
Não é certo se o partido mais votado virá a ser o PSD ou o PS, dada a escassa diferença entre ambos, apesar de o primeiro surgir reiteradamente com um ou dois pontos percentuais de vantagem. E não é certo se a soma de votos no PSD e no CDS superará a dos votos no PS, no BE e no PCP, tal como não é certo se o CDS sozinho conseguirá ter tantos votos, por si só, como o BE e o PCP juntos. Parece, no entanto, mais provável uma maioria parlamentar de direita do que a concretização desta última hipótese.
Se este cenário se não alterar, o CDS será o partido mais próximo de obter um reforço estratégico da sua posição, uma vez que, conjugando as intenções de voto que sobre ele recaem com o contexto político, está prestes a destacar-se significativamente do lote dos pequenos partidos e a desempenhar um papel charneira no cenário pós-eleitoral.
Em contrapartida, quer o BE quer o PCP, correm o risco de sofrer uma derrota estratégica. Tendo ambos escolhido o PS como inimigo principal, não conseguiram gerar um cenário que projectasse essa posição, de modo a romper a dicotomia entre um governo de direita puro e duro e um governo do PS ou com a sua presença. Por isso, objectivamente, perderam qualquer autonomia estratégica, tendo-se convertido em armas da direita contra o PS, o que, num plano secundário, indirecto e de médio prazo, implica que, de algum modo, também se combatem a si próprios. O PCP parece ter tomado consciência desse problema, na medida em que nos últimos dias ajustou o seu discurso, no que diz respeito às suas relações com o PS, mas não foi capaz de romper o bloqueamento que sempre o tem embaraçado no caminho para uma laicização do seu relacionamento com esse partido.
Na verdade, se a direita tiver maioria parlamentar e se o BE e o PCP descerem ou estagnarem, ficará materializada a derrota estratégica acima referida. De facto, a linha seguida por esses dois partidos, continuando a ser questionável, podia ter algum êxito, à luz da sua própria lógica, se a sua luta contra o PS se traduzisse num enfraquecimento deste partido e num reforço deles os dois, de modo a que, mesmo não sendo o PS o partido mais votado, a direita não ficasse em maioria. De outro modo, não podendo separar a sua linha de orientação dos frutos que ela ajude a criar, ficarão politicamente estigmatizados por qualquer resultado eleitoral que abra a porta a uma conjuntura socio-económica que suscite mais descontentamento, nas suas bases sociais de apoio, do que aquele que foi nelas suscitado pelo governo cessante.
O PSD conserva boas hipóteses de ser o partido mais votado e de vir a liderar um governo de direita. No entanto, será provavelmente confrontado com a necessidade de uma parceria governamental com um CDS muito mais forte do que aquilo que pensava. Mas, salvo qualquer inesperado acidente político, a maioria absoluta que parecia estar de início ao seu alcance tornou-se numa miragem irrealista. Ele pode assim correr o risco de obter uma vitória eleitoral com um gosto amargo. Corre na verdade o risco de ser um vencedor tangencial, forçado a coligar-se com um CDS em expansão, num governo acossado pelo exterior. E, pior do que isso, nem sequer está a coberto do risco de perder, o que será para a sua actual direcção uma ironia objectiva devastadora.
O PS foi empurrado para estas eleições, porque a direita estava firmemente certa que o esmagaria. Uma enorme coligação de poderes fácticos e dos seus braços mediáticos pegou nos partidos da direita ao colo e decidiu assaltar o poder. Numa sofreguidão de hostilidade e menosprezo pelo PS, procurou simultaneamente esmagá-lo eleitoralmente, decidir por ele quem deveria liderá-lo, para aproveitar depois o que dele restasse e obrigá-lo a coonestar e apoiar tudo o que os seus núncios partidários, assim instalados no governo, decidissem fazer a bem dos seus interesses e do reforço do seu poder.
Mas as coisas começaram a correr-lhes mal: o eleitorado não ficou muito agradado com o golpe de mão que derrubou o governo, a nova liderança do PSD foi lentamente descambando para uma caricatura de si própria, o seu cabecilha foi tropeçando na sua inconsistência ideológica, na sua inexperiência política, num certo radicalismo neoliberal algo primário, e em alguns dos seus mais directos esteios, que se revelaram verdadeiros idiotas políticos. Entusiasmado com a fragilidade da liderança do PSD o manhoso leader do CDS ferrou as canelas de Passos Coelho e não mais as largou. O BE e o PCP, como acima se disse, não conseguiram assumir uma linha estratégica própria no combate ao PS, deixando-se absorver e instrumentalizar pela única lógica anti-Ps realmente operativa nesta conjuntura, a da direita. Tudo isso permitiu ao PS voltar a respirar com algum desafogo. E, a pouco e pouco, voltou a subir a montanha. Hoje, a uma semana das eleições, não tem a certeza de as não perder; mas, ao contrário do que seria sequer imaginável há dois meses atrás, os seus adversários já receiam de novo uma vitória sua. A combatividade de Sócrates é um engulho crescente para a matilha mediática arregimentada para o derrubar e o povo socialista está a erguer-se. Também no quotidiano da campanha se percebe que a luta não está decidida.
Para todos os partidos, seja qual for o resultado eleitoral, o período subsequente ao dia das eleições vai ser complexo e difícil. Mas o PS tem seguido uma via que o coloca em boa posição nesse difícil cenário, quando, ao contrário do que muitos pensavam, se mostrou aberto ao diálogo com todos os partidos, sem ignorar a circunstância de alguns deles terem assinado o compromisso com a "troika" e outros não, alargou o seu espaço de manobra no período pós-eleitoral. Em contrapartida, todos os partidos que afirmaram peremptoriamente que não aceitavam qualquer coligação com ele, estreitaram a sua própria margem de manobra e alargaram a do PS. E alguns deles, situados à direita, desautorizaram até grosseiramente os muitos notáveis seus apoiantes que tão maviosamente apelaram em público a consensos vastos, há uns tempos atrás, julgando estar a favorcê-los e a embaraçar o PS. Afinal, enganaram-se.
Se todo este cenário se tornar mais evidente nesta semana final da campanha, o PS pode daí tirar vantagem. Na verdade, será difícil valorizar o mérito de pequenas propostas, quando a atitude e a posição política geral de quem as faz revele afinal uma enorme incompetência estratégica. Por outro lado, será mais fácil passar por cima de detalhes programáticos que desagradem, quando o sentido estratégico geral da caminho proposto for reconhecido como lógico, congruente e harmonizável com as atitudes parcelares que forem sendo tomadas. Na verdade, é mais fácil optar por um caminho que nos leve a algum lado, ainda que polvilhado por dificuldades e erros, do que dar primazia a flores oferecidas num atalho para lado nenhum.
2 comentários:
Serenidade. Quem mantiver a serenidade e revelar capacidade de fazer pontes ganhará as eleições. (escrevi isto há mais de um mês; continuo convicto de que a serenidade será premiada)
Serenidade, foi aquilo que nos procurou transmitir o Presidente do nosso Partido, Almeida Santos, com as suas sensatas declarações...
Enviar um comentário