terça-feira, 15 de outubro de 2013

O OUTONO DOS PILARES EUROPEUS

Quanto mais a esquerda for inexpressiva na Alemanha e na França, mais estes dois pilares da União Europeia serão tomados pela anemia política de um melancólico outono. Nestes últimos dias, chegaram notícias de ambos os países que parecem indiciar um aumento do risco dessa deriva.

1. Voltou teimosamente à superfície a pequenez da grande vitória eleitoral da Srª. Merkel, com o regresso às notícias da penosa marcha rumo à formação do seu novo governo. Vitória estranha, embora tonitroantemente anunciada sem contestação, que sentou no parlamento alemão uma maioria de esquerda, repartida por três partidos (SPD, a Esquerda e os Verdes), remetendo a enorme vencedora para uma posição minoritária. Estranha esquerda essa que se aconchega na pseudo-vitória da direita, na esperança de que os seus eleitores, ao esquecerem-se da sua vitória, permitam que escape a uma severa reprovação. Reprovação impulsionada pela insólita renúncia a formar governo, praticada pelos três partidos de esquerda e causada pela sua incapacidade em chegarem a um entendimento.
Caminha-se assim para uma coligação liderada pela Sr.ª Merkel que envolverá o SPD, certamente ainda lembrado que a mais recente coligação idêntica (2005-2009) o fez descer da qualidade de um grande partido, separado dos democratas-cristãos por um escasso deputado, para a de um modesto partido de média dimensão, que ficou abaixo dos 25 %. Em quatro anos de oposição (2009-2013), conseguiu a proeza pálida de, ao subir apenas cerca de 2%, exceder ligeiramente o  modesto patamar anterior. Contudo, essa anemia política do SPD nada de positivo trouxe para o peso eleitoral dos outros dois partidos de esquerda, que continuaram penosamente a rondar os dez por cento.
Será de esperar que os eleitores alemães de esquerda continuem a dar votos a partidos que preferem ser capachos, diretos ou indiretos, de um partido de direita, que tem assombrado a Europa, do que ousarem a enorme aventura de se entenderem?

2. A França e, de algum modo, a Europa assustaram-se com um recente resultado de uma eleição local, conjugado com uma sondagem que colocava a Frente Nacional no primeiro lugar das intenções de voto dos franceses. Mesmo que não se possa  dizer que há aqui uma verdadeira exceção francesa e sendo a FN um fenómeno político com décadas, só por ligeireza, no entanto, se poderiam desvalorizar estes sinais.
E eu não estou a pensar em sofisticadas interpretações do fenómeno, mais vocacionadas para compensarem a inação do que para serem guias da ação. Não estou a pensar numa meticulosa procura de culpados, como se fosse mais importante encontrá-los do que combater politicamente o prenúncio de novas serpentes.
Estou a pensar na necessidade de confrontar a direita democrática francesa com os recorrentes sinais de transigência que vários dos seus vultos têm enviado à FN e com as consequências dessas atitudes.
Estou a pensar no imperativo de se confrontarem as várias esquerdas com a necessidade de avaliarem aprofundadamente as razões  da perda de apoio social e eleitoral que as atingiu, parte da qual,  por desespero e primarismo político, talvez se  tenha transferido para a extrema-direita.
Particularmente, o PSF não pode permanecer alheado da necessidade premente de uma reconversão estratégica, que supere definitivamente o pântano da terceira via, reconciliando-se com a sua matriz socialista, que no essencial o identifica e que não pode deixar de inscrever um pós-capitalismo no seu horizonte. O PSF, todos os partidos socialistas europeus, não podem pedir o voto ao povo de esquerda, para deixarem depois os banqueiros governar.
E não podendo imprudentemente ignorar a realidade que os condiciona e rodeia, não podem limitar-se a deixarem-se arrastar pela corrente dos automatismos económico-financeiros do capitalismo, sem praticarem a resistência possível e sem se baterem pelo seu próprio caminho, rumo ao seu próprio horizonte.
De facto, se os socialistas aceitarem exercer o poder político institucional, como meros certificadores de decisões que lhes escapam, como simples homologadores de decisões dos poderes de facto, podem penosamente governar durante uma ou outra legislatura, num ou noutro país, mas arriscam-se a sofrer um forte desgaste popular, pelas consequências sociais desse caminho. E podem assim  perder, irremediavelmente o peso político necessário para que estejam em condições de desempenhar o seu papel nuclear, como garantes e potenciadores de um  desenvolvimento democrático que transcenda o capitalismo.

Ora, faz parte das vicissitudes da luta política que um partido socialista se arrisque em prol dos seus objetivos históricos e identitários, expressão do interesse legítimo de todos os que são prejudicados pelo capitalismo, materialização de um humanismo completo, podendo pagar um preço político por essas decisões. Mas é um puro absurdo estéril que um partido socialista perca a sua base social e eleitoral de apoio, por se deixar arrastar na deriva dos automatismos económicos, eles próprios reflexos dos interesses e do domínio dos poderes económicos de facto.

3 comentários:

Anónimo disse...

não tenho que me reportar ao passado histórico.
Mas, não tem sido sempre assim?

O Partido Socialista que ao longo de décadas tem sido governante nos maiores e mais pequenos países da comunidade europeia e até antes da comunidade, fez o quê...

qualquer PS digno de ser socialista terá primeiro que governar para todo o povo e não para as suas capelinhas.

os resultados eleitorais á direita em expansão, é devido á esquerda desunida. bem sei que é difícil, mas cabe aos socialistas definirem uma estratégia de Estado de direuto Socialista para todo o povo e não só para o povo socialista.
VEJA-DE O CASO DE ONTEM -- MAIS UMA VEZ O POVO TRABALHADOR DESCEU ÁS RUAS, DIGA-SE PONTES. ONDE ESTAVAM OS DIRIGENTES SOCIALISTAS.
quando UM ps SE SEPARA DOS SINDICATOS, SEJAM UGT.S OU CGTP-IN MAL VAI ESSA CONDUÇÃO DE UNIDADE.
RESPEITOSAMENTE
DE "O CATRAIO"

Rui Namorado disse...

Resmungar , mesmo com alguma razão, tem efeitos bem menos positivos do que persuadir.

Anónimo disse...

resmungar, quem diria...
CREIO que o lado positivo da esquerda com o PS, todo ele, está encoberto por um qualquer interesse pessoal, individual ou coletivo. Daí a paralisia politica.
O agueiro ideológica entre nós povo de esquerda, não passa de um argueiro. É bom que fiquemos por aqui. Depois vem a trave e é um nunca mais.
respeitosamente de "o catraio"