Publico hoje o último poema do Livro
das Ignorãças, do qual é autor Manoel de
Barros, poeta brasileiro nascido em 1916 e falecido em 2014. Advogado, fazendeiro e poeta, é um dos
expoentes da poesia brasileira do século XX, mas a sua criatividade ousada
transbordou para o século atual e
prepara-se para ocupar um lugar de relevo no futuro da poesia e da língua portuguesa.
AUTO-RETRATO
FALADO
-Manoel
de Barros
Marinha,
onde nasci.
Me criei no Pantanal de Corumbá, ente bichos do
chão,
pessoas humildes, aves, árvores e rios.
Aprecio viver em lugares decadentes por gosto de
estar entre pedras e lagartos.
Fazer o desprezível ser prezado é coisa que me
apraz.
Já publiquei 10 livros de poesia; ao publicá-los me
sinto
como que desonrado e fujo para o
Pantanal
onde sou abençoado a garças.
Me procurei a vida inteira e não me achei --- pelo
que
fui salvo.
Descobri que todos os caminhos levam à ignorância.
Não fui para a sarjeta porque herdei uma fazenda de
gado.
Os bois me recriam.
Agora eu sou tão ocaso!
Estou na categoria de sofrer do moral, porque só
faço
coisas inúteis.
No meu morrer tem uma dor de árvore.
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