1.O PS
atravessa um período conturbado, com o acentuar da sua conflitualidade interna.
A conflitualidade não é, em si própria, e necessariamente um mal. Mas esta, por
enquanto, parece sê-lo, por se travar em torno da liderança do partido a partir
das alegadas qualidades de duas pessoas e não entre duas orientações políticas
separadas por aspetos estratégicos relevantes, ainda que encabeçadas
naturalmente por pessoas.
Se estivessem em causa duas visões distintas, cada uma delas se
podia aperfeiçoar no decorrer da
controvérsia, agilizando as hipóteses de diálogo entre ambas e potenciando a
qualidade de uma possível síntese final. As repercussões externas podiam até
ser positivas, pelo relevo do que estaria necessariamente em causa.
Predominantemente, não é isso que acontece com a querela atual. O que é mais
visível é a tentativa de apoucamento de
cada parte relativamente à outra.
Cientes
disso, mas compreendendo que desencadeada uma infeliz refrega ela haverá que
percorrer um curso antes de ter um fim, os socialistas podem, no entanto,
conter danos, apurar espaços de convergência no próprio calor da refrega e agir
com a argúcia de quem não esquece que cada uma das partes precisa da outra para
levar a bom termo os objetivos que visa.
Não
se trata de um combate entre inimigos, mas de uma discordância entre parceiros
de um mesmo combate. É legítimo que cada um faça valer sem tergiversações os
seus argumentos, sem que com isso tente destruir o outro lado. Se e quando o
fizer estará também a destruir-se a si próprio. Se é dramático que dentro da
esquerda se combata por vezes como entre inimigos, muito mais dramático é que
isso ocorra entre os militantes de um mesmo partido.
2. Dito
isto, devo começar por dizer que não apoiei Seguro quando ele foi eleito e que
até ontem não tinha ainda decidido se o apoiaria ou não num possível confronto
com Costa, num futuro próximo. Depois do que aconteceu ontem, depois daquilo de
que me apercebi quanto às suas propostas, é maior a probabilidade de o vir a
apoiar.
De
facto, entre as propostas que hoje fez na Comissão Nacional, incluem-se algumas
pelas quais eu e muitos outros
socialistas nos batemos dentro do PS, há pelo menos dez anos, como é o caso das
eleições primárias para escolha dos candidatos do PS a órgãos políticos e a
adoção de medidas que contribuam para separar com clareza dentro do PS a
política dos negócios.
Se
os caminhos em causa forem adequadamente percorridos e os outros também
propostos forem calibrados com
equilíbrio, quando forem concretizados, chegaremos a um novo patamar de
qualidade na vida interna do PS e a uma apreciável melhoria do sistema
político.
De
facto, o panorama político europeu, bem como o português, depois das recentes
eleições europeias , parece indicar que,
mais do que uma crise programática do partido socialista europeu, estamos
perante um nível de confiança baixo, no que diz respeito ao modo como os
partidos dessa área exercem, delimitam e orientam a sua intervenção política na
sociedade, ao modo como se relacionam com ela.
Medidas
como aquelas que foram propostas por Seguro
visam o cerne da problemática em causa. Virtuosas no plano da
qualificação do sistema político, representam uma reviravolta profunda na vida
interna do partido, indo na direção do que era um sentimento continuado de
incomodidade por parte de muitos militantes, pela sua marginalização na
designação dos candidatos e um apego
excessivo ao status quo por parte do
chamado aparelho. A conjugação destes dois planos tem todas as condições para funcionar
como um poderoso tónico eleitoral, nada impedindo que lhes sejam acrescentados
outros fatores de fortalecimento eleitoral
e político do partido.
Por
isso, penso que é muito mais benéfico para o PS, quer politicamente, quer no
mero plano eleitoral, assumir e pôr em prática as mudanças referidas, do que
uma mudança de líder que deixasse tudo na mesma nos planos em causa. Para mais,
as propostas feitas por Seguro implicam a possibilidade de uma disputa
eleitoral para escolher quem será o próximo candidato do PS a
primeiro-ministro, podendo Costa, se assim o quiser, ser um dos concorrentes. E
atendendo a que Costa está convencido de que dispõe de uma aceitação dentro do
eleitorado do PS muito superior à de Seguro, ele só tem a ganhar com a nova
maneira de designar o candidato do PS a primeiro-ministro. Por outro lado, numa
disputa dessa amplitude, seja qual for o vencedor, o que podemos ter por certo
é que ele ficará eleitoralmente muito mais robusto do que se a designação não
passar por eleições primárias abertas.
