Anteontem, participei num programa do Rádio Clube Português, comemorativo dos 120 anos da Associação Académica de Coimbra, emitido a partir da Universidade de Coimbra, onde representei a Faculdade de Economia, na qualidade de Vice-presidente do Conselho Científico, no impedimento do Presidente. Participaram professores e estudantes das várias Faculdades.
Quanto à minha Faculdade, destaquei o grande desenvolvimento dos estudos pós-graduados, situados nas áreas das suas quatro licenciaturas (Economia, Sociologia, Gestão e Relações Internacionais), bem como o significativo cosmopolitismo dos seus estudantes.
Continuam a decorrer os processos individuais de doutoramento que estavam já em curso, traduzidos numa relação de tutela na investigação entre o orientador e o doutorando. Além deles, já homologados segundo as novas regras, o conjunto dos cursos de doutoramento, dos mestrados e das pós-graduações, que estão a funcionar neste ano lectivo, chega aos vinte. Neles estão inscritos 327 alunos, dos quais 17% são estrangeiros. Estes últimos são oriundos do Brasil, dos outrods PALOPS e de mais seis países. No seu todo, estes alunos representam cerca de 12% do total de alunos da FEUC. Aliás, este número é de cerca de 2700, dez por cento dos quais são estrangeiros, distribuídos por vinte e nove nacionalidades diferentes. Podem agrupar-se em três grandes conjuntos de peso aproximado: Brasil, outros PALOPS e países da União Europeia. Fora destes três grupos, há pouco mais de uma dezena de estudantes de vários países.
Ao que julgo saber, esta percentagem de estudantes estrangeiros não se afasta da que existe na Universidade como um todo. No entanto, quanto a esta há um dado complementar com algum significado. Se juntarmos aos estudantes com outra nacionalidade, aqueles que tendo nacionalidade portuguesa nasceram fora de Portugal (em larga medida, casos de dupla nacionalidade), chega-se a um número que representa cerca de vinte por cento do total de alunos da Universidade. Como se vê, há por aí alguma publicidade enganosa de outras Universidades que, como se vê, reivindicam uma primazia de cosmopolitismo discente que não têm.
Conforme disse o Magnífico Reitor, e o Diário de Coimbra de ontem, noticiou, no ranking elaborado por "The Times Higher Education Supplement", um dos mais críveis e prestigiados no plano mundial, a Universidade de Coimbra ocupa a posição 145 a nível europeu e a 319, a nível mundial. Isto representa uma apreciável descida no ranking, mas não a impede de ser a Universidade portuguesa mais bem classificada. A seguir, surge a Universidade Nova de Lisboa que é 158 a nível europeu e 341 a nível mundial.
Os rankings não são uma sentença infalível, com base na qual se possam lançar anátemas ou desfraldar vaidades, mas podem ajudar no apuramento das estratégias e na aferição dos resultados. E não são fungíveis: o seu valor tem a marca das entidades que o promovem e do prestígio que granjearam. Este é um dos mais reputados. Não é por isso honesto ignorá-lo, na esperança que apareça um outro qualquer que dê uma preciosa primazia às conveniências de ocasião.
Por isso, não se pode deixar de registar, negativamente, a descida experimentada no último ano, que significativamente não foi apenas da Universidade de Coimbra, já que foi uma tendência experimentada por outras Universidades portuguesas. Eis um indício, que torna mais verosímil imputar a evolução à política universitária do governo do que ao improvável acaso de várias Universidades terem funcionado pior do que antes, por demérito próprio, ao mesmo tempo.
