quarta-feira, 30 de junho de 2010
Contracapa da Vértice - 32
terça-feira, 29 de junho de 2010
Contracapa da Vértice - 31
"Desgraçado daquele estado em que o homem tem a certeza de não ser algum dia mais do que é hoje".
segunda-feira, 28 de junho de 2010
Amigos, no dia inicial
Mas olhemos para a fotografia. O fotógrafo de ocasião, seguindo as instruções do Leitão Marques, não faz parte da história. São quatro os personagens que sorrindo para nós num primeiro plano, nos interpelam. Do lado esquerdo de quem olha para a fotografia, o Leitão Marques tem a mão no ombro do Décio Sousa; à direita de quem olha para a fotografia, do lado de fora, o José Augusto Gil e o Luís Namorado, mais para dentro, sorriem. Ao centro, imediatamente acima, ao lado de uma jovem que não entra nesta história, já empoleirado no carro de combate, de óculos, o Alfredo Soveral Martins brinda-nos com um sorriso de quem descobriu a raiz da alegria. Curvado sobre ele, com seu farto cabelo e sua abundante barba, o Francisco Carrilho está em festa. Imediatamente abaixo, bem escanhoado, espreitando, por cima da cabeça da jovem que não entra na história, o Mário Vale Lima respira também o novo tempo.
Olho para os sete e neles antevejo um segredo de eterna juventude. E através da saudade, tão pesada, pelos que já partiram, o Soveral e o Gil, através da fraternidade, simples e natural, que envolve os outros, descubro que, também eu, estive um pouco com eles naquele dia inicial, naquele euforia fundadora que rejuvenesceu irremediavelmente as vidas de todos nós.
Barómetro do CESOP- eleições em Portugal
domingo, 27 de junho de 2010
Foi à lã, acabou tosquiado...
Fazendo jus ao seu enormíssimo ego, que levou a que fosse voz corrente nos idos dos anos 60 nos meios estudantis de Lisboa que o referido Vasco se considerava a si próprio, modestamente, como o mais inteligente da Europa, o referido académico reduziu implacavelmente o nosso Prémio Nobel a uma sombra quase banal.
O prémio Nobel não garante a importância literária de ninguém. Basta ver a longa lista de mediocridades que o receberam. Pior ainda, o prémio Nobel é atribuído muitas vezes por razões de nacionalidade ou pura política, sem relação alguma com a obra, que num determinado ano a Academia Sueca resolveu escolher. Que Saramago fosse o único escritor de língua portuguesa a receber essa mais do que duvidosa distinção não o acrescenta em nada, nem acrescenta em nada a língua portuguesa. Só a patriotice indígena (de resto, interessada) a pode levar a sério e protestar agora indignadamente porque o Presidente da República se recusou a ir ao enterro do homem. Por mais que se diga, e até que se berre, Saramago não era uma glória nacional indiscutida e universalmente venerada.Pelo contrário, desde sempre que viveu do escândalo e da polémica. Devoto do Partido Comunista e ateu militante, não lhe custou muito. E Sousa Lara, com ignorância contumaz da nossa direita, acabou por lhe dar uma grande ajuda. O Evangelho segundo Jesus Cristo, qualquer que seja o seu mérito literário (e, para mim, é pouco), não passa de um repositório de lugares-comuns sobre o Cristianismo (alguns dos quais do século III), que não revela sombra de pensamento original e só pode perturbar um analfabeto. Para defender a sua fé, ao que parece acrisolada, Sousa Lara teria feito melhor em proibir A Relíquia e O Mandarim, dois livros de facto subversivos, que justamente não incomodaram a burguesia de uma época em que o Catolicismo era a religião de Estado.De qualquer maneira, a fama de incréu beneficiou Saramago. Como também a fama de comunista, adquirida no DN em artigos que suavam ódio e, dia a dia, pediam violência e, mais tarde, num ou noutro romance em que mitificou o povo à boa maneira neo-realista. Mas nem essa fidelidade à esquerda e ao PC merece muita consideração. Ele, que denunciava tão depressa tanta gente, nunca condenou a sério os crimes sem nome (e sem número) do "socialismo real" e, no fim da vida, gostava de se apresentar como um campeão dos direitos do homem, um exercício para que obviamente lhe faltava toda a autoridade. Apesar disso, o Estado democrático, manifestamente impressionado com o Nobel, não o tratou mal. Instalada na Casa dos Bicos, mesmo no centro da Lisboa antiga, a Fundação Saramago é homenagem bastante.”
