quarta-feira, 22 de julho de 2015

Cinzento escuro, quase noite


O militante do PSD Cavaco Silva aproveitou o fato de ser Presidente da República para promover um tempo de antena do seu partido. Marcou a data das eleições. Perdeu-se num labirinto de instruções confusas aos eleitores, preconizando a realização de coligações, como se em Portugal elas não existissem, como se os partidos políticos devessem seguir os seus conselhos, coligando-se entre eles entusiasticamente.

Fiquei surpreendido. Estava perante mim um misterioso agente do pensamento esotérico ou um agente despudorado, ainda que algo emaranhado, de uma pressão política sobre o PS?

Realmente, estando ele a falar no termo  de uma legislatura, em que houve um Governo de coligação durante toda ela, que sentido faz ele falar em coligações como algo que não costuma existir em Portugal ? Ou será que, sem ter o desplante de o dizer às claras, ele quer pressionar o PS para que se  coligue com a direita se ele ganhar as eleições sem maioria absoluta? Ou, pior, estará ele a tentar inculcar na opinião pública a ideia de que pode haver uma vitória da coligação da direita sem maioria absoluta, mas geradora do direito de ter primazia na iniciativa de formar Governo, devendo nesse caso ter o apoio do PS ?

No primeiro caso, o PS pode formar um governo minoritário ( como Guterres fez ) ou procurar uma coligação ou um acordo parlamentar fora dos partidos que formam o actual Governo. Não poderá nunca coligar-se com quem acaba de ser derrotado e de fazer contra  o PS uma das mais miseráveis e mais reaccionárias campanhas de que há memória; não poderá coligar-se com os agentes políticos diretos dos poderes de facto financeiros que o PS terá que conter e contrariar quando for Governo.

No segundo caso, a coligação de direita desaparecerá no momento de fecho das urnas. Depois conta apenas o número de deputados de cada partido para se determinar qual deles tem mais deputados, o que lhe dá o direito de ser encarregado de formar governo , em primeiro lugar.

 Se a coligação de direita tivesse em conjunto mais deputados do que o PS, mas não chegasse à maioria absoluta e o PSD tivesse menos deputados do que o PS, seria o PS a ser chamado para formar Governo em primeiro lugar. A máquina de propaganda dos poderes instituídos está a tentar legitimar um golpe de Estado (que é aquilo que se deverá  chamar a qualquer decisão do PR que, por hipótese, ignore o número de deputados conquistado por cada partido, dando à coligação de direita o estatuto de partido unificado, colocando o PS artificialmente em segundo lugar, mesmo com mais deputados do que o PSD).

O PR não sustentou expressamente esta via golpista, mas tudo aquilo que disse não é incompatível com ela.

Por tudo isto, mais uma vez insisto. O PS deve varrer estas toscas tentativas de perpetuar no poder  os partidos da direita, mesmo sendo eles derrotados nas eleições.

 Se a coligação PSD/CDS tiver maioria absoluta ganha as eleições , caso contrário perde-as, mesmo que tenha em conjunto mais votos do que o PS sozinho. Realmente, sendo claro que o PSD está muito longe do PS, finge-se que é a coligação que conta como se fosse um partido e dá-se verosimilhança à ficção de  uma disputa apertada com o PS.

O PS pode deixar correr o marfim , calculando que a ficção da direita pode alimentar o voto útil á esquerda, mas por mim acho mais acertado denunciar um golpe de estado, quando o vemos, ainda que seja melífluo e suave.


Enfim, o discurso do PR de hoje chamou a nossa atenção para a necessidade de o PS como partido tudo fazer para impedir que a direita se perpetue em Belém. Não nos deixemos confundir . Os presidentes de direita  não tratam a esquerda da mesma maneira que os presidentes de  esquerda tratam a direita. Não foi por acaso que o PSD tanto sonhou com o célebre tripé que tiveram durante estes quatro anos: uma maioria, um governo, um presidente. 

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