista dos ministros e um programa de governo e deixarmo-nos conduzir inebriados para o paraíso caváquico. Lá CHEGARÃO: ( julgam eles!).

Por mim, permito-me um sorriso final: forte da sua consabida cultura poética, para deixar respirar um pouco a sua prosa cinzenta, não conseguiu recorrer a outro exemplo que não fosse uma leve e tosca evocação  de Sofia, uma grande voz da poesia portuguesa que no seu tempo se sentou na bancada parlamentar do PS. 

Embora espantadas, as musas sorriram. Mesmo na poesia, o comité laranja  dos arcanjos prosaicos tem de se socorrer da tribo rosada  dos sonhadores.

 

 

sexta-feira, 5 de maio de 2023

INDIGESTÃO…

 

INDIGESTÃO…

Julgavam talvez que o PS ia ser cozinhado em lume brando.

 Sabe-se agora que não vai ser assim. Pensavam talvez que tudo se resumia  a  insultar o governo, a  insultar o PS ,a insultar os socialistas, esperando-os civilizados e previsíveis na resposta, conformados no debate, mansos nas polémicas.  Vai ser um pouco mais duro.

Vão  ter a maçada de combater, de arriscar. Podem talvez fazer-nos morder o pó. Mas não são favas contadas.

Sabem agora que não vão poder  passear-se  prazenteiramente sobre as nossas dificuldades.

Aprendam : há sempre o risco de, ao fim ao cabo, o  povo socialista ser um osso duro de roer.

segunda-feira, 1 de maio de 2023

DEMOCRACIA. E da boa!!!

 

DEMOCRACIA. E da boa!!!

 

O Sr. jornalista Magalhães, um sujeito calvo de meia idade, percuciente crítico de tudo o que, ainda que ligeiramente, lhe cheire a PS, cometeu hoje na sua CNN uma alusão comparativa com a qual pretendeu mostrar bem a esse Partido as suas limitações como protagonista de Estado. Pretendia ele contar a recente história do computador à procura de um dono, dada a sua alergia a pertencer ao Estado.

Ilustrando bem para que horizontes olham alguns dos vigilantes críticos do actual Governo, recordou um episódio do tempo da “outra senhora” que apresentou como exemplo. Nele se envolveu uma intemerata enfermeira desconhecida que, plantada no seu hospital de trabalho , sofreu a transcendente visita do então Ministro da Saúde do Doutor Salazar, o popular Catedrático de Finanças da FDUL, o suave Soares Martinez. A audaz enfermeira e o feroz catedrático envolveram-se numa rixa de salão, correndo o risco de produzir forte  susto nos inocentes doentes.

O épico de Santa Comba, possuído pela sua consabida verticalidade democrática, apressou-se a despedir velozmente a azougada enfermeira; e, após algumas horas de serena reflexão,  correu também, num gesto  nobre e decidido. com o insalubre Ministro da Saúde.

Para o Senhor Jornalista,  estava assim bem destacado esse transcendente exemplo de Estado, em que participaram alguns destacados vultos da sua confessada democracia: os híper democráticos Salazar e Martinez, bem como a malfadada enfermeira.

Acachapado pela força moral do expoente comparativo deveria o PS curvar-se arrependidamente?  Ou  deveria apenas o povo socialista exclamar: Vai-te encher de moscas aos quadrados !!!

sábado, 29 de abril de 2023

Afinal quem é o Presidente da Junta?

 

Afinal quem é o Presidente da Junta?

O Presidente da Junta acordou rosnando esta manhã uma melíflua ameaça de demitir o Regedor.

A malta mais afecta ao Senhor Prior exige-o enérgica e civilizadamente. Não perdoam que o Zé dos Bifes tenha mordido, ainda que cerimoniosamente, a prima mais nova da Dona Mafalda.

A freguesia lusitana alegadamente cansada de absolutos é energicamente conduzida para uma modesta democracia relativa. Nefelibaticamente, a matilha do crescimento e da saudade ignora a respiração  reinante e troveja vitupérios num esforço de cavar sepulturas.

segunda-feira, 17 de abril de 2023

 

O Dia Claro

                 (17 de Abril de 1969)

               - fragmentos de memória poética

 

 1.

