1. O 27º Congresso Internacional do CIRIEC, que decorreu em Sevilha, entre os passados dias 22 e 24 de Setembro, teve como tema geral “Inovação e Management : as respostas aos grandes desafios das empresas da economia pública, social e cooperativa”.
Tendo-se naturalmente desenrolado de acordo com o plano previsto, com abordagem das temáticas parcelares previamente programadas, foi marcado fortemente pela conjuntura de risco de desastre económico, que actualmente assinala o bloqueio do atalho neoliberal, aberto sob a égide de Reagan nos anos oitenta do século passado.
De facto, a necessidade de estimular um protagonismo mais amplo das empresas públicas, sociais e cooperativas tornou-se verdadeiramente ostensiva. E com ela, naturalmente, emergiu a legitimidade (ou até o imperativo) de submeter o neoliberalismo (e até o capitalismo, em si próprio) a um crivo crítico mais apertado. Assim, a emergência da importância da economia pública e da economia social e cooperativa, uma e outra com lógicas distintas, mas com um largo campo para exploração em comum de sinergias, foi talvez a marca mais relevante do Congresso. Marca essa, que na opinião de quem assistiu aos anteriores congressos, talvez represente uma viragem do próprio CIRIEC.
2. Abra-se aqui um breve parêntesis para dizer brevemente o que é o CIRIEC.
O CIRIEC (Centre International de Recherches et d'Information sur l'Economie Publique, Sociale et Coopérative) é uma organização científica internacional não governamental. Tem como objectivos “assegurar e promover: a colecta de informações, a investigação científica e a publicação de trabalhos.”
Foi fundado, em 1947, pelo Prof. Edgard MILHAUD, economiste francês docente da Universidade de Genève, tendo sido inicialmente denominado "Centre International de Recherches et d'Information sur l'Economie Collective".
O referido professor fora já o fundador em 1908 da revista "Les Annales de l'économie collective", cuja perenidade queria garantir através da nova organização. Essa revista, cujo nome passaria mais tarde a ser “Annales de l'économie publique, sociale et coopérative”, órgão do CIRIEC, está a festejar este ano o seu primeiro centenário.
O CIRIEC dispõe actualmente de treze secções nacionais: Alemanha, Argentina, Áustria, Bélgica, Brasil, Canadá, Espanha, França, Itália, Japão, Portugal, Suécia e Turquia. Nos países onde não existem secções nacionais, podem filiar-se no CIRIEC directamente organizações não governamentais, cujos objectivos caibam no seu âmbito.
3. No recente Congresso de Sevilha, participaram 700 congressistas de 35 países, para além de mais algumas centenas de acompanhantes. As delegações dos vários países eram numericamente muito heterogéneas. Naturalmente, a mais numerosa era a espanhola com quase 300 participantes, seguindo-se-lhe a da Bélgica com 136, a da Áustria com 52, a da França com 47 e a de Portugal com 28. Menos numerosas, mas ainda assim com uma dimensão significativa, eram as delegações da : Alemanha, Canadá, Itália, Argentina e Venezuela. Os restantes 61 participantes repartiam-se por outros 25 países, entre os quais menciono aleatoriamente: Brasil, Japão, USA, Grécia, Senegal, México e Bangla Desh.
4. Como escrevi há dias neste mesmo blog, a conferência de Stiglitz foi um aspecto marcante do Congresso. Para além do que foi assinalado nesse outro texto, não resisto a recordar uma irónica observação que o economista americano fez, quando se referiu à chamada mão invisível do mercado, dizendo que agora se compreendia por que razão ela era invisível. E afirmou : ela é invisível, simplesmente, porque não existe.
Também ele, com simplicidade, mostrou como é um pura ilusão quase grosseira, uma pseudo-evidência, que me lembro de ter visto incluída em textos intencionalmente de esquerda, para além de fazer parte da vulgata mediática partilhada por jornalistas, por políticos de vários quadrantes e até por comentadores que se acham encartados.
Trata-se daquela afirmação recorrente que traduz a ideia de que é preciso primeiro produzir para depois distribuir, muitas vezes acompanhada com a aparente evidência de que não se pode distribuir o que não se tem, mas sempre destinada a justificar privilégios para a lógica do capital e sacrifícios para os trabalhadores.
De facto, como Stiglitz mostrou, a desigualdade social em si própria e a frustração pela penosidade das condições de trabalho prejudicam a própria produtividade, inquinam a competitividade, sendo por isso factores de degradação nos processos de produção de bens e serviços.
É a própria organização da produção e o próprio processo produtivo que têm que reflectir respeito pela pessoa humana, pelo trabalho como algo que se não reduz a uma mercadoria, para induzirem naturalmente nos trabalhadores uma motivação e uma identificação com os objectivos do que produzem, que sejam potenciadoras da sua produtividade e assim indutoras naturais de maior competitividade.
As políticas distributivas não precisarão de ser tão fortes, nem as medidas de protecção social. E, principalmente, não será tão radical o desequilíbrio entre os sacrifícios pedidos hoje aos trabalhadores, que são certos pela própria natureza das coisas, e a compensação posterior pelas políticas distributivas, que é incerta , cada vez mais incerta, e em grande parte das vezes inexistente.
5. Ainda como observações gerais, mais duas apenas. Em primeiro lugar, foi patente, ao longo das várias sessões parcelares e das duas plenárias, uma disponibilidade clara para um protagonismo crescente, por parte das organizações de economia social. Em segundo lugar, ficou bem claro o vigor da economia social na Andaluzia, bem como o forte envolvimento do poder político regional andaluz no êxito do sector.
O próximo Congresso será em Berlim, em 2010. Até lá, presidirá ao CIRIEC-Internacional, o alemão Wilhelm Georg Hanss.
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