A memória do espaço mediático é uma nuvem ligeira que se esvai de surpresa, volátil e fugidia. Quem se lembra da majestade dos tigres asiáticos, cujos passos nos eram insistentemente apresentados como devendo ser o sonho do que Portugal haveria de querer ser como país, quando escapasse a um triste destino de séculos? Quem relaciona os longos anos de estagnação, que alegam ter caído sobre o Japão, com a qualidade, que antes lhe atribuíam, de farol que, de algum modo, se tinha como a luz do caminho dos referidos tigres? Quem se espanta com essa estranha metamorfose de altivos tigres em pobres bichanos ronronantes de desgraça?
Mas no próprio trovejar actual da agenda mediática já se instalou, pé ante pé, uma outra desmemória. Quem se esqueceu dos oráculos que se espremiam em lágrimas sinceras, na antevisão de uma Grécia que nos ia ultrapassar plena de eficácia, na corrida dos números e das estatísticas, para cuja sôfrega angústia nos empurraram? Quem ainda se recorda de como se rosnava o êxito da economia espanhola para se carpir a mediocridade lusitana ? Quem não perdeu ainda os ecos dos repetidos hinos à Irlanda, cantada com se fosse uma ilustração magnífica de receitas de políticas e de práticas económicas liberais, que nos indicaria o caminho para uma terra prometida de leite e de mel ?
Ora, hoje, aqueles que nos eram apresentados como luminosos exemplos, Grécia, Espanha e Irlanda, são identificados como pesadelos que nos podem contaminar. E, no entanto, as grelhas de análise, os critérios de avaliação, as ideologias alegadamente científicas, as unilateralidades analíticas, as opções socioculturais, que foram suporte de uma visão que hoje se verifica ser ilusória, continuam a ser os bordões dos mesmos “invisuais” que nos continuam a indicar os caminhos de salvação, com a mesma certeza com que antes nos impingiam o que hoje se sabe ser um completo catálogo de equívocos e mistificações.
De um ponto de vista subjectivo, admito que essas criaturas actuem de boa fé num autismo algo confrangedor, mas objectivamente estamos perante um simples charlatanismo, vendido como circunspecta imparcialidade científica e guia único de uma salvação almejada. Trágico ?
Mais trágico é que o espaço mediático, marcado pelas funções que desempenha no congelamento da esperança, acolha como oráculos os mastigadores da mesma fala enganosa que tantas vezes nos vaticinou um futuro que, hoje, afinal sabemos que nunca chegou a existir.
Talvez o futuro possível de que os oráculos da desgraça fogem sofregamente não convenha aos poderosos, aos ricos, aos que exploram os outros como se lhes fizessem um favor, mas é o único que se inscreve no caminho dos povos como horizonte de justiça, de liberdade e de humanidade. Por isso, é dia a dia mais importante que os cidadãos se metam na política, que sejam políticos.
Mas a política é isto, o debate que merece ser travado, se possível com paixão. Isto, e não a rapsódia de cacetadas verbais distribuídas com fúria numa girândola estéril; nem o mastigar enjoativo de trivialidades previsíveis. Isto é política, ambição de futuro, onde os erros podem ser honestos e as verdades relativas. Isto, e não a arenga que exprime e oculta simples interesses particulares. E se a política for isto, então podemos compreender que seja legítimo dizer-se que ela é também vida e utopia. E neste sentido, repito, é urgente que todos os cidadãos sejam políticos.
Mas no próprio trovejar actual da agenda mediática já se instalou, pé ante pé, uma outra desmemória. Quem se esqueceu dos oráculos que se espremiam em lágrimas sinceras, na antevisão de uma Grécia que nos ia ultrapassar plena de eficácia, na corrida dos números e das estatísticas, para cuja sôfrega angústia nos empurraram? Quem ainda se recorda de como se rosnava o êxito da economia espanhola para se carpir a mediocridade lusitana ? Quem não perdeu ainda os ecos dos repetidos hinos à Irlanda, cantada com se fosse uma ilustração magnífica de receitas de políticas e de práticas económicas liberais, que nos indicaria o caminho para uma terra prometida de leite e de mel ?