Acendeu-se este dia de manhã

na alameda da memória,

sem melancolia, sem saudade.

Apenas liberdade,

respiração sem tempo

e um cravo vermelho de audácia

na aventura.

 

Na cidade há um vago perfume

de guitarras em fogo.

O Mondego recorda-se das serras e do mar

e viaja por nós, colhendo-nos, dizendo-nos.

                          

 

2.

Colho a pureza inteira deste dia

nas lentas alamedas da memória.

Acende-se no tempo uma saudade,

firme, calorosa, doce, intensa.

 

Respira-se nas ruas, fogo lento,

uma difusa luz de encantamento

e os dedos inquietos dos estudantes

tecem as lendas do deslumbramento.

 

Estavam diante de nós os muros altos

das desoladas sombras da tristeza,

o cerco sujo da soturnidade,

o violento  punhal  da desgraça.

 

Mas a manhã abriu-nos libertando

 os sonhos  que acordaram loucamente

sedentos de alegria e liberdade.

 

Rui  Namorado

       (17.04.2023)

 

 

                                                

 

segunda-feira, 2 de janeiro de 2023

A FUGA DOS MESES

 

Votos de um Bom Ano de 2023!

 Um poema que ofereço como ressonância do tempo, acompanhado pela inquietação exuberante de um grande pintor, que assim me ajuda num abraço de amizade e nos votos de um Bom Ano Novo . Retribuo também deste modo os votos de Boas Festas que recebi.

Rui Namorado




Bom Ano de 2023!     [A fuga dos meses]

 

Foge por nós o tempo em cada ano

e há um futuro em riste  que nos colhe

na vertigem dos sonhos desprezados.

 

Nas pérolas mais frias da revolta

só a paixão dos passos que perdemos

abre  inquieta todos  os caminhos.

 

A cor  do tempo  vai amanhecer

e as colheitas audazes vão crescer

na seara dos sonhos que hão-de vir.

 

Rui Namorado

 

 

segunda-feira, 31 de outubro de 2022

A Cidade do Tempo - uma ressonância poética de Coimbra

 


No próximo dia 2 de Novembro (2022) , em Coimbra, assinalando a abertura de uma nova livraria da editora Lápis de Memórias, vai ocorrer um evento cultural centrado no livro da autoria de  Rui Namorado, A Cidade do Tempo, recentemente publicado.



quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Regresso a BRECHT

 


Um dia,  Brecht escreveu um daqueles diamantes breves que rasgam a noite sem contemplações.

 

Escapei aos tubarões
Abati os tigres
Fui devorado
Pelos percevejos.

 

Marta Temido conquistou  legitimidade para o fazer seu.

quarta-feira, 15 de junho de 2022

DEMOCRACIA ─ E DA BOA!

 


DEMOCRACIA
─ E DA BOA! 

A direita, revelando um apurado bom senso e um profundo sentido de justiça, insiste generosamente na perfumada sinfonia da reforma eleitoral.

Engrossando o coro com energia, levantam-se das suas sepulturas políticas, onde a história displicentemente os colocou, alguns dos seus mais clássicos expoentes. O próprio Oráculo de Boliqueime , ágil e enciclopédico, disse  de sua justiça com a grave sabedoria do costume. Há mesmo um balbuciar vago, tímido e alegadamente científico oriundo da esquerda baixa que dá algum aconchego ao transcendente desígnio da direita.

Círculos uninominais, apagamento da diversidade de representação política pela redução da proporcionalidade ─ enfim, qualquer coisa que possa dispensar a direita e os seus acólitos de conquistarem lugares electivos sem precisarem de ganhar mais votos. Dar a palavra ao povo, sim senhor. Mas nada de exageros. Não lhe deixar nunca espaço para poder fintar a direita em momentos cruciais. Enfim, democracia de fino recorte.

