domingo, 23 de agosto de 2009

Impulso extravagente


Ouvi nos noticiários televisivos que o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público defendeu publicamente que devia ser aberto um inquérito criminal pelo MP ao acidente na Praia Maria Luísa, que originou cinco mortos.

Provavelmente, é uma iniciativa que se justifica. Mas seguramente que está fora da competência do Sindicato tomar posição pública sobre isso. De facto, se ele tivesse legitimidade para isso, estaria instalado, em seu benefício, um estranho confisco de parte de uma competência pública, sem que nenhuma instância com legitimidade democrática lha tivesse delegado.

Não é esta a primeira vez que tal Sindicato sai claramente da sua esfera de acção, para se intrometer em áreas de competência que, mesmo que possam caber ao Ministério Público, enquanto instituição constitucionalmente desenhada no quadro do nosso sistema jurídico, de modo nenhum podem ser capturadas por qualquer Sindicato, mesmo que represente os cidadãos que desempenham funções nessa instituição.

Será este, um simples delírio estival ou, mais do que isso,um dano colateral da lenta sedimentação, ocorrida ao longo de vários mandatos e de muitos anos, dos automatismos próprios do que alguns têm chamado uma concertação de “vodka” com “laranja”?

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Os dislates de vó-vó rabujenta


"Não quero saber se há escutas ou não. As pessoas sentem que há" ─ eis a pérola de Manuela Ferreira Leite, citada com destaque pela imprensa matutina de hoje.

Estando em causa uma grave imputação, envolvendo potencialmente dois órgãos de soberania, não teria mais gravidade se a nossa Dama de Cinza tivesses dito: "Não quero saber se a matou ou não. As pessoas sentem que sim". Ou então: "Não quero saber se roubou ou não. As pessoas sentem que roubou".

É esta senhora, rabujenta e impulsiva, que queremos como primeira figura do Governo de Portugal ?

É esta a paixão pela verdade que há meses MFL tem vindo a proclamar numa profusão de cartazes, por todo o país ?

Ideias


O pensamento da semana, atribuído a Pilica de Azevedo, futura Marquesa da Maresia:


" A monarquia é gira. Pecebe?"

Pixordices - 30 - Faltas de ar



A senhora tem falta de ar. Sente-se asfixiada. Toldada pela agitação dos tempos, embriagada pelo perfume de eleições teve uma intuição aguda: só pode ser uma asfixia democrática.


E, gostando pouco ou nada de Sócrates e do PS, há uma certeza ainda mais funda que a possui : só pode ser uma asfixia democrática provocada pelo PS, pelo governo do PS.


Compreendo: a senhora sentiu-se sempre confortável antes do 25 de Abril de 1974, não havendo qualquer sinal público de que então tenha resistido à asfixia realmente existente ou que sequer se tenha sentido afrontada por ela, pelo que, verdadeiramente, não sabe o que é uma asfixia política.


A direita é assim: quando não a deixam exercer sem peias o poder absoluto dos seus interesses e privilégios, aos quais julga ter direito por cominação divina, sempre grita como se a estivessem a asfixiar.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

A verdade como engano

Há uma regra de ouro nas estratégias de propaganda política: cada um deve exagerar naquilo que pensa que lhe falta.

Por isso, uma das coisas que me intrigava na propaganda do PSD era o facto de MFL insistir tanto, na verdade, na ética, elevando-as a um patamar de quase santidade, que só ela alega poder garantir. E intrigava-me isso, pelo facto de a referida senhora não ter uma imagem negativa nesses campos, que pudesse obrigá-la a carregar tanto nas tintas de uma invocada virtude própria.


Mas a naturalidade, com que acolheu nas listas de deputados do PSD, alguém já pronunciado e prestes a ser julgado, abriu uma primeira janela de esclarecimento quanto à raiz de uma tão ostensiva campanha de paixão pela verdade e pela virtude. De facto, parece visível que, sabendo MFL com que tipo de partido pode contar, achou prudente maquilhar-se, sôfrega e preventivamente, com as cores da verdade e da virtude.


Dizem-me que na entrevista de ontem, valorizou especialmente esse registo. Porquê? - hão-de perguntar. Talvez na esperança de fazer esquecer eventuais episódios de que a integração nas listas do PSD de um elemento que está á beira de ser julgado é um exemplo gritante. Consegui-lo- á ?