Contracapa da Vértice - 30
Vértice nº 223/224- Abril/Maio de 1960
sábado, 26 de junho de 2010
Está aí alguém ?
O PSD atinge 47.7% (há um mês 43,9%); o PS desce até aos 24,1 % (antes 27,6 %); o BE sobe até aos 8,9% (antes 7,7 %); o CDS fica-se pelos 6,9% (antes 7,5); e a CDU desce a 6% (antes 7,1 %). Isto significa que o PSD+ o CDS têm agora 54,6% (há um mês tinham 51,6%); o PS+ o BE+ a CDU têm 39% (há um mês tinham 42,4%).
Se nos lembrarmos que das eleições de Setembro de 2009, o drama acentua-se. O PS então com 36,56% desceu 12,4%; o PSD então com 29,09% subiu 18,6%; o CDS então com 10,46 % desceu 3,3 %; o BE então com 9,85 % desceu 0,9%; a CDU então 7,88 % desceu 1,7 %. Portanto, desde Setembro passado o PSD + o CDS subiram de 39,5 % para 54,6 %, enquanto o PS+ o BE+ a CDU desceram de 54,9% para 39%.
Para além de uma inversão completa da relação de forças entre a esquerda e a direita no seu todo, estes números mostram que todos os outros partidos, em maior ou menor grau, perderam para o PSD, embora o PS seja, de longe, o partido mais atingido. Assim, consolida-se a demonstração prática de que, independentemente das intenções de cada um dos partidos da oposição, o resultado prático da sua estratégia de conjugação de esforços no ataque ao PS e ao governo actual, foi apenas vantajosa para o PSD. Tudo se passou como se os outros partidos da oposição fossem instrumentos úteis para o PSD.
No meio de todo o seu tradicional fogo-de-artifício, o CDS não deixa de estar politicamente entalado. Mas é o conjunto do BE com a CDU que parece estar num beco estratégico, uma vez que passando em conjunto de 17,73% para 14,9%, em nada beneficiou, em termos de um possível aumento do seu peso eleitoral, com a enorme queda do PS. Pelo contrário, em 9 meses, perdeu 15% do seu eleitorado de Setembro de 2009.
Tudo isto mostra que a direita, no seu todo, acompanhando a deriva europeia, parece ir de vento em popa, enquanto as esquerdas, no seu todo, parecem definhar.
Seria estulto pensar-se que os partidos de esquerda poderiam, de repente, passar por uma metamorfose virtuosa que os fizesse convergir uns com os outros. Mas será suicida que, nenhum deles actue para reverter esta situação, para modificar radicalmente o modo como se têm relacionado entre si.
É certo que também podem continuar, nesse aspecto, pelo caminho que têm vindo a percorrer, procurando o BE e o PCP diabolizar o PS, identificando-o repetitivamente com a direita, e sublinhando o PS a cumplicidade de todas as oposições e as diferenças programáticas que o separam dos outros partidos de esquerda. Mas, seguramente, que, se isso acontecer, as condições para um próximo desastre político continuarão a ser reforçadas. E se o desastre acabar por acontecer, de nada adiantará depois que os vários partidos da esquerda continuem a debater entre si qual deles é o mais culpado da catástrofe que já tenha ocorrido.
Não se trata de reconhecer acertos ou erros, nem de dar razão a uns ou a outros. Trata-se de dialogar sem condições, cada um respeitando as posições dos outros, para se apurar se é possível fazer alguma coisa, para impedir que a direita portuguesa regresse ao poder, pela mão da esquerda unida na sua crónica desunião.
Ou será que teremos de gritar para as direcções dos vários partidos de esquerda: “Está aí alguém ?”
terça-feira, 22 de junho de 2010
Cataventice ou puro oportunismo ?
2. Rapidamente, encontrei, no blog “Realistas – portugueses de corpo e alma” [http://www.realistas.orgr/bio.html],informação relevante. Realmente, é aí mencionado um pequeno número de monárquicos ilustres, entre os quais se inclui o nome de Fernando Nobre.
Por outro lado, no blog Esquerda Republicana numa postagem de 7 de Junho de 2010, sob o título “A pirueta de Fernando Nobre”, pode ler-se o seguinte texto:
3. Estes tópicos, no seu todo, mostram claramente que, quando o candidato em questão se afirmou, em declarações à comunicação social, como republicano, ou estava a anunciar uma mudança de opção (renegando a sua velha opção monárquica) ou estava a mentir. Ora, deve sublinhar-se que nas suas declarações ele nunca se apresentou como um republicano que tivesse deixado de ser monárquico. Pelo contrário, escamoteou a sua opção monárquica, talvez, por achar que ela prejudicaria a imagem política de si próprio que queria construir.