Mas estando volátil o xadrez político, o desígnio guloso e esperto da direita para a reforma eleitoral, pode tornar-se num verdadeiro “hara-kiri”. Por isso, certo, certo e do seu interesse “nacional” é obedecer a dois grandes princípios estruturantes.

1º- o total dos votos no PS será  corrigido, amputando-lhe 33%;

2º -qualquer maioria parlamentar de esquerda (PS sozinho ou acompanhado) terá que ser previamente autorizada pelo actual Presidente da República, após parecer favorável do Oráculo acima referido.

Quando tal for alcançado, as sereias da democracia sem peias dar-nos-ão a melodia dos seus cânticos…

quarta-feira, 8 de junho de 2022

Pesadão e Silva falou.

 

Pesadão e Silva falou.

 


Pesadão e Silva falou.

Como irmão mais velho reduziu Rio a um esquálido ribeiro que censurou sem fraternidade pela irremediável secura.

Decretou teocraticamente a caducidade  da repartição entre a esquerda e a direita, mas inventou-se firmemente como o mais esotérico social democrata.

Glosou a vulgata crescimentista neoliberal com a transparência do simplismo economicista. Pavoneou-se  com a sua alegada vocação reformista, ruminando os mais sagrados tiques ideológicos  da direita mais classicamente inequívoca.

Massacrou ferozmente o PS, fornecendo o roteiro da sua oposição. Esmagou olimpicamente António Costa com o peso imenso da sua grandeza. O povo de esquerda exultou:” Se Pesadão e Silva nos ataca é sinal de que estamos no bom caminho-”

Antóno Costa limitou-se a fintá-lo. E a sorrir…

Num rasgo de última instância, o Prof. Silva ignorou corajosamente os trinca-fortes da saudade, varrendo-os para debaixo do tapete.

Só então a corte respirou de alívio e descansou:” afinal existimos! Uf!”

sábado, 21 de maio de 2022

SERENATA

 



SERENATA


Que lágrima triste subiu no vento,

deixando a saudade a perder-se nele?

Que garra de angústia se rasgou no peito

perdida na dor dos versos cansados,

esquecida da audácia das grandes montanhas?

 

Os lábios longínquos das guitarras tristes

não dizem os sonhos das ruas mais largas,

não trazem os cheiro das histórias sofridas,

não esquecem o medo dos anos de abismo.

 

Podiam abrir as ruas mais lentas,

subi-las num rasgo,  emoção e prazer,

 ser campos abertos de sonho e amor,

esculpida em memória a dor do futuro.

 

Mas descem os dedos das harpas mais tristes

perdendo os silêncios das velhas saudades,

e escavam  a angústia das harpas mais tristes

fugindo da audácia que colhe o amor.

 

Respira-se a sombra dos tempos que faltam,

arranca-se o gume crispado nos versos

e sobe-se o voo de todas as águias,

mais longe, mais longe, mais longe.

 

É esta a serenata dos peitos abertos,

das cordas que rasgam o som das guitarras

e olhando através de todos os mares,

Coimbra cansada de não se cansar.

                        [Rui Namorado]

segunda-feira, 16 de maio de 2022

PRÉ-HISTÓRIA DE GUERRA

 


Em Fevereiro de 1996, quando eu era deputado na AR pelo PS, publiquei um livro de poemas , “Sete Caminhos”, através da editora Fora do Texto [Centelha].

O livro estava organizado em sete partes, uma das quais a penúltima se intitulava “Pré-história”. Era composta por quatro poemas, um dos quais “Pré-história de guerra” evocava o risco de uma guerra nuclear- O título sugeria que estávamos perante um risco que perdera actualidade.

Hoje, passados todos estes anos, vemos que assim não é. Por essa razão resolvi recordá-lo aqui.