Dir-se-á
que pode gerar-se uma situação embaraçosa para um Secretário-Geral, se,
concorrendo contra outro candidato, perder essa competição. Numa situação
dessas, seria compreensível que se demitisse, mas uma coisa é demitir-se porque
numa consulta, tendo-se pronunciado centenas de milhares de cidadãos, foi
vencido; outra coisa, é demitir-se porque um seu concorrente acha que pode
fazer melhor e há umas centenas de militantes que acham o mesmo. Por outro
lado, a verificar-se esse tipo de resultado, pode até dar-se o caso de que, por
acordo entre o SG em funções e o pré-candidato hipoteticamente vencedor, se entenda que durante
um certo tempo possa manter-se em funções o SG vencido na disputa da
candidatura a primeiro-ministro.
São conhecidas noutros países situações
paralelas. Não está aqui em causa nenhuma bicefalia, mas quando muito uma
complementaridade que sempre dependeria nessa hipótese de uma conjugação de
vontades de dois protagonistas. Uma complementaridade mais ou menos transitória
consoante fosse a vontade conjugada de ambos. Pelo que conheço de uma
metodologia idêntica já seguida em Itália pelo Partido Democrático, que, como
se sabe, pertence ao Partido Socialista Europeu desde há pouco e integra desde
a sua fundação o grupo parlamentar do
PE, onde estão os socialistas, após a escolha feita as crispações internas no partido diminuíram
e a força eleitoral aumentou. Recorde-se que nas recentes eleições europeias o
PD na Itália passou a barreira dos 40%.
Seja
como for, o importante é fixar a regra da escolha dos candidatos do PS a todas
as eleições através de primárias abertas a simpatizantes , abertas ao
eleitorado socialista habitual. Na regulação dessa via haverá que agir com
rigor e equilíbrio, sendo certo que nos últimos anos se têm multiplicado experiências
destas em partidos irmãos de vários
países. Esse mesmo rigor e essa mesma cautela devem ser usados para instituir
as regras e os mecanismos tendentes a separar a política e os negócios dentro
do PS ou a partir dele, bem como para se regularem com verdadeira transparência
e equidade democráticas, quer as primárias abertas, quer quaisquer eleições
internas realizadas no PS.
3. Fui
apanhado de surpresa pela posição assumida por Seguro. Foi uma surpresa
positiva. Mas também me surpreendeu a posição assumida por Costa e alguns dos
seus apoiantes, uma vez que, se estão realmente convencidos de que dispõem de
uma vantagem na popularidade, tanto maior quanto mais se alarga o universo dos
consultados, só têm a ganhar com este tipo de legitimação através de primárias
abertas. Realmente, um candidato a primeiro-ministro instituído pela vontade
conjugada de centenas de milhares de eleitores socialistas, seja ele qual for,
sairá desse processo amplamente reforçado.
Ao conjugar esse tipo de escolha do candidato
a primeiro-ministro com um processo idêntico de escolha dos candidatos a
deputados, o PS apresentar-se-á nas próximas eleições como uma dinâmica coletiva
de dezenas de milhares de vontades, o que se traduzirá inevitavelmente num
poderoso impulso eleitoral. Um impulso que não retira importância aos
principais aspetos programáticos, à questão das alianças ou a algumas vias de
intervenção social novas que são necessárias, mas que será um fator de enorme
relevo na atual conjuntura.
Pode
compreender-se o excesso de emoção posto em diversas posições de alguns
camaradas nossos, mas é bom ter-se presente que o caminho em causa beneficiará
muito o partido seja qual for o candidato a primeiro-ministro, tornando-o mais
forte. E muitas vezes os resultados objetivos de uma escolha política
transcendem em muito as motivações subjetivas de quem escolheu.
4. E sendo este, na minha opinião, o cerne da
questão política que está em cima da mesa, não podemos esquecer também que o
respeito pelos Estatutos é uma condição sine
qua non para o funcionamento normal de um partido, quiçá para a sua
sobrevivência. Pelo que não é possível ignorar os Estatutos do PS,
especialmente quanto às competências principais dos seus órgãos nacionais,
quanto ao modo como são eleitos e podem ser demitidos. Ora, sem pretender aqui
a analisar em profundidade as implicações estatutárias das posições em
confronto, há algumas coisas simples, mas básicas, que vale e pena reter.