Inimigos de si próprios


Há os que sustentam a existência de um cabalístico arco constitucional, dentro do qual colocam o PS, o PSD e o PP, para a partir dessa visão esotérica da política, defenderem o imperativo nacional de transformar o PS num servo venerador e obrigado da direita.


Há os que imaginam o PS como parte da direita, para daí retirarem sentido à necessidade de o terem como parceiro na luta contra a direita realmente existente, ou seja, PSD e PP.


Os primeiros procuram atrair o PS, por intermédio de uma operação de verdadeira bruxaria política que lhes convém, para o seu próprio pântano político.


Os segundos procuram empurrar o PS de modo a que se afaste tanto deles que torne impossível a cooperação.


Percebo os primeiros: que a direita siga uma estratégia que a beneficia é algo que se revela como lógico.


Espantam-me os segundos: que uma parte da esquerda empurre a outra parte para longe de si, é algo que apenas reforça a direita e dificulta a cooperação entre as esquerdas.

A verdade silenciada sobre as Honduras


Através do diário espanhol “Público” foi hoje difundido o texto que abaixo transcrevo, com a devida vénia. O seu autor é Vicenç Navarro, Catedrático de Políticas Públicas da Universidade Pompeu Fabra (Espanha) e Professor de Policy Studies na Universidade John Hopkins (USA).Eis o texto:

La verdad silenciada de Honduras
Vicenç Navarro

La interpretación más generalizada del porqué hubo un golpe militar en Honduras (reproducida en los cinco rotativos de mayor distribución en España) es que este ocurrió para parar el intento del presidente Zelaya de “perpetuarse en el poder”. El diario más activo en la promoción de esta explicación del golpe militar ha sido La Vanguardia cuyo corresponsal en América Latina, Joaquim Ibarz, entrevistó nada menos que al general que realizó el golpe, Romeo Vásquez, dándole la oportunidad de que lo justificara, indicando que la intervención militar era plenamente constitucional, necesaria para impedir que Zelaya se perpetuara en el poder. Ibarz entrevistó también al cardenal Óscar Rodríguez Madariaga, arzobispo de Tegucigalpa, que justificó también el golpe refiriéndose a la necesidad de recuperar la legalidad, interrumpida por el presidente Zelaya. Es interesante subrayar que hace 70 años, en España, La Vanguardia –entonces llamada La Vanguardia Española (propiedad de la familia Godó, que apoyó el golpe militar de 1936)– justificó el golpe del general Franco contra el Frente Popular, con argumentos semejantes a los utilizados ahora por los golpistas en Honduras. Según La Vanguardia Española (18-07-40), el Gobierno del Frente Popular, democráticamente elegido, había violado la Constitución, siendo necesario su derrocamiento por parte del alzamiento nacional para recuperar la legalidad.
El sesgo conservador de la cobertura mediática de lo que ocurre en Honduras explica que ninguno de aquellos cinco rotativos haya entrevistado a personalidades hondureñas conocidas por su oposición al golpe militar. De haberlo hecho, tal como lo han hecho varios medios en EEUU, los lectores de tales rotativos tendrían información de la que hoy carecen. Además de entrevistar al cardenal progolpista, Óscar Rodríguez Madariaga, La Vanguardia podría haber entrevistado, por ejemplo, al arzobispo hondureño de Copán, Luis Alfonso Santos Villena, quien en las entrevistas que dio al Catholic News Service (04-08-09) y a la cadena de televisión CNN (06-08-09) indicó que “algunos dicen que Manuel Zelaya amenazó a la democracia al proponer cambiar la Constitución. Pero los pobres de Honduras saben que Zelaya subió el salario mínimo. Esto es lo que conocen. De lo que ellos son conscientes es de que defendió a los pobres. Esta es la razón por la que ahora están en la calle, bloqueando carreteras y pidiendo la vuelta de Zelaya”.
El presidente Zelaya, entre otras muchas medidas populares, dobló el salario mínimo, medida que enojó a la patronal hondureña; proveyó comidas gratuitas en las escuelas (el 72% de los niños hondureños en zonas rurales tienen problemas de malnutrición) y vetó la propuesta de la Asamblea Nacional de prohibir la utilización de la píldora postcoital. Estas políticas cambiaron la actitud de las clases populares hacia el Gobierno Zelaya. Tal como señaló el dirigente campesino Rafael Alegría, “Zelaya dio esperanza al pueblo”. Los sindicatos y campesinos, así como la población indígena, fueron apoyando a Zelaya que, al proceder del establishment hondureño, había tenido a tales sectores en contra. Pero en la medida que estas fuerzas populares fueron apoyando a Zelaya, la oligarquía fue movilizándose para parar tal proceso. Tal como indicó el arzobispo Luis Alfonso Santos: “Es un error asumir (como hacen los medios) que Honduras tuviera una democracia y que la Asamblea Nacional representara a la mayoría de la población hondureña. En realidad, nunca hubo democracia en Honduras. Lo que tenemos es un sistema electoral donde a la población se le ofrece la oportunidad de escoger entre candidatos que han sido elegidos por la élite política. La población no está representada ni por la Asamblea ni por la Corte Suprema, escogidas por los ricos del país. Somos el país más corrupto de Centroamérica. No podemos decir que tengamos una democracia en la que la población participe en las decisiones”.
En realidad, incluso el Departamento de Estado de EEUU en su informe sobre los “Derechos Humanos en Honduras en 2008” había indicado que “aunque la Constitución (hondureña) habla de un sistema jurídico independiente, tal sistema está muy poco financiado con muy escasos recursos, sujeto a una corruptela clientelar y a múltiples influencia políticas. La Corte Suprema nombrada por los dos grandes partidos carece de autonomía y está claramente influenciada políticamente, dentro de una cultura de corrupción”. Fue esta Corte Suprema la que ordenó la detención del presidente siguiendo las órdenes de los dos partidos políticos que dominaban la Asamblea Nacional.El nuevo presidente, Roberto Micheletti, fue una voz poderosa durante la dictadura militar y el Gobierno autoritario que le siguió. Según The New York Times (08-08-09), su jefe de campaña en las últimas elecciones, Billy Joya, fue dirigente de la Policía política en los años ochenta, responsable de las torturas y desapariciones que caracterizaron aquel periodo. Hoy es asesor del nuevo Gobierno golpista en temas de seguridad. Como señaló el arzobispo Luis Alfonso, “las personas detrás del golpe no eran demócratas. Ellos conspiraron antes para preparar el golpe y luego encontraron los argumentos para justificarlo. A ellos no les importa que niños mueran de hambre o que personas mueran en los hospitales por falta de medicinas” (entrevista del 29 de julio en la radio jesuita Progreso). El nuevo Gobierno ha iniciado una brutal represión que no ha podido parar las continuas movilizaciones populares y huelgas en contra del golpe.
En EEUU, el máximo defensor del Gobierno golpista es el abogado Lanny Davis, que representa a la Cámara de Comercio de Honduras y que fue, en su día, el representante legal de la dictadura paquistaní del general Musharraf. Hoy asesora, también, al mundo empresarial estadounidense en su intento de hacer fracasar la propuesta de ley que facilitaría la sindicalización de los trabajadores en EEUU. Fue también asesor del presidente Clinton y de la candidata Hillary Clinton, que hoy es la persona del Gobierno de Obama más tolerante con el Gobierno golpista. Todos estos datos son desconocidos por los lectores de aquellos cinco rotativos.
Vicenç Navarro es Catedrático de Políticas Públicas de la Universidad Pompeu Fabra y Profesor de Policy Studies en The Johns Hopkins University

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Pixordices 29- Os tontos não compram malmequeres...


Tem-me espantado particularmente o péssimo estado em que parecem estar os neurónios de algumas figuras públicas e de alguns comentadores da comunicação social.

Esse estado tem sido evidenciado a partir de diversos acontecimentos, ou melhor, do modo como são comentados esses acontecimentos.

Um dos exemplos mais gritantes foi aquele que resultou de um comentário mais agreste, feito por dirigentes do PS, a propósito de notícias vindas a público e não desmentidas, atribuindo a colaboradores da Presidência da República um papel activo na preparação do programa eleitoral do PSD.

