quinta-feira, 23 de abril de 2015

V ariações em Nóvoa


Anuncia-se intensamente o anúncio da candidatura de Sampaio da  Nóvoa.

Tudo indica que será uma candidatura robusta. Mas uma abordagem realista mostrará que,  tal como se desenha o cenário dos candidatos, dificilmente será o vencedor. Apresenta-se, no cenário atual, como possível contendor na 2ª volta, mas mostra-se como um provável perdedor dessa segunda contenda. Há problemas no seu caminho que poderá ainda  resolver a seu tempo.

 No entanto, há um que parece tender a complicar-se e que lhe pode ser fatal: o modo como se tem vindo  a relacionar com o eleitorado do PS.É uma dificuldade, aliás, suscitada quer  pelo modo como se tem vindo a impor como candidato, quer pelo modo como a direção do PS tem lidado com essa ( pelo menos) aparente imposição. De facto, nas atuais circunstâncias, depois de terem sido alvitrados nomes que se autoapagaram e nomes que obtiveram um eco demasiado discreto, traduzindo sensibilidades distintas dentro do PS e do seu eleitorado,  o nome de Nóvoa, ou o de qualquer outro potencial candidato, só logrará um apoio sólido da parte ( do eleitorado) do PS se resultar de uma decisão tomada em eleições primárias realmente abertas ( modelo francês). Ignorar isto, é brincar com o fogo, pois mesmo que as instâncias dirigentes do PS alcancem uma aparência unanimista em torno de um candidato, seja ele qual for entre os possíveis, sempre se correrá o risco de o eleitorado se rebelar , farto de ser posto perante factos consumado.

Mas se o candidato apoiado vier a ser um independente que, como Nóvoa, tenha afirmado publicamente que o seu "herói" de referência é Eanes, enquanto Presidente da República, as dificuldades podem crescer ainda mais. O eleitorado que vota habitualmente no PS pode legitimamente interrogar-se sobre essa admiração tão estruturante. É um sinal de que Nóvoa se fosse eleito faria o que fez Eanes? Ou seja, procurar destruir o PS, criando um novo partido político que tente  substituir o PS, disputando-lhe a mesma área, a partir do  cargo de Presidente da República.

Por mim, enquanto eleitor preciso de ver por completo apagada a dúvida, criada por Nóvoa, quanto ao seu próprio desígnio. Não faria sentido que votasse num candidato que tem como desígnio, mais ou menos claro, a destruição do partido a que pertenço; ou que, pelo menos, escolhe como referência alguém que o tentou no passado , sem êxito mas com um elevado preço político que todos os portugueses pagaram , em especial  o povo de esquerda.

Mas se, contra toda a razoabilidade política, a direção do PS vier a optar pela via estreita que se receia, isso tem um outro efeito colateral negativo: dificulta uma outra candidatura verdadeiramente a sério apoiada pelo PS, amarrando-o assim   à sorte incerta do candidato Nóvoa. E isso, repito, pode ser fatal. É que , não sendo suficiente o apoio da generalidade do eleitorado do PS, sem esse apoio a vitória nas presidenciais de um candidato de esquerda é uma miragem. E esse apoio de muitas centenas de milhar de eleitores nunca é o resultado automático de um ordem de serviço burocrático-política, mas sim a consequência amadurecida de um envolvimento profundo desse eleitorado no processo de escolha e de afirmação de um candidato, que é possível estimular, mas que não se estimula de qualquer maneira.

 Receio que os vários protagonistas ( diretos e indiretos) do referido processo de candidatura se tenham deixado  reduzir a quase-autómatos políticos que seguem um roteiro que sabem intuitivamente que os vai conduzir à derrota, mas do qual não sabem como fugir. O PS está a deixar-se envolver nesse automatismo fatal. É ainda tempo de lhe escapar, parecendo claro que para isso  não chegará a repetição até à  exaustão da subalternidade das eleições presidenciais em face das legislativas.

Se tudo acabar realmente por correr mal, será fácil que os vários protagonistas se culpem mutuamente. E, nessa hipótese, até talvez, todos eles tenham alguma razão. Só que, nesse caso, não poderão esquecer-se de assumir também as culpas próprias. Não lhes pode faltar a lucidez de assumirem as eventuais culpas próprias. Por mim , preferia que os acontecimentos tornassem tudo isso desnecessário, mas tenho algum receio que assim não seja.

2 comentários:

JGama disse...

Concordo inteiramente com esta tua análise. O eleitorado terá em conta as razões políticas e a própria empatia (o pathos do candiadato). Há uma temperatura baixa quanto a este 2º factor.
As primárias seriam esclarecedoras.

Humberto Umbrais disse...

Enquanto indivíduo, ninguém pode negar a Sampaio da Nóvoa os seus méritos académicos. Pode ser uma presença valorizadora, por exemplo, se lhe couber fazer a intervenção principal durante o lançamento de um livro ou durante a homenagem a alguma figura ilustre da nossa cultura e história. Até fala bem... Até dá gosto assistir a uma palestra por ele proferida. É uma presença agradável em qualquer mesa, redonda ou não.
Enquanto candidato presidenciável, Sampaio da Nóvoa é uma presença ausente.