Quanto à possibilidade de Fernando Nobre ser monárquico e ser candidato a Presidente da República, nada há a objectar. No entanto, esconder a sua opção monárquica, renegando publicamente as suas convicções, por mero calculismo eleitoralista, representa um aleijão irremediável no perfil etico-político de qualquer candidato presidencial.
E é esse aleijão que torna legítimo pensar-se que a sua imensa e bem conhecida versatilidade política, que o levou, num período de pouco mais de seis meses, ao longo de 2009, a apoiar, primeiro, o BE e depois, em simultâneo, candidatos autárquicos do PSD e do PS, é um fenómeno mais perverso e censurável do que aquilo que sugerem as simples aparências.
Na verdade, tudo isso faz com que seja legítimo pensar-se que Fernando Nobre, apenas foi tão versátil na referida distribuição de apoios, por julgar que isso lhe convinha na perspectiva da candidatura presidencial que actualmente protagoniza. Ter-se-ia, assim, tratado, neste último surto de apoios, muito mais de cultivar boas vontades, encorajadoras de futuros apoios de que pensava vir a precisar, do que uma convicta "cataventice" política.
Mas, pense-se o que se pensar desta possível interpretação da multiplicidade de opções acima mencionada, do que parece não haver dúvida é que o candidato presidencial Fernando Nobre se assumia há muito publicamente como monárquico, só tendo descoberto o seu "republicanismo" , quando lhe pareceu que isso seria positivo na perspectiva de uma candidatura presidencial que, embora estruturalmente ambígua, não podia correr o risco de uma completa inverosimelhança da sua procurada tonalidade de esquerda.
Estamos pois, aparentemente, perante um embuste político friamente premeditado, que no essencial se traduz na tentativa, levada a cabo por uma personalidade claramente radicada na direita do espectro político, de se fazer passar por alguém impregnado pelos valores e pelas grandes opções estruturantes da esquerda.
Como acontece com quase todos os " grandes salvadores", eis-nos perante alguém que afinal precisa de ser salvo.
É por tudo isso que é para mim um mistério, cada vez mais denso, que ainda haja quem, considerando-se a si próprio de esquerda, se deixe envolver numa tão descarada mistificação.
sábado, 19 de junho de 2010
DILMA ROUSSEF - entrevista
Dilma Rousseff (Belo Horizonte, 1947) está ante el mayor desafío de su vida, convertirse en la primera mujer que gobierne Brasil. Es la protegida del presidente Lula da Silva y él no ha dudado nunca en que ella debía ser su sucesora en el cargo a pesar de que la actual ministra de la Casa Civil (jefa de Gabinete) jamás compitió en las urnas por un cargo público. Lula no titubeó ni cuando se alzaron algunas voces dentro del Partido de los Trabajadores (PT) en contra de la candidatura de Rousseff -no es una baronesa del partido- ni cuando tuvo que ser operada el año pasado para extirparle un tumor linfático.
Arrastra Rousseff un pasado de militancia activa y de lucha contra la dictadura que vivió Brasil entre 1964 y 1985. La candidata del PT estuvo involucrada directamente en la lucha armada contra los militares hasta que en 1970 fue detenida y enviada tres años a una prisión, donde sufrió torturas. Era conocida como la Juana de Arco del movimiento guerrillero Vanguardia Armada Revolucionaria Palmares, uno de los más importantes de la época. Ya a finales de los años setenta contrajo matrimonio con otro integrante de la guerrilla, Carlos Franklin Paixão de Araújo, con quien tuvo su única hija y se estableció en Rio Grande do Sul. Allí se graduó en Ciencias Económicas en 1977 y allí empezó su carrera política, primero en el Partido Democrático Laborista y, desde 1999, en el PT.
En Madrid estuvo ayer apenas unas horas. Y para ser quién es, no es baladí destacar que llegó con una comitiva modesta y se hospedó en un hotel también modesto. Tiene fama de dura, pero eso es imposible de confirmar en una sola entrevista. Sí se puede decir que es enérgica, que parece muy segura de sí misma, y que no le gusta que le interrumpan.
Pregunta. ¿Si gana, seguirá el modelo político de Lula?