Pois bem, a escassez de neurónios que não estejam de férias deve ter feito com que da PR, em vez de terem confirmado ou desmentido (talvez por acharem que, lá no Olimpo onde se julgam, não se cultivem confirmações ou desmentidos), tenham denunciado eventuais escutas de que estariam a ser vítimas. E isto não por terem qualquer evidência de que assim acontecia, mas numa pose agarotada querendo dizer que o PS só podia saber de uma colaboração de gente da PR no programa do PSD se tivesse montado escutas à Presidência da República. O “chico esperto” que congeminou essa triste piada de mau gosto, estava aliás com ela a confirmar a veracidade da imputação do PS, o que verdadeiramente é o único facto político realmente escandaloso, nesta xaropada.

Apesar disso, foram vários os plumitivos que gravemente regougaram censuras ao Governo, por não ter desmentido logo solenemente a “garotada” praticada por alguns dos raros neurónios que povoam neste Agosto o Palácio de Belém. Por isso, quando falou de “disparates de Verão” Sócrates reagiu no registo devido. Não vale a pena dar solenidade a dislates tontos.

Espera-se agora que o PR esclareça qual dos porteiros do Palácio foi colocado em serviço de relações públicas nesta época estival, tendo deixado escapar inadvertidamente para a comunicação social a "palermice" das escutas.

domingo, 16 de agosto de 2009

Aqui há gato!

com a devida vénia, transcrevo do blog Bich0 carpinteiro, o texto do Medeiros ferreira que se segue.



SEGUNDA-FEIRA, AGOSTO 10, 2009

Porque teria de ser o governo?

Passei o fim de semana a cismar porque teria de ser o Governo a indicar o nome de João Lobo Antunes para o Conselho Nacional de Ética, de entre os 3 que lhe são atribuídos, enquanto a AR elege 6, e uma série de corporações indica mais 8. Eu próprio tenho alguma experiência de nomeações não consumadas, mas ,fora o critério da boa vontade, não vejo neste caso porque teria de ser o Governo a indicar um nome sugerido por Cavaco Silva nos 3 lugares que dispunha num total de 17, segundo a recente lei que regula este orgão de consulta da AR. Aqui há gato.

E permito-me acrescentar: gato, e dos gordos !

sábado, 15 de agosto de 2009

A coligação das "Parcas"

As quatro “parcas” tristes da oposição declamaram, com a habitual pose dramática de um pessimismo triste, as suas deixas sombrias, a propósito do desemprego. Serviram-se, uma vez mais, dos desempregados como simples pedradas conjunturais atiradas raivosamente ao Governo do PS.

Todos esqueceram que, no plano mundial, estamos a atravessar a maior crise dos últimos oitenta anos. Todos esqueceram que os receios eram, há uns meses atrás, de um verdadeiro desmoronamento económico mundial que arrastaria o nosso país para dificuldades que apenas podemos imaginar. Contra esse risco, o Governo bateu-se. Pode evidentemente questionar-se o acerto de todas as medidas, mas é mistificatório ignorar o arreganho do Governo no combate à crise e não condiz com a realidade dizer que, nesse aspecto, a sua política foi um desastre. Mas pretender , simplesmente, comparar os números actuais com os do ano passado, ou com os dos últimos anos, desconsiderando por completo a existência de uma crise mundial do capitalismo, com especiais reflexos nos USA e na Europa, para tentar imputar ao governo português o exclusivo da responsabilidade pela crise em estamos mergulhados, é uma manifestação de cegueira política e de um sectarismo primário.

Anteontem, as lideranças do partido do Governo, mostraram natural satisfação pelo facto de os dados europeus terem indicado que o último trimestre foi melhor do que aquilo que era esperado pelos especialistas, tendo até, no caso de Portugal, da Alemanha, da França, da Grécia e da Eslováquia, havido uma ligeira subida do PIB por comparação com o trimestre anterior. Ou seja, entre os vinte e sete da União Europeia, Portugal era um dos cinco países que recebeu essas boas notícias. Sócrates e Teixeira dos Santos, sem deixarem de se congratular com as notícias, sublinharam que não se devia considerar a crise como terminada, dizendo o primeiro que, quando muito (quando muito - eu ouvi bem!) se podia considerar que isto era o princípio do fim da crise. Tanto bastou para que todas as “Parcas” da oposição se tivessem assanhado, dizendo que o Primeiro-ministro era um optimista irresponsável.

Aliás, quem tiver estado atento terá verificado que os representantes dos Partidos da oposição corrigiram, de um modo mais ou menos marcado, nas declarações posteriores, as primeiras declarações que, na verdade, foram uma grosseira mistura de má fé política e indigência intelectual.

