sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Trucidados


Hoje, no Destak, J.L.Pio Abreu, publicou o texto que abaixo se transcreve com a sua autorização.



Trucidados

Um rapaz desconhecido subiu ao palco mediático para proclamar a sentença dos funcionários públicos recalcitrantes: trucidados. Podia dizer que mãos e cabeças serão decepadas para as expor na praça, e o resto do corpo ligado a uma cauda de cavalo que o arrastará até ao cemitério. A sentença vai demorar o tempo suficiente para que os acusados paralisem de medo. Talvez um ou outro seja executado, sem contar com os que optem pelo suicídio ou pela retirada. Mas depois virá a magnanimidade do perdão, seguindo-se dois anos de alegres festejos e comemorações.

Como o poder subalterno não tem imaginação, calculo que o jovem governante ande a ler o livro de Laurentino Gomes 1808: Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a História de Portugal e do Brasil. É que esta foi a receita que D. João VI aplicou com eficácia aos revolucionários pernambucanos.

Mas os funcionários públicos já estão a ser trucidados. Não os que se opõem à reforma, mas aqueles que a praticam. São trucidados pelas folhas A4 saídas em catadupa de um computador concebido para poupar papel. Em escolas, hospitais, institutos, repartições, é um ver-se-te-avias de projectos, protocolos, relatórios, inquéritos, avaliações e o que mais se verá para entreter toda uma hierarquia de chefes e sub-chefes.

Tirando quem os preenche, ninguém vai ler tais papéis. Mas vão-lhes apor um despacho aleatório que ditará a vida dos que estão na base da hierarquia. Só que estes também já estão a ser trucidados pelo trabalho real que sobra, uma vez que os outros só trabalham para o papel.

J. L. Pio Abreu

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