Respuesta. Voy a continuar el modelo de Lula pero con corazón y alma de mujer. No para repetir, sino para progresar. Para mí la mujer tiene una gran capacidad de cuidar y, al mismo tiempo, de estimular. Por supuesto que el hombre también puede ser cuidadoso, pero la mirada femenina es distinta. El programa de asistencia Bolsa Familia [las familias reciben dinero a cambio de que los niños vayan a la escuela y se vacunen], por ejemplo, lo gestiona la madre. En primer lugar, porque ella tiene un papel clave en la cohesión de la familia. Y en segundo porque... ¿Acaso usted conoce a una madre que si le dan dinero no lo destine al bienestar de sus hijos? Difícil ¿No? En Brasil, una de las mayores tareas pendientes es la recomposición de los lazos. Con mejorar la situación económica no basta, también hay que reconstruir la familia porque es clave para mejorar la educación, para combatir la delincuencia... En definitiva, para crecer como sociedad. Esta recomposición de los lazos familiares debe colocarse en el centro de la agenda política. Y no es tarea para un mandato, sino de muchos años de trabajo... En Brasil, privilegiar a la mujer no es una política de género, es una política social. El 30% de las familias brasileñas están encabezadas por mujeres. El 52% de la población somos mujeres, y el 48% restante son nuestros hijos. No se trata de crear un matriarcado, sino de darle a la mujer la importancia que tiene para la estructura familiar. Lula tiene mucha sensibilidad con este tema, él fue criado por una mujer fuerte.
P. ¿No teme que la sombra de Lula perjudique su carrera?
R.
P. Esta es la primera vez que opta a un cargo electo ¿Cómo se siente? ¿Cómo está su salud?
R. La presión es la misma que cuando se está dentro del Gobierno, quizá incluso menor, porque cuando se gobierna hay que dar respuestas todos los días. El proceso electoral es distinto... Hay discusiones, debates, viajes... Pero me permite estar más cerca de la gente. Y el pueblo brasileño es muy alegre, muy sentido... Me gusta mucho, la verdad. Y de salud me siento muy bien.
P. ¿Si gobierna, cómo conjugará las políticas de crecimiento económico con la protección del medio ambiente?
R. En Brasil, el 87% de la energía eléctrica procede de las plantas hidroeléctricas, es decir, que es renovable. Añadido a esto, la energía eólica está aumentando significativamente. Nuestro parque automovilístico, por otra parte, utiliza el etanol, un combustible que no es fósil. Si usted me pregunta si hay que talar árboles para producir más caña de azúcar, le digo que no. Brasil tiene una de las tecnologías agrícolas más importantes del mundo y las investigaciones para producir más en menos territorio avanzan. No es cierto que haga falta más tierra para producir más. Lo que se necesita es una mejor tecnología para aprovechar mejor los terrenos de cultivo. Esto es lo que hacemos en Brasil. Y permítame decirle que la Amazonia no solo está protegida por ley, sino que además no es un terreno fértil para el cultivo.
P. ¿Cuáles serían las principales diferencias de su modelo con el que propone José Serra?
R. La diferencia más importante es que sabemos cómo construir las condiciones para el crecimiento sostenible. Crecemos al mismo tiempo que distribuimos la riqueza. En Brasil hoy hay movilidad social, la gente sabe que mañana estará mejor. 24 millones de brasileños han dejado atrás la pobreza y otros 31 millones han escalado socialmente. Pero queda mucho por hacer, aún hay 50 millones de personas que cobran por debajo del salario mínimo. Tenemos que invertir mucho en la educación de calidad, porque eso nos permitirá estimular el empleo formal. Este año serán creados dos millones de empleos de este tipo.
P. ¿Cuáles serán las líneas maestras de su política exterior?
R. Brasil siempre ha tenido una política externa enfocada en pocos países. Los grandes logros de estos últimos años han sido el avance del multilateralismo y que el país ha tomado conciencia de su importancia dentro de América Latina. Nos manejamos con respeto y sin injerencias en políticas internas. No somos imperialistas. Impulsamos la cooperación entre los países, no políticas de imposición. No podemos ser ricos rodeados de pobres, por eso el impulso a las infraestructuras regionales es vital para nosotros. Es muy importante también la relación con África y con los BRICS (Rusia, India, China y Sudáfrica). Irán tiene derecho a desarrollar un programa nuclear para uso civil, y someter el programa con la mayor transparencia al control de los organismos internacionales es la mejor política. Pero no creo que este conflicto deba resolverse con sanciones, sino con diálogo. Hay que construir puertas, no levantar muros.
sexta-feira, 18 de junho de 2010
Homenagem a José Saramago
"Acho que na sociedade actual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de reflexão, que pode não ter um objectivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objectivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos a parte nenhuma. "
Prestemos homenagem ao grande escritor, hoje desaparecido, aceitando este texto como um dos seus testamentos políticos. Mas, aceitando-o de facto. Isto é, pensando.
sábado, 12 de junho de 2010
As sondagens como aviso
Mas a infografia mostra também a evolução das intenções de voto, desde Novembro passado. Há uma quebra suave mas continuada, do PS, uma subida do PSD, em aceleração nos últimos três meses; e ligeiras descidas dos outros três partidos.
