quinta-feira, 8 de maio de 2008

A balança torcida: desigualdade e gestão



Um gestor de referência, com passagem altaneira pelo Olimpo da política, anunciou estratégias de internacionalização da sua empresa, um ex-serviço público convertido numa simples máquina de fazer euros. Como um Átila do século XXI, desenhou a expansão irresistível da sua empresa, país após país, numa sofreguidão de continentes.


O seu sorriso plano e impessoal brilhava na exuberância dos resultados.

Um incauto jornalista, ainda não devidamente polido, preocupou-se com o detalhe, sem importância de ter sido decidido pelos administradores dessa empresa um aumento a si próprios de mais do que 100%. Aumento particularmente esotérico, tendo em conta os modestos aumentos concedidos, na mesma circunstância, ao comum dos trabalhadores dessa mesma empresa. Aumento estranho, aliás, à luz da recomendação geral de que aos portugueses cabe apertarem corajosamente o cinto, para sofrerem solidariamente as dificuldades do país.

Luminoso, o gestor de referência deu displicentemente a chave do enigma: " Isso não é relevante. O que é relevante é o lucro que os super-aumentados geraram com o seu “trabalho” no bolso dos accionistas".

Estranho critério: o trabalho do punhado de dirigentes recebe a medalha de mérito de um super-aumento, mas o trabalho do comum dos trabalhadores da empresa recebe o modesto afago de um aumento esquelético.

E toda a gente adormeceu sobre este escândalo como se tivesse ocorrido uma trivialidade justa. Mas não foi o caso. Pelo contrário, sublinhou-se uma das raízes da verdadeira crise que assola a sociedade portuguesa: a desigualdade de repartição dos frutos do processo produtivo entre o trabalho , por um lado, e o capital, por outro ( incluindo neste, naturalmente, as despesas com os capatazes ). Veio assim à superfície o carácter injusto e imoral da lógica que move acontecimentos como aquele que acima se referiu.


E não se trata de um eco natural de uma suposta "natureza das coisas". Trata-se de uma vergonhosa injustiça. Não se trata de uma repartição justa dos frutos do trabalho de todos. Trata-se do sobre-pagamento de alguns, à custa do sub-pagamento de muitos. Trata-se de uma involuntária revelação da lógica de repartição inerente ao sistema vigente.


Na verdade, o iluminado gestor que revelou o aleijão apenas agiu nestes termos, por estar em posição de o fazer, por delegação voluntária do poder feita pelos donos do capital, que evidentemente não lhe teriam deixado sorver a gostosa fatia, se não tivessem assegurado uma bem mais apetecível.

O iluminado chama-se Mexia, mas podia ter outro nome qualquer. Se alguém ainda duvida da injustiça estrutural que inquina o tipo de estruturação económica das sociedades actuais, tem aqui um elemento de persuasão que o deveria esclarecer em definitivo.
( A imagem acima incluída foi retirada do blog Khyos.)

4 comentários:

Anónimo disse...

O Paulo Azevedo ganhou um milhão e 300 mil euros na Sonae SGPS.
Quantos administradores há nestas condições?
Quantas empresas pagam estes salários?
Provavelmente nem a uma meia centena de gestores e mais de 90% destes salários atingem a taxa de 42% do IRS.
Em média, os outros contribuintes recebem do salário do Paulo de Azevedo uns 40%, ou seja, 520 mil euros, mas como são meia centena ou pouco mais dá apenas 26 milhões de Euros para o Estado.
Além disso, as pessoas como o Paulo de Azevedo têm carros de alta gama onde o Estado chega a ir buscar 70% em impostos sobre automóveis e consomem produtos de luxo com altos IVA, etc.
A redistribuição está feita no IRS, mas sem grande significado económico dado que o número de gestores dessa ordem ser demasiado pequeno. Se fossem 200 ou 300 mil, o IRS até dava para uma boa maquia para redistribuição.
A igualdade nunca existiu. Leia-se a biografia de Mao Ze Dung da Yung Chang. Como ele vivia com dezenas de palácios com gigantescos bunkers espalhados por todo o país e a companhia de guardas femininas que ele utilizava para todo o serviço.
E o resto do pessoal político. Leia "Os Cisnes Selvagens" da mesma autora que decreve os bairros especiais para os dirigentes das Províncias com restaurantes gatuitos e de luxo no seu interior. O povo passava fome, mas nos restaurantes dos dirigentes o requinte alimentar era digno dos Imperadores da China Antiga.
E Estaline e o seu pessoal.
O próprio Lenine apoderou-se do Rolls Royce do Czar para seu uso em vez de o transformar numa ambulância para os feridos de guerra.
Um dos grandes palácios do Czar estava transformado em Hospital - vejam-se as fotos em "O Século da Rússia". Lenine expulsou os feridos e doentes e transformou aquilo em palácio de "trabalho" para os dirigentes bolchevistas.
Quem, no MUNDO, foi melhor que o PS hoje em Portugal?
Absolutamente NINGUÉM. Apesar de a política do PS ser péssima, mas a de todos os outros governos do País e do Mundo foram ou iguais ou piores, sendo maioritariamente piores.Um Abraço de
DD

Anónimo disse...

Caro DD:

O meu termo de comparação não é o atalho estalinista-maoista que urupou a designação de "comunista". também não p+rocuro o paraíso.
Apenas não sou um crente na eternidade do capitalismo. E sendo provável um pós-capitalismo luto, dentro da minha muinúscula medida, para que seja melhor.
De facto, um horizonte socialista é um horizone de esperança, mas no nosso dia a dia cada vez se inscreve com mais nitidez o preço exorbitante que a Humanidade paga em cada dia pela globalização capitalista, de que modestamente retiraram o último qualificaitvo.

Um abraço.
RN

Anónimo disse...

Anónimo disse... [ o mesmo do que o anterior, mas sem gralhas]

Caro DD:

O meu termo de comparação não é o atalho estalinista-maoista que usurpou a designação de "comunista".

Também não procuro o paraíso.

Apenas não sou um crente na eternidade do capitalismo. E, sendo provável um pós-capitalismo, luto, dentro da minha muinúscula medida, para que seja melhor.

De facto, um horizonte socialista é um horizone de esperança, mas no nosso dia a dia cada vez se inscreve com mais nitidez o preço exorbitante que a Humanidade paga em cada dia pela globalização capitalista, de que modestamente retiraram o último qualificaitvo.

Um abraço.
RN

Anónimo disse...

O BES demarcou-se das declarações.
Se não parece estúpido,peço desculpa.
tatão