Primeiro,
desde que o Secretário-Geral é eleito diretamente pelos militantes, é estruturalmente impossível que seja
demitido por qualquer dos órgãos do partido, sendo essa a razão pela qual
nenhum órgão nacional (nem o próprio Congresso) tem entre as suas competências
o poder de demitir o Secretário-Geral. Só este por decisão pessoal e livre pode
resolver demitir-se.
Segundo,
os Congressos Extraordinários não são eletivos, pelo que a capacidade eleitoral
ativa dos Congressos quanto a órgãos nacionais, que lhes é atribuída
estatutariamente, não pode ser exercida no caso de um Congresso Nacional ser
extraordinário.
Terceiro,
o SG, a Comissão Nacional ou um certo número de Federações podem suscitar a
marcação de um Congresso Nacional Extraordinário, mas não podem atribuir-lhe
poderes que lhe não estejam previamente atribuídos pelos estatutos.
5. A conjugação
do contexto estatutário com as considerações acima feitas apontam claramente no
sentido de se concretizarem os pressupostos normativos, práticos e
institucionais para materialização das propostas feitas por Seguro,
nomeadamente, a das primárias abertas. Desse modo, pode rapidamente
legitimar-se o candidato do PS a primeiro-ministro, abrindo-se assim uma porta para uma vitória eleitoral de
um PS bem mais enraizado no seu próprio eleitorado, menos crispado internamente
e mais resistente à propaganda de descredibilização dos
partidos que tem vindo a contaminar a opinião pública em Portugal..
11 comentários:
Para quem se encontra no mesmo espaço político, sem qualquer vínculo partidário, é agradável ponderar as ideias dos militantes capazes de as formularem.
Penso que líder que tem medo dos seus militantes jamais será um lider
Digo com muita magua as minhas rsizes são dessa área
O Rui sugere aqui um exame ponderado e rigoroso da situação. Ponderação e rigor devem alargar-se a todos os debates do PS, a começar pelos dois intervenientes principais. António José Seguro evidenciou crispação a mais, atitude que não o beneficia. Se o processo não decorrer com mais serenidade, prejudicará o PS e, em consequência, as alternativas democráticas para a resolução política da situação.
1ºNão se pode vociferar contra o fechamento dos partidos, contra a presença esmagadora do chamado aparelho e considerar que propor o alargamento do universo de quem é chamado a decidir é ter medo dos militantes.
2º A serenidade e a convivialidade como atmosferas saudáveis para os partidos, especialmente para um partido socialista, são qualidades a conquistar. Sem dúvida. Mas se a crispação é um desvio ao que é desejável, muito mais o são a duplicidade e a traição. Tudo isso deve desaparecer do quotidiano da vida partidária. Mas devemos ter a noção que dizer isto é muito mais fácil do que consegui-lo.
Rui Namorado
No PS existirá limites como em qualquer PARTIDO socialista europeu, o que não se pode é ultrapassa-los como agora.
A ambição pelo poder pode ser legitimada, mas desta forma...é devaneio!
Considero os dois titulares, sim mas poderá existir um terceiro para desempate..!
Porque estreitar o âmbito do Parlamento é reducionista r qualquer dos dois o pretendem.
Não votarei neles!
Quanto ao aparelho que vive como se fosse um partido Leninista é um paradoxo a sua existência
De o "Catraio" com respeito
Na questão do estreitamento do parlamento também não concordo. Mas , salvo erro, neste caso estão em cima da mesa hipóteses diversas, no quadro de um respsito pela proporcionalidade que julgo não estar em causa. Pelo que, a ser assim, a diminuição do número de deputados não deverá ter uma dimensão relevante.
Rui Namorado
Descer à Terra, por uma vez, e auscultar o que pensa a franja enormemente suficiente dos que fazem, ou têm feito até aqui, pender a balança eleitoral. Há os que são PS ou do PSD como se fossem do Benfica; até contrariados votam sempre no mesmo partido. Aí, o PS julgo que tem mais adeptos… Depois há os tais "muitos", que oscilam em cada eleição de acordo com a "qualidade" da governação cessante e as promessas do futuro ou as simpatias e antipatias várias que o candidato principal do partido. O que eu OUÇO é: o Seguro é simpático mas com ele não vamos lá… Os que agora votaram Marinho e Pinto - como já votaram PRD ou BE - os que votaram PC (tenho-os na Família) os que se abstiveram com um encolher de ombros descrente, traduzem a faixa que daria a maioria confortável ao PS. O que ouço é que o Seguro não traz nada de novo… Auscultem!
