segunda-feira, 7 de junho de 2010

Várias esquerdas, uma vontade


1. Na Comissão Nacional do Partido Socialista votei o apoio à candidatura do Manuel Alegre, tendo sido um dos participantes que expressamente interveio, defendendo essa posição. Nem talvez eu conseguisse, nem teria interesse reproduzir essa intervenção, mas talvez valha a pena indicar o sentido geral daquilo que disse.
Comecei por apoiar a proposta de José Sócrates e o modo como a apresentou e justificou. Foi uma proposta directa, simples e clara. A opção pela candidatura de Alegre baseou-se politicamente, no essencial, no facto de ela ser inequivocamente progressista, o que tornava natural que o PS com ela substancialmente se identificasse. Não se estava a escolher um candidato do PS. Estava a dar-se apoio, expresso e oficial, a um candidato que já existia.
Sem pôr em causa a sua independência, a sua vitória passava a ser um objectivo político central do PS. Sócrates deixou bem claro que o PS nunca poderia ter como opção a não escolha, ou seja, uma hipotética liberdade de voto, concedida aos seus militantes e apoiantes, que alguns opositores de Alegre tinham defendido. Foi também peremptório a garantir que o PS assumia a sua posição sem reserva mental e sem meias tintas. O que estava em causa era apoiar ou não um candidato, nunca uma opção de meias tintas. Propunha o apoio a Manuel Alegre; e fazendo-o, queria que o PS procurasse pesar nesse prato da balança com toda a sua força. No respeito pleno pela autonomia da candidatura e pela independência do candidato, procuraria fazer tudo para que Alegre fosse eleito.Foi esta atitude que eu e muitos outros apoiámos.
Sublinhei depois que a política não devia ser guiada por emoções. Devia pôr-se emoção na maneira racional de fazer política. Se eu me tivesse guiado por emoções, teria apoiado Manuel Alegre na eleição anterior, pois era amigo dele há décadas, não conhecendo então pessoalmente Mário Soares. Mas foi a este e não a Alegre que apoiei, por uma escolha racional que me pareceu certa e na qual pesou o que eu entendia ser nessa circunstância o interesse do PS, da esquerda e do país.
Por uma razão idêntica, apoio agora Manuel Alegre. Aliás, há alguns meses já que declarei publicamente esse apoio.Valorizei a escolha proposta, como uma das movimentações estratégicas necessárias ao PS (uma das movimentações, mas não a única), para não se deixar encurralar numa espécie de reduto simbólico, no qual apenas lhe fosse dado resistir. Ora, a resistência, mesmo que valente, não basta, por si só. Não será suficiente para sobrevivermos como força organizada, actuante e institucionalmente relevante, aos ferozes bombardeamentos políticos que, provavelmente, nos esperam num futuro próximo.
Depois de mais algumas breves considerações nesse registo, concluí sustentado a ideia de que, devendo-se sempre lutar para vencer, era importante combater-se bem, pois só assim se poderá pensar em ganhar. E se, mesmo combatendo-se bem, não se conseguisse ganhar, o efeito político obtido seria, seguramente, positivo para o PS, para a esquerda em geral e para o país.

2. Fazendo agora um comentário breve ao significado político da candidatura de Alegre, penso que a sua grande força estratégica está no facto de a sua independência não ser uma contrariedade que tenham que digerir as forças políticas que resolvam apoiá-la, mas pelo contrário algo que convém a essas forças. A sua força táctica está no facto de o candidato, ao ser ele próprio com plena autonomia, estar em consonância plena com aqueles que o apoiam.
É claro, que isto será tanto mais assim quanto Alegre consiga executar com plena eficácia uma orientação geral que valorize os grandes eixos de desenvolvimento de uma sociedade mais justa, no quadro de uma democracia em constante aperfeiçoamento, de modo a que no horizonte se perfile o fim dos pesadelos sociais que sobre eles hoje se abatem. Se ele conseguir fixar as grandes linhas de uma esperança progressista , congregando-as num desígnio nacional que prossiga na senda de Abril e se assuma como plenamente identificado com a nossa actual Constituição, fará tudo o que lhe compete e tornará possível que um leque diversificado de opções políticas dentro da esquerda , sem reserva mental, vejam na sua candidatura um passo muito importante para fazer sair os actuais humilhados, excluídos e desfavorecidos, do pesadelo para onde os arrastaram.
Não se espera que, nem o candidato, nem as forças que o apoiam, renunciem aos seus objectivos próprios ou às suas convicções, espera-se que ganhe solidez uma confluência natural de interesses políticos, uma ideia de complementaridade na diversidade, viradas para o futuro e para a construção de uma sociedade justa e livre.

2 comentários:

Carta a Garcia disse...

Caro Rui,
Muito bom. Fiz link para "A Carta Garcia".Obrigado.
Abraço,

Osvaldo Castro

Luis Marinho disse...

Excelente,justo e mobilizador!