_________________-

 

PRÉ-HISTÓRIA DE GUERRA

 

1.

a pomba foi morta pelo general

 

calculou  o sítio exacto

o lugar único    onde a morte esperava

 

 no relatório omitiu a cor branca da vítima

e aquela leve pluma de ternura

visível no seu olhar    depois de morta

 

parecia mais pena    do que saudade ou terror

mais um enorme peso de braços caídos

do que o gelo transido do pânico

 

o general descreveu com precisão

a trajectória magnífica do tiro

o seu rigor    a rapidez fatal

 

com palavras antigas   sincopadas

ao ritmo dos tambores de mil batalhas

 

2.

quando pouco tempo depois lhe disseram

que o neto   o filho   a sua velha mãe

a mulher cujo sabor guardava dia a dia

a casa com jardim e duas árvores

a rua suave     a cidade onde nascera

eram agora uma nuvem espessa de cinza

onde a custo emergia o esqueleto de uma árvore sozinha

 

o general suspendeu o relatório

e teve um suor frio vindo da raiz da alma

 

mas quando lhe vieram dizer pouco depois

que era inútil mandar o relatório

porque o lugar que o ia receber não existia

 

o general chorou como um menino perdido

 

e  foi então que o sol se perdeu numa nuvem de poeira

e um doce sabor a morte   azul e profundo

entrou pelo general até aos ossos

 

3.

a mão do general ficou ligeiramente tombada

sobre a folha do relatório vitorioso

 

ocultou um pouco a trajectória da bala

a palavra pomba parecia agora levemente manchada

 

e junto à porta o olhar fixo do jovem ajudante

era um vidro de espanto gravado no general

 

tudo à volta estava finalmente tranquilo

a paz fulminantemente conquistada

 

sábado, 14 de maio de 2022

PARA QUEM QUISER APRENDER...



 Para quem quiser aprender...

Numa sondagem [Cluster 17] hoje difundida, quanto às intenções de voto nas próximas eleições legislativas em França, a união das esquerdas (insubmissos, verdes, socialistas e comunistas) ocupa destacada o primeiro lugar com 31%-
Seguem-se os apoiantes de Macron com 27% e os apoiantes da Srª Le Pen com 19%, ficando a direita clássica abaixo dos 10%.
Na segunda volta a estimativa aponta para uma nova vitória dos macronianos com maioria absoluta. Mesmo assim aos resultados estimados para a primeira volta traduzem uma recuperação espetacular do protagonismo da esquerda. Se concorrer unida, claro.. Se permanecer fiel às suas pulsões divisionistas , pelo contrário, caminha para um declínio provável.
Muitos notabilíssimos ex-dirigentes do PSF e da própria França torcem fortemente o nariz à participação dos socialistas na dinâmica unitário. Absolvem-se generosamente dos desastres políticos que ajudaram a provocar e parecem irresistivelmente atraídos pela vertigem do 1,5% do cometimento Anne Hidalgo.nas presidenciais.
O povo de esquerda deu a sua resposta, está a dar a sua resposta. Quem aspira representá-lo deve ao menos cometer a modesta proeza de o ouvir.

quarta-feira, 4 de maio de 2022

DOS SOCIALISTAS EM FRANÇA.

 

 


DOS  SOCIALISTAS  EM  FRANÇA.

Uma resistência à entrada do Partido Socialista Francês na grande coligação de esquerda liderada pela França Insubmissa ecoa lugubremente na comunicação social francesa.

 É especialmente  protagonizada por alguns dos seus notáveis de má memória. De facto. alguns dos  coveiros mais ostensivos do socialismo francês parecem não querer admitir qualquer tentativa séria para o desenterrar. Uns, como Manuel Valls, assumem e aprofundam sem rebuço uma deriva de traição que iniciaram há anos  juntando-se à estéril nebulosa “macroniana”. Outros erguem-se penosamente da sepultura política em que caíram e procuram evitar com desespero que o PSF retome um protagonismo político relevante. Não se percebe se resistem a sair do buraco em que Anne Hidalgo os meteu nas recentes eleições presidenciais ou se sonham  nunca lá terem caído.

Quase miraculosamente o que resta do Partido, como um quadrado de raiva, parece querer resistir. No horizonte, cresce a probabilidade da sua adesão a uma União Popular Social e Ecológica que congregue toda a esquerda francesa.

