quinta-feira, 24 de outubro de 2013

O REGRESSO DE UM JOGADOR DE XADREZ

Foi um pugilista, lutando na política com a paixão dos combatentes. Retirou-se, perante o veredicto inapelável dos eleitores.

Leu, estudou, pensou, escreveu. Longe, no coração da Europa, numa luminosa cidade de artes e saberes. Deu tempo ao tempo, deixando os meses passarem sem pressa nem sofreguidão.

As matilhas de sombra que o assediavam sem piedade foram encarregadas de outros alvos. Os mabecos que persistem rosnam agora mais isolados, com ecos já temerosos, sem norte.

Quando já quase o não esperavam, voltou. Quando o imaginavam refém de memórias amargas, subtilmente discreto, quase silencioso, entrou na voragem do espaço público sem inibições, com palavras que não fazem cerimónia.

Não perdeu a paixão dos combatentes, mas regressou como jogador de xadrez. Sentou-se em frente do tabuleiro do nosso destino e começou a jogar.

Os portugueses olham-no com uma atenção crescente. Os que o odiaram revisitam cuidadosamente as velhas emoções, pressentindo que as coisas são agora mais complicadas, a exigirem cóleras mais bem medidas, estratégias de inimizade  mais elaboradas. Os que o transportavam aos ombros do seu entusiasmo hesitam em desembainhar uma nova alegria, interrogando-se ainda sobre o próximo horizonte. Os que o encararam num registo laico, apoiando-o ou criticando-o conforme os casos, sem pequenas raivas nem grandes incondicionalidades, dão-lhe as boas vindas, confiantes na força das ideias e cépticos quanto à consistência das fidelidades.Os que se dispõe hoje a olhá-lo de uma maneira diferente pesam-lhe cuidadosamente as palavras, escrutinam-lhe com atenção redobrada ideias e atitudes.

Perante o tabuleiro ingrato das suas ansiedades os outros jogadores observam-no. Admitiam a hipótese de o ter que enfrentar como pugilista da política. Cada um deles  receia agora  estar frente a frente com um jogador de xadrez que lhes pode dar xeque-mate.

3 comentários:

Carlos Esperança disse...

Que beleza de texto onde a forma faz jus ao conteúdo. Não me surpreende.

Fatima Moreira disse...

Excelente!!É um prazer ler este Senhor da Palavra!!

Anónimo disse...

Tudo bem, mas para ser claro ou transparente não seria melhor dizerem o nome do tal jogador de xadrez..?

E se for aquele senhor do PEK 4...que até gosto de o ouvir... Mas estou como a minha avó dúzia ao meu avô...Olha Inocêncio,,,se não te conhecesse...
respeitosamente de "O Catraio"