terça-feira, 24 de março de 2015

Homengem Convencional a Herberto Helder



Homenagem convencional a Herberto Helder


Palavras são coisas vestidas de palavras
e as coisas são sereias vestidas de mulher.

Versos são viagens para todos os lugares,
eterno o desespero de não querer chegar.

Mastiga com delícia os sabores proibidos,
ouvindo-os com prazer, como se os fosses pintar.

Só então o poema inventa o universo,
em sílabas de sombra ou colheitas de luz.

A vida é um desejo que desce pelos braços,
dizendo-se infinita como se fosse morrer.

E no princípio de tudo houve um Palácio,
um hálito do vento e da Loucura.

Sais da vida, do tempo e da saudade,
e tudo o que acabou vai começar.


 [Rui Namorado- 24 /03 /2015]

 

sábado, 21 de março de 2015

Uma lágrima no dia mundial da poesia



A lágrima de Auschwitz

A lágrima do espanto corre ainda
pelos muros mais negros de Auschwitz.
Lágrima fria no silêncio imenso,
colheita amarga descobrindo a cólera.

Uma pequena lágrima perdida,
doendo mais longe do que a dor,
está por dentro de todos os invernos,
pedindo, executando o desespero.

Podia descer o rosto da tristeza
como um rio de sofrimento,
mas é apenas pétala de sombra
no coração dos homens e no tempo.

Sílaba de luz que não foi dita,
angústia desregrada, densa, pura.
Gelo de uma dor que não perdoa,
pérola triste que descobre a noite.

A pequena luz fria de Auschwitz
cultiva a espessura da memória,
deixa o tempo voltar desamparado
como se fosse vento e fosse sempre.

Vamos hoje cercá-la de carinho,
dar-lhe asas para não sofrer
e enviá-la, contrabando doce,
para lá da galáxia da esperança.

[ Rui  Namorado -21 de março de 2015]