Vários analistas e pelo menos o Ministro do Trabalho disseram anteontem que era natural que o desemprego continuasse a subir, mesmo depois da inflexão de tendência da economia em geral que se havia verificado. O Ministro do Trabalho sublinhou mesmo a constância dessa tendência geral de desfasamento entre as duas dinâmicas. Pois, apesar disso, logo que se soube que, como o próprio Governo admitira anteontem como provável, o desemprego subira, embora a um nível inferior ao esperado, as “Parcas” apressaram-se a proclamar que isto mostrava que o que o Governo afirmara na véspera estava assim a ser desmentido.

Aliás, é curioso verificar que perante uma notícia favorável e uma outra desfavorável quanto à evolução socioeconómica as “Parcas” reagiram da mesma maneira:
“Chove? O governo é o culpado!”
“ Faz algum sol? O Governo é culpado por não haver mais sol ! Aliás, haver sol nem sequer é importante”.


Está pois tudo a voltar ao normal, a voltar inesperadamente ao normal, a voltar ao antes das eleições europeias, à “coligação canguru”, à coligação negativa contra o PS que parece ter recuperado convergência e afinação. Mas enquanto o PSD e o PP têm uma estratégia precisa (colocar no Governo a direita sob a liderança da Dama de Cinza) o BE e o PCP, não assumem a via que objectivamente estão a seguir: ao atacarem ferozmente o PS e o actual governo estão objectivamente a favorecer a eclosão de um governo de direita liderado pelo PSD. Na verdade, mesmo que possam não o querer, o resultado mais provável do modo como têm feito o combate político ao PS é o de contribuírem decisivamente para que isso aconteça. E, para que não haja dúvidas, têm vindo a sublinhar que cooperação política com o PS, nem pensar!

A subalternidade estratégica da oposição de esquerda, em face da oposição de direita, está aliás bem patente na verdadeira fusão política que ambas puseram em prática, ao atribuírem à política do governo do PS a principal responsabilidade pelo eclodir da actual crise. Na verdade, o que seria de esperar de uma oposição de esquerda, que realmente o fosse, na actual conjuntura, era a valorização da decadência global do capitalismo como factor central da crise e nunca a de quaisquer factores conjunturais, como é o caso das políticas sociais ou da política económica de um qualquer governo.

Tudo isto implica que, independentemente das intenções subjectivas e dos sentimentos das pessoas que integram as direcções políticas do BE e do PCP, estes partidos fizeram um tipo de oposição e têm feito uma campanha nas últimas semanas, cuja lógica é a de contribuírem para uma solução governativa que unifique todas as actuais oposições ao PS e ao governo actual. Naturalmente, que uma solução dessas será naturalmente liderada pela dirigente máxima do PSD.

Assim, a mensagem subliminar de todas as campanhas das oposições ao actual governo é simples: Votem contra o PS, de modo a fazer com que não seja do PS o próximo Governo!

Ora, como não se vê que, não sendo do PS o próximo governo, possa ser outro do que um governo liderado pela Dra. Manuela Ferreira Leite, as oposições de esquerda estão objectivamente a fazer campanha pela leader do PSD.

Portanto, os eleitores têm pela frente uma escolha simples: votam no PS ou votam na coligação das “Parcas”.
E quando digo que a escolha é simples não estou a dizer que o actual governo é perfeito, que não precisa de corrigir algumas das suas políticas ou sequer que a linha de orientação dominante actualmente no PS merece a minha concordância completa. Por exemplo, também o PS devia ser mais consequente com a sua demarcação em face do neoliberalismo, colocando expressamente no horizonte a superação do capitalismo como a condição essencial para uma efectiva saída da crise, sem riscos de rápido retorno.
Mas sei que, para quem for de esquerda, levar as discordâncias com o PS até ao ponto de contribuir para reinstalar a direita no poder, além de ser um erro estratégico, é verdadeiramente uma auto-flagelação.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

O estranho caso da mulher silenciosa


Um esgar esquálido atravessou-lhe o rosto, numa tentativa de sorriso. A pergunta questionava-a sobre as listas do PSD. E, quando se esperava o esclarecimento cabal das dúvidas levantadas, ou algo que se pudesse assemelhar a isso, a pérola caiu imprevistamente: estava muito orgulhosa pelo facto de se preocuparem com as listas do PSD. E estava tudo dito.

