O programa foi diversificado, tendo começado no dia 4 com uma Sessão Solene. Seguiu-se-lhe uma visita por alguns dos mais ricos lugares de cultura do Concelho de Baião, tendo o primeiro dia culminado com um jantar na Fundação Eça de Queiroz. No dia seguinte, o programa incluía uma visita na terra natal do homenageado ( Santa Marinha do Zêzere), ao que no futuro virá a ser o"Centro de Estudos e Documentação Professor Orlando de Carvalho" e, além do mais, uma romagem ao jazigo do Dr. Orlando.
Só assisti à Sessão de Abertura e usufruí de uma parte do passeio que se lhe seguiu. É dessa sessão que quero dar testemunho. O Auditório Municipal do Baião estava cheio. Familiares e gente da terra, amigos vindos de longe. A Faculdade de Direito de Coimbra bem representada. Muitos dos seus alunos e amigos. Vários oradores. O Eldad Neto, um dos impulsionadores da Homenagem, deu as boas-vindas e foi dando a palavra aos oradores. Começou o Presidente da Câmara, José Luís Carneiro, com brilhantismo e sobriedade, assumindo-se como autarca, elevando o seu concelho nas palavras com que se referiu, mas sem esquecer ou diminuir o que ali nos trouxera.
Seguiu-se-lhe o Bastonário da Ordem dos Advogados, António Marinho e Pinto, recordando o mestre de muitos combates, o gume das palavras exactas e nunca adormecidas, a voz incómoda, por vezes, agreste, sempre justa. Gomes Canotilho homenageou com uma apreciável leveza literária o saudoso mestre, relembrando-o através de uma pequena colecção de instatâneos poéticos, que acordaram a saudade. José Teixeira de Sousa, psiquiatra portuense e conterrâneo do Dr. Orlando, de quem foi um amigo de sempre, partilhou connosco algumas preciosas memórias pessoais.
Um perito comentou uma pintura a óleo da autoria de Henrique Vaz Duarte, na qual Orlando de Carvalho é retratado e que ao lado se reproduz.
No meu livro de poemas publicado em 2003, "Nenhum Lugar e Sempre", incluí um poema A Hora do Tigre, já aliás difundido neste blog, que apenas referi como sendo um poema de homenagem. Chegou o momento de dizer que é um poema de homenagem a Orlando de Carvalho, não podendo deixar de o transcrever aqui uma vez mais.
A Hora do Tigre
Foi em vão que esperaste, loucamente,
essa hora do tigre desregrada
que te rasgasse o fundo de ti próprio.
Foi em vão que, sofrendo, imaginaste
essa hora do tigre que inventasse
o gesto de uma audácia ainda pura.
Foi em vão que, sonhando, construíste
uma hora do tigre que salvasse
de misérias, insídias, de traições,
das emboscadas torpes e fatais.
Soltaste, ainda em vão, o voo das águias
que fosse além de todas as montanhas
e nas asas do vento abandonasse
a secreta flor do teu destino.
Estavas preso entre nós, desamparado,
numa angústia sem margens que perdia
suas próprias raízes.
Só o extremo de tudo te bastava
na mais larga ambição de liberdade,
harpa de um sonho, som de violino,
ou asa do rigor de uma palavra.
Abriste cada gesto, em tempestade,
aos mistérios da luz, despovoados.
O mundo num poema e em cada verso
o secreto sabor da madrugada.
Foi em vão que esperaste, loucamente,
essa hora do tigre desregrada
que te rasgasse o fundo de ti próprio.
Foi em vão que, sofrendo, imaginaste
essa hora do tigre que inventasse
o gesto de uma audácia ainda pura.
Foi em vão que, sonhando, construíste
uma hora do tigre que salvasse
de misérias, insídias, de traições,
das emboscadas torpes e fatais.
Soltaste, ainda em vão, o voo das águias
que fosse além de todas as montanhas
e nas asas do vento abandonasse
a secreta flor do teu destino.
Estavas preso entre nós, desamparado,
numa angústia sem margens que perdia
suas próprias raízes.
Só o extremo de tudo te bastava
na mais larga ambição de liberdade,
harpa de um sonho, som de violino,
ou asa do rigor de uma palavra.
Abriste cada gesto, em tempestade,
aos mistérios da luz, despovoados.
O mundo num poema e em cada verso
o secreto sabor da madrugada.
Foi na hora do tigre que ensinaste
a épica altivez de ser vencido
e num último voo ainda ousaste
o gesto de ir mais longe.
6 comentários:
Recordando o Dr. Orlando de Carvalho como Árbitro Sindical na negociação do Contrato Colectivo de Trabalho dos Empregados Bancários.
"...Foi um espectáculo verdadeiramente espantoso este de ver a mais alta hierarquia financeira declarar aos quatro ventos que está a um passo da miséria.
Acreditará qualquer pessoa, acreditará o País ?
O tempo há-de mostrar que, aqui também, o rei vai nú!
(...) a batalha não foi nem podia ser perdida.
A vossa força é a força real do trabalho contra a qual não resiste nenhum "bluff" dos banqueiros.
Se a Classe permanecer como um só homem, unida e firme nas suas reivindicações mais legítimas, não tardará o momento em que a parede há-de cair.
( Da mensagem do Dr. Orlando de Carvalho às Assembleias dos Bancários em 09/Julho/1973 )
João Rocha
É com saudade que me associo à tua justa homenagem a ORLANDO DE CARVALHO, mestre com quem muito aprendi dentro e, sobretudo, fora das aulas. Inclusivé em Santa Marinha do Zêzere, onde o visitei quando me encontrava em férias em Baião. Ele e TEIXEIRA RIBEIRO são professores que sempre recordo pelo exemplo, verticalidade e desassombro. Um abraço
Não custa nada meter os creditos fotográficos:
http://denunciacoimbra2.wordpress.com/fotos-com-historia/
Abraço
Foi uma omissão pela qual peço desculpa.
Passado tanto tempo, desde que a coloquei no blog, fico na dúvida sobre se não mencionei o autor da fotografia por rotina descuidada ou se pura e simplesmente o ignorava. E, podendo estar enganado, numa primeira memória, parece-me que fui buscar a fotografia a uma fonte que não mencionava que o seu autor era Paulo Abrantes.
"Só o extremo de tudo te bastava
na mais larga ambição de liberdade"
Perfeito. Ninguém o disse tão bem. Obrigado.
Pedro Caeiro
Agradeço, as suas palavras. Principalmente, porque elas qualificam a homenagem que pretendi fazer.
Rui Namorado
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