sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

O estranho caso do leão arraposado


Era uma vez um jovem político a amadurecer na árvore lenta da sabedoria. Desenvolto, inteligente, ousado. É certo que às vezes um pouco desenvolto de mais a tratar com a comunicação social. Como se uma certa manha de "raposa velha" inesperadamente o pudesse corroer.

Vestia com alguma elegância uma certa ousadia parlamentar, embora às vezes parecesse tropeçar numa certa superficialidade. Um estro fracturante parecia polvilhar prometedoramente a sua retórica fácil.

Ao mesmo tempo, entre os seus pares, um outro deputado, figura nacional de resistente e poeta, tecia com tranquilidade mais um episódio parlamentar de uma longa trajectória, cujo começo se perdia de vista, nas difíceis brumas da resistência. Com bonomia e naturalidade, acolheu com fraternidade o promissor despertar do jovem político.

Mas nas voltas rápidas da política, abriu-se de súbito uma contenda no partido de ambos. E quando se pensaria ver a irrequieta esperança partilhar uma aventura com a histórica figura, num combate comum, ei-lo inesperadamente feroz nas hostes dominantes, a zurzir sem contenção o mesmo que antes ungira de quase veneração. E, em vez de responder com ousadia ao desafio de ser futuro, aconchegou-se na modesta alegação de um imaginário “capitalismo popular”, que imprudentemente propagandeou, como a quinta essência de qualquer socialismo que se pretendesse moderno. A vida esqueceu-se do dislate e o jovem lá prosseguiu na Europa um percurso bordejado de pequenas venturas e de mansas glórias. O resistente lá seguiu o seu caminho através da História..



O tempo foi passando, até que uma nova emboscada do destino abriu uma nova conjuntura de combate. O velho lutador não faltou à chamada. Por seu lado, o ex- jovem político, de há uns anos atrás, ganhara a patine triste da previsibilidade, como se ninguém o tivesse colhido a tempo da árvore do destino. Transformou-se, assim, numa voz corriqueira, numa monotonia de pensamentos lisos, que, de quando em vez, se sobressalta a si própria em assomos imprudentes.

Foi, por isso, sem surpresa , mas com um ligeiro perfume de mágoa, que o ouvi regougar, num programa televisivo recente, explicitamente, contra o velho combatente. Percebi então que aquele que um dia pareceu poder vir a ser um “jovem leão”, corre o risco de nunca conseguir ser mais do que uma “velha raposa”.

2 comentários:

Maria José Vitorino disse...

Eu diria mesmo mais: está em vias de transformação em sendeiro...
Parabéns pelo blog

Ana Paula Fitas disse...

Adorei... e, no A Nossa Candeia, ficou a evocação do... Morcego Vermelho :)
Um abraço :)