Quiseram saber ainda o que pensava a senhora sobre um artigo de Sócrates, saído no JN. Quando esperavam que o estilete aguçado da sua imensa sabedoria reduzisse a pó os assomos políticos do dirigente do PS, ei-la que se recusa a comentar, em vésperas de eleições, afirmando uma ladainha qualquer sobre o que ela acha que o povo português pensa e vai fazer.
Quando lhe perguntaram por que razão há nas listas do PSD candidatos a contas com processos judiciais, esperando talvez uma explicação clara e esclarecedora, limita-se afinal a dizer que eles já eram deputados antes e que já outros os tinham posto em listas sem ninguém reclamar. De substancial, zero.
A senhora tem a pose solene dos maduros que abarrotam de experiências e vivências, mas, chegada aos momentos decisivos, limita-se a sair de cena sem nada dizer, numa pose algo semelhante à de um pavão que não sabe escapar a um sorriso amarelo.
A senhora é, afinal, uma simples pastora de silêncios embaraçados, atingível, como se vê, pela sombra de interesses pouco frequentáveis, estando, assim, longe de ser aquela poderosa águia da verdade que empenhadamente nos aponta o futuro.
A senhora, essa preciosa dama de cinza, é, no fundo, o rosto sombrio e crepuscular do passado, a resmungar, a advertir, a amedrontar. A senhora, como luninosamente lembrou o Pio Abreu, é, realmente, no essencial ( e sem menosprezo) uma nova e autêntica "Velha do Restelo".

domingo, 9 de agosto de 2009

A aristocracia dos interesses

Julgam-se a aristocracia da direita. Medem a própria ferocidade pela rasteirice dos insultos com que julgam apoucar tudo o que lhes cheire, ainda que vagamente, a esquerda.
Nesta quadra eleitoral, estão especialmente excitados, numa sofreguidão de atacar o governo, de combaterem tudo o que julgam poder pôr em risco o poder dos seus senhores. Gulosos, sonham-se já assessores, chefes de gabinete, avençados de luxo ou mesmo, quem sabe, secretários de Estado.
Os poderes fácticos abrem-lhes espaço nos seus jornais, onde naturalmente se promovem também os seus blogs.
Se a História lhes tivesse concedido a graça de ter feito durar a "outra senhora" seriam hoje eis-esperanças da Mocidade Portuguesa ou "eis-rebeldes" do Jovem Portugal, a caminho de um destino marcado: assessores, chefes de gabinete, avençados de luxo ou mesmo, quem sabe, secretários de Estado, de um governo liderado por um qualquer Salazar empalhado que ficcionasse a sua própria eternidade.
Julgam-se leões de uma direita feroz, modernaça e tecnocrática, mas para os seus verdadeiros donos são apenas caniches que se podiam levar a passear nas esplanadas chiques da "linha", em tardes modorrentas de descuidada indolência.
Vêem-se já na história, estudados pela filosofia das ideias, ignoram que estão afinal destinados a ser apenas estudados pela zoologia dos interesses.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

À procura do convite perdido...


A vida política, do ponto de vista dos seus protagonistas individuais, não é apenas um jogo algo semelhante ao xadrez, com o seu recurso aos peões para as jogadas mais sujas, com a bênção de alguns bispos, com ousados saltos de cavalo, com o refúgio prudente em algumas torres, com o assédio a algumas rainhas e mesmo, nos ápices decisivos, com tentativas de pôr os reis em cheque; mas não deixa, em parte, de o ser.

Por isso, o episódio do pré-convite feito a Joana Amaral Dias por Paulo Campos, tanto pode ser encarado como uma anedota política com ecos dramáticos, como pode ser lido como uma combinação de manobras que muito se aproximam de movimentos subtis num imaginário tabuleiro de frustrações e ambições. Levemos a sério as narrativas dos interessados e esqueçamos uma possível camada ainda mais funda do episódio que, não deixando de ter interesse, por enquanto, pode ficar adormecida.

