Há quem qualifique como modernas as posições de esquerda
mais moderadas, dando-lhes a ancoragem neste século como uma característica que
falta ás posições mais enraizadas no sentido histórico do socialismo e dos seus
valores, consideradas mais à esquerda. Não é um argumento. É um carimbo
arbitrário que traduz apenas a subjectividade de quem o usa, bem como a
dispensa de uma argumentação política efectiva.
Sem querer aqui discutir o fundo da questão, uma coisa a experiência
histórica nos mostra: já tem mais de cem anos a tentativa de carimbar como modernas
as posições moderadas e como ultrapassadas as posições que o não são.
Por isso, esses modernos,
afinal tão antigos, usam este carimbo , principalmente, quando sentem que a
realidade lhes foge debaixo dos pés . É o que parece estar a acontecer com os
trabalhistas britânicos. Um candidato da esquerda do Partido Trabalhista parece ter a preferência
dos militantes . Logo saltam para a ribalta mediática as vozes modernas dos
blairistas, a começar pela do próprio Blair, para desenharem como Apocalipse uma vitória de Jeremy Corbyn.
Se os Apocalipses bíblicos são um risco milenar inscrito nos
medos mais ancestrais que pairam sobre os povos, há outros aparentemente mais
triviais mas pesados, muito pesados nos custos humanos que têm. É o que está
agora a ocorrer na chegada á Europa das
externalidades humanas das politicas guerreiras de Bush e do seu acólito Blair,
cujo expoente máximo foi a conquista do Iraque com base em motivações que hoje
se sabe serem redondamente falsas.
É assim uma dramática ironia que Blair qualifique como apocalíptico
o risco de uma vitória de Corbyn, quando ele próprio foi um dos terríveis
cavaleiros do Apocalipse.
Por isso, verdadeiramente, os que à esquerda se reivindicam
como modernos talvez apenas estejam a
procurar que os dispensem de explicar porque viraram tanto à direita. Mas
se realmente, ao contrário do que eu julgo, esses modernos estão
verdadeiramente possuídos pela vertigem do amanhã, não podem deixar de se
angustiarem com o facto de apenas estarem a regressar a um nariz de cera que
data do fim do século XIX.
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