As Universidades portuguesas têm muito que progredir. E o país também. E o nível de alfabetização também, tal como a literacia e o nível de desenvolvimento cultural e a vivência cívica. Precisamente por isso, as Universidades públicas portuguesas precisam de ser destinatárias de uma política universitária adulta que as apoie sem reserva mental e que encontre mecanismos de avaliação e controle honestos, fiáveis e concludentes. Mecanismos de avaliação que possam fornecer indicações efectivas quanto às melhorias a fazer e quanto aos erros a corrigir, a partir de critérios amadurecidos, susceptíveis de avaliarem todos os parâmetros de que se faz a excelência e a utilidade social e cultural de uma estrutura tão complexa e tão avessa ao conjunturalismo como é a Universidade. Mecanismos de avaliação que não sejam cegos no apuramento dos aspectos em que as disfunções das Universidade são reflexo incontornável de mazelas e insuficiências da sociedades, contra as quais nada podem fazer por si sós.
Mas tudo será diferente, se a avaliação efectiva do mérito global da Universidades, for substituída por uma salada de instrumentos de avaliação caracterizados pela sua susceptibilidade de quantificação simples, pela facilidade de recolha dos dados envolvidos, pela viabilidade prática de um célere tratamento das respostas a grelhas de questões tão lineares quanto possível. Ou seja, se confundirmos uma avaliação fácil, rápida, barata e quantificável, com a avaliação necessária, estaremos apenas a desperdiçar tempo e recursos, ou a encenar uma farsa avaliativa, cuja única possível utilidade é a der ser usada como arma de arremesso de ideias preconcebidas. Embrulhar o totoloto da avaliação em inglês e pagar a peso de ouro um grupo de avaliadores estrangeiros, que caiam de repente num terreno que não conhecem, para reunirem um leque anárquico de elementos informativos, para darem um qualquer palpite bem engendrado, não melhora as coisas. De facto, ele pode reflectir, se for esse o caso, uma boa qualidade intelectual dos avaliadores, pode até conter indicações relevantes, baseadas na sua experiência, mas não pode reflectir uma análise que não é feita, nem um amadurecimento objectivamente impossível, nem métodos de avaliação realmente abrangentes da globalidade em causa que não foram seguidos.
As Universidades têm vindo há muito a percorrer um processo de auto-avaliação que deve prosseguir, mas da última coisa que precisam é de um processo atabalhoado de avaliação que se destine mais a salvar as aparências ou a fundamentas cortes orçamentais, do que a apurar defeitos e virtudes, a detectar limitações e virtualidade, a propor as correcções necessárias e a sugerir os caminhos mais adequados.
Naturalmente que, como qualquer política universitária posterior ao 25 de Abril, a política do actual Ministro tem aspectos positivos e nalguns casos respondeu a necessidades práticas evidentes. Todavia, encarada no seu todo é decepcionante. De facto, adoptou uma atitude arrogante e impositiva, induziu uma pressa devastadora no Processo de Bolonha, que condicionou por um controleirismo de última instância, burocrático e sorrateiro, que atrofiou todo o trabalho das Universidades. Impôs contra a esmagadora maioria da comunidade universitária uma lei que reduziu a pouco mais de uma caricatura o funcionamento democrático das Universidades, envolvendo tudo isto num processo de estrangulamento financeiro que por se inserir num verdadeiro bloco central para a liquidação das universidade públicas, agrava o que fizeram os governos anteriores e corta as pernas a alguns dos aspectos positivos das suas próprias políticas.
Para um optimista, nem tudo está perdido. Assim, seria bom que se iniciasse um processo de reexame dos caminhos percorridos pelas Universidades, bem como das políticas seguidas pelos governos posteriores ao 25 de Abril, para se poder chegar, num prazo razoável, a uma partilha de objectivos estratégicos que entusiasmassem a comunidade universitária, dessem ao poder político garantias de bom uso dos fundos públicos envolvidos e aos portugueses um horizonte de esperança e confiança nas suas Universidade. Ainda se vai a tempo de inverter a deriva em que estamos envolvidos, reabrindo as portas que o Ministro tem vindo a fechar.
Doutro modo, as Univerisides caminham para o atrofiamento , os estudantes para a inquietação larvar que é seiva de todas as revoltas e o Ministro vai sendo arratstado para uma crispação crescente. Eis um horizonte, nada esperançoso.
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