Ora, hoje, aqueles que nos eram apresentados como luminosos exemplos, Grécia, Espanha e Irlanda, são identificados como pesadelos que nos podem contaminar. E, no entanto, as grelhas de análise, os critérios de avaliação, as ideologias alegadamente científicas, as unilateralidades analíticas, as opções socioculturais, que foram suporte de uma visão que hoje se verifica ser ilusória, continuam a ser os bordões dos mesmos “invisuais” que nos continuam a indicar os caminhos de salvação, com a mesma certeza com que antes nos impingiam o que hoje se sabe ser um completo catálogo de equívocos e mistificações.
De um ponto de vista subjectivo, admito que essas criaturas actuem de boa fé num autismo algo confrangedor, mas objectivamente estamos perante um simples charlatanismo, vendido como circunspecta imparcialidade científica e guia único de uma salvação almejada. Trágico ?
Mais trágico é que o espaço mediático, marcado pelas funções que desempenha no congelamento da esperança, acolha como oráculos os mastigadores da mesma fala enganosa que tantas vezes nos vaticinou um futuro que, hoje, afinal sabemos que nunca chegou a existir.
Talvez o futuro possível de que os oráculos da desgraça fogem sofregamente não convenha aos poderosos, aos ricos, aos que exploram os outros como se lhes fizessem um favor, mas é o único que se inscreve no caminho dos povos como horizonte de justiça, de liberdade e de humanidade. Por isso, é dia a dia mais importante que os cidadãos se metam na política, que sejam políticos.
Mas a política é isto, o debate que merece ser travado, se possível com paixão. Isto, e não a rapsódia de cacetadas verbais distribuídas com fúria numa girândola estéril; nem o mastigar enjoativo de trivialidades previsíveis. Isto é política, ambição de futuro, onde os erros podem ser honestos e as verdades relativas. Isto, e não a arenga que exprime e oculta simples interesses particulares. E se a política for isto, então podemos compreender que seja legítimo dizer-se que ela é também vida e utopia. E neste sentido, repito, é urgente que todos os cidadãos sejam políticos.
9 comentários:
"Erros honestos, verdades relativas". Parece-me um bom ponto de partida para a reflexão. Mas ... o erro desonesto é, então, aquele que é praticado com a intenção de enganar, de iludir, de desviar do verdadeiro sentido? É suposto que aqueles que o praticam conhecem a verdade e pretendem desviar-nos dela? Ou "praticam" simplesmente o erro (intencional) de apresentar verdades relativas como se fossem verdades absolutas?
Também dificilmente se pode considerar um erro honesto todo aquele que tiver na raiz a "má fé" sartriana, que na minha leitura é mais intelectual do que psicológica.
A evidência dos factos consumados e a consumar que se verificam, tendo como pano de fundo a social- democracia como veículo branqueador
do capital monopolista e imperialista, é tão triste e arrepiante, que nos faz duvidar das parecidas boas-vontades conciliadoras das classes.
Os Tigres asiáticos foram a eficácia dos pontas de lança do império EUA/CEE/UE/Japão na tentativa de abucanhar e ao mesmo tempo apetrechar o cerco económico e politico/militar àquilo que chamou «Socialismo».
O mesmo está a acontecer com a inclusão na UE dos diversos países do leste Europeu, que ainda assim vão reivindicando o seu, coisa que Portugal nunca fez.
MÁRIO SOARES + Cavaco Silva entraram pela porta pequena de tal ordem que os portugueses nem sequer tiveram maneira de piar.
Hoje a lembrança da desgraça Irlandeza serve somente para fazer esquecer o nosso mal.
Novamente, como diz o outro, os abutres foram alimentados pela mão dos sociais democratas com governo dito socialista, Infelizmente!
Se somos assim tão amigo do povo?
Se o queremos feliz?
Por quê tanta curva bisarra?
Com o devido respeito pela sua prosa do mal o menos...Do "Catraio"
Se os pressupostos que estão na base do seu ponto de vista estivessem próximo de estarem certos, a União Soviética devia ser hoje uma realidade pujante com futuro pela frente.