É visível também o relativo êxito da nova liderança do PSD e o aproveitamento concentrado neste partido do desgaste relativo sofrido pelo PS. Tudo linear e de certo modo espelhando a percepção pública do que se passa. Duas observações a fazer, todavia.
Primeiro, a vantagem do PSD é de apenas uma décima, o que reflecte os limites da sua subida e a apreciável resistência do PS. É curioso, aliás, recordar como no ano passado, quando, havendo sondagens que davam entre 1,5% e 2% de vantagem ao PS, alguma comunicação social falava em empate técnico. No entanto, esses mesmos órgãos de comunicação social esqueceram-se por completo da história do empate técnico, quando se trata agora de sublinhar a facto de o PSD ter ficado à frente do PS pela diferença de 0,1 %.
Segundo, tendo havido nos últimos meses uma acção convergente de todas as oposições numa furiosa contestação do Governo e do PS, verifica-se que, sendo o alarido anti-PS feito por todos, dele só colhe frutos o PSD. Assim, estando embora o BE e o PCP motivados na sua hostilidade ao PS por razões muitas vezes distintas das que movem a direita, a verdade é que é esta quem parece ter tirado todo o proveito do esforço do BE e do PCP. Na verdade, a soma dos votos do PSD e do CDS, fazendo -se fé na sondagem, permitiria muito provavelmente uma maioria parlamentar de direita.
À semelhança de algumas outras sondagens, o PS é mais uma vez avisado, o PSD ainda não foi entronizado e ao BE e ao PCP é dada uma nova oportunidade para reflectirem sobre o risco de verem todo o seu trabalho político transformado na abertura de uma estrada, por onde passe a direita a caminho do poder.
Os partidos que forem capazes de analisar com racionalidade todos os sinais que têm vindo a ser dados, ficarão com boas possibilidades de reverterem o que lhes for desfavorável ou de acelerarem o que lhes for favorável. Os que insistirem na simples mastigação das suas rotinas actuais arriscam-se; e arriscam-se muito.
Eleições na Holanda
As recentes eleições parlamentares na Holanda abriram o caminho do poder a um partido liberal conservador ( 31 deputados) que há décadas não liderava nenhum governo. Os trabalhistas da Internacional Socialista, participantes secundários do governo cessante, ficaram em segundo lugar com menos um deputado (30), mas não deixaram de perder três lugares, relativamente ao seu fraco resultado anterior. De facto, o resultado agora obtido só foi negativamente superado uma vez desde 1946. Os democratas-cristãos que lideravam o governo cessante desceram de 41 para 20 lugares, tendo tido o seu pior resultado de sempre, desde que existem com a actual configuração, desde 1977, tendo descido do 1º para o 4º lugar. Mas, em terceiro lugar, com 24 deputados, ficou um partido de direita radical o Partido da Liberdade (PVV), que antes tivera apenas 9.
Mas o desaire relativo dos trabalhistas não foi aproveitado pelo Partido Socialista (um partido defensor de um socialismo democrático, à esquerda dos trabalhistas) que, pelo contrário, teve um resultado ainda pior, tendo recuado nove lugares, ao descer de 25 para 16 deputados. Em seguida, os Democratas 66 (defensores de um liberalismo social) tal como a Esquerda Verde ficam com 10 deputados cada um, o que significa que ambos subiram, já que antes o primeiro tinha 3 deputados e o segundo tinha 7. Assim, se estes quatro partidos se juntassem, ficariam com 66 deputados, longe dos 76 que precisariam de ter, para chegarem a uma maioria absoluta, já que o Parlamento Holandês (câmara baixa) tem 150 deputados [o Senado tem 75 senadores]. E no entanto, em 1998, embora com pesos relativos diferente [as maiores diferenças: trabalhistas – 45; socialistas -5], os mesmos quatro partidos haviam chegado aos 75 lugares.