Registe-se, entretanto,  a posição assumida no twitter  pelo candidato do PS às eleições de 2017, Benoit Hamon:

“Afastei-me da vida política nacional  mas , a título pessoal, neste dia de aniversário da vitória da Frente Popular,  afirmo que a aliança em torno da União popular é uma excelente notícia”.

Haverá esperança ?



segunda-feira, 25 de abril de 2022

Homenagem ao 25 de Abril

 


Capitães de Abril

               [1974/2022]

 

Capitães de um futuro incendiado

esculpiram num só dia o coração

das largas avenidas que hão de vir

 

O povo semeou-se pelas ruas

gritando em vermelho um cravo imenso

com asas que voaram pensamento

 

Em todo o horizonte ficou escrito

um sonho que perdeu o seu limite

  pétala de luz   deslumbramento

 

Capitães inventados em Abril

o povo atravessou-os como um rio

com a paixão mais justa e vertical

 

        [Rui Namorado – 25 de Abril de 2022]

segunda-feira, 18 de abril de 2022

Ganhámos a taça!

 Em 2012, no dia em que a Académica ganhou a Taça pela segunda vez, escrevi o poema que abaixo reproduzo.



 Difundi-o então no meu blog  O Grande Zoo. No final de 2021, publiquei na Editora Lápis de Memórias, o meu livro de poemas mais recente. "A cidade do Tempo" é uma ressonância poética de Coimbra. Nele incluí o poema que hoje transcrevo.

Hoje, que a Académica atravessa uma grande tempestade de infortúnio é indispensável uma verdadeira respiração do futuro. Com verdadeira grandeza; com imaginação e ousadia.

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Ganhámos a taça!

          -em 2012

O jogo começou há longos anos,

quando ganhámos a primeira vez.

Em maio de mil novecentos e sessenta e nove,

julgou-se que tínhamos perdido.

Cinco anos depois viu-se que não,

porque somos de um outro campeonato.

Foi talvez, por isso, que ganhámos

neste ano já de um outro século,

como se tudo tivesse começado.

 

E, no entanto, o jogo continua.

Há sempre um novo jogo a começar:

entram em campo todas as memórias.

Mas também a saudade e a alegria.

As capas são os ventos que não param.

Os ventos que são anos e são  vida.

Há golos para todas as  balizas.

O Bentes virá sempre pela esquerda.

No último minuto, o Artur Jorge

Há de marcar o golo de uma vida.

Ia ser golo já sem remissão,

mas o Capela  voou mais que o possível

e a bola não entrou.

E hoje, quando a festa começou,

já o leão rugia rudemente;  

a bola insidiosa veio da esquerda,

procurou a cabeça do Marinho

e o golpe foi desferido e foi mortal. .

 

Vamos entrar em campo novamente,

sabendo que a Briosa a entrar em campo,

é sempre muito mais do que ali está.

Cada golo é sempre  mais que um golo:

milhares em todo o mundo vão marcá-lo.

Cada vitória é mais que uma vitória:

milhares em todo o mundo vão erguer-se,

num gesto de alegria.

E quando os onze perdem nunca perdem,

porque a Académica ganha moralmente.

E se, apesar de tudo, ainda perderem,

os onze sempre sabem que jamais 

irão perder sozinhos.

O sonho estará sempre ao lado deles

e há sempre um outro jogo para ganhar.

 

Ganhámos esta taça.

Na praça da saudade estão connosco

os que partiram antes de a ganhar.

Vai haver nas ruas de Coimbra

um fraterno Mondego de pessoas,

um clamor de alegrias.

E se nas largas ruas da vitória

se abrir alguma porta de silêncio,

não estranhem,

são aqueles que partiram,

fazendo recordar a sua ausência.

 

O que hoje entrou em campo foi a lenda

e o mito de uma eterna juventude.

Briosa é nome de uma caravela,

mas o vento que a leva só é vento

de quem saiba sonhar sem desistir.

 

Por isso, se percebe com clareza

que nós somos de um outro campeonato.