Os factos: um dos muitos secretários de estado do actual governo, vendo naufragar uma ambição pacientemente sustentada, ao longo de meses, por uma rede de iniciativas viárias e de subtis sugestões, resolveu tirar um vistoso coelho ( ou, neste caso, com algum humor e o devido respeito, uma coelha) da cartola, talvez com a secreta esperança de se mostrar imprescindível, quiçá, recuperando a hipótese de um primeiro lugar na lista de Coimbra que vira escapar-se-lhe por ente os dedos quando o julgava seguro.
E se bem o pensou, melhor o fez. Foi-se ao telefone e zás: sondou Joana Amaral Dias para ser segunda na lista do PS, por Coimbra. Assarapantada pelo inesperado da sondagem a pré-deputada converteu a inesperada sondagem num convite e, podendo ter corrido à pedrada verbal o insólito sondador, educadamente disse que ia pensar.
O nosso contingente mediático daria bom dinheiro por tais pensamentos, mas adiante. Ouvidos alguns oráculos, consultadas as estrelas, metida a mão na consciência, a sondada declinou o convite e comunicou ao guia espiritual do BE a sua firme e inabalável recusa a tão insólita tentação. Justamente indignado pela demoníaca mensagem do PS o guia supremo explodiu em público, demolindo a subtileza da sondagem e blindando para sempre a firmeza da recusa.

Irremediavelmente longe do primeiro lugar da lista, sem a energia e o peso políticos necessários para lhe abrirem a porta do segundo lugar, tendo lhe escapado a coelha saída da cartola, o jovem secretário de estado achou-se, apesar de tudo, demasiado grande para um terceiro lugar. Recusou ser terceiro. Se foi longe de mais nesta recusa, só o tempo o dirá. Mas quando se aprestava a digerir a nova conjuntura, ocorreu a já referida tempestade mediática tecida pelos enérgicos relâmpagos do guia do BE.

Aí o jovem governante entaramelou-se. Aludiu a contactos pessoais, que nalguns jornais chegaram a íntimos, confessou que tudo não passara de telefonemas entre amigos, para depois modestamente se ficar pelo reconhecimento de que, em comum entre convidante e convidada, havia a apreciável distância de apenas disporem de círculos de amigos comuns. E, olímpico, chegou a imaginar publicamente que lhe assistia a legitimidade para, tendo renunciado majestosamente a ir na lista, conceder a graça de uma substituta que assim generosamente dispensava a uma Federação de Coimbra, deslumbrada e agradecida.

É certo que no fragor da agitação mediática deixara cair a sua falta de mandato para convidar JAD, como banalidade que podia esvair-se nas fraquezas da memória, sem espanto nem estranheza.
De facto, se tudo for como pareceu fazer crer a direcção do PS, o que se registou foi um desvario de um militante do PS que pegou num telefone e convidou uma senhora para ser deputada, candidata a deputada. A senhora foi pensar, sem ter pensado que o convidante era apenas um delirante sem mandato. Pensou, pensou, pensou. E, ao fim de muito pensar e depois de recorrer aos mais reputados oráculos da nossa política, descobriu que a aparente sondagem convidante era muito mais do isso, era um verdadeiro assédio político. Contidamente indignada, avisou o Grande Pregador, embora não tivesse deixado de o fazer sentir subliminarmente que enquanto a sua própria confraria a excluíra das primeiras filas, outras a disputavam sofregamente. Ferido pela grandeza do pecado e temeroso pelo agravar da concorrência, o Grande Pregador trovejou maldições sobre o PS. Excomungou inocentes e pecadores, como um arcanjo vingador desregulado.

É certo que do seio da sua virtuosa organização partira um convite simétrico dirigido às hostes do PS, mas o Grande Pregador nunca perde de vista o essencial: só aos ungidos pela virtude é consentido o pecado.

Ou seja, ao surrealismo político da sondagem, que nem era convite nem estava autorizada, somou-se o angelismo comovente de um repúdio diferido do que tendo começado por ser ouvido como um promissor convite se converteu num reprovável assédio.

sábado, 1 de agosto de 2009

A leal conselheira

Espalharam pelo país milhares de cartazes em que uma circunspecta senhora dá sábios conselhos ao futuro Governo.


Como não é de esperar que se tenha dado a tanto trabalho e a suportar tanta despesa para dar conselhos a si própria, pode concluir-se que ela não espera fazer parte desse novo Governo.


Também é curioso que os cartazes ostentem o emblema de um partido político que quando foi responsável por anteriores Governos ignorou por completo os conselhos que agora distribui.