Há dúvidas quanto ao tipo de coligação que vai surgir com base na nova relação de forças, embora sempre com o partido vencedor como eixo, sendo embora possível que se incline mais para a esquerda ou mais para a direita.
Tudo isso mostra como é evidente, fica claro que, também na Holanda, a Internacional Socialista continua a murchar. E contra o que antes acontecera não foram os socialistas de esquerda que ganharam com isso: pelo contrário, recuaram ainda mais do que os trabalhistas. E os grandes beneficiários da derrota estrondosa dos democratas-cristãos foram os liberais conservadores e a extrema-direita.
Para quando a declaração da Internacional Socialista e do Partido Socialista Europeu como tendo caído num estado de calamidade política? De facto, sem isso, pode recear-- se que os partidos nacionais desta família política não consigam sacudir o torpor que parece envolvê-los, de modo a que, em simbiose com um novo protagonismo do povo europeu de esquerda, consigam reverter o declínio que parece tê-los atingido.
sexta-feira, 11 de junho de 2010
Sacrifícios, palavras e sereias
terça-feira, 8 de junho de 2010
Manoel de Barros : a surpresa enquanto poesia
Com uma caligrafia caprichada e uma letra miúda, o poeta Manoel de Barros prepara à mão um novo livro que promete ser sua obra-prima, coroando os quase 93 anos de tranquila trajetória
A vitalidade do poeta Manoel de Barros é invejável. Próximo dos 93 anos (completa em dezembro-[ portanto, já os completou]) e apesar das dificuldades auditivas e de visão, ele escreve mais um livro. O teor ainda é um mistério mas, segundo sua primeira e mais fiel leitora, a mulher Stella, trata-se de sua obra-prima. "Manoel escreve à mão, como de hábito, com uma caligrafia muito particular", comenta Pascoal Soto, diretor editorial do Grupo Leya do Brasil, que contratou a obra do poeta mato-grossense - serão 17 títulos e esse inédito, a partir do próximo ano. "Quando recebo correspondência do Manoel, minha pulsação aumenta: são os originais de uma poesia inigualável."
De fato, como há muito trabalha na edição da obra do poeta, Soto acumulou um verdadeiro tesouro de papéis rabiscados com uma letra miúda e linhas caprichadas. Uma linguagem artesanalmente construída, sem se ater a convenções gramaticais ou sociais, mas sempre em busca da simplicidade. Fazendeiro aposentado, Manoel de Barros tornou-se, com o passar dos anos, um cultor da palavra - leitor dos sermões do padre Vieira, hábito que o ensinou, ainda jovem, a admirar a formação e utilização das palavras, ele se habituou a consultar dicionários etimológicos quando criava seus versos simples mas recheado de encanto e fantasia.
O trabalho, atualmente, é mais moroso, visto o prejuízo físico provocado pela idade. Mas Manoel continua com a mente livre como a de uma criança, como mostra na seguinte entrevista, também concedida via bilhete.
O Manoel de Barros que surge da poesia não é o mesmo daquele pessoa física, em carne e osso. Quem é o verdadeiro Manoel de Barros?
Sim, somos dois. Um é biológico, outro é letral. Ambos somos verdadeiros. Um é de sangue. Outro é de palavras. O de sangue é comum: come, bebe água e até quebra copos. O ser letral gosta de fazer imagens pra confundir as palavras. E gosta de usar palavras pra destroncar as imagens. Tipo assim: eu vi um passarinho pousado no muro da tarde. As palavras servem para me enganar e para enganar os outros. Quem escreve sobre si mesmo procura sua própria glória, disse Cristo. Eu procuro. Não sei me pular.
O sentimento de pertencer a um mundo à parte faz bem ou mal aos escritores?
A mim só faz bem. Mas eu não fico em mundo à parte. Sou muito egoísta e narcisista. Meu mundo sou eu em carne e letras. Sou o que produzo e o que não consigo produzir. Sofro um pouco nessa parte de não poder produzir.
O senhor ainda considera seu primeiro livro, Poemas Concebidos Sem Pecado, o seu melhor? Por quê?
Penso que por ser o meu primogênito informei algum dia que o meu primeiro livro é o meu melhor livro. Acho que foi uma tirada de amor. Gosto do meu primeiro livro por que ele sabe mais da minha infância do que os outros.
A palavra está acima de tudo?
Eu tenho pela palavra a mesma fascinação que a lesma tem pelas pedras. E que os lagartos têm pela solidão das pedras.
