sexta-feira, 9 de maio de 2008

PS em Coimbra - à espera das primárias




Passou quase um mês sobre o dia das eleições para a Comissão Política Concelhia de Coimbra do PS. Uma quietude sombria parece ter-se apossado novamente da vida política interna. Apenas uma pausa natural para o render da guarda? Esperemos que sim.

O combate foi renhido. O vencido (Carlos Cidade) chegou aos 408 votos (43,6 dos votantes), conseguindo 27 eleitos. O vencedor (Henrique Fernandes) teve 528 votos, alcançando 34 lugares na Comissão Concelhia. Juntos obtiveram 936 votos; ou seja, menos de metade dos militantes inscritos no Concelho. Não é inédito, mas é um facto que não deve ser atirado para debaixo do tapete.

Tudo o que ocorreu na campanha, os seus resultados e os poucos sinais visíveis subsequentes, não me fizeram arrepender do não apoio a qualquer das candidaturas. Como durante a campanha escrevi neste Blog, foram na verdade duas candidaturas suaves. Em vários sentidos. HF protagonizou uma tentativa de suavizar o ónus da continuidade e CC não quis deixar de suavizar o gesto da ruptura. E entre as duas margens dessa suavidade não deixou de haver pontes.

Se as vozes sussurradas nos corredores do PS não são apenas fantasia ou contra-informação, depois das eleições foi já estabelecida uma ponte definitiva. Ora, se estas pontes são o subtil pão-nosso-de-cada-dia da política intra-partidária, não deixam também de assinalar objectivamente, pela dificuldade ou pela facilidade com que são lançadas, a distância que separa as duas margens.

Numa outra circunstância, toda esta atmosfera de relativização das diferenças, de superficialização das fracturas, podia ser um sinal de coesão partidária e um indício positivo de uma convergência desejável. Podia mesmo ter-se como natural que da campanha saísse, como primeiro resultado ostensivo, a decisão sobre quem seria candidato a Presidente e quem seria candidato a Vereador.


Mas a conjuntura que vivemos está longe de se poder comparar a um lago de águas calmas e sem surpresas. O provável é que estejamos fadados a viver em tempestade (ou sob a ameaça séria de tempestade) nos próximos tempos. E a primeira grande tempestade, para que nos temos que preparar, é a falta de confiança dos eleitores que votam habitualmente no PS, nas próximas eleições para a Câmara Municipal de Coimbra.

Falhámos no primeiro passo, que, como resulta do que tenho dito, na minha opinião, devia ter implicado uma ruptura profunda, ostensiva e radical (apenas no plano político e sem quebra da desejável convivialidade), saída de um combate em que se confrontassem, sem ambiguidades, a continuidade e a ruptura. Não houve base de apoio ou capacidade para se suscitar uma candidatura que, protagonizando uma ruptura sem pontes, obrigasse a continuidade a assumir-se em toda a sua extensão, de modo a provocar assim uma verdadeira clarificação interna, que pudesse mostrar, para fora de nós, objectivamente, a novidade radical de um novo tempo, ou a existência de uma forte expressão interna dessa ambição.


As coisas estão, portanto, neste ponto incerto, em que a novidade é tímida e a sombra do passado visível. De fora do PS, continuam a olhar-nos sem grandes expectativas. E isso eleitoralmente é muito arriscado.

Mas enquanto continuarmos num caminho, podemos sempre atenuar o que perdemos nos desvios ou nas paragens. Estamos nessa situação. Se os vencedores compreenderem que têm que conquistar o entusiasmo dos quase cinquenta por cento de votantes que foram vencidos; e que, para além disso, precisam de mobilizar a metade dos militantes que, por razões diversas, se mantiveram fora da pugna, perceberão que têm um difícil caminho a percorrer.

Uma simples ponte entre os duas quartas partes deixa a outra metade de fora. Uma simples ponte para repartir protagonismos pode arrefecer crispações, mas não suscitará novos entusiasmos. Pode ser um cachimbo da paz entre chefes, mas pode ser pouco para conquistar o coração dos eleitores.

Na verdade, só um golpe de uma ousadia limpa, que mostre um partido realmente aberto aos seus eleitores e forte do protagonismo empenhado e visível de todos os seus militantes, trará uma credibilidade real ao PS de Coimbra, enquanto colectivo, que assim mostre poder arcar de novo com a responsabilidade pelos destinos do Concelho de Coimbra.

E o rasgo possível, com o tempo de que dispomos, e como alicerce indispensável, é a opção de escolhermos o nosso candidato, às eleições para a Presidência da Câmara Municipal de Coimbra, em eleições primárias em que participem todos os militantes do PS e todos os seus simpatizantes.


No momento em que essa decisão for tomada, passarão a estar directamente envolvidos no processo, como sujeitos activos, todos os que estejam em condições para votar nessa primárias. As clivagens entre maioria e minoria, ou esbater-se-ão, ou serão transferidas para uma saudável competição entre projectos e entre rostos de projectos. Os socialistas que se abstiveram ficarão dentro do processo, que será ainda aberto aos simpatizantes.


Cada pré-candidato há-de ter um projecto, há-de ter ideias, há-de ter uma equipa. A campanha terá que ser democraticamente impecável e o combate, pela preferência dos socialistas, uma competição de perspectivas e de propostas. Uma competição que tem que ser rodeada de regras rigorosas que a protejam das tentações de sectarismo e de arregimentação, ou seja, de um tribalismo interno, fulanizado e estéril. Uma campanha que, se for séria, substancial e competente, poderá ser uma preciosa pré-campanha, no plano eleitoral geral.

De facto, qualquer pré-candidato forte só lucrará com esta prova de fogo , não havendo processo mais seguro, mais saudável e mais transparente, para suscitar a unidade dos militantes e dos simpatizantes, em tono de um vencedor.


Falando por mim, posso imaginar os outros. Apoiarei, sem qualquer reserva, o candidato escolhido em eleições primárias internas, desde que elas sejam limpas, leais e justas, mesmo que tenha sido outra a minha preferência inicial e por maior que seja a antipatia pessoal que ele me possa merecer.

Um processo destes é possível e desejável. Se houver consenso em torno dele, em termos gerais, não será difícil acertarem-se depois os detalhes.

Fora dele, será maior o risco de termos que enfrentar uma candidatura independente que nos dispute parcialmente o eleitorado. Será maior o risco de termos que engolir um candidato do PS imposto pela direcção nacional do partido. Será maior o risco de perdermos as eleições.

Henrique Fernandes tem a responsabilidade principal, Carlos Cidade tem alguma responsabilidade, os membros da Comissão Política Concelhia, no seu todo, têm legitimidade para seguir esse caminho.


Segui-lo, não garante a vitória, mas torna-a mais provável. Ignorá-lo, não conduz necessariamente à derrota, mas aproxima-nos perigosamente dela.

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