O veneno dos blocos centrais


No jornal espanhol El País, de hoje, saiu um texto, assinado por Juan Gómez, que de seguida parcialmente reproduzo, com a devida vénia. Ei-lo:


El SPD pierde el voto de apoyo del mayor sindicato alemán


IG Metall rechaza los recortes sociales aplicados por los socialdemócratas

El jefe del sindicato alemán IG Metall, Berthold Huber, ha rehusado apoyar al candidato del Partido Socialdemócrata (SPD), Frank-Walter Steinmeier, en la campaña electoral recién inaugurada. En una entrevista concedida al diario Süddeutsche Zeitung, el líder del mayor sindicato alemán señala: "Se acabaron los tiempos en los que el sindicato recomendaba el voto para unos o para otros".

Steinmeier sufre un nuevo revés en su intento de rebajar la ventaja de Merkel
El sindicato renunciará también a valorar los programas electorales para orientar a los votantes. Huber, que es militante socialdemócrata, destaca también las distancias entre su sindicato y el nuevo equipo que Steinmeier presentó el jueves como pistoletazo de salida de la campaña veraniega para las elecciones generales del 27 de septiembre.
La entrevista supone un nuevo jarro de agua fría sobre el intento socialdemócrata de recortar distancias con su actual socio de Gobierno, la Unión Cristiana Democrática (CDU) de la canciller Angela Merkel. Mientras Merkel sigue de vacaciones, Steinmeier adelantó unas semanas el inicio de su campaña y trató de colocarse en el centro de la atención mediática presentando un gabinete en la sombra.
Ahora, la falta de apoyo de IG Metall oscurece el perfil social y combativo que Steinmeier quería imprimir a sus propuestas. Ante la crisis económica, el SPD quería presentarse como defensor de los puestos de trabajo y las prestaciones sociales.
Huber dirige desde hace dos años el poderoso sindicato IG Metall, que tiene más de dos millones de afiliados. El sindicalista arremete en la entrevista contra las políticas aplicadas por sus compañeros de partido durante 11 años en el Gobierno de Alemania. Huber ataca los recortes sociales del canciller Gerhard Schröder, que gobernó entre 1998 y 2005. En su opinión, "son percibidos como una amenaza" por los trabajadores alemanes. La participación de los socialdemócratas en el Gobierno de Merkel también es objeto de las críticas de Huber, en especial el retraso de la edad de jubilación hasta los 67 años, aprobada en 2007 por la gran coalición.
Las reformas de Schröder, conocidas como Agenda 2010, abrieron una gran división entre el SPD y sus sindicatos históricamente afines. La labor conjunta de SPD y CDU durante los últimos cuatro años ha dado a Merkel un halo centrista, mientras que ha disuelto el perfil político de su contrincante socialdemócrata. Así, Huber señala en su entrevista que tiene "menos problemas con la CDU que con el FDP", en alusión al Partido Liberal Democrático con el que Merkel quiere coligarse si no logra una mayoría suficiente para gobernar en solitario.
Las críticas al equipo de Steinmeier para las elecciones llegaron también ayer desde Los Verdes. Claudia Roth, presidenta del partido, acusó a Steinmeier de intentar "dar una imagen de renovación eligiendo de nuevo a los actuales ministros".
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Dedico este texto àqueles que no PS transigem com a ideia do Bloco Central, ainda que embrulhada numa vaga ladaínha que a remete para o lugar aparentemente distante de uma última hipótese, que aliás muito convenientemente dizem indesejar. Aconselho ainda a sua leitura a quem procura amarrar o PS ao pântano da transigência com hipotéticos governos minoritários de direita. Uns e outros deviam meditar sobre o texto acima transcrito.
De facto, o que se tem vindo a esboroar na Alemanha, como reflexo da teimosia no celebrado "novo centro", agora velho de mais de uma década, é um bloco político-social que levou mais de um século a construir.
A terceira via e seus sucedâneos, podem até render, no curto prazo, vitórias eleitorais, mas a longo prazo são apenas o suicídio suave do socialismo democrático e um sério contributo para o agravamento dos problemas dos países em que se instalem.
O maior contributo que os socialistas podem dar aos seus países é o de serem eles próprios. Para políticas de complacência com a direita e para a aceitação do capitalismo como fim da história, não é necessária a esquerda. É mais do que suficiente a direita que,afinal, existe para desempenhar esse papel.