Descer à Terra, por uma vez, e auscultar o que pensa a franja enormemente suficiente dos que fazem, ou têm feito até aqui, pender a balança eleitoral. Há os que são PS ou do PSD como se fossem do Benfica; até contrariados votam sempre no mesmo partido. Aí, o PS julgo que tem mais adeptos… Depois há os tais "muitos", que oscilam em cada eleição de acordo com a "qualidade" da governação cessante e as promessas do futuro ou as simpatias e antipatias várias que o candidato principal do partido. O que eu OUÇO é: o Seguro é simpático mas com ele não vamos lá… Os que agora votaram Marinho e Pinto - como já votaram PRD ou BE - os que votaram PC (tenho-os na Família) os que se abstiveram com um encolher de ombros descrente, traduzem a faixa que daria a maioria confortável ao PS. O que ouço é que o Seguro não traz nada de novo… Auscultem!
Tenho a sensação que José Seguro que pouco ou nada fez durante os governos Socialistas, (veja-se o último de Sócrates) 2Á espera de um lugar ao sol" tornou-se LIDER POR FORÇA DO "APARELHO", UM PARADOXO NOS TEMPOS ACTUAIS.
Costa DESPENSOU OS COMUNISTAS NA CML E GANHOU ABSOLUTAMENTE.
devo DIZER QUE O partido SOCIALISTA TEM MAIS HOMENS E MULHERES COM CURRICULOS POLÍTICOS E SOCIAIS MAIS AVANÇADOS.
o QUE OIÇO É QUE NÃO BASTA SORRIR E SER SIMPATICO NA IMODESTIA.
É ao PS , TODO ELE, QUE DEVE ESCOLHER O SEU LIDER SEM VERGONHA DAS CÚPULAS.
Para hoje ou para amanhã os estatutos não estão conforme o programa, alguém terá de ver isso- a Comissão politica, a comissão nacional a secretaria geral ou até o aparelho convexo.
A competência do candidato deve contar primeiro, a vontade de servir e só depois algum interesse pessoal.
Ora, estamos próximos de eleições legislativas e é ao Partido todo ele que deve avançar e não um qualquer que seja.
De o "Catraio" respeitosamente
Tenho a sensação que José Seguro que pouco ou nada fez durante os governos Socialistas, (veja-se o último de Sócrates) 2Á espera de um lugar ao sol" tornou-se LIDER POR FORÇA DO "APARELHO", UM PARADOXO NOS TEMPOS ACTUAIS.
Costa DESPENSOU OS COMUNISTAS NA CML E GANHOU ABSOLUTAMENTE.
devo DIZER QUE O partido SOCIALISTA TEM MAIS HOMENS E MULHERES COM CURRICULOS POLÍTICOS E SOCIAIS MAIS AVANÇADOS.
o QUE OIÇO É QUE NÃO BASTA SORRIR E SER SIMPATICO NA IMODESTIA.
É ao PS , TODO ELE, QUE DEVE ESCOLHER O SEU LIDER SEM VERGONHA DAS CÚPULAS.
Para hoje ou para amanhã os estatutos não estão conforme o programa, alguém terá de ver isso- a Comissão politica, a comissão nacional a secretaria geral ou até o aparelho convexo.
A competência do candidato deve contar primeiro, a vontade de servir e só depois algum interesse pessoal.
Ora, estamos próximos de eleições legislativas e é ao Partido todo ele que deve avançar e não um qualquer que seja.
De o "Catraio" respeitosamente
Espero que não haja redução nr deputados.
Mas se por desventura acontecer...sei lá o que vai na alma dos deputados... nunca se sabe o que pode acontecer...Que será feito á proporcionalidade?
Continuo a pensar que cabe ao Partido Socialista a grande tarefa de esclarecer o povo...Mas desta forma e com estes candidatos mais aparelho me parece duvidoso.
é a tal teoria do "um em dois"
ou a da "revolução permanente" mas em períodos menos latos. Nem Trotsky...
de "O Catraio" respeitosamente
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