quinta-feira, 30 de abril de 2015

NÓVOA e o PS - labirinto fatal?



Nóvoa mergulhou formalmente na sua aventura presidencial. Falta saber se chegará á outra margem. Parece suficientemente robusto e apoiado, para não soçobrar na difícil terra de ninguém das primeiras braçadas. Se o xadrez de candidatos da primeira volta for o previsível e não emergir um candidato surpresa que, em maior ou menor grau, perturbe o esperado, Nóvoa tem boas hipóteses de ir à segunda volta. Mas quanto a ser eleito Presidente já as perspetivas são bem diferentes. Aqui a sua candidatura está marcada por um grande ponto de interrogação.

É que Nóvoa tem que esperar que a direita não consiga gerar um candidato unificador, para ela consensual, que seja envolvente e que resulte de um processo de escolha que satisfaça os padrões médios atuais da decência. Pelo contrário, basta que isso aconteça para que as suas dificuldades aumentem muito.

Mas Nóvoa tem também que concitar o apoio de todas as esquerdas. O apoio e quiçá o entusiasmo mobilizador. Tem que desse modo receber o apoio dos partidos com uma maior base eleitoral, PS, PCP e BE. Mas tem que receber esse apoio de modo a que ele se possa converter, natural e eficazmente, no apoio dos respetivos eleitorados.

No caso do PCP, sabe-se que costuma ser forte a capacidade para as instâncias dirigentes do partido projetarem as suas escolhas no respetivo eleitorado. No caso do BE, essa capacidade, sendo aparentemente menor, é ainda relevante. Mas quanto ao PS as coisas são bem diferentes. A obediência do eleitorado às indicações do partido está longe de ser incondicional e resulta de diversos fatores: o prestígio do candidato no seio do partido, o grau de afetividade do povo socialista para com ele, a intensidade com que seja apoiado pelas estruturas partidárias, o nível de democraticidade do processo de escolha e a existência ou não de outros candidatos que sejam pelos eleitores socialistas sentidos como próximos e relevantes. Nos últimos anos, tem ganho terreno a defesa de eleições primárias para escolha de todos os candidatos do PS às diversas eleições. Recordem-se as primárias para escolha do candidato a primeiro-ministro. Cresce a convicção de que, se nas duas últimas eleições presidenciais o candidato apoiado pelo PS tivesse sido escolhido em primárias, Cavaco não teria ganho.  

Perfilam-se assim algumas nuvens de incerteza quanto à medida em que o eleitorado socialistas seguirá a orientação do partido se a escolha recair em Nóvoa.  O problema é que esta parcela do eleitorado é mais do que o dobro do conjunto das parcelas correspondentes às outras esquerdas. 

Mas somam-se indícios de que a candidatura em causa se está deixar envolver em algumas ambiguidades estruturais. Por exemplo, afirma-se como impulso regenerador da vida politica e sente-se confortável com o apoio do PS, mesmo que ele não seja resultado de primárias; afixa uma imagem de independência, mas coloca-se na fila dos ex-presidentes que são militantes do PS como se fizesse parte dela; tenta sugerir-se como fator de congregação das esquerdas, mas revela-se cético quanto à perenidade da clivagem esquerda direita; omite no seu discurso qualquer tonalidade crítica do sistema capitalista, mas assume objetivos que entram em colisão com a perenidade desse sistema; afixa uma independência altaneira em face dos partidos, mas esforça-se por sugerir o apoio tácito do PS. Enfim, parece prisioneiro de uma incongruência, mais ou menos visível, entre alguns objetivos gerais populares , especialmente á esquerda,  e a imagem estrutural que a sua candidatura projeta.

De momento, o PS parece apostar na tática de deixar que pensem que vê Nóvoa com bons olhos, sem contudo se comprometer formalmente com ele. Corre vários riscos. Se a candidatura ganhar asas, pode aparecer como pouco relevante para esse começo de êxito, sendo-lhe no entanto muito difícil deixar de a apoiar. Se a candidatura se atolar na irrelevância, terá muita dificuldade em patrocinar um candidato sucedâneo. Podendo parecer subtil, o PS parece ter-se deixado apanhar numa ratoeira. Deixa que pareça ter tido que engolir um candidato que veio de fora e não pode assumir o ónus de suscitar outro.

Por outro lado, é natural que se procure aumentar a energia eleitoral das candidaturas do PS nas legislativas, através da sinergia com um candidato presidencial suficientemente forte para ser capaz de ter esse efeito político. Ora, se o PS realmente vier a apostar em Nóvoa, parece claro que estamos muito longe de poder esperar desse apoio um qualquer impulso favorável ao PS nas legislativas.

Tudo isto faz recear que uma opção pelo candidato Nóvoa , tomada por uma decisão formal do PS, daqui a algum tempo, não seja seguida por uma parte do seu eleitorado, incomodada pelo método autocrático da escolha e pouco identificada afetivamente com ela. Se isso acontecer, perde Nóvoa como candidato, perde o PS e ganha a direita. Se isso acontecer, fica à mostra o erro político cometido. Melhor, seria evitá-lo.

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