O discurso do pássaro perdido
Que fantasma é este que se assombra
com a sombra do próprio movimento?
De onde vem este gelo que nos corta
o coração que guarda o que é futuro ?
Quem escavou o ódio nesta noite,
este hálito tão sujo e tão sombrio ?
Quem disse essas palavras tão
cansadas,
erguidas como um muro contra nós?
Um corvo foge no palácio imenso
como se fosse o vento da desgraça.
As suas asas são a própria cinza,
a sua voz , o verme da tristeza.
Um outono rasgou nesse discurso
o fantasma de todos os crepúsculos
e as palavras perderam-se dispersas,
sem carne, sem luz e sem futuro.
Olhámos esse amargo entardecer
já dentro de uma outra companhia.
Pegámos com cuidado o novo dia,
sabendo que só falta caminhar.
O gavião das sombras recolheu-se
à triste solidão do seu discurso
e aí ficou gelando a sua cólera,
gelando-se a si próprio ainda mais.
RUI NAMORADO
[27/11/15]
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