quinta-feira, 16 de abril de 2009

Europa - socialistas e compromisso histórico- II


Ontem, incluí neste blog a transcrição da "Introdução" a um texto da minha autoria, intitulado “Europa - socialistas e compromisso histórico”, que foi publicado no número mais recente da revista FINISTERRA. Como então disse, por razões que me são estranhas, a versão do meu texto que foi publicada não é a mais recente, enviado para a FINISTERRA em Novembro passado, mas sim uma versão anterior que eu remetera para a revista em Fevereiro de 2008. Ontem, publiquei a "Introdução", hoje vou publicar a "Conclusão"do artigo, igualmente na sua versão de Novembro de 2008, que difere menos da versão publicada do que o texto que ontem difundi.
Eis a "Conclusão" :



"Uma União Europeia aberta ao futuro, humanista, democrática, libertadora e solidária, seria um factor de esperança na evolução do mundo em que vivemos. Pelo contrário, o colapso do projecto que a sustenta seria um retrocesso dramático. No entanto, se ela continuar enredada nos cânones do neoliberalismo, a esperança poderá esvair-se e o risco de colapso aumentará.
Para fugir a esse risco, é necessário um caminho que possa começar a ser percorrido a curto prazo. É o que acontece com o compromisso histórico proposto. Na verdade, nada impede os socialistas de começarem a prepará-lo desde já, uma vez que não pressupõe qualquer ruptura política prévia, não depende de uma dramatização da conflitualidade social, nem de quaisquer acontecimento particular.
Não deve, no entanto, esquecer-se que, para a sociedade evoluir, na vigência desse compromisso, no sentido pretendido pelos socialistas, será decisivo que os movimentos sociais futurantes assumam nesse processo um papel activo e relevante.
De facto, o compromisso histórico proposto é um pacto para garantir as condições gerais de uma disputa política democrática, através da qual os socialistas hão-de procurar, naturalmente, passar de subalternos a hegemónicos. Ora, essa luta nunca poderá ser apenas institucional. Pelo contrário, envolverá necessariamente todos os aspectos da vida em sociedade, nomeadamente, os de natureza social, cultural e ideológica. Por isso, os partidos da Internacional Socialista terão, também, que aprender a suscitar novas sinergias com os movimentos sociais futurantes, particularmente, com os que exprimam resistência e alternatividade, em face do capitalismo.
Envolvendo necessariamente as duas grandes famílias políticas europeias, esse compromisso não deve fechar a porta a um pluralismo mais amplo. Todavia, como se sublinhou, os socialistas europeus têm que participar nele a partir da sua própria identidade, com base, portanto, num paradigma exterior ao neoliberalismo.
Na verdade, os partidos da Internacional Socialista não podem continuar a admitir o condicionamento da sua liberdade de acção, em nome de falsos limites objectivos, que afinal mais não são de que os pressupostos ideológicos dos seus adversários, tributários das conveniências dos poderes económicos dominantes, mas profundamente lesivos dos interesses da larga maioria dos cidadãos.
A matriz de transformação social própria do verdadeiro reformismo corresponde a um processo social complexo e prolongado. Implica imaginar-se um futuro que não repita o presente e aprender-se a descobrir os fragmentos de futuro que já hoje existam, para poder protegê-los e desenvolvê-los.
Nada tem a ver, sublinhe-se uma vez mais, com a contra-reforma neoliberal, que não passa de uma máscara tecida por dinamismos conjunturais e desgarrados, para ocultar o profundo conservadorismo que representa o esforço de eternização do capitalismo.
Tudo isto tem que ser assumido, sem ambiguidades nem tergiversações, pelos partidos da Internacional Socialista. Sem essa radical mutação no processo de construção europeia, a Europa tenderá a ser, cada vez mais, uma sucessão de equívocos, armadilhada por dificuldades crescentes, presa fácil de um agravamento de crispações e conflitos.
De facto, a crise que atravessamos mostra claramente que, sem uma esquerda com protagonismo próprio, relevante na esfera do poder político, a direita tenderá a limitar-se a responder aos problemas imediatos incontornáveis, reproduzindo todas as condições para que ciclicamente se repitam, embora sem poder garantir que o não façam com uma força e gravidade maiores. Paralelamente, tenderá a radicalizar-se em sinergia com os poderes de facto, que tendem a tornar-se crescentemente mais sôfregos.
Além do mais, só a afirmação de uma lógica alternativa ao capitalismo pode tornar visível a raiz dos conflitos sociais e indicar caminhos para sua superação. Doutro modo, perante a imagem, cada vez mais pesada, da inevitabilidade da exclusão social e da desigualdade, bem como da consequente ausência de um caminho político para sair delas, o mal-estar social dos explorados e excluídos tenderá a ser cada vez menos convertível numa energia política institucionalmente relevante e transformadora.
Aumentará o risco de se cair num mal-estar social difuso, numa angústia colectiva alheada da esperança, numa atmosfera propícia ao exacerbamento de uma conflitualidade social movida por factores circunstanciais, assente em preconceitos ou em dinâmicas aleatórias e dissipativas, politicamente estéreis. Ficará assim aberta a porta a todos os fundamentalismos, ao exacerbar dos nacionalismos mais estreitos, às alianças de todos os ressentimentos, às pulsões suicidárias de todos os desesperos. A mais vertiginosa irracionalidade poderá chegar ao cerne de muitos conflitos sociais e políticos, minando os alicerces da democracia e fazendo regredir social e culturalmente a Europa.
Hoje, vivemos uma grave crise financeira e económica que abala os próprios fundamentos do capitalismo reinante, ao mesmo tempo que já é claro o risco de grandes catástrofes ambientais. Todavia, tem sido ideologicamente ocultado o risco de catástrofes sociais e de bloqueamentos políticos. E, no entanto, eles dificilmente serão evitáveis se não soubermos caminhar para um futuro que não se limite a ser uma reprodução degradada do presente.
O contributo da construção europeia para diminuir esse risco é decisivo. Porém, só é realista contar com ele se houver um acréscimo de protagonismo dos partidos socialistas na União Europeia. Sem esse novo protagonismo, pelo contrário, o risco de uma implosão social e política da Europa tenderá a agravar-se.

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