As palavras são perigosas?
Pra mim todas são amáveis. Podem me trair, mas isso é do nosso mundo. A gente precisa se vigiar ao escrever. Não podemos, ao escrever, abandonar o canto, a harmonia letral, etc. Não podemos desprezar os gorjeios das palavras.
O senhor escreveu certa vez: "O artista é um erro da natureza." Existem erros perfeitos?
Os gênios são erros perfeitos da natureza. Botei como erro porque os outros somos nós.
O senhor sempre gostou de escrever à mão. A escrita é também aquilo com que se escreve?
Eu sou minha imaginação e meu lápis. Quando o lápis acerta um erro, ele percebe e grita por uma borracha. Visto que eu seja atrasado por não usar computador.
O escritor português António Lobo Antunes disse que sente dificuldade cada vez para escrever, pois ele teme desapontar os leitores que acreditam nele. O mesmo se passa com o senhor?
Acho normal que a gente queira aparecer como é.
segunda-feira, 7 de junho de 2010
Várias esquerdas, uma vontade
sábado, 5 de junho de 2010
A transigência dos intransigentes
Vou-me embora pra Pasárgada
Este é um poema emblemático, na obra do grande poeta brasileiro Manuel Bandeira [ Recife, 19 de abril de 1886 — Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1968], a quem deste modo aqui se presta homenagem.
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau de sebo
Tomarei banho de mar !
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mais triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei -
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
quinta-feira, 3 de junho de 2010
Caprichos italianos
terça-feira, 1 de junho de 2010
O Papa deveria renunciar
Isto é - A Igreja Católica está em crise?
Isto é - Mas a Igreja Católica pode se modernizar sem perder a essência de seus princípios e, consequentemente, sua identidade?
A Igreja se engessou em suas doutrinas, em suas normas, em seus ritos que poucos entendem e num direito canônico escrito para legitimar desigualdades e conservadorismos. Os homens de hoje têm o direito de receber a mensagem de Jesus na linguagem de nossa cultura moderna, coisa que a Igreja não faz. Ela coloca sob suspeita e até persegue quem tenta fazer.
Isto é - O que o sr. acha que a Igreja Católica deveria fazer para sair dessa crise?
Isto é - O sr. acha que os escândalos de pedofilia contribuem para a debandada católica, com fiéis migrando, no Brasil, principalmente, para as igrejas evangélicas?
Leonardo Boff - Muitos cristãos não aceitam ser infantilizados pela Igreja como se nada soubessem e tivessem que receber a comida na boca. Estes estão emigrando em massa. Mas é uma emigração interna. Continuam se sentindo dentro da Igreja, mas não identificados com as doutrinas deste papa, nem com o estilo com o qual ela se apresenta no mundo, com hábitos e símbolos palacianos que os tornam simplesmente ridículos. As igrejas evangélicas crescem porque a católica deixou um espaço vazio.
Leonardo Boff - Bento XVI é fiel a uma esdrúxula teologia que sempre defendeu e da qual eu ainda como estudante e ouvinte dele discordava. Ele é um especialista em Santo Agostinho, grande teólogo. Santo Agostinho partia do fato de que a humanidade é uma “massa condenada” pelo pecado original e pelos demais pecados. Cristo a redimiu. Criou um oásis onde só há salvação e graça. Esse oásis é a Igreja. Ocorre que esse oásis é uma fantasia. Ele é tão contaminado como qualquer ambiente, haja vista os pedófilos e outros escândalos financeiros.
Isto é - Como o sr. avalia o pontificado de Bento XVI?
Leonardo Boff - Do ponto de vista da fé, este papa é um flagelo. Ele fechou a Igreja de tal forma sobre si mesma que rompeu com mais de 50 anos de diálogo ecumênico, vive criticando a cultura moderna, desestimula qualquer pensamento criativo, mantendo-o sob suspeita. Todo papa tem a missão imposta por Jesus de “confirmar os irmãos e as irmãs na fé”. Esta missão, a meu ver, não está sendo cumprida.
Isto é - Por quê?
Leonardo Boff - Bento XVI cometeu vários erros de governo com respeito aos muçulmanos, aos judeus, às mulheres e às religiões do mundo. Reintroduziu o latim nas missas em que se reza ainda pela conversão dos judeus, reconciliou-se com os mais duros seguidores de Lefebvre (Marcel Lefebvre arcebispo católico ultraconservador, que morreu em 1991), verdadeiros cismáticos. Enquanto trata a nós teólogos da libertação a bastonadas, trata os conservadores com mão de pelica. É um papa que não suscita entusiasmo. Mesmo assim, convivemos com ele, porque a Igreja é mais que Bento XVI. É também o papa João XXIII, é dom Helder Câmara, é a Irmã Dulce, a Irmã Doroty Stang, é dom Pedro Casaldáliga e tantos e tantas.
Leonardo Boff - O papa, para o bem dele e da Igreja, deveria renunciar. Devemos exercer a compaixão: ele é um homem doente, velho, com achaques próprios da idade e com dificuldades de administração, pois é mais professor que pastor. Em razão disso, faria bem se fosse para um convento rezar sua missa em latim, cantar seu canto gregoriano que tanto aprecia, rezar pela humanidade sofredora, especialmente pelas vítimas da pedofilia, e se preparar para o grande encontro com o Senhor da Igreja e da história. E pedir misericórdia divina.
Isto é - Como foi a convivência dos srs. no mesmo ambiente acadêmico?
Isto é - Anos depois, em 1985, já na Congregação para a Doutrina da Fé, ele o puniu. Como foi esse encontro?
Leonardo Boff - Ele me fez sentar na cadeira onde sentou Galileo Galilei, no famoso edifício, ao lado do Vaticano, do Santo Ofício e da antiga Santa Inquisição. Foi meu “inquisidor”, interrogando-me por mais de três horas sobre o livro “Igreja: Carisma e Poder”, que me custou o “silêncio obsequioso”, a deposição de cátedra e a proibição de publicar qualquer coisa. Mas devo dizer que é uma pessoa finíssima, extremamente elegante na relação, mas determinado em suas opiniões. E muito, mas muito, tímido.
Leonardo Boff - Não há nenhuma doutrina ou dogma que impeça as mulheres de serem ordenadas e até de serem bispos. O patriarcalismo intrínseco à instituição, governada só por homens e celibatários, faz com que não se tenha apreço pelas mulheres nem se reconheça o imenso trabalho que fazem dentro da Igreja. E, no entanto, devemos reconhecer que as mulheres, nos evangelhos, nunca traíram Jesus, como fez Pedro, foram as primeiras testemunhas do fato maior para a fé cristã, que é a ressurreição, e também foram discípulas.
Isto é - O sr. também é a favor do fim da obrigatoriedade do celibato?
Leonardo Boff - Entre a pedofilia e o celibato há um denominador comum que é a sexualidade. A educação sexual que os candidatos ao sacerdócio recebem é carregada de suspeitas e distorções e é feita longe do contato com as mulheres. Hoje sabemos que o homem amadurece sob o olhar da mulher e vice-versa. Quando se tolhe um desses polos da equação, pode surgir o recalque, a sublimação e as eventuais distorções. A pedofilia é uma distorção de uma educação sexual mal realizada. Ademais, a pedofilia é um pecado e um delito.
Isto é - O sr. pode explicar melhor?
Leonardo Boff - A Igreja só via o pecado que podia ser perdoado, e tudo terminava aí. Não via as vítimas, que eram crianças e adolescentes que sofreram violência. Ela não via o delito que deve ser levado aos tribunais para ser julgado e receber a punição adequada. Este lado sempre foi mantido em sigilo, para não prejudicar a imagem da Igreja. Isso configura cumplicidade no crime. Graças a Deus, o papa agora acordou, se redimiu, reconheceu o delito e exige a denúncia dos pedófilos aos tribunais civis.
Isto é - Quando o sr. era frei franciscano, soube de casos de abuso sexual?
Leonardo Boff - Nunca soube de nada.
Isto é - O que o sr. acha da Renovação Carismática Católica?
Leonardo Boff - É um movimento forte, que trouxe muitos elementos positivos, pois tirou o monopólio dos padres. Agora o leigo fala e inventa orações, coisa que não ocorria. Deu certa leveza ao cristianismo, muito centrado na cruz e na paixão e menos na alegria e na celebração. Mas, a meu ver, ela ficou a meio caminho.
Leonardo Boff - Eles produzem um tipo de evangelização adequada ao que é dominante hoje, que é o mercado. Mas com as limitações que o mercado impõe, tenham eles consciência disso ou não. É sempre problemático, do ponto de vista teológico, transformar a mensagem cristã numa mercadoria de fácil consumo e de pacificação das consciências atribuladas. Noto que as grandes questões sociais estão ausentes em seus discursos e cânticos.
Isto é - Por quê?
Isto é - O sr. ainda é católico?