É um tempo rasteiro, este que nos atrofia como se fosse uma conjura de todos os passados, para nos separar da simples humanidade e de todo o futuro. Para transgredir a melancolia e o silêncio, recordo com saudade Joaquim Namorado, apelando à sua "Incomodidade", a um dos seus poemas. Um poema que talvez nos mostre com mais clareza as raízes da chamada crise do que as orações de sapiência televisivas com que fungíveis lacaios dos poderes económicos de facto nos brindam todos os dias. Isto, apesar de o poema ter sido publicado nos anos quarenta do século XX. Como se pode ver, se é certo que o mundo mudou muito, há algo de muito insalubre nele que está na mesma. Eis o poema:
CONSPIRAÇÃO
Estava tudo combinado,
os planos bem medidos,
não podia ter falhado.
As provas tenho-as aqui:
seus artigos e leis
− tudo bem dividido
e melhor justificado!
Que fica ao pobre que nasce?
Papas, juízes e reis
fizeram como quiseram
as suas leis.
Decretos, filosofias, ditados,
ciência rara,
ensinam que foi assim,
pela ordem natural.
Mas, por mim,
não me conformo:
Fui roubado! Fui roubado!
[Joaquim Namorado, in "Incomodidade", 1945]
sexta-feira, 28 de outubro de 2011
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