No site da prestigiada revista semanal brasileira
de grande circulação, CartaCapital, Claudio Bernabucci, um dos seus colunistas,
publicou um interessante texto que merece ser lido. O autor é conselheiro
especial da
United Nations Office for Project Services – UNOPS. O texto tem como sugestivo
título "A conspirata neoliberal". Ei-lo:
"Em toda parte estamos assistindo a uma epidemia de
comportamentos criminosos e corruptos nos vértices do capitalismo. Os
escândalos bancários não representam exceções nem erros, são fruto de fraudes
sistêmicas, de uma avidez e arrogância sempre mais difundidas.”
A autor dessa declaração, poucas semanas atrás, não é
um líder bolivariano ou um jovem contestador do movimento Occupy Wall Street.
Trata-se do renomado professor americano Jeffrey Sachs, economista que outrora
flertou com o neoliberalismo, consultor do BM, FMI e ONU, entre outros
atributos. Por sorte, Sachs não está só na batalha de ideias que ocorre,
finalmente, contra o modelo econômico dominante: numerosas vozes do mundo acadêmico
e da intelligentzia internacional, protestos dos jovens, alguns governos
do Hemisfério Sul e, mais recentemente, parte da Europa, fazem parte da
minoritária tropa. Já é alguma coisa, mas é dramaticamente pouco para domar a
fera do capitalismo selvagem.
Resulta particularmente
perigoso é que, paralelamente, foi desencadeado um ataque sem
precedentes à evolução democrática do chamado Ocidente. Nestas cruciais semanas
de agosto, acho importante conferir uma leitura política, precisa e sem
nuances, aos acontecimentos econômico-financeiros europeus, de sorte a aumentar
a atenção sobre os riscos deste momento, inclusive nas nossas latitudes.
O epicentro da guerra em curso – que não utiliza armas
de destruição física, mas visa igualmente a férrea submissão de homens a outros
homens – encontra-se hoje na Europa, com ataques especulativos furiosos contra
os países mais frágeis do Euro. O objetivo estratégico, evidentemente, não é a
falência deste ou daquele país, mas o fracasso ruinoso da experiência da moeda
única e do processo de integração europeia.
Uma vez superado o momento agudo da crise bancária em
2008, graças ao socorro providencial dos governos centrais, o sistema
financeiro neoliberal conseguiu evitar qualquer satisfação à pressão da
Administração Obama para o estabelecimento de novas regras e controles. Diante
da aliança lobista entre Wall Street, a City londrina, Fundos Hedge e bancos de
investimento americanos que administram, entre outros, os imensos tesouros dos
paraísos fiscais, até mesmo o mais poderoso governo do planeta teve de baixar a
crista. Ainda assim, foi dado o sinal de que a política quer enfrentar o
problema. Juntamente com um novo clima geral, os donos dos mercados (vale
lembrar: poucas dezenas de grupos de poder multinacional) perceberam
recentemente outros sinais “subversivos”, como a vitória socialista na França e
a onda de críticas teórico-ideológicas, inimaginável na fase precedente do
pensamento único.
Qual ocasião melhor que a
derrubada do Euro, para reverter a
própria momentânea fraqueza em um sucesso histórico? A inadequada arquitetura
do sistema político e financeiro da Europa tem se manifestado de forma patente,
com lutas e contradições internas que podem provocar paralisia fatal. Resulta
claro que a sobrevivência do Euro se liga de forma indissolúvel à aceleração da
união política federal, fortalecimento que representaria ameaça gravíssima para
os senhores das finanças. Por outro lado, se a zona da moeda europeia
precipitar-se em uma depressão ainda mais aguda – comprometendo a fraca
recuperação americana –os donos dos mercados alcançariam o primeiro objetivo de
curto prazo: a derrota de Obama pelo reacionário integralista Romney, aliado
político por definição. Uma vez eliminado o inimigo principal, seria mais fácil
o ataque final à moeda antagônica e, com essa, a definitiva humilhação do
quanto resta do modelo social europeu.
Enormes lucros especulativos, dizem os especialistas,
escondem-se por trás da constante conspiração de Wall Street & cia. contra
o Euro. A possível explosão da União Europeia e a volta às antigas moedas
nacionais, ademais, abriria pradarias a novas incursões bárbaras, com compras
de bens, territórios e almas do Velho Continente a preços de saldo.
Fantapolítica, como dizem os italianos? A realidade
dos fatos nos diz que a bandidagem do capitalismo contemporâneo supera as
piores fantasias.
A integração europeia, com todos os limites,
representa um exemplo decisivo para similares processos como o Mercosul, uma
experiência democrática e um modelo de pacificação acompanhados por crescimento
econômico e políticas sociais sem paralelo. A desgraçada hipótese de sua
derrota pode representar uma involução da civilização ocidental com
consequências inimagináveis no mundo inteiro. A manutenção e possível evolução
virtuosa de tal experiência enfrenta inimigos mortais e, hoje, necessita da
aliança vitoriosa entre progressistas e federalistas europeus. Seria importante
que os aliados destes, se existem, se manifestassem já."
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