No fundo, como por mais do que uma vez já referi no GZ, por detrás da perspectiva que se projecta nas posições semelhantes à do seu comentário, está a velha palavra de ordem dos anos trinta do século passado: "enterrar o nazismo sobre o cadáver da social-democracia".
De facto, se a esquerda se reduzisse à URSS e à China, e aos que se identifiquem com os modelos protagonizados pelo que nesses dois países impropriamente se chamou "socialismo", podíamos dizer que se tinha reduzido a muito pouco no mundo actual; e que as suas perspectivas tinham, realmente, deixado de contar como possível alfobre de alternativas futuras.
Não penso que assim seja; e é por isso que me sinto muito longe do ponto de vista que o seu comentário reflecte.
Caro RN, a única certeza que tenho é a de «estar vivo»!
Sei que o socialismo e o comunismo, daquilo que se falou muito, ainda estão por concretizar e, só lá para as calendas...Se calhar, levará tanto tempo ou mais que a distância/espaço/tempo entre o dito cujo «comunismo» primitivo até ao Manisfesto Comunista de Marx/Engels. Tenho dito...
Contudo, tanto uns como outros, de tracção de esquerda ideológica, esqueceram essa mesma posição.
Raramente, ou nunca informaram ou pouco investiram nos informes e formação para o advento dos mesmos- Socialismo e Comunismo.
Ainda que nesses tempos remotos fossem poucos intelectualizados e as igrejas de todo o tipo, quase únicas na proliferação do Saber...
Caro RN, falar hoje da URSS/Rússia ou da China, é falar de propostas, de experiências avançadas por outros homens como nós feitos do mesmo jeito. No entanto a experiência foi feita com todo o mundo de então a combatê-la.
Hoje estão em movimento novas e variadas experiências políticas que têm como tópico principal o Socialismo.
Como não vai ficar por aqui, outras experiências virão, e, pelo que sei de História, muitas outras virão.
São simplesmente experiências!
Não haverá derrotas nem vitórias! São as massas em movimento, a prolongar-se no sempre-eterno problema,- A Procura do "Ser"!
Sem necessidade de dividendos...
E com todo o respeito de
"O Catraio"
e CONTUDO, em Espanha e na Irlanda vive-se melhor que em Portugal...
Esta é para responder ao André:
"Vive-se" ?
Há uns que vivem melhor e outros que vivem pior: aqui, na Espanha ou na Irlanda.
E quem vive mal( aqui, na Espanha ou na Irlanda)não fica consolado por lhe assegurarem que no seu país há outros que vivem muito melhor do que ele.
Caro "O Catraio":
Se me disser que em política não há vitórias ou derrotas definitivas(definitivas), até posso concordar consigo.
Mas negar que na luta política haja derrotas e vitórias, tácticas ou estratégicas, é que não pode ter o meu acordo.
Claro, caro RN. Ainda assim, prefiro a minha!
É que falar claro é bem dificil de aceitar...A luta dita política caseira, ou como dizem em Coimbra/Lisboa - provinciana - não passa de facto disso mesmo.
O processo político que se vive em Portugal é mesmo assim - o seu partido quer ter por força um primrio ministro e, se tiver um presidente da república ainda melhor.
Por outro lado, o meu partido quer o mesmo e assim socessivamente; e aqui reside a hipocrisia. E o que o povo quer?
Uma boa governação não necessita de que o homem ou a mulher sejam de partido tal e tal. Necessita sim, de bons(as) Homens e mulheres políticos, capazes, de saber e vontade de fazer. É só isto, Pronto
Existiram impérios e impérios e que se saiba faliram todos eles!
Raramente se nota na mundividência tanta misericórdia como agora nas humanidades religiosas assim comos nas direcções políticas dos países ditos democráticos ocidentais.
É preciso que de vez enquando haja um cataclismo, e, aí, sim, Os religiosos e os políticos/religiosos até parecem santos..!
Eu sei que de utopias está o mundo cheio. Mas (eu) quero continuar a crer na Utopia. Na Verdade de facto.
Com todo o respeito de "O Catraio"
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