A noite dos prodígios
ou a surpresa da recontagem
A contagem dos votos desenrolava-se com fluidez. No
estado-maior dos “ roxos” o perfume do êxito insinuava-se como luz nascente. Respirava-se
júbilo. Parecia certo que um dos seus “generais” ia entrar para o governo da
cidade pela porta grande dos votos.
Mas à medida que os votos iam sendo contados a melodia de
esperança e regozijo começou a murchar.
A noite foi ganhando um tom sépia. O tom
que prenuncia os outonos. Até que foram contados os votos da última urna ; e a noite estendeu-se como um manto fúnebre sobre uma alegria que
não chegou a nascer.
A serenidade saiu assutada do estado-maior dos “roxos”.
Explodia por todos os lados uma raiva surda contra as outras cores.
Especialmente contra os de “cor rosa” que haviam conquistado aos “ roxos” o
lugar sonhado.
Mas, para grandes males, grandes remédios: exige-se a recontagem dos votos. Exigiu-se
e os “roxos” venceram a árdua batalha: os
votos foram recontados à sombra de um juiz.
Durante dias, a alegria perdida projetou uma ligeira esperança de
voltar.
O juízo final chegou, enfim. E ─ ó desgraça das desgraças! ─ os de “cor rosa” mantiveram o lugar que já tinham
e os “roxos” continuaram sem ele. O perfume da alegria perdida que ainda restava
esvaiu-se sem remissão.
E a sombra tornou-se um pouco mais sombria, quando na
recontagem para uma assembleia coadjuvante se verificou que, aí sim, os de “cor
rosa” perderam um lugar. Perderam-no para os “vermelhos”; não para os “roxos”.
Consta que os “ vermelhos” fizeram uma
festa. Uma festa tanto mais suculenta quanto a ficaram a dever à fúria vencida
dos “roxos”. Os de “cor rosa” perderam um lugar na assembleia, mas conservaram
os que tinham-no governo. Nem caso para deitarem foguetes, nem para porem luto.
Moralidade: As
paróquias das pequenas raivas são espaços asfixiantes. E quando se respira mal
raramente se decide bem.
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