Quem tiver visitado este blog nos últimos meses poderá recordar-se, fazendo fé nalgumas notícias aqui dadas, que há muito o Clube Político Margem Esquerda, vem preparando uma moção para apresentar no próximo Congresso do PS.
Essa moção foi entregue na sede nacional do PS na passada sexta-feira, dia 16 de Janeiro, por volta do meio-dia. Foi a primeira moção a ser entregue. Na parte final da sua elaboração, recebeu contributos de muitos camaradas exteriores à Margem Esquerda, os quais vieram assim, naturalmente, a subscrevê-la. No momento da sua entrega, recebera já o apoio de mais de duzentos socialistas, sendo certo que apenas teriam sido estatutariamente necessários cem subscritores.
O seu sentido é o de superar uma rotina, de apontar para a urgência de se romper o círculo viciosos dos hábitos organizativos, das inércias paralisantes que têm vindo a atrofiar o partido, deixando que ele acompanhe a voragem de deslegitimação cívica que tem vindo a corromper os partidos políticos, em Portugal é certo, mas também noutros países europeus. Por isso, a moção se propõe essencialmente contribuir para mudar o PS. E sublinha a necessidade de uma mudança profunda no PS, por saber que, no caso português é irrealista esperar conseguir mudanças profundas no país, se um dos instrumentos centrais dessa mudança necessária – o Partido Socialista - não começar a mudar, já. Por isso, a nossa moção afirma o imperativo de se “Mudar para Mudar”, ou seja, de “mudar o PS para mudar Portugal”.
Foram dados a conhecer a muitos socialistas vários documentos preparatórios da versão final da moção. Essa versão final será divulgada abundantemente, tal como as outras moções. Qualquer interessado pode pedir desde já esse texto, dirigindo-se através da internet a mudar.para.mudar@gmail.com (também se pode dirigir directamente a mim para rop37798@mail.telepac.pt ). A curto prazo, receberá o ficheiro com o respectivo texto.
Apesar disso, talvez valha a pena que eu vá sublinhando neste blog alguns dos aspectos mais relevantes da referida moção.
Quanto ao PS, apontamos dois tipos de medidas, como elementos do necessário processo de mudança que preconizamos, umas imediatas e outras para irem sendo implantadas num processo prolongado. Quanto às medidas imediatas, valorizamos três: 1) eleições primárias para escolher os candidatos do PS a todas as eleições em que se apresente como partido, sejam elas autárquicas (neste caso, essencialmente o candidato a Presidente da Câmara), legislativas, europeias e presidenciais, envolvendo militantes, simpatizantes e eleitores habituais declarados; 2) aperfeiçoamento da democracia interna do partido, instituindo regras que garantam a plena igualdade de todas as candidaturas, proscrevendo-se assim todas as práticas e comportamentos que inquinem as eleições internas no PS; 3) tomar as necessárias medidas preventivas para evitar o risco objectivo de que as estruturas partidárias dirigentes possam servir de plataformas de favorecimento em negócios pessoais, ou seja, tornar objectivamente impossível no plano do partido a promiscuidade entre a política e os negócios.
Quanto às medidas de médio prazo, destaco: 1) trazer a cultura para dentro do PS como prática habitual veiculadora dos pressupostos indispensáveis para a impregnação do partido, enquanto colectivo de militantes e cidadãos, pelo espírito crítico necessário para a compreensão do complexo mundo em que vivemos; 2 ) construção de uma vertente mutualista formal, ligada ao partido que una os socialistas numa solidariedade organizada que, em sinergia com elas, seja um complemento das estruturas públicas de solidariedade e segurança social; 3) substituir o distrito pela região como base da estrutura federativa do partido; 4) usar todos os recursos da internet para dotar o PS de uma rede nacional de contactos entre os seus militantes e entre eles e as suas estruturas; 5) modernizar as sedes existentes de modo a torná-las espaços acolhedores, funcionalmente adequados às tarefas implicadas por tudo o que atrás se disse.
A moção não esquece naturalmente a tradição socialista em que se incorpora, valorizando-a criticamente, e assume uma visão prospectiva do mundo que transcende a simples reprodução do presente. Propõe, por isso, uma nova ordem institucional mundial democrática e a pressupõe a caducidade histórica do capitalismo, valorizando a necessidade de um horizonte socialista.
No centro das preocupações centrais que devem estar no cerne das políticas socialistas, coloca o combate às desigualdades, geradoras da miséria e da infelicidade de uma boa parte dos portugueses, cuja centralidade não a faz , no entanto, esquecer idêntico sofrimento de uma grande parte da humanidade.
Sublinha a centralidade da educação na conquista de um futuro decente para todos os portugueses, valorizando a urgência de uma profunda reforma da educação que responda quer aos novos desafios que as próprias mutações sociais, tecnológicas e civilizacionais induzem, quer aos reflexos do progresso científico no binómio “ensinar-e-aprender”. Uma refforma que responda a esses desafios que são universais, mas que saiba também corresponder aos que sejam especificamente portugueses, entre os quais se destaca a degradação da formação de professores desencadeada pelo cavaquismo e não revertida pelos governos posteriores. Nesta medida, salienta que toda a dramaticidade de que se reveste a questão das avaliações é uma luta em torno de uma questão distante do que é, na verdade, essencial hoje no plano educativo. O essencial é recuperar um sistema de formação de professores que foi desqualificado, porque o essencial é ter bons professores e não avaliar bem professores. Nesta perspectiva, a moção sublinha que o processo de reforma que se preconiza só tem possibilidades de êxito se envolver a participação e o envolvimento dos professores, que para isso têm que ser dignificados e estimulados. É por isso que a desmotivação dos professores é, em si mesmo, um factor de degradação do sistema educativo.
Aponta também os vectores estruturantes de uma reforma do sistema político, sustentando que ela só faz sentido, se incorporar o processo de regionalização, cujos parâmetros e pressupostos a moção desenvolve com clareza.
Também é valorizado o papel do cooperativismo e da economia social, em geral, como factores estruturantes de um desenvolvimento sustentável, em sinergia com a ideia de que a transformação da sociedade não se faz apenas a partir do governo, nela desempenhando um relevante e insubstituível papel o sector cooperativo e social.
A moção ocupa-se ainda de diversas outras temáticas políticas, tais como, entre outras, a saúde, a política energética, a justiça, a segurança, a imigração, a cultura , a formação profissional.
Na minha opinião, esta moção, que não propõe um candidato próprio à liderança do partido, não é uma moção nem de aplauso nem de oposição ao actual governo. Entre os seus subscritores são diversos os graus de aplauso e de crítica ao actual governo e à direcção do partido. Esta moção, para sublinhar o óbvio, é apenas o conjunto das ideias e das propostas que contém Não tem por detrás de si nenhuma estratégia dissimulada, nem se construiu com base em cálculos. Não é um labirinto de alusões e de silêncios medidos, é um texto ostensivo. Não pede licença para criticar, mas não esconde traições programadas. Traduz apenas o compromisso entre as posições dos militantes que ajudaram a construí-la e vive do apoio de todos os que se revejam no essencial do seu conteúdo. Tudo isto significa que esta é uma moção crítica fortemente centrada numa proposta de renovação do partido, por entender que só um Partido Socialista renovado pode ser verdadeiramente eficaz, como guia do desempenho político de um governo que apoie e pelo qual se responsabilize politicamente.
5 comentários:
Não tendo lido a moção na sua totalidade mas apenas os aspectos/princípios que agora me foram dados a conhecer e dos quais comungo em grande parte, não subsistem dúvidas do, apesar de irrelevante, meu apoio.
Na sua maioria são propostas que há muito vêm sendo apresentadas, sem que se vislumbre um aumento de adesão por parte dos militantes do PS às mudanças propostas que têm o mérito de pretender uma mudança assente em boas práticas internas que possa ter reflexos na sociedade e evitar esse aparente ( ou real?) divórcio entre a generalidade dos cidadãos e os partidos políticos, em especial o PS.
Temo que o combate à rotina se transforme ele mesmo em rotina e leve ao cansaço. Do cansaço se chega à desistência. É que nem todos temos a mesma capacidade de persistência e de resistência. No meu caso, essa capacidade já foi bem maior.
Um abraço longínquo.
Caríssimo,
Infelizmente, de boas intenções está o mundo cheio.
Interessante que no presente caso não é uma questão de tomada do poder, mas é do governo, comprometido com a alta finança europeia, estar comprometido com a continuidade.
Há já sensivelmente seis anos que em conjunto com alguns outros camaradas "algarvios", defendemos novas praticas e mais autenticidade na politica, nomeadamente ao nivel do partido socialista, nos circulos concelhios.
É com renovada esperança que vejo alguns itens, por nós já defendidos, assumirem nesta moção uma necessidade imediata na sua aplicação, pois a aproximação de mais um ciclo eleitoral de "modelo tradicional", recheado de caciquismos e influências, leva inevitavelmente à necessidade de reforço da legitimidade dos eleitos, e a uma aproximação/identificação do eleitorado com os escolhidos.
Não obstante o tempo já passado, os meus ideais por estes valores continuam vivos, e vejo que a pouco e pouco as mesmas ideias vao tomando conta de cada vez mais socialistas.
algarvenet@gmail.com
A utopia de um Governo"mundial" não compensa o esquecer a Europa politica e federal."Alter mundialismo" contra "europeismo?Reflitam...
Não se excluem as duas hipóteses. Pelo contrário, uma UE mais bem articulada é uma condição para uma aproximação a um governo mundial.
Poderá verificar que assim é, lendo a nossa moção no site Mudar para mudar ou no site do Partido Socialista.
A UE é dada como adquirida, o que não acontece